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Niilismo: algumas de suas influências na música moderna pesada

Por Felipe Resende
Postado em 23 de junho de 2015

Parte 1 – O problema do Niilismo

Este texto não se trata exatamente de uma introdução ao problema do Niilismo, embora possua um certo teor didático. Ele primeiramente busca expor um quadro geral do problema – por meio de um estilo ensaístico (livre e até com certos exageros literários e teóricos) sucinto - para mostrar que o Niilismo não estaria reduzido apenas à crise de substância da principal doutrina religiosa do ocidente: o cristianismo. Em sua segunda parte, procura exemplificar suas ressonâncias na música moderna pesada.

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E para tentar dar conta da tarefa de mostrar sua complexidade, sugiro uma lenta e gradual caminhada em torno do grande deserto que o pensamento nietzschiano iluminou sob nossos pés e sobre nossas cabeças... Sob nossos pés e sobre nossas cabeças? Sim. Nessa aparente confusa alusão está dada justamente a situação dramática em que se encontra o homem moderno. Sob nossos pés, quase tudo o que encontramos é aridez, porque nossa condição geral no mundo é de desorientação. Sobre nossas cabeças, mais aridez, porque não somos capazes de superar esse estado de desorientação. Eis pois o deserto, senhores e senhoras: o Niilismo.

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Caminhamos em seu deserto sem nos darmos conta do calor de seu Sol. Nosso caminhar é lento, pesado e penoso. Nesse deserto não há oásis, e pior, contentamo-nos com as suas miragens. Miragens: fantasmas do passado! O longo legado de uma tradição cultural que pode ser vista, mas não mais tocada. Vagamos sem rumo, acreditando que essas miragens sejam capazes de nos levar a algum lugar. Mas para onde afinal teríamos de ir? Qual seria a terra prometida, se todas estão devastadas? Acontece que a maioria ainda recusa em ver a devastação como devastação, enquanto outros até a transformaram em meta. E quem a põe como problema?

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Nietzsche, como ninguém de sua época, sabia muito bem que a crise dos valores cultivados há séculos na civilização ocidental - responsáveis por orientar a ação humana no mundo e dotar a vida de significado – não estaria ainda sendo vivida como um problema real. Muitos atualmente ainda acreditam na última representante de tais valores: a cultura humanista. Muitos ainda nutrem a crença na possibilidade da razão executar grandes feitos. Temos cá, por exemplo, o sucedâneo da parusia cristã na derradeira revolução social que finalmente iria mostrar aos homens a derradeira amostra sintética entre teoria e práxis. Quem haveria de negar que o socialismo científico não é... científico? Mas não se trata mais meramente de um embate entre metafísica ou materialismo, delírio ou exatidão.

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Temos diante de nós a falência de qualquer possibilidade de significado em nossa vida e no mundo. No Niilismo, as esferas da cultura – religião, arte, política, etc – e a razão não mais conseguem sustentar um cosmos responsável por produzir um sentimento de pertencimento dos homens entre si e com as coisas que os cerceiam. Nenhuma teoria tem mais forças para construir alguma base capaz de orientar nossas ações e dotar nossa vida de sentido pleno. E nós, por nós próprios, não conseguimos ir adiante desse vazio. Além disso, a própria vida perdeu valor. Ela não é mais algo "sagrado" e intocável: é descartável, insignificante, vendível. Nas melhores situações, seria um "fantástico" fenômeno biológico no qual um organismo nasce, cresce, deixa descendentes e, por fim, falece.

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Bastam poucos olhares ao redor para termos uma clara visão dos ecos do Niilismo. Nós o vemos, mas não o compreendemos (e ainda rimos). E essa cegueira poderia ser resumida na seguinte afirmação: os grandes valores morais da tradição agora são motivo de motejo. Quem, hoje em dia, ainda acredita no amor? Quem não é ironizado por estar há mais de dois anos no mesmo relacionamento? Quem não se espanta com a honestidade? Há os que contorcem a face com asco ao ouvirem a palavra "Belo", ou, também, podemos dizer junto a James Phillips que o próprio ato de exercitar o juízo de gosto, de decidir entre o que é Belo ou Feio já seria por si só tedioso. Vejam o quanto nos tornamos bárbaros dentro de nossa própria terra. Bárbaros, diziam os gregos, eram aqueles que não estavam submetidos ao regime da polis, que eram estranhos aos costumes civilizados. Bárbaros: aqueles fora dos muros e das leis gregas. Experienciar a barbárie, assim, era ter contato com um bárbaro, travar conflito com povos não-gregos.

