Carol Morreu - Fritando no Shopping (Parte 1)
Por Felipe Ricotta
Postado em 14 de julho de 2005
"Teve um show do Kiss uma vez, isso é uma parada que eu nunca esqueço porque foi fundamental na minha formação como indivíduo.
O Paul Stanley, que era realmente um cara muito foda e tal..."
"Inclusive ele cortou o freio da língua pra poder..."
"Não! Esse aí é o Gene Simmons. Porra, tu num sabe nada de Kiss, hein?"
"Lógico. É uma merda de banda, que bom que eu não sei."
"Mas enfim, certa hora do show o cara virou e fez assim AAAAAÚÚÚÚ (em falsete exageradamente bichola) e a galera foi ao delírio ÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉHHHHHHHHHHHHH. Aí ele virou pra galera de novo e fez AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAÚÚÚÚÚÚÚ e a galera ÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉÉHHHHHHHHHHHHHH. Aí ele virou e AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAÚÚÚÚÚ e eles começaram a tocar HEAVEN'S ON FIRE."
"Mas como assim, cara?"
"Pô, foi um momento muito foda."
"Ah tá. Que legal."
Marcelo D2.
Claro Hall.
Rio.
Ainda dentro do carro, debatíamos tretas do passado e a questão girava em torno do fim da parceria Ricotta-Fotógrafo Noiado (naquela noite específica mais conhecido como Batman Do Cinto De Utilidades), personagem marcante das primeiras ricottas de shows mas que começou a ser vetado do esquema pois não era rocker o suficiente e se recusava a ter o comprometimento necessário que a nossa profissão sempre exigiu. Ele deu outra versão dos fatos.
"Cara, eu fiquei bolado contigo daquela vez porque eu não queria ir pro show do Sepultura."
"Mas eu não fui no show do Sepultura."
"Eu sei, mas você queria que eu fosse sozinho, enquanto você ia pro Village People com a tua mina. Ficava exigindo seriedade da minha parte mas tirou minha vaga de fotógrafo no show do Village People porque queria me mandar pro show do Sepultura igual um mendigo."
(pra qualquer outro ser humano normal, isso ia ser ótimo.)
"É. Isso foi escroto da minha parte. Mas não é verdade esse lance de que eu tô te vetando, esses dias eu até te chamei pra ir pra Juiz De Fora ver um show do Abaixo De Zero, lembra?"
"Isso é verdade. Mas isso é porque eu ainda continuo sendo o fotógrafo das estrelas."
"Lógico. Você não é o Irmão Brother mas você é o Cousin Brother."
(...)
"São exatamente 7h e 43min. Às 6h e 46min, a gente ___________________________ e eu simplesmente estou virando o Batman. Eu quero combater o crime, eu quero jogar coisas nas pessoas..."
"Mas peraí, o Batman joga coisas nas pessoas?"
"Ele joga aquela paradinha em forma de morceguinho com corda."
Já completamente abduzidos pelo Espírito Maligno Das Pupilas Dilatadas Em Largo Espectro, eu, Dr. Love, e meu fotógrafo Batman Do Cinto De Utilidades chegamos enfim ao Via Park Shopping - a mega loja de conveniência do Claro Hall - e, andando pelo estacionamento, planejava uma entrada triunfal no estabelecimento dentro de um dos carrinhos de supermercado que morgavam solitários quase ao lado das milagrosas portas automáticas.
"Cara, eu tô ficando com medo. O Felipe quer pegar um carrinho do Casa & Construção, entrar dentro dele e ficar dando rolé por aí com todo mundo olhando."
"Vamu, cara."
Eu sempre fazia isso quando era pequeno no supermercado e sempre guardei lembranças muito bacanas de quando o espaço do carrinho ia ficando menor e eu começava a me imaginavar soterrado por chambinhos, biscoitos recheados e guloseimas variantes.
Talvez influenciado por lembranças saudáveis da infância, minha primeira entrevista com fãs de D2 da noite acabou rolando com uma menina de 8 anos que se divertia naquelas jaulinhas divertidas que os pais deixam os filhos quando precisam de alguma paz na praça de alimentação.
"Vem cá, o que você acha do D2?"
"Ah, eu acho legal."
"Mas você veio ver o show ou veio pra brincar?"
"Pra brincar."
"Sei. E você usa drogas?"
É. Eu sei. O que eu fiz foi algo muito sem noção e eu me envergonho muito. Quase editei esse momento do texto e da minha lembrança mas preferi assumir minha joselitez diante dos leitores, pedir desculpas e fazer uma promessa de NUNCA MAIS PERGUNTAR PRA MENINAS DE 8 ANOS SE ELAS USAM DROGAS. Nada justifica.
Na verdade mesmo, minha concepção de droga para uma menina de 8 anos tinha a ver com o Planeta Xuxa ou com aquele cd da Adriana Calcanhoto Pirilim Pimbolim Pim, mas ela foi embora sem que eu me explicasse e acabei saindo como o estranho malvado na história.
(...)
Depois de invadirmos uma loja que vendia ROCK'N'ROLL com interrogações pertinentes...
