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Guns N' Roses: o sucesso que a mídia forjou e destruiu - Parte 8

Por Nacho Belgrande
Fonte: Playa Del Nacho
Postado em 08 de dezembro de 2013

Continuação da parte anterior [todos os links ao fim da matéria]:

[...]

Michael: deixa fazer uma pergunta agora, como comparação… há muita gente que disse que, na história do KISS, em 1976, logo após ‘Kiss Alive!’, quando os negócios daquela banda explodiram, a banda mudou naquele momento. Tudo começou a mudar pra eles, eles se tornaram pessoas diferentes, a postura deles mudou, a equipe técnica inteira foi mudada, todo mundo que estava lá desde o começo, exceto pelo empresário, basicamente se foi. Houve um ponto em que você olhou para o Guns N’ Roses e pensou, ‘quer saber? O Guns N’ Roses de Appetite For Destruction mudou, eles não existem mais, temos um Guns N’ Roses diferente. ’ Houve um momento em que você viu que isso havia acontecido com eles?

Niven: Com certeza. Perder Steven foi parte disso. Eu me lembro de claramente de ter saído com Slash em uma noite e essa noite acabou virando um fim de semana inteiro, e o foco principal da conversa daquele fim de semana foi o fato de Slash estar ficando muito, muito frustrado com o material que acabou em ‘Use Your Illusion’. E ele achava que o direcionamento rock n’ roll da banda estava sendo comprometido pelo tipo de material que Axl estava compondo. Eu olhei pra ele e disse, ‘Olha, se você de fato se sente assim, genuinamente, você precisa articular isso com Axl, e resolver isso com ele’. E ele disse, ‘Eu vou fazer qualquer coisa que for necessária pra garantir que o cheque venha’. Estava muito presente, na consciência de todo mundo, uma falta de confiança que Axl pudesse sobreviver a uma turnê como headliner, todos tínhamos dúvidas em nossas mentes, se ele cumpriria com aquilo. Por que diabos vocês acham que Slash e Duff cederam seus direitos do nome da banda pra que continuassem em turnê?

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Mitch: Certo, eu estava prestes a perguntar isso a você…

Niven: E em termos de pessoas querendo dinheiro, é óbvio que todo mundo estava esperando ansiosamente pelos frutos de uma turnê como banda principal, quer dizer, claro que todo mundo quer isso. Mas esse é o objetivo principal? Não, não é. É ir lá e fazer grandes shows, ver as plateias na sua frente e receber aquela energia, é pra isso que você vive. São aquelas duas horas, a mágica e a energia fervilhantes de um grande show.

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Mas eu te digo uma pessoa que vivia dizendo, ‘vamos continuar em turnê e vamos fazer dinheiro, vamos ganhar grana’ e era Doug Goldstein. Ele ficava nas minhas costas o tempo todo dizendo, ‘vamos lá, Niv, temos que fazer isso agora, tem que ser agora. Eu quero terminar essa turnê com cinco milhões na minha conta’.

Eu me lembro de caminhar pela praia com Doug certa noite em Redondo Beach, e possivelmente não muito esperto, compartilhei um pouco da minha estafa por lidar com tudo aquilo, e Doug ficava dizendo, ‘Temos que terminar essa turnê! Temos que terminar essa turnê! E daí podemos ficar com todo aquele dinheiro no banco!’

E eu só olhava pra ele pensando, ‘É isso que significa pra você?’

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Mitch: Havia um conceito de urgência por parte dele por ele achar que Axl pudesse implodir e a banda pudesse implodir ou ele achava que era simplesmente negócio, como sempre, tem uma banda, pega e coloca na estrada e vamos fazer dinheiro?

Niven: Não, sabendo de tudo que sei agora, e olhando sob outra perspectiva, tinha muito mais coisa rolando do que eu sabia na época. Sabe, começou a ficar evidente quando eu saí e Doug assumiu o controle. [irônico] ‘Meu deus, como será que isso aconteceu?’’

‘Meu deus, vamos tentar entender isso juntos, se pudermos, eu sei que é muito complicado, mas vamos tentar compreender essa!’

Michael: Como é que armaram essa… [risos]

Niven: Quero dizer, por exemplo, o papel dos Maynard nisso me interessa muito…

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Eles se apresentavam como ‘conselheiros espirituais’, e eram de Sedona.

Mitch: Eles intencionavam fazer parte do empresariado da banda, ou só queriam ser pajés pessoais do Axl?

