Rush: internautas debatem se letras de Neil Peart são fascistas
Por Igor Miranda
Postado em 13 de janeiro de 2020
A notícia da morte de Neil Peart, do Rush, fez com que muitas pessoas revisitassem a obra da banda - em grande parte, para exaltar o legado deixado com tantos álbuns e gravações ao vivo. Porém, alguns internautas demonstraram preocupação ao apontar que entre as letras do grupo, sempre assinadas por Peart, algumas ideias de origem fascista estariam sendo discutidas.
O debate nas redes sociais teve início após uma entrevista de Neil Peart ao New Musical Express, concedida em 1978, adotar caráter viral na internet. Durante o bate-papo, Peart, que estava em turnê com o Rush, expressa suas visões políticas e destaca que seus pensamentos - alguns deles, expressos nas letras da banda - eram influenciados pela escritora Ayn Rand.
Para alguns analíticos, Rand tem ideias ligadas ao fascismo e extrema-direita. A escritora falecida em 1982 é conhecida por ter desenvolvido o objetivismo, descrito por ela como "o conceito do homem como um ser heroico, com sua própria felicidade como o propósito moral de sua vida, com a realização produtiva como sua atividade mais nobre e a razão como seu único absoluto". As obras defendem a razão como a única forma de adquirir conhecimento, rejeitando a fé e a religião, e o capitalismo em vertente liberal, contra o coletivismo, estatismo e anarquismo.
A entrevista
Em um trecho da entrevista ao "New Musical Express", separado pelo jornal "O Globo", Neil Peart diz: "Certamente nos dedicamos ao individualismo como o único conceito que permite que os homens sejam felizes, sem que alguém tire de outra pessoa. A coisa para mim sobre Ayn Rand é que sua filosofia é a única aplicável ao mundo hoje, em todos os sentidos. Colocando o indivíduo como prioridade, tudo pode ser feito para funcionar de uma maneira que nunca possa ser feito sob qualquer outro sistema".
Em outro momento, ele completa: "Veja o que o socialismo fez à Grã-Bretanha! É paralisante! E o que ele fez com a juventude? Com o que você acha que os Sex Pistols e todo o resto estão realmente frustrados? Eles estão frustrados porque estão crescendo em uma sociedade socialista em que não há lugar para eles como indivíduos". O músico também declara: "A única função do governo é proteger os direitos do indivíduo; portanto, você precisa de uma força policial e um exército. Você precisa de um exército para proteger os indivíduos e um tribunal para resolver suas disputas".
Vale destacar que o vocalista e baixista Geddy Lee também fez elogios à obra de Ayn Rand na mesma entrevista. "Acho que ela trouxe muitos conceitos e filosofias que confirmaram muitas coisas diferentes para nós. Achei muito positivo. Encontrei muita verdade no que ela escreve".
Não é de hoje a discussão entre fãs de Rush a respeito da influência de Ayn Rand nas letras de Neil Peart. Porém, o debate se limita aos primeiros álbuns da banda, na década de 1970 - ou seja, até "Hemispheres" (1978). Depois, Peart teria se afastado das ideias de Rand e se aproximado de outros conceitos.
Letras
No site Quora, um internauta identificado como Jose Geraldo Gouvea, que se apresenta como escritor e ex-professor de História, apontou algumas das letras do Rush que podem ser consideradas como fortemente influenciadas pelas ideias de Ayn Rand.
Em "Anthem", por exemplo, o trecho a seguir é apontado na página como influenciado por Ayn Rand:
"Live for yourself
There's no one else more worth living for
Begging hands and bleeding hearts
Will only cry out for more"
Tradução:
"Viva para você mesmo, não há mais ninguém por quem valha mais viver
Mãos esmoleiras e corações sangrentos irão apenas gritar por mais"
Outra letra que teria influência da escritora é a de "Closer to the Heart", segundo a publicação no Quora:
"And the men who hold high places
Must be the ones who start
To mold a new reality
Closer to the heart
The blacksmith and the artist
Reflected in their art
They forge their creativity
Closer to the heart
Philosophers and plowmen
Each must know his part
To sow a new mentallity
Closer to the heart
You can be the captain
And I will draw the chart
Sailing into destiny
Closer to the heart"
Tradução:
"E os homens de altos cargos são os que devem começar
A moldar nova realidade mais próxima do coração
O ferreiro e o artista refletem em sua arte
A forja de sua criação mais próxima do coração
Filósofos e agricultores cada um com sua parte
Semeando nova mentalidade mais próxima do coração
Você pode ser o capitão e eu traçarei o mapa
Navegando rumo ao destino mais próximo do coração"
Na publicação no Quora, é dito: "O primeiro verso diz que as mudanças precisam ser feitas por homens de alto cargo. Deve ser a frase menos democrática em uma banda de rock que não seja neonazista. O verso que defende uma nova realidade evoca ideias fascistas de reforma social (assim como socialismo Stalinista). O que deixa a letra fascista ao invés de socialista é dizer que a nova realidade deve ser irracional ('próxima ao coração'), enquanto socialistas defendem realidade baseada na ciência".
