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Guns N' Roses: o sucesso que a mídia forjou e destruiu - Parte 1

Por Nacho Belgrande
Fonte: Playa Del Nacho
Postado em 19 de novembro de 2013

No começo desse ano, o site Dropping The Needle – idealizado e administrado pelos profissionais da mídia musical MICHAEL BRANDVOLD [estadunidense que trabalha com divulgação e marketing de bandas e foi o responsável pelo primeiro pacote VIP de meet and greet do meio] e MITCH LAFON [jornalista canadense com mais de vinte anos de experiência no hard rock e no heavy metal, tendo trabalhado para revistas do naipe da Metal Hammer e Classic Rock inglesas e também para a brasileira Roadie Crew] – entrevistou o empresário e produtor musical ALAN NIVEN, que em sua longa carreira gerenciou diversas bandas da cena do hard rock angeleno, mais notavelmente o GUNS N’ ROSES da fase áurea.

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Niven concedeu três sessões de conversa com Brandvold e Lafon, e dentre quase quatro horas de assunto, destacamos alguns trechos [em especial as passagens nas quais ele detalha, com riqueza, os erros e melindres que se sucederam desde a aurora até o ocaso do Guns N’ Roses original] e os transcrevemos – traduzidos – em uma série de quatro postagens, a começar por essa.

[...]

Mitch: Vamos abordar o que você fez tanto com o GREAT WHITE como com o GUNS N’ ROSES. Quer dizer, com o Great White, você não foi apenas o produtor, que só dizia, "bem, esse é um baita dum riff", você compunha, você saía e pensava em covers que se encaixariam na voz de Jack Russel, então em que ponto as duas linhas se misturam? Vamos falar um pouco de sua relação com o Great White.

Niven: Bem, foi uma progressão natural. A banda havia sido contratada originalmente contratada pela [gravadora] EMI em novembro de 1983 e pra dizer bem a verdade, já faz tanto tempo que eu não tenho pudor algum em dizer que eles eram basicamente um Van Halen dos pobres, um Judas Priest dos pobres… Mark Kendall é um dos guitarristas mais subvalorizados daquele período dos anos oitenta, e claro, Jack era um monstro… uma voz incrível. Não que eles tivessem muito talento, no que tange a moldar algo que fosse apropriado pra eles, a concepção que eles tinham de si próprios naquela época não passava necessariamente por explorar o máximo de suas habilidades.

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E o disco de estreia pela EMI não foi tão bom e a banda teve seu contrato cancelado. E eu fiquei na situação onde eu podia sair andando e dizer, ‘hasta la vista, vocês tiveram a chance de vocês’, ou se você tinha uma relação profunda com essas pessoas, você poderia dizer, ‘olha só, vamos enfiar a cara e vamos achar um meio de fazer isso acontecer’.

E eu me vi sentando ali e pensando no que havia nessa banda que me fez responder a eles inicialmente e que pudesse ser desenvolvido em um esforço válido.

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Basicamente, eu me remeti à terceira vez que os vi tocar – nas duas primeiras vezes eu achei que eles tinham sido um porre. Mas na terceira vez em que os vi ao vivo, Kendall tocou "I Don’t Need No Doctor" e mandou bem demais. Aquele foi o momento da fagulha entre eu e o Great White. [...]

Mitch: Então você ainda tem uma boa relação com Slash…

Niven: Eu o amo. Eu acho que ele é uma pessoa maravilhosa. Fama daquele naipe é uma coisa extraordinária de se embarcar, de sofrer, lidar, desfrutar, o que seja… e não há nenhum aviso sobre como você vai ter que lidar. Há um verso em uma música de Joe Walsh sobre as pessoas mudarem, e Joe Walsh permaneceu o mesmo. E isso resume muito bem o tipo de experiência pela qual você passa, do padrão de comportamento das pessoas a seu redor mudar, à medida que a fama e a atenção sobre você se intensificam e eu acho que Slash lidou com ser Slash com uma leveza notável. Eu acho que ele o fez com estilo e eu acho que ele é uma pessoa muito boa, bastante centrada e você não tem como dizer isso sobre todo mundo que passou por esse tipo de coisa.

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Você tem contato com algum outro dos caras?

Niven: Izzy veio aqui no Arizona para me visitar uma vez, não faz muito tempo. Ele é como um navio fantasma, de vez em quando ele aparece, sai da neblina e é tipo, ‘que legal te ver’ e daí ele desaparece de novo e você não tem certeza se ele de fato existe ou se ele é apenas uma mitologia de si próprio.

Duff?

