Scars on Broadway: sem cicatrizes ou traumas
Postado em 12 de janeiro de 2009
Em 95 a cidade norte-americana de Los Angeles foi o palco onde o conjunto System Of A Down foi formado por Serj Tankian (voz e teclado), Daron Malakian (guitarra e vocais), Shavo Odadjian (baixo) e John Dolmayan (bateria) – todos descendentes de armênios. Três anos depois, com o lançamento de seu debut, System Of A Down, a banda começou a chamar a atenção de um público que estava buscando algo pesado, mas atual.
Mas, foi apenas em 2001, quando o segundo álbum da banda Toxicity foi lançado que a banda de fato encontrou a fama, quando o single "Chop Suey!" começou a tocar no mundo inteiro. Misturando influências de heavy metal, punk rock, blues, músicas tradicionais armênias e letras ácidas com fundo político o conjunto conseguiu achar sua identidade.
Depois disso tudo é história. A banda lançou mais três álbuns e contabiliza no total sete Discos de Platina, sendo três deles por Toxicity. Além de seus dois últimos CDs, Mezmerize (lançado em maio de 2005) e Hypnotize (colocado nas lojas em novembro de 2005), terem estreado no topo da parada da Billboard e em 2006 ter levado para casa o Grammy de melhor vídeo de hard rock com a música "B.Y.O.B.".
Após 11 anos de história, enquanto ainda se encontrava em ótima fase, o grupo pegou todo mundo de surpresa quando anunciou que iria entrar de férias, sem previsão de volta.
Assim, os quatro músicos seguiram seus próprios caminhos. O vocalista Serj deu início a sua carreira solo, tendo lançado no ano passado seu primeiro disco, Elect the Dead. Shavo deu início a um novo projeto musical batizado de Achozen, dessa vez direcionado ao rap, pelo qual lançou este ano seu auto-intitulado debut. Já Daron Malakian conseguiu o tempo necessário para dar continuidade a um projeto que já vinha idealizando e formou o Scars on Broadway, nova banda para o qual chamou seu ex-companheiro de banda John Dolmayan para o posto de baterista (o conjunto é completado pelo guitarrista Franky Perez, pelo tecladista Danny Shamoun e pelo guitarrista que virou baixista Dominic Cifarelli). Agora, o primeiro trabalho homônimo do grupo está sendo lançado no Brasil pela Arsenal Music.
Antes do System dar qualquer sinal de que uma separação estava a caminho, por volta de 2003, Daron Malakian, idealizador do Scars on Broadway, vinha sentindo que suas habilidades e necessidades musicais iam além do que seu antigo conjunto podia oferecer, tendo iniciado os planejamentos do que viria ser o Scars. "Quando estava compondo para Mezmerize e Hypnotize havia uma porção de coisas que estava fazendo paralelamente, algo mais eletrônico, coisas que achava que não se encaixariam no System, coisas mais melódicas, mais levadas para o lado do rock. Foi mais ou menos assim que o Scars surgiu", explica o músico.
Mas o mundo só veio saber dos novos planos de Malakian em 2005, quando o músico começou a falar publicamente sobre um novo projeto. As coisas foram acontecendo lentamente. "Scars on Broadway já existia há mais de um ano antes de eu entrar. Obviamente Daron estava procurando por pessoas para montar o projeto. Na verdade, pelo o que sei, ele testou uns dois bateristas. No final ele sabia como eu tocava e também que se a banda viesse a ter sucesso eu não iria mudar. O principal para nós é que temos que ter na banda não só músicos talentosos, mas que também sejam pessoas boas, que sejam ‘de família’ como sempre fomos", explica o baterista John Dolmayan.
Comparações são comuns de acontecer e, após tanto tempo de estrada, Daron e John estão bastante conscientes das provações que eles e seus novos companheiros terão de passar até que as pessoas entendam o que é o Scars on Broadway e seu novo trabalho conquiste os fãs de seu antigo projeto e novos admiradores. E estão vivendo essa nova fase como se tudo fosse inédito.
