Heavy Metal: Satanismo? Aonde?
Por Don Roberto Muñoz
Fonte: youtube.com
Postado em 06 de maio de 2017
Discorrendo suscintamente sobre uma fundamental faceta do tema: inexiste "tradição satânica" simplesmente porque o Mal inserido está num esquema simbólico maior de espiritualidade que diz respeito à Tradição judaico-christã dentro da cultura ocidental. De fato, Satã é o "adversário".
Por isso, não há uma "bíblia satânica", pois a personagem matriz do mundo "opositivo" aparece depois, ou seja, não começa a Tradição onde ela própria está inserida. Impossível negar a sua importância no drama Christão, mas como cita Jung – "Deus usou o seu Filho como isca para pegar o Leviatã."
Tradição remete ao Fundamento, à Unidade Primordial. Lúcifer também aparece depois, e como um ser "revolucionário", deformando surpreendentemente a sua essência ao ser acometido pelo ciúme diante do tratamento por Deus dado ao ser "humano". Judas Iscariotes, espírito protestante par excellence, também exerceu a veia revolucionária ao acreditar em um Messias político. Vale lembrar, os filhos de Caim também fazem parte deste tronco existencial devido ao primeiro fratricídio, e foram viver no oeste, onde morre o sol.
Assim, averiguar alguns acontecimentos ocorridos dentro do âmbito do Heavy Metal, sobre o específico assunto, interessa principalmente por causa das retóricas inclusas. Vejamos o caso do MÖTLEY CRÜE, onde a simbologia maléfica sempre apareceu através de um escandaloso pentagrama invertido, seja nos shows, no encarte do álbum debut, "Too Fast for Love", 1981, ou na própria capa do "Shout at the Devil", 1983. Há dois vídeos que explicitam algo muito difícil de ser escondido, ou seja, a falta de claridade de um conceito mal articulado porque supranaturalmente obscuro.
Diante do implacável questionamento de WENDY O. WILLIAMS, TOMMY e VINCE meneiam suas cabeças e evasivas pululam de suas bocas, enfim, um blá-blá-blá argumentativo pouco eficaz. No outro vídeo, NIKKI SIXX chega a ser grosseiro com o entrevistador do ClipTV, ao tentar esfregar a capa do "Shout..." em seu rosto, que reage a tempo fazendo o sinal da cruz. Evidentemente, NIKKI ficou constrangido diante desta cena. E, pior, durante a entrevista, o baixista relembra um detalhe no título do álbum – (shout) "at" (the devil) – como algo que desvinculasse os músicos de qualquer tipo de associação com o demônio.
No encarte do "Too Fast..." constam agradecimentos aos Bones. Creio que no "Shout..." também. Mas tudo indica que a idéia básica de tais proposições opositivas remeta a MICK MARS, sendo NIKKI apenas um executor. O baixista pegou emprestado um livro de satanismo do produtor e fez algumas experiências práticas bem elucidativas, vide o livro "Dirt", 2001, sobre a banda. O próprio MICK defende uma velha tese contra o Christianismo – que não passaria de uma religião equivocada porque promotora do "sofrimento", etc. Bem, a Paixão integra o processo de maturação da alma por meio da Fé, e, no final, a Ressurreição serve como um tapa de luvas de pelica no coração dos crentes na vingança, no ódio e no prazer vituperado pelas banalidades.
Existem outros como KING DIAMOND, que nega Jesus Christo desde o MERCYFUL FATE, e que, agora, quer simplesmente "esquecer" e juntar todas as espiritualidades. Aí fica fácil, o cara fala um monte de absurdos, não faz mea culpa e quer todo mundo unido, facilzinho? Não é assim não, não é assim meeesmo. Não gratuitamente a residência de Lúcifer é o abismo, cantinho do planeta reservado a ele por Deus para que nunca mais se esqueça de quem realmente manda no pedaço. E o que dizer do título "God Hates Us All", álbum do SLAYER, 2001? Peraí, os infernais tentam esculhambar a criação de Deus sempre que podem, para depois serem enaltecidos por simpatizantes como coitadinhos, como vítimas?
Goethe, com a sua versão de "Fausto", 1808-32, bem que tentou acrescentar um glamour intelectual/ espiritual ao discurso de Mefistófeles. Sendo islâmico e maçom, o autor tinha os seus motivos para tanto. Da mesma forma, seu rechaço do bombástico texto de Novalis "A Christandade ou a Europa", 1799, indica o que ele queria para a sua Germânia no futuro, recheada de laicismos burgueses e desesperos espirituais para os "não-iniciados"... Já em "Fausto" anônimo, obra primeva de 1587, ocorre a ação maligna numa coerência simbólica ímpar. Semelhante distância de proporção aparece no "Drácula" de Coppola, 1992, à face do "Dracula" de Terence Fisher, 1958. No primeiro, surge um vampiro absurdamente chorão e sensível, ao passo que no filme da Hammer Film Productions não há concessões sobre o caráter do maleficum.
Claro, "The Number of the Beast", 1982, do IRON MAIDEN foi uma jogada de marketing. E os músicos do SABBATH sempre usaram crucifixos, logo, não entram na referida temática. Surpreendente foi a guinada do CELTIC FROST, seus fãs ficados chocados. Porém, quem deu a grande dica foi GREG DULLI, THE AFGHAN WHIGS, na letra de "Retarded", álbum "Up in it", 1990, pois a enganação proveio do anjo caído, luciférico ser. Sim, Lúcifer pode ter a Visão, o olho que a tudo vê, entre outras características, mas apenas Deus contempla, luz e calor, metafísica e devoção, juntos na Santa Unidade. Sim, Lúcifer até pode amar a Arquitetura, mas Deus é quem sorri diante do Lirismo, o coração da Poética.
Roberto Muñoz, escritor
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