Niven: Duff… a última vez em que vi Duff foi quando o "Projeto" estava sendo elaborado, o que acabou virando o Velvet Revolver. Slash e Duff, muito gentilmente, me convidaram para fazer parte daquilo, mas por várias razões, eu achei que seria uma má ideia, essencialmente pelo fato de estarmos lidando com um nível muito alto de expectativas ao convidar todo mundo menos Axl, e eu achei que não era apropriado. Para ser perfeitamente honesto, na época havia outras coisas que eu precisava resolver na minha ida e eu não teria o foco e o direcionamento que a banda teria exigido.

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Eu também fiquei um pouco apreensivo quanto ao comprometimento de Izzy, que eu achava que seria essencial. Porque, pra mim, Izzy é o coração e a alma do Guns N’ Roses.

Mitch: Mesmo? Porque a maioria dos fãs vai dizer que acha que o coração e a alma do Guns N’ Roses são Slash ou Axl…

Niven: Eu vou te fazer uma analogia muito barata a respeito disso… eles dois podem ser os dois seios enormes na frente, mas Izzy era o coração batendo dentro do peito.

Claro, tanto Axl como Slash são ‘frontmen’ naturais. Izzy, pra mim, personificava a postura, é o melhor compositor e também o mais constante, ele tem uma noção maravilhosa de ritmo, falando sobre seu modo de tocar guitarra base. Havia uma concepção de melodia na qual a expressão dele era perfeita. A primeira vez em que eu vi o Guns N’ Roses, na verdade foram Izzy e Duff, do lado deles do palco, que me intrigaram mais do que qualquer outro membro. Eles eram lindamente centrados e havia esse magnetismo – estou tentando evitar a palavra ‘cool’, mas aqueles dois eram a essência do ‘cool’.

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Michael: Antes de Slash entrar pro Guns N’ Roses, ele fez teste pro Poison… ele chegou a comentar algo sobre isso com você alguma vez?

[Risos]

Ele deve ter dito alguma coisa…

[Risos]

Niven: Com certeza não disse, mas entre dois cavalheiros há um senso de discrição. Você não vai ficar trazendo à tona todos aqueles relacionamentos que são obviamente – e totalmente obviamente – errados.

É como ser convidado para ser o padrinho de um casamento e você está parado ali e por sua cabeça passam todas s histórias sujas que ouviu sobre a noiva, você não conta isso pro noivo.

Mitch: Você se envolveu com eles já com a formação de "Appetite For Destruction", ou você já estava no lance quando Tracii Guns era do grupo?

Niven: Não, eu me envolvi no verão de 1986, então a formação era a formação que todo mundo vê e associa ao Guns N’ Roses. E eu vou expressar minha opinião: eu acho que Axl lidera, nesse momento, a banda cover mais lucrativa do mundo. E isso não é a mesma coisa que dizer que Ron Thal não é um grande músico e um cara legal, mas aquilo não é o Guns N’ Roses, sinto muito.

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Mitch: Mas muitas bandas mudam de membros…

Niven: Sim e não. O que quero dizer é…

Keith Richards levou Slash para jantar certa noite e disse a ele que ele realmente precisava repensar seu relacionamento com Axl, e que a última coisa que ele deveria fazer seria deixar Axl. E a linha de raciocínio dele era, ‘Você deveria amar o Guns N’ Roses mais, e respeitar o que ele significa para os fãs, manter essa formação com a qual todo mundo se identifica e se associa. Claro, Slash só olhou para Keith e disse, "Você não tem noção…"

Keith virou-se e disse: "Eu não gosto de Jagger tanto quanto você não gosta de Axl, mas eu amo os Rolling Stones mais do que isso". E Slash ainda disse: "Você não tem noção".

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Mas qual era a pergunta de novo?

Michael: Se você estava envolvido quando Tracii era da banda. Mas deveríamos falar mais sobre a relação Axl/Slash, porque até onde eu saiba você disse veementemente, "Não, eu não quero trabalhar com esses caras" umas duas vezes.

Niven: Sim, é uma história bem conhecida, mas basicamente, Tom Zutaut me chamou três vezes, em três ocasiões distintas. Eu conversei com a banda, a primeira quando eles tinham acabado de ser contratados, e naquela época, eu não queria lidar com esse tipo de empresariamento, não me animava, além do que tinha levado um ano e meio pra levar o Great White a ser contratado de novo, e fazer com que aquele projeto engrenasse da maneira que devia. E em meio ao Great White ter sido contratado e dispensado e recontratado, eu dava muito valor àquilo e a última coisa que eu faria seria dividir minha atenção e energia, isso seria um problema, eu teria que me manter ali em cima o tempo todo pra quando fosse preciso.

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Na segunda vez, os executivos vieram, eles sempre tinham problemas para achar quem levasse a banda a sério, uma ou duas pessoas que tinham conseguido levar a banda a sério estavam um pouco assustadas com eles – Tim Collins me vem à mente o empresário do Aerosmith. Naquele momento, eu tinha feito uma pesquisa sobre a banda e a última coisa que eu faria com minha energia vital seria me envolver com aquele tipo de idiotice caótica, desastrosa, autodestrutiva, arrogante, ridícula e fora de controle. Então eu disse, "muito obrigado por pensarem em mim".