"Vocês não acham meio contraditório esse lance de ter uma loja de rock'n'roll dentro de um shopping?"
"Vocês não tem vergonha de ficar passando esse DVD do Bon Jovi aí não?"
"Mas afinal de contas, onde diabos estava ligado o amplificador do Steve Vai naquele clip que ele tá tocando sozinho (todo zen e fazendo caretas enquanto punheta sua guitarra) na montanha?"
...seguimos andando pelo shopping cantando e dançando como os Orishas e nessa hora, eu tive a certeza de que pálas iam rolar grosseiramente. Meu colega de trabalho me repreendia só porque eu queria sair entrevistando toda e qualquer Pessoa de Shopping que cruzasse nosso caminho e que provavelmente nem deveria saber que ia ter show do D2. Ele também tinha a certeza de que a dona da loja, "uma coroa gatinha, nova e dona de uma loja de rock'n'roll uhuuu", tinha dado mole pra ele, olhando COM O RABO DE OLHO.
"Cara, sabe que show vai ter aqui amanhã? Orishas! Como que os caras do Orishas cantam?"
A imitação dele foi melhor que a minha, eu assumo.
"A gente tá completamente perdido aqui dentro. Onde é esse maldito banheiro?"
Entrei numa loja de bebê e gestantes porque sei que o D2 é um pai que preza a família e tal, achei que ia ser bacana ouvir a opinião da subgerente de vendas da loja sobre o cara e...
"Será que eu posso ser o seu controlador de onda? Porque tá foda, cara."
"Tá bom então." - nessas horas é bom ter um fotógrafo noiado - "Melhor a gente entrar logo dentro do Claro Hall."
Na Praça de Alimentação, encontramos nosso point.
O Radical Sucos vendia latão de cerva e a gente aproveitou pra pegar o depoimento das atendentes que deram mole pra gente.
"Ela aqui tá dizendo que se encontrar com o D2 vai agarrar ele."
"Pô, mas você acha o D2 tão gatinho assim? Ele nem malha, fala sério!"
"Mas homem bombado é tão feeeeeeio."
"Opa. Bom saber disso."
Pedi o email pra uma delas e MAS EU NEM SEI O QUE É ISSO.
"Olha, você é que tá certa, sabia? Esse lance de email é mó loucura, depois que você entra no mundo virtual você não vai mais conseguir sair dele."
(a cantada nas gateeenhas do radical sucos. em off.)
"Olha, o que vocês acham da gente passar aqui depois do show, sair pra tomar uma cerveja em outro lugar e tal. Tudo bem que a gente não é o D2, não tem aquele bigodinho sensual dele mas..."
"Ihihihih..."
"(...)" - putz.
(...)
Mais uma volta no shopping.
Eu explicava pro meu fotógrafo o jeito certo de se andar num shopping tirando onda de imprensa.
"Andar tirando onda de imprensa é algo mais ou menos assim..." - (anda, anda) faz cara de tá doendo e olha pras pessoas pseudo-ignorando como se você fosse mais legal que elas - ..."lembra daquele clip do Bon Jovi KEEP THE FAITH que os caras andam na rua em câmera lenta?"
"Não lembro, eu sou homem."
Enfim, achamos a entrada de imprensa do Claro Hall mas tava tudo fechado. A gente chegou muito cedo, não tinha ninguém pra deixar a gente entrar. Estávamos fritando e com vontade de dançar rumba. E agora?
"Vamos beber até cair então."
(pô, cara. mas não vai adiantar nada...)
"Peraí, peraí... eu tô vendo aqui o Cebolinha e a Magali. A gente tem que entrevistar eles!"
"Entrevista o Cascão também."
"O Cascão não. O Cascão fede. Chegaí, Magali."
A pessonha vestida de Magali - um vestidinho amarelo e uma máscara mega cabeçuda - deixou as criancinhas do parquinho de lado pra dar seu depoimento e segundo o Marba, também estava dando mole pra gente.
"Magali, vai ter show do D2 daqui a pouco, deixa eu te perguntar uma coisa... você sempre foi muito comilona e... você seria uma Lariquenta Forever?" - ela fez que não - "Não? Mas peraí, Marba, será que a Magali é um homem? Vamos ver aqui...não, ela tem um corpo lindo, ela definitivamente não é um homem."
Cascão brincava no escorrega e a gente conseguiu um furo jornalístico bombástico.
"Cascão, você curte D2?" - ele levantou o polegar fazendo ok.
Cá entre nós, eu já sabia. De toda a galera da turma da Mônica, o Cascão sempre foi o mais sujeira.
"E por que você fede tanto?"
"Por que você fede também?"
Como assim eu fui sacaneado pelo Cascão?
"Mas peraí, eu sempre lia tuas histórias na minha infância, você vai ficar zoando com a minha cara?"
Ele balançou o Mega Cabeção de Plástico e falou que ia. Perdi a linha e se não fosse a grade que nos separava, tinha partido pra cima dele.
"Cara, eu não tô acreditando nisso. CASCÃO MALDITO! TE ODEIO!"
(continua...)
Carol Morreu
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