Metallica: o que aconteceria se Cliff Burton não tivesse falecido?
Por Ricardo Seelig
Fonte: Collectors Room
Postado em 16 de fevereiro de 2016
Essa é uma das questões mais discutidas da história do heavy metal: e se Cliff Burton não tivesse falecido em 27 de setembro de 1986, como a carreira do Metallica se desenvolveria? Em um exercício de futurologia imaginativa, vou tentar imaginar como teria sido a trajetória de Burton e do Metallica caso os eventos daquela fatídica noite de inverno no interior da Suécia não tivessem ocorrido (e você, que está lendo, pode fazer o mesmo exercício nos comentários. Fechou?).
Clifford Lee Burton perdeu a vida durante a turnê do terceiro álbum do Metallica, o clássico "Master of Puppets". Em relação aos dois discos anteriores - "Kill ‘Em All" (1983) e "Ride the Lightning" (1984) -, "Master of Puppets" mostrava uma evolução, com canções intrincadas e cheias de trechos com fartas doses de melodia, expediente já usado no segundo álbum e que havia gerado descontentamento em alguns fãs mais radicais, que acusavam o grupo de estar se vendendo e se tornando "mais comercial". Vale lembrar que naquele mesmo 1986 o Slayer veio com o oposto disso tudo, dando ao mundo o violento "Reign in Blood", com canções mais diretas e que babavam agressividade e velocidade.
A popularidade da banda crescia a cada dia, com o nome do grupo já sendo falado e reconhecido por publicações de fora do universo metálico. O baixista era considerado, de maneira unânime, como o melhor instrumentista do Metallica. Tanto que o próprio grupo foi atrás de Burton quando ele ainda tocava no Trauma, e Cliff só aceitou o convite para entrar na banda impondo a condição de que o trio se mudasse para a sua cidade, San Francisco. James, Lars e Dave Mustaine tinham plena consciência de que estavam diante de um músico diferenciado e que seria fundamental para o futuro do Metallica, e aceitaram a solicitação de Burton sem maiores delongas.
Hetfield, Ulrich e Hammett ficaram muito abalados e chegaram a pensar em desistir da banda após a morte do baixista. Devastados, os músicos se afastaram de tudo que envolvia o grupo por um tempo, retomando aos poucos as atividades na medida em que a dor ia cicatrizando. Jason Newsted assumiu o posto, "... And Justice for All" foi lançado e o "Black Album" transformou o Metallica em um fenômeno mundial de popularidade, sem precedentes na história do metal.
O auto-indulgente e egocêntrico "... And Justice for All" provavelmente não existiria caso Cliff Burton ainda estivesse na banda. Uma espécie de auto-afirmação do grupo e veículo para demonstrar a técnica dos músicos em composições intrincadas que flertam com o progressivo, o quarto álbum do Metallica simboliza também o controle criativo total de James Hetfield e Lars Ulrich sobre os destinos da banda. Sem Burton, a dupla, que já compunha a maioria das faixas, jogou Hammett para o lado, ignorou o baixo de Newsted na mixagem final e tomou posse do destino. O disco funciona como uma espécie de prova final de que James e Lars poderiam seguir sem Cliff.
Caso Cliff continuasse com o grupo, entendo que "... And Justice for All" não existiria. Não seria esse o caminho que o Metallica seguiria ao lado do baixista. Provavelmente evoluiria ainda mais a sonoridade impactante de "Ride the Lightning" e "Master of Puppets", entregando ao mundo um metal agressivo, pesado e com muita melodia, uma espécie de passo adiante do disco de 1986. De toda maneira, o quarto disco do Metallica seguiria sendo um trabalho de transição, a calma antes da tempestade que viria com o multi-platinado álbum preto.
No meu modo de ver, o "Black Album" não apenas existiria com Cliff, como soaria ainda mais eficiente e um pouco diferente com a presença do baixista. Ao invés de uma faixa como "My Friend of Misery", parceria de James e Lars com Jason e veículo de afirmação do baixista, penso que a banda experimentaria outro caminho. Como visto em "Load" (1996), onde o grupo flertou com o country em "Mama Said", creio que isso seria antecipado já no "Black Album" com Cliff. Burton era muito fã do Lynyrd Skynyrd e passava grande parte das viagens tocando na guitarra (sim, guitarra) composições da banda de Ronnie Van Zant. Como James também era um admirador do grupo, imagino que teríamos no disco uma composição que uniria o metal a elementos de southern rock, algo como um southern metal.
O Metallica explodiria, como explodiu, com o "Black Album". A banda continuaria se tornando popular em todo o planeta, com o álbum preto sendo um fenômeno de vendas. Mas, após a ressaca do disco, o caminho sonoro seria outro. Ao invés de "Load" e todas as suas polêmicas - como os cabelos curtos, a maquiagem e os beijos entre Lars e Kirk, aspectos até hoje não digeridos por uma parcela de metalheads -. a história seria diferente. A banda se dividiria internamente em duas partes: de um lado Ulrich e Hammett e suas inovações, e do outro Hetfield e Burton. Cliff seria o parceiro que James não encontrou em Jason quando o Metallica gravou seus polêmicos álbuns lançados na década de 1990.
Essa parceria entre o guitarrista e o baixista faria o som do Metallica mergulhar na rica cultura musical norte-americana, levando o metal ao encontro do southern, do country e até mesmo do blues. Cliff era um hippie por natureza, um cara avesso ao estrelato e apaixonado por música. James é um caipira conservador, apaixonado pelo seu país. A dupla consolidaria sua parceria criativa, levando a música do Metallica para um caminho inédito. Discos como "Load" e "Reload" (1997) não existiriam, e em seu lugar seriam lançados álbuns com uma musicalidade que levaria o thrash metal ao encontro do southern. Ainda mais popular, o Metallica não teria a já citada ressaca do "Black Album" e gravaria mais discos durante a década, ao invés de apenas três.
Além disso, a demanda por rock clássico surgida no início da década de 1990 refletiria no grupo, que jamais gravaria um trabalho como "St. Anger" tendo Cliff Burton em suas fileiras. O Metallica seguiria sendo inovador e inquieto como sempre foi, mas nunca lambendo o fundo do poço como fez no disco de 2003. A presença de Burton e sua musicalidade e técnicas intensas floreceria sobre os outros três músicos, gerando frutos benéficos como o constante desafio interno que levaria ao aprimoramento técnico do quarteto. Lars não regrediria tecnicamente como regrediu, e, ao invés disso, evoluiria em direção a novos caminhos. Nesse aspecto, uma possível aproximação com o prog e até mesmo com outros gêneros, como o jazz, seria algo provável no hipotético futuro do Metallica com Cliff, além da sempre presente influência do hardcore e punk, gêneros que o baixista era um apreciador confesso.
É claro que tudo isso não passa de especulação, mas ao olhar para o passado, para onde o Metallica estava quando Cliff faleceu, me parece a evolução mais plausível dos acontecimentos. Você pode concordar ou não, é claro, só não pode deixar de fazer uma coisa: ir aos comentários e contar pra gente o que você acha que aconteceria se Cliff Burton ainda estivesse entre nós.
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