Carol Morreu - Surfistas calhordas

"Eu quero é que esses caras que vôam de asa-delta, dependuram-se em montanhas, os tatuados em geral e os granoleiros, se esborrachem, eles que se fodam. O problema é que o litoral brasileiro é imenso. Que se fodam os jipeiros e os fãs de Bob Marley. A maldita adrenalina está acabando com a punheta. O cara, ao invés de punhetar, bate frutas - alheio à morbidez original e tesuda da alcova - cereais e iogurte no liquidificador." (Marcelo Mirisola, o cara)

Pororocas e Netunos.
Cine Surf Rock Night.
Teatro Odisséia.

"Beleza, vejo você por lá! E vê se escreve sobre o SHOW e não sobre as garotas que supostamente você comeu, hehehehehe!" (Sandro, organizador do evento respondendo meu pedido de credencial)

Entrevista exclusiva com os Netunos, uma banda de surf music.

"Vocês acham que, depois que Bobby Martinez venceu o Hang Loose Pro Contest com nota 10 nos tubos da cacimba do padre, a tendência é que haja uma maior escovação das baterias do East Coast daqui pra frente ou isso é algo que depende muito do swell e da marca de parafina que você usa?"

"Pode ser uma combinação de tudo isso, mais muito treino, tanto no mar quanto jogando California Games."

"Se vem um tubo de mais ou menos 8 pés, você corta pelo beach-break, faz um backslip duplo mortal ou então, dependendo do swell, quebra com um cut back entrando pelo meio?"

"A gente torce pro surfista sair vivo."

"O figurino de vocês é baseado naquela famosa coleção VERÃO TOTAL da Company de 1987?"

"Nãaaaao...nossa gama de patrocínios é outra - com destaque pra Casas Turuna, nossa endorser de colares havaianos."

"Por que diabos vocês resolveram estragar TOXIC da Britney?"

"Sabíamos que o único jeito das pessoas ouvirem essa música prestando atenção apenas nela era fazer com que ela fosse cantada por outra pessoa que não a Britney. Daí, deu no que deu."

"Vocês já perdoaram a Daniela?"

"Nunca. Esperamos cantar que ela morreu pra nós por muitos e muitos anos."

(...)

Bussunda, velho amigo da galera dos Pororocas, circulava pelo recinto e eu, grande fã da tosca e antiga revista do Casseta, tinha que perguntar a parada mais óbvia pra ele.

"E aí? O que você acha dessa galera que diz que vocês se venderam?"

"Olha, a gente tava à venda fazia tempo já, mas ninguém nunca quis comprar. Aí a Globo foi lá e comprou!"

"Podecrer. E rola um veto forte lá dentro ou vocês têm uma liberdade bacana pra criar?"

"Rola muito pouca vetação."

Duas velhinhas chegaram e interromperam minha exclusiva.

"Olha, é o menino do Casseta! Nós somos suas fãs! Podemos te dar um beijo?"

"Claro, claro."

"Bussunda, a sua mãe é judia?"

Não entendi qual foi a da pergunta da velhinha, mas deixei pra lá. E depois de me despedir do cara, vazei pensando em como deve ser bacana ter Groupies Idosas. Falando sério.

(...)

Dentro do camarim, me pediram fogo e eu acabei penetrando na roda enfumaçada bem na hora em que um cara do Casseta & Planeta falava algo sobre um provável retorno da banda que eles tinham. Lembra de MÃE É MÃE VACA É VACA?

"...mas ensaiar é um saco! Blah blah blah...aí eu virei e falei VAMO FAZER A MERMA MELDA?"

Um lance legal dos aditivos é que às vezes eles têm esse poder de fazer com que você não se sinta um péla saco no lugar errado quando na verdade você não passa mesmo de um péla saco no lugar errado. Acontece direto comigo.

"Pô, desculpa interromper aí, Massaranduba, mas devolve meu isqueiro aí, cara! Ele é todo estiloso e tal, não posso perder."

"Pô, lógico, lógico."

Mais tarde, o cara do Kid Abelha, que tinha aparecido lá no Odisséia pra dar uma canja no show, me passou o banzo e eu acabei fazendo uma pergunta muito escrota pra ele, tenho que assumir. Mas a verdade é que eu realmente não tinha nada pra falar pro cara, foi a primeira coisa que me veio à cabeça. Não que eu TIVESSE que falar algo pra ele, mas... Enfim, o que lembro é que eu tava meio grog e ficava pensando em como ia ser legal poder falar pras pessoas depois que o cara do Kid Abelha tinha me passado um banzo. Mas ao mesmo tempo, não conseguia entender porque aquilo ficou martelando na cabeça, eu nem gosto de Kid Abelha! Acho que meu deslumbramento tinha mais a ver com toda a surrealidade do momento, sabe?

"Cara, diz aí, você que é um cara que já tá nessa faz tempo, eu tô começando agora com a minha banda e tal, você acha que eu tenho que desistir?"

"Pô, que cara escroto, aí."

Eu vou ter que conviver com essa lembrança pro resto da vida. Fiquei com vergonha de mim mesmo e foi bom pr'eu aprender a não sair falando qualquer merda da boca pra fora como eu sempre faço quando não tenho nada pra falar. E o cara do Kid Abelha me deu uma bronca legal que mexeu com os meus brios. Acho que era o Espírito do Rock'n'roll ou algo do tipo.

"Olha, eu tenho mulher e filha em casa, eu não precisava estar aqui. E eu tô, entende?"

(...)

Eu e meu amigo itajubense vocalista do Buena realizamos um sonho de infância e cantamos o refrão de "Popstar" com os Pororocas!

Muito emocionado e quase com lágrimas nos olhos, ele me confessou.

"Cara, eu vou contar pra geral lá em Itajubá e você vai confirmar tudo!"

"Demorou."

(...)

Se você acompanha a cena rocker carica, já deve ter reparado no ruivo que sempre está na primeira fila de TODOS os shows que rolam. Ricotta conseguiu uma entrevista exclusiva com esse cara que é atualmente uma das maiores personalidades do underground.

"Cara, quanto tempo faz que você frequenta a primeira fila dos shows?"

"Ah, já tem uns dois anos."

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"E como é isso? Ficar sempre na primeira fila?"

"Ah, eu acho legal você ter essa proximidade com o artista. NA PRIMEIRA FILA, VOCÊ SE SENTE PARTE DA BANDA!"

"Certo. E você usa drogas?"

"Não. Drogas não rola. Você perde a autenticidade."

"No show de hoje, você estava acompanhado de uma ruiva. Você acha que deveriam ter mais ruivos nas primeiras filas dos shows?"

(...)

"E aí? Você curtiu os Pororocas tocando no Ruído?"

"Achei uma MELDA. Aqueles coroas fazendo gracinha em cima do palco, as mesmas piadas de anos atrás. Só que agora não tem mais a menor graça."

Para se tecer um comentário desses como o do meu amigo, basta apenas uma certa dose de síndrome de garoto enxaqueca, misturado com um pouco de pessimismo indie exagerado, deprê do dia seguinte e um pouquinho de raiva ao culto 80's forçado.

Mas com a mesma facilidade que se cospe um comentário da boca pra fora e imbecil como esse, dá pra inverter a vibe, abrir um sorriso e se divertir pra carai com eles - que mandaram muito bem em não tocar muitas música antigas e cair no óbvio.

O lance é que o mundo continua uma melda.

Mas voltou a ser um pouco mais legal com os Pororocas por aí. É só você querer embarcar.

Como diria os Carbona, FELICIDADE INCONDICIONAL.

É o que emana dos caras.

Carol Morreu