O que significa "Se o V de verde é o verde da verdade" em "Let Me Sing" de Raul Seixas
Por Gustavo Maiato
Postado em 28 de abril de 2025
Por ocasião de sua estreia solo, Raul Seixas escolheu desafiar o senso comum. Em vez de recorrer a fórmulas fáceis ou melodias simples, o cantor baiano apresentou no VII Festival Internacional da Canção, em 1972, a música "Let Me Sing, Let Me Sing". A canção, que mistura baião e rock, faz uma crítica direta à imposição de uma verdade única durante o regime militar. Com versos como "Se o ‘V’ de verde é o verde da verdade / Dois e dois são cinco, não é mais quatro, não", Raul expôs, de forma sutil e metafórica, os mecanismos de manipulação do poder.
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A composição, assinada por Raul Seixas e Nadine Wisner, foi lançada pela gravadora Philips no compacto homônimo, e mais tarde incluída na coletânea "Os Grandes Sucessos do FIC 72". Segundo o site Análise de Letras, a escolha da cor verde como símbolo remete ao Exército Brasileiro, principal sustentáculo da ditadura. A associação entre "verde" e "verdade" sugere que os militares buscavam legitimar seu domínio por meio de um discurso oficial inquestionável.
A referência ao absurdo matemático — "dois e dois são cinco" — remete diretamente ao romance 1984, de George Orwell. No livro, o Partido totalitário exige que seus membros aceitem mentiras como verdades absolutas. A mesma frase é citada no artigo TOCA RAUL!: Intertextualidades nas músicas de Raul Seixas (in memoriam), de Ivan Fortunato, como evidência da influência orwelliana no trabalho do cantor. Segundo Fortunato, esse verso reforça a crítica à censura e à manipulação ideológica promovidas pelo regime brasileiro à época.

O canal do pesquisador Julio Ettore no YouTube também aponta que Raul já trabalhava, nessa fase inicial da carreira, com temas que marcariam sua discografia. O verso "não quero ser o dono da verdade / pois a verdade não tem dono, não", por exemplo, seria retomado anos depois em Metamorfose Ambulante, de 1973. Para Ettore, Let Me Sing é a semente do estilo que o artista consolidaria nos anos seguintes: acessível, provocador e profundamente filosófico.
Na canção, Raul Seixas também declara sua recusa a seguir modelos impostos, como no trecho "não vou cantar como a cigarra canta / mas desse meu canto eu não lhe abro mão". Conforme análise publicada pelo usuário Jeferson Santos no Análise de Letras, essa afirmação expressa a defesa da liberdade de criação, em oposição à imitação e à padronização exigidas pela indústria cultural e, por extensão, pela lógica autoritária.

Na época, Raul Seixas era produtor musical na gravadora CBS e compunha para artistas ligados à música romântica popular, como Diana e Tony & Frankie. Em entrevista resgatada por pesquisadores e comentada por Júlio Ettore, o artista se referiu a esse período como uma fase de "conscientização e vivência", na qual aprendeu a dialogar com o grande público sem perder a essência crítica.

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