"Realmente não senti que ‘hey, só porque sou Daron do System of a Down, todo mundo irá se render a essa música.’ A primeira vez que ouvi essa música no rádio estava tão animado como se nunca tivesse tido uma música tocada no rádio antes", conta Daron.
A sensação de novidade parece ser a coisa que ambos mais sentiam falta após fazerem parte da mesma banda durante mais de uma década.
"Quando estávamos no System, saíamos do palco e ficávamos na expectativa de ouvir a multidão gritar pelo System e era como se ficássemos dopados. Aí o Scars tocou com o Metallica no Arizona e todo mundo estava chamando pela gente. É algo novo. As pequenas coisas que subestimávamos com o System, porque era assim há mais de dez anos, têm voltado com o Scars", explica Malakian.
Mas toda a onda de "novidade" significa também muito trabalho pela frente, o que significa ter de conquistar novamente as pessoas com algo novo. "Os primeiros dois shows, havia uma energia naqueles lugares que não sentia há muito tempo. E é bom ter esse tipo de sentimento novamente, porque com o System acabávamos achando que as pessoas iriam sempre estar lá. Estávamos tocando músicas antigas para que os fãs ainda curtissem do mesmo jeito. Com Scars, não temos isso. Temos de conquistar tudo e gosto disso. Gosto de ter de lutar pelas coisas", fala John.
Mesmo tendo dois dos quatro membros que formavam o System Of A Down, o Scars vem buscando seu próprio espaço e a banda parece não ter medo de colocar a mão na massa para convencer as pessoas que seu trabalho vai além do que ser herdeiros do System, avisando os desavisados que há mais no Scars do que havia na antiga banda de Malakian e Dolmayan.
A agressividade, marca do System, ainda pode ser encontrada no primeiro trabalho do Scars, assim como a intensidade musical. Bons exemplos disso são faixas como "Serious" e "Exploding/Reloading", ambas repletas de energia, algo meio punk. Mas, entre as canções, também podemos perceber o outro extremo do rock, onde o lado mais pop da banda se reflete em canções como "World Long Gone" e "They Say".
Até chegar ao material que foi lançado este ano a banda passou um bom tempo trabalhando as canções que iriam mostrar ao mundo quem era o Scars on Broadway. No total foram três anos se dedicando ao debut.
"Algumas pessoas entram em estúdio e dizem: ‘essa semana faremos um álbum’. Não posso fazer isso, porque trabalho de acordo com meu humor e gosto que diferentes aspectos do meu humor entrem nas canções. Gosto de ter um tempo para sentar e pensar sobre minha vida, absorver isso e deixar que saia de forma natural nas músicas que componho ao invés de forçar algo", conta o guitarrista e vocalista Daron.
Em suas canções o conjunto fala de assuntos diversos, mas um dos que mais se destacam é um sentimento que pode ser compreendido por qualquer pessoa – a frustração. "Seja uma música pesada ou algo mais lento, uma coisa que as une é a atitude e um pouco de frustração nas letras e nos vocais... É algo pessoal, global e tudo vem junto; o mundo é como uma mente perturbada, cheio de contradições. Você liga no jornal e aparece a moça loira te contando as piores coisas pessoais que se pode ouvir na televisão, como a taxa de suicídio que vem aumentando no Iraque. Então, há um monte de coisas que estão acontecendo e as pessoas têm de assimilar e com isso você acaba não sabendo mais como se sentir. Por isso há tanta gente passando por depressão, estresse e coisas ligadas a ansiedade", explica Malakian.
Após dividir por tanto tempo a tarefa de compor com outras pessoas, desta vez Daron assumiu completamente a tarefa de escrever as canções e mostra o quão importante esse processo é para ele. "É completamente subconsciente... Vou tocar ou escrever algo e simplesmente acontece. Não sentei pensando ‘vou escrever algo em tal estilo’. É muito espontâneo. É quase como não me sentisse responsável por aquilo. Se estou com vontade de tocar guitarra ou teclado é como se algo canalizasse através de mim. Ás vezes pego o violão e nada acontece. Nessas horas em que sinto como se algo canalizasse em mim são os momentos pelos quais vivo. Ainda tento entender. Ás vezes sinto como se estivesse cantando sobre a vida de outra pessoa. São músicas pessoais, mas não são sobre mim", fala o compositor.