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E hoje, onde estão os bárbaros senão em qualquer lugar? A barbárie não reside mais só fora dos muros, mas também dentro deles. Poderíamos metaforicamente afirmar, aliás, que os muros entre o mundo civilizado e bárbaro caíram. "Dentro" e "fora" seria agora uma mera racionalização valorativa quando as leis pouco significam aos homens, quando ideais de justiça e igualdade social são sedutoramente risíveis. O que seria o Niilismo senão um estado de "catástrofe permanente", no qual um tédio profundo pela vida mescla-se com o terror social? Poderíamos dizer que ser bárbaro, em um primeiro estágio, é rir das leis e dos valores últimos sem ter nada a acrescentar na discussão. Em um segundo estágio, é não ter nada a acrescentar e ainda obrar contra a civilização.

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O que se extrai desse quadro? Ora, se o Niilismo ainda não é vivido como um problema real, como a barbárie dentro e fora de nossos muros poderia realmente ser levada a sério? Tratamos da decadência da cultura ocidental enquanto uma normalidade banal, e não uma normalidade problemática. Um dito da Dialética do esclarecimento sobre o riso resumiria bem isso. Seria aquele o qual a vida que ri dos costumes é a vida que irrompe de modo bárbaro, que não possui escrúpulos. Por trás do riso bárbaro está o prazer em burlar ou aniquilar tabus civilizatórios. Possuímos nós, modernos, escrúpulos (respeito aos tabus)? A condição básica (mas não necessária) para os escrúpulos é a possibilidade de alguma forma de valor e significado em nossa vida subjetiva e na realidade objetiva . Já antevemos a resposta em uma sociedade afetada pelo Niilismo. Mas é preciso ressaltar que não se trata de uma condição necessária, e sim de uma tendência. Ora, quantos não se deleitam diabolicamente contra aqueles que dizem "Mas isso é pecado!"? Há aqueles que não sentem o mínimo de espanto ao observar imagens de pilhas de corpos de judeus esquálidos, submetidos aos campos de concentração e à posterior morte sumária. Há aqueles que gozam com a morte alheia e aqueles que se excitam sexualmente com a violência extrema. Não ficamos espantados ao vermos um massacre de seres humanos na maioria dos filmes da indústria cultural, pois a violência e a morte se tornaram diversão, perderam parte de seu "perigo" (ou sentido) ontológico imediato. Excitamo-nos, inclusive, para saber como determinado personagem irá morrer em um filme de terror. Se "rimos" da sacralidade da vida, rimos também da gravidade da morte. Elas se tornaram algo comercializável; a morte, até algo aprazível, desejável para a satisfação sensível.

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Não contamos mais com a visão da história imanentemente significativa. Ela não é mais uma manifestação da Palavra ou da Razão, por exemplo. Não é a vontade divina se perfazendo ou a liberdade astuciosa se desdobrando em seus vários estágios. Como poderia sê-lo após os grandes eventos de barbárie do século XX? Haveria de ser o desvelamento do Belo uma pilha de milhares de corpos queimados e amontoados em Auschwitz?

Não contamos mais também com os regimes hierárquicos responsáveis por assegurar uma unidade mundana. Com a dissolução ou descentralização das formas de poder antigas, ninguém está mais predestinado a cumprir um papel social específico. Somos livres, mas tão abandonados ao léu. Somos mais livres, mas agora competimos selvagemente por status. Vivemos a angústia de alcançar algum tipo de prestígio social e a luta para não perdê-lo.

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Não contamos mais por fim, também, com a Verdade. Com a crença em um mundo metafísico solapada pelo processo do esclarecimento, esvai-se todo um conjunto de verdades que habitavam a sua esfera e todo o conforto de uma terra prometida. O que resta a nós, então? Resta aceitar a angústia de estarmos jogados ao mundo e sem uma forma de conforto existencial efetiva. O único mundo possível é este, imperfeito (pois corruptível), indevassável à totalidade da razão, que põe o homem em seu devido lugar: em um canto qualquer da insignificância cósmica.

Este é o pano de fundo geral da problemática. Espero que já seja possível ao leitor imaginar o que estaria posto em jogo no universo da música moderna pesada (a ser pensado na parte 2).

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