Niven: Eu acho que a segunda opção, desde que os cheques continuassem sendo feitos. Eu acho que era exatamente isso que eles queriam, e acho que eles são completos e totais charlatões. E Axl acabou se envolvendo com eles sem meu conhecimento e eu me lembro de estar um dia no [estúdio] Record Plant e Axl diz, ‘Niven, eu preciso de uma foto sua’, e eu ‘Claro’, e ele tira uma Polaroid de mim. Depois eu fiquei sabendo que essas Polaroides eram levadas para Sharon Maynard para que ela lesse a aura das pessoas e dissesse quem era bom pra ele e quem era ruim pra ele. Claro que eu era ruim pra ele, porque eu ia chutar charlatão pra rua e dizer, ‘Puxa o carro!’. Então obviamente, eu sou mal pra Axl. E eu meio que imaginava que tipo de relação Doug tinha com eles, sabe, havia muito a se questionar ali.

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Mitch: Você acha que Doug estava…

Niven: Eu ia dizer que nós ficávamos muito, muito tristes com aquilo, eles foram uma das peças principais da minha demissão, e na degeneração da banda… o que é muito triste e profundo nisso tudo é que Axl obviamente sabia que precisava de aconselhamento espiritual, ele estava tentando achar algo. Ele estava tentando achar seja lá o que fosse, ele estava tentando definir o sentido de seu propósito, e ele se associa a esses ladrões! Ele pega o que está dentro da mente dele e expõe para o público, se joga pros lobos, e esses filhos da puta cobram 75 mil dólares por um exorcismo! Eles também costumavam ter retiros de fim de semana, aos quais os mais chegados de Axl eram obrigados a ir, e cada um tinha que pagar 10 mil dólares para ir nesse fim de semana. Esses dois charlatões do caralho subiam num avião, Mitch, e iam pro Canadá na segunda ou na terça-feira depois do fim de semana e compravam terras no Canadá!

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Mitch: Mas só no verão!

Niven: Logo depois de eles fazerem a festinha pro Axl em Sedona. Eu ouvi tanto da boca de Reese como da de Goldstein que aqueles dois arrancaram, eu achava que fossem dezenas de milhares de dólares, mas Reese me disse que foram centenas de milhares de dólares.

Mitch: De Axl? O que acabou acontecendo com esses dois?

Niven: De Axl e dos que o cercavam. O triste é que ele é um cara que está procurando por ajuda. E daí o que acontece? Limpam os bolsos dele.

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Michael: Falando disso, e não estou me referindo especificamente a Axl ou a qualquer outro artista que mencionemos aqui, porque você já esteve envolvido de perto com grandes astros internacionais, isso parece ser meio que uma ameaça comum. Por exemplo: é bastante conhecido que, a certa altura, o KISS era comandado pelo psicólogo de Paul Stanley. O Metallica fez um filme inteiro com o terapeuta deles tentando controlar e ajudar a banda. O que é que rola com todos esses artistas que, nesse nível, eles se abrem e ficam suscetíveis a gente desse tipo entrar e controlá-los?

Niven: Me deixa voltar pra algo que eu já disse: ‘Aquele que não conhece a si próprio, será definido por sua fama’. Trocando em miúdos, eu acho que Slash se adaptou muito bem à sua fama, e o fez com suavidade, porque ele se conhece. Quando Slash sai do palco, ele costumava me fazer cócegas, eu o visitava em Los Angeles, essas coisas, você sai pra comer algo, a cartola some, os óculos escuros somem, o cabelo dele fica preso e ninguém nem sabe que é o Slash, e ele pode relaxar, conversar, e ser ele mesmo. E eu acho que ele tem os dois pés no chão. Minha pergunta, nesse respeito, para Axl, é: ‘o que você representa além de seu narcisismo e a seu próprio ego? O que você representa além de um exercício de poder sobre os bajuladores a seu redor?’

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Houve um momento de pura magia pra mim no tempo dos ‘Use Your Illusion’. Foi quando, pela primeira vez, eu ouvi o que ele estava compondo e que acabaria virando ‘Civil War’. Eu achei aquilo fudidamente brilhante! E na minha cabeça, ali estava Axl amadurecendo para ser um grande porta-voz de seu meio, pra poder escrever uma música como aquela e criar uma expressão daquele porte, eu achei absolutamente brilhante. E sabem, pra mim, brilhantismo, no meu conceito, é definido por John Lennon e Bob Dylan, e eu o vi a caminho de superar aqueles dois gigantes. Daí o filho da puta me vira e compõe ‘Right Next Door To Hell’!