Daí ele veio de novo e disse, "Cara, eu estou numa péssima situação." E eu sabia que Ruth Blatt, presidente da Geffen na época queria dispensar o Guns N’ Roses. Então Tom disse, "Olha, isso pode ser o fim da minha carreira, eu realmente preciso de ajuda."

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Eu disse, "bem, sendo assim, ok, eu vou conversar com eles". Não vou prometer nada, vou ver se podemos nos dar bem e realizar algo.

Mitch: Deixa fazer uma pergunta sobre isso: as bandas entram e saem das gravadoras o tempo todo e a carreira de ninguém morre por causa disso. Por que ele estava tão preocupado com isso especificamente? Era por que ele tinha investido muito dinheiro, ou por que ele precisava de um sucesso…

Niven: Não, era um contrato de grande importância pra ele. Eles já tinham gasto cerca de 75 mil dólares em adiantamentos em dinheiro, eles não tinham nenhum material digno de ser lançado, a reputação da banda por ser… uma banda de rock n’ roll a meus olhos, e pouco focada em ter uma carreira…

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Mitch: Nada profissional…

Niven: Eles não eram o Boston, entende?

Michael Brandvold: Se eles não tem nenhum material digno de se lançar, por que um selo dá 75 mil dólares a eles, se eles não acham que vale a pena? Os fãs não entendem isso.

Niven: Eles acharam que valeria a pena, lá no começo, sabe como é. O que eles descobriram é que eles não eram muito fáceis de lidar, muito fáceis de organizar, e eu tenho toda certeza que quando você sentava Ruth Blatt no escritório dele, e vinha alguém dizendo que queria contratar essa ou aquela banda, eles falavam e discutiam a respeito, e agora que ele os contratou, o cara tem que ir embora com eles e tomar conta, é uma experiência totalmente diferente, e a gravadora lida com eles por meio de um ou dois intermediários.

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Mitch: Quando Tom Zutaut procurou você pela terceira vez, eles estavam sendo gerenciados pela empresa de Rod Stewart naquela época?

Niven: Sim, e estavam desesperados pra sair daquilo. Eles haviam alugado uma casa pra eles nas colinas, e foi onde tive meu primeiro encontro com eles. Sob circunstâncias normais, seria uma casa bem decente…

Michael: Nessa altura, você já tinha ouvido algum material deles ou você só estava indo encontrar ‘uns caras’?

Niven: Não, quando fui me encontrar com eles, já tinha ido a alguns shows, eu tinha material…

Mitch: OK, e como você reagiu à música? Você achou que precisava de muita lapidação ou achou que fosse fenomenal, ou pensou, "ah é legalzinho, vai dar…"?

Niven: Eu achei que era bem cru, especialmente pra época, eu estava bem cético quanto a como as rádios lidariam com aquilo, eu achei que se conseguíssemos nos organizar e estabelecer um certo profissionalismo ao ponto de podermos sair em turnê, achava que teríamos uma chance muito boa de ter uma banda muito boa e compensadora de rock n’ roll. As demos que eu tinha ouvi naquela altura me indicavam que Slash era um guitarrista muito promissor.

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Mitch: Qual foi a primeira demo que você ouviu deles?

Niven: Tinha várias faixas nela, coisas como "Jumpin Jack Flash", "Move To The City", "Mama Kin", que eu me lembro de cara….

Mitch: Temos que falar do EP "Live! Like A Suicide" em algum momento… vamos seguir…

Niven: Estávamos falando de eu ir ao encontro deles pela primeira vez…

Michael: Sim, continue…

Niven: Eu desço da minha moto e a primeira coisa que eu vejo é um vaso sanitário espatifado ao lado da porta da frente, e dela sai uma stripper bem conhecida pela porta e daí, eu tenho minha primeira impressão do GN’R.

Michael: E só melhorou!

Niven: Pelo jeito sim!

[risos]

Continua…

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Sobre Nacho Belgrande

Nacho Belgrande foi desde 2004 um dos colaboradores mais lidos do Whiplash.Net. Faleceu no dia 2 de novembro de 2016, vítima de um infarte fulminante. Era extremamente reservado e poucos o conheciam pessoalmente. Estes poucos invariavelmente comentam o quanto era uma pessoa encantadora, ao contrário da persona irascível que encarnou na Internet para irritar tantos mas divertir tantos mais. Por este motivo muitos nunca acreditarão em sua morte. Ele ficaria feliz em saber que até sua morte foi motivo de discórdia e teorias conspiratórias. Mandou bem até o final, Nacho! Valeu! :-)
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