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On The Road: Chuva de Guitarras; domínio do instrumento e feeling absurdo

Por Cláudio Vigo
Postado em 02 de março de 2001

Quando na sexta-feira avisei meus amigos colecionadores que passaria o Carnaval em casa e não havia comprado um mísero cd para encarar a empreitada, o desespero se estampou naqueles semblantes, e entre um "assim não dá" e um "isso é inconcebível", ficou combinado que receberia um estoque regulador, que criasse um cordão sanitário, anti-Alalaô e que me fizesse escapar de um eminente atropelamento do Bonde do Tigrão.

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No sábado pela manhã, um pacote de dezenove cds estava na minha portaria, trazendo de tudo um pouco: progressivo polonês, shows piratas do Tempest, até uma interminável chuva de guitarras, de todos os tipos, que me fizeram refletir nesta meia dúzia de temas que discuto por aqui com vocês.

Não adianta negar, de todos os instrumentos que participam de uma banda de rock, a guitarra elétrica é o alvo maior de todos os fetiches. O vocalista pode ser o gostosão, o baterista o alucinado, o tecladista o genial, mas quando sola o guitarrista, todo mundo faz biquinho, fecha os olhos, balança a cabeça e se põe a tocar uma guitarra imaginária, desesperadamente. Já vimos isso em show, em casa de amigo e nós mesmos quantas vezes já nos pegamos mandando "aquele" solo do Johnny Winter, na solidão do quarto, num delicioso mico sem testemunhas.

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Isto me lembrou uma historinha seventies hilária, que eu conto agora para dar um clima no contexto. Sempre tive muitos amigos músicos, e era figurinha fácil em inúmeros ensaios de varias bandas. Muita gente que hoje é profissional já me atormentou muito a alma e os ouvidos com cover de "Smoke on the Water" e "We're an American Band". Eu era uma espécie de roadie, ou seja, carregava umas caixas, plugava uns pedais e fazia inacreditáveis gravações piratas, que eram o desespero dos graves e agudos. Mas tinha pose (hoje se diria atitude), rock'n'roll e estava em todas.

Num destes intermináveis ensaios, sempre numa minúscula garagem cheia de caixa de ovo pra "dar acústica", apareceu um antigo colega de escola, que eu não via tinha uns trocentos anos me surpreendendo tanto pela ausência da merendeira como pela companhia de uma faiscante Gibson Les Paul (a galera local estava toda a bordo de Gianinnis) numa marra digna, no mínimo, de um John Mclaughlin.

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Depois dos carambas e dos quanto tempos ajudei o ex-coleguinha a montar a inacreditável pedaleira, comprada pelo pai milico no exterior (assim como a Les Paul) e depois de uma meia dúzia de caras e bocas, o compadre mandou um solo que fez a garagem tremer e todo mundo emudecer de espanto. Parecia que iria liderar a própria Mahavishnu, uma rapidez absurda e uma precisão estonteante. Ficou todo mundo babando.

O convite para uma jam session foi imediato. Corri para registrar o momento histórico nas minhas cassetes assassinas. Todos a postos, o couro comeu. "Smoke on the Water" já tinha rolado e eu achado o solo um pouco parecido, mas podia ser impressão né? Veio "We're an American Band" e já estava bem desconfiado. Tentaram "Black Dog" e nada. Quando se partiu para um blues bem improvisado, a conclusão foi inevitável: o solo era genial, mas era sempre o mesmo, inacreditável, independendo da musica ou do gênero (fox, mambo, tango etc...) o nosso herói mandava sempre o mesmo, fantástico, mas único, solo de guitarra. Foi constrangedor, depois que o rapaz pôs literalmente a Les Paul no saco e se retirou. O baixista comentou que ele treinava muito sozinho e portanto não tinha conjunto. Na mesma hora comparei o guitar hero com um fã enlouquecido da Rita Cadilac que depois de passar longas temporadas em solitários treinos homenageantes quando visse a "pantera" cara a cara (ou quase isso) negaria fogo por falta de conjunto.

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Entre os cds que vieram pro auxílio momesco estava o show da trinca de valetes: Joe Satriani, Eric Johnson e Steve Vai. Onde, guardadas as devidas proporções, acontece um problema semelhante ao rapaz da Les Paul. Infelizmente só nasceu um Jeff Beck e este povo junto com mais uma galera enorme ainda não percebeu isso. A técnica é absurdamente perfeita. Estão lá todos os truques, escalas e surpresas, fazendo os fãs, de biquinho e olhinho fechado, tocar horas e horas de guitarras imaginárias. Só que lá pela terceira música o espetáculo da bola no focinho da foca começa a cansar. Fico imaginando Santana, Eric Clapton e Hendrix tocando juntos. Duvido que imediatamente não reconhecêssemos quem estava tocando o quê. Por que? Porquê além de uma técnica extraordinária, os caras tinham uma história e uma visão de mundo que passavam em cada música, em cada solo. Experimentem ouvir um solo do Santana seguido de um de Clapton ou Hendrix e vejam que passam emoções e evocações completamente distintas. Querem outro exemplo? Keith Richards e Pete Townshend são bons guitarristas? Eu mesmo respondo: ótimos, apesar da falta de malabarismos e mágicas de circo. Existe um riff igual a "Brown Sugar" ou "Jumping Jack Flash"? Pois é. O papo é por aí.

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Tive a sorte de assistir inúmeros desses heróis da guitarra tocando ao vivo (com a óbvia e triste exceção de Hendrix). De Clapton a Santana, passando por tantos e tantos outros. Posso dizer que o que mais me impressionou foi Jeff Beck, de quem sou fã absoluto. Total domínio do instrumento (volume, microfonias, efeitos etc...) e um feeling absurdo. Estava junto de um amigo (guitarrista de mão cheia) que pensa bastante parecido comigo, neste aspecto, e ficamos bestificados com a simplicidade e a beleza das idéias do mestre. Talvez por isso mesmo, por paradoxal que pareça, seja o mais invejado e imitado pelos tiradores de coelho da cartola. A crítica andou espinafrando o último álbum de Jeff Beck, já procurei e não consegui encontrar, portanto ainda me recuso a admitir o ocaso.

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Seria injusto, para não dizer ingrato, com meus amigos se não dissesse que a grande maioria dos cds era excepcional. Só para ficar nas guitarras, lembro que vieram coisas do calibre de Roy Buchanan e Pete Haycock (ex-Clímax Blues Band). Meu carnaval que perigava ser uma tempestade de bundas de TV, uma ventania de thuchucas preparadas, acabou se transformando numa chuva de guitarras, com muito suor e cerveja.

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Da safra de 62 , Claudio Vigo ganha a vida com a poesia, o jazz e o rock n roll. Paga as contas como arquiteto.
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