A letra de "The Trees" também teria a influência da escritora, segundo a postagem. Veja:
"There is unrest in the forest
There is trouble with the trees
For the maples want more sunlight
And the oaks ignore their pleas
The trouble with the maples
(And they're quite convinced the're right)
They say the oaks are just too lofty
And they grab up all the light
But the oaks can't help their feelings
If they like the way they're made
And they wonder why the maples
Can't be happy in their shade
There is trouble in the forest
And the creatures all have fled
As the maples scream 'Oppression'
And the oaks, just shake their heads
So the maples formed a union
And demanded equal rights
' The oaks are just too greedy
We will make them give us light'
Now there's no more oak oppression
For they passed a noble law
And the trees are all kept equal
By hatchet, axe, and saw"
Tradução:
"Há inquietação na floresta
Há problema com as árvores
Pois os bordos querem mais luz do sol
E os carvalhos ignoram seus argumentos
O problema com os bordos,
(e eles estão totalmente convencidos que estão certos)
Eles dizem que os carvalhos são muito altos
E eles capturam toda a luz.
Mas os carvalhos não podem evitar seus sentimentos
Se eles gostam do jeito que são feitos.
E eles se perguntam por que os bordos
Não podem ser felizes em suas sombras.
Há problema na floresta,
E as criaturas todas fugiram,
Enquanto os bordos gritam 'Opressão'
E os carvalhos, apenas mexem suas cabeças
Então os bordos formaram um sindicato
E exigiram direitos iguais.
'Os carvalhos são muito gananciosos;
Nós os faremos nos dar luz.'
Agora não há mais opressão dos carvalhos,
Pois aprovaram uma lei nobre ,
E as árvores são mantidas todas iguais
Por machadinhos, machados e serrotes."
O texto no Quora aponta: "A letra conta uma fábula sobre árvores lutando por luz do sol. Deixa a ideia de que algumas árvores merecem mais sol (carvalhos) enquanto outras (bordos) pensam que precisam mais. É uma alegoria sobre a demanda das classes trabalhadores. É usada a palavra 'união' em relação a 'demandar direitos iguais'. No fim, as árvores são 'mantidas iguais por machadinhos, machados e serrotes', o que zomba da fase violenta de uma revolução".
Porém, a publicação reforça o que muitos fãs já destacam: as ideias de Ayn Rand foram deixando as letras do Rush a partir de "Permanent Waves" (1980). O texto cita algumas composições que se aproveitam de conceitos considerados distantes do suposto fascismo adotado no passado, como "Chemistry" (1982), "Subdivisions" (1982), "Red Sector A" (1984), "Big Money" (1985), "Territories" (1985), "Prime Mover" (1987), "Scars" (1989), "Nobody's Hero" (1993).
[an error occurred while processing this directive]E o que Ayn Rand pensa sobre o fascismo? Em uma carta escrita em 1944, ela disse que a corrente em questão é igual ao nazismo, comunismo e socialismo, pois são "variações superficiais do mesmo tema monstruoso: coletivismo". Por definir-se como liberal, Rand afirma estar distante das ideias fascistas e chega a dizer que o socialismo é mais honesto em suas proposições do que o fascismo.
Debate
No fim das contas, o tema voltou a ser discutido nas redes sociais, especialmente após o analista político conservador Michael Johns republicar a entrevista de Neil Peart, de 1978, para exaltar a ideologia liberal de Peart.
Veja algumas publicações feitas sobre o assunto:
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Morte de Neil Peart
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