Tendo influências que podem parecer estranhas à primeira vista, as novas composições de Daron parecem abrir um novo mundo que o músico não tinha como expressar antes.
"Sou atraído por melodia... E as composições de Daron amadureceram muito durante esses dez anos e creio que irão amadurecer mais. E dessa forma as coisas dele foram se tornando cada vez mais melodiosas e isso é uma coisa que sempre gostei muito", diz Dolmayan.
Indo contra a maré, ditada pela rapidez pela qual as músicas são consumidas nos dias de hoje com ferramentas como a Internet, Daron, responsável por todas as composições do disco, parece não ter pressa quando se trata de escrever. Inspirado por nomes que vão de Beatles a Neil Young, o músico prefere que as composições saiam de maneira natural e não corrida. "Tenho escutado o trabalho de muitos compositores pop dos anos 60 e 70. Sou muito fã de Kinks, Beatles, Zombies. Sinto, mesmo que não de maneira óbvia, que uma canção como "3005" foi muito influenciada por Neil Young... Amo metal, mas estava seguindo essa nova direção com as canções. Era onde as minhas composições estavam indo. Não podia continuar fazendo a mesma coisa sempre. Isso me faria muito infeliz. Queria expressar um lado de mim que gosta de coisas como Roxy Music, The Beatles e The Grateful Dead. Qualquer banda que não fosse metal. Ao mesmo tempo não queria ter de apagar o metal, porque ele também faz parte de quem eu sou", conta o músico.
As diferentes misturas sonoras do Scars on Broadway que pareciam ser um dos objetivos a serem alcançados pelos integrantes da banda são um de seus maiores atrativos, tanto para o público quanto para os músicos, dando o toque de atualidade e novidade ao som.
"É um grande conduíte. É bom ter a habilidade de tocar diferentes estilos musicais na mesma banda. Você tem um álbum que, na verdade, sente como se fossem três trabalhos diferentes, mas ainda há algo que une tudo e é isso que sinto sobre a maneira que toquei no disco. Posso tocar estilos diferentes em uma mesma canção e fazer funcionar, porque há um senso de melodia na música que faz com que tudo se encaixe", diz o baterista.
Com seu primeiro trabalho com Scars na mão, ambos músicos se dizem muito satisfeitos com o disco pronto e a banda se prepara para encarar o mundo inteiro e sua descrença. "Me orgulho dele. É como assistir a uma criança se formar na faculdade. Você é responsável por criar aquela criança, ter certeza de que se torne uma boa pessoa, ajuda-la a crescer como indivíduo. E é isso que sinto com essas canções. Temos ainda mais o que provar, pois já obtivemos sucesso. É como ser um jogador de futebol e ganhar o campeonato com um time, então mudar de time e fazer deste novo time campeão também. O passado não importa. Você deve fazer de seu novo time um campeão", conta John.
Vendo seu atual trabalho como uma evolução do que é como pessoa e profissional Daron fala o que os "órfãos" do System Of A Down queriam ouvir. "Sinto que Scars é uma evolução e progressão de onde vim, que é o System, e é assim com o John também. Quando ouço nossas canções sinto que é o certo, como se tudo o que está acontecendo é de fato o que deveria estar acontecendo agora", diz o músico. "Scars é uma continuação. Daron era o compositor principal do System Of A Down e ele é o único do Scars On Broadway. Ele é o melhor compositor com o qual trabalhei. Suas canções estão sempre seguindo caminhos diferentes, mas ele não irá se tornar uma pessoa diferente e começará a escrever músicas completamente diferentes", completa o baterista.
Começando praticamente do zero e felizes com isso, os ex-integrantes do System Of A Down preferem não ficar fazendo previsões do que poderá ser o futuro do Scars on Broadway e deixar as coisas acontecerem. "Não há necessidade para discutirmos a direção da banda. Quando se têm pessoas motivadas como eu e Daron estamos… queremos ser o melhor que podemos", diz Dolmayan. "Planejamos nos doar 100% ao Scars on Broadway" finaliza Daron.
Comando Rock
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