Mitch: [cuspindo o café rindo]

Niven: Sabe? Que é sobre uma velhinha que morava do lado dele e que ele bateu na cabeça com uma garrafa de vinho! Ah, qual é, mano!?! Tenha perspectiva! Todos nós temos que lidar com merda em nossas vidas, não somos perfeitos, todos cometemos erros, todos temos discussões ou nem sempre nos damos bem com nossos vizinhos. Mas você é o frontman de uma das maiores bandas da história! Pro que é que você quer usar essa plataforma?

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Mitch: Falando nisso, ele também fez aquela música, ‘Get In The Ring’, atacando [o jornalista] Andy Secher da [revista] Hit Parader…

Niven: Mick Wall…

Mitch: Foi um erro lançar o ‘Use Your Illusion’ em dois discos? Não seria melhor ter deixado apenas as 9, 10 melhores músicas e lançado um só álbum?

Niven: Foi tipo, ‘vamos dar mais um osso pros trouxas por GN’R roerem’. Devo dizer que parte de meu conceito de Axl é que ele tem mentalidade de interiorano, mas ele foi inserido num ambiente global. E claro que há uma disparidade aí! Ele precisava de tempo pra se acostumar. Com os ‘Use Your Illusion’, ele queria ter o ‘Physical Grafitti’ dele, num estágio da carreira dele anterior ao que o Led Zeppelin estava quando pôde fazer um disco duplo. Era essa a mentalidade.

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Eu to ali sentado, pensando, ‘por que você está baseando sua avaliação criativa e sua produção criativa numa referência de Livro dos Recordes? Isso tem mesmo alguma importância?’

E por mais que Slash já tivesse deixado de mão um pouco, eu tivesse deixado de mão um pouco, porque eu já estava pensando comigo mesmo, ‘a única maneira de conseguirmos lançar esse disco é se Axl conseguir colocar tudo que ele quer nele e até onde eu saiba, minha responsabilidade é fazer com que esse disco seja lançado, minha responsabilidade é botar essa banda na estrada, minha responsabilidade é maximizar os ganhos deles com isso, porque quem é que sabe quanto tempo isso vai durar pra eles? A propósito, Axl, eu estava me dando muito bem como compositor, produtor e empresário sozinho. ’

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Uma das coisas que ele mais odiava era o fato de não poder ser meu DONO. Ele odiava isso, ele odiava MUITO o Great White!

Não era que ele gostasse ou não do que eles faziam, pra ele, eles representavam a própria incapacidade dele de me controlar como uma porra de marionete. E se eu não concordasse com ele, eu diria, ‘Eu não concordo com você!’

Mas estávamos fazendo o corre, queríamos que os discos fossem lançados, e pra ser bem honesto, quando eu pensava em um álbum duplo, e pro preço ao qual um disco duplo chegaria às lojas, eu tinha pesadelos com aquilo. Eu pensava, ‘Vamos quebrar a cara e o povo vai dizer, ‘essa banda já era’. ’

E foi aí que eu pensei no conceito de, cheguei e disse, ‘Axl, vamos fazer dois álbuns separados. ’ E eu lancei essa pra ele me baseando que ‘grande parte de nossos fãs não é lá muito bem de vida. Pra eles, comprar um disco por semana já é ótimo, pra poder comprar um disco duplo pode ficar pesado demais. Mas, se lançarmos dois álbuns separados, eles podem comprar um numa semana, e não ficarem sem grana, e daí poderão comprar o outro álbum na semana seguinte, e não ficarem sem grana’.

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Mas eu acho que qualquer pessoa certa da cabeça estava olhando pra esse quadro e pensando, ‘Sabe, um grande álbum poderia sair espremido das músicas desses dois discos’. [...]

Continua…

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Sobre Nacho Belgrande

Nacho Belgrande foi desde 2004 um dos colaboradores mais lidos do Whiplash.Net. Faleceu no dia 2 de novembro de 2016, vítima de um infarte fulminante. Era extremamente reservado e poucos o conheciam pessoalmente. Estes poucos invariavelmente comentam o quanto era uma pessoa encantadora, ao contrário da persona irascível que encarnou na Internet para irritar tantos mas divertir tantos mais. Por este motivo muitos nunca acreditarão em sua morte. Ele ficaria feliz em saber que até sua morte foi motivo de discórdia e teorias conspiratórias. Mandou bem até o final, Nacho! Valeu! :-)
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