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Iron Maiden: um disco para analisar os mínimos detalhes

Resenha - Final Frontier - Iron Maiden

Por Ronaldo Costa
Postado em 21 de agosto de 2010

Vamos combinar um negócio. O que será feito aqui é a análise de um álbum de heavy metal em si. É lógico que para tentar caracterizar e contextualizar as coisas, serão citadas outras obras e bandas. No entanto, o objetivo não é avaliar a carreira do IRON MAIDEN, nem comparar suas várias fases, tampouco se aprofundar nas reações que os mais variados tipos de fãs terão ao ouvir seu novo lançamento. Isso será discutido num outro momento. Pode-se até dar uma pincelada nisso, mas o que está em discussão agora é unica e exclusivamente uma coisa: a música que ouvimos em "The Final Frontier".

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Baseado no que foi citado acima, pode-se inverter a lógica comum de uma resenha e expor a conclusão já no começo do texto. "The Final Frontier", 15° álbum de estúdio da lendária banda britânica, na conta final, é um senhor disco. Não é uma obra-prima incomparável, bem como também está longe de ser um trabalho descartável. Ali, se revezam numa profusão poucas vezes vista, momentos de pura genialidade e outros onde o ouvinte poderia desejar uma solução diferente. Tudo ali, lado a lado. Inesperado. Talvez seja essa a palavra que melhor defina o álbum em questão. Apesar de a banda repetir alguns clichês, sobretudo em comparação com suas obras mais recentes, fica evidente desde o primeiro minuto que a Donzela busca, mais do que em qualquer momento prévio, a experimentação, a novidade. Por isso mesmo, o trabalho soa inesperado, seja na passagem de uma música a outra, seja na progressão dentro de uma mesma música. Não há a menor dúvida de que esse é o material mais difícil e intricado da história do sexteto inglês. Por isso, não adianta pensar que suas canções possam ser facilmente digeridas. E isso pode até ser algo contraditório, à partir do momento em que observa-se uma banda totalmente solta, à vontade, e com muita inspiração ainda.

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‘Papo furado, disco bom a gente conhece já na primeira ouvida’, dirá o leitor mais afoito. No entanto, essa lógica não cabe aqui. "The Final Frontier" é um trabalho complexo, não na noção de complexidade que possa ter um fã do YES, mas dentro do contexto da discografia do Maiden. É preciso deixar claro que este não é um disco de rock progressivo. É, sim, um álbum de heavy metal, onde o conjunto deixar fluir suas já tão propaladas influências prog. Só que a banda conseguiu unir a isso momentos de hard rock, de metal clássico e de influência celta, o que acaba por transformar o trabalho em algo muito rico musicalmente. Apesar disso, se os vários pontos altos do disco são tão claros para quem o ouve de mente aberta, os seus baixos também acabam se tornando evidentes.

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O IRON MAIDEN colocou na abertura da nova bolacha duas músicas diferentes, as quais resolveu unir e dar um único nome. É essa a descrição exata de "Satellite 15... The Final Frontier". A primeira parte é uma intro experimental diferente de qualquer coisa já lançada por eles. Talvez pela primeira vez em sua história, uma música da Donzela se inicie sem que o fã perceba a sonoridade tão característica do grupo já nos acordes iniciais, pois até o som do baixo de Steve Harris soa diferente. Um ataque de riffs mais distorcidos que o habitual, marcados por uma bateria tribal, cria um ambiente caótico. Quando se presta atenção ao que está sendo dito nos primeiros versos por um Bruce Dickinson cujo vocal varia do desesperado ao fantasmagórico, percebe-se que o clima desolador da canção casa perfeitamente com sua letra. E é aqui onde percebemos que o Maiden é uma das bandas que melhor sabe fazer uma ambientação sonora perfeita para suas letras. Uma marcação de bateria quase marcial continua o andamento dessa introdução fantástica e completamente fora dos padrões, até que após uma pausa muito rápida somos pegos de surpresa novamente. Quando se espera uma explosão de riffs e energia, a banda traz um quase hard rock, despretensioso e cadenciado, com um bom clima e um refrão grudento, daqueles que ficam na cabeça. Os dois solos são competentes, embora não sejam espetaculares. O contraste existente entre as duas metades da faixa é proposital, porém o melhor aqui talvez fosse separar a canção em duas outras, sendo que a primeira parte parece superior à segunda. "El Dorado" começa de forma estrondosa, com uma peça típica de fim de show, seguida pela indefectível cavalgada do baixo. Um riff direto marca a canção e o vocal segue uma linha mais contida para dar a interpretação irônica que a música pede. A ‘bridge’ que antecede o refrão é um dos melhores momentos da faixa, que tem uma variação brusca para um refrão cantado de forma muito alta e que, se ouvido isoladamente, é ótimo, porém é tão diferente que fica meio fora do contexto do restante da música. Em seu segundo terço, segue uma tendência mais prog na execução dos riffs e ótimos solos dos três guitarristas, até retornar para a construção de sua primeira parte. Uma música com identidade própria.

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Na sequência, temos a parte mais tradicional do disco, a ‘mais IRON MAIDEN’, nas três próximas canções. "Mother Of Mercy" é uma música densa, carregada de melodia, misto de um clima sombrio com um tom de resignação, aliada a uma letra excelente. Apresenta bons riffs e um ótimo refrão. Faixa cadenciada, que só se torna mais veloz em seu final, mas que cumpre muito bem seu papel. "Coming Home" é a que mais chega perto da sonoridade de uma pseudo-balada, lembrando muito alguns momentos da carreira solo de Bruce Dickinson. Uma música contida, bastante melódica e muito bem trabalhada em seus detalhes. Trilha com brilhantismo um caminho que poderia facilmente cair na pieguice. Pra completar, traz um refrão que está entre os melhores do disco, além de ter os dois solos mais agradáveis de "The Final Frontier". À seguir temos a faixa mais rápida do álbum, tanto em sua duração quanto em seu andamento. "The Alchemist" retorna àquele típico som no estilo NWOBHM, com seus riffs típicos, guitarras dobradas e uma execução vocal muito boa. O solo é absolutamente competente e condizente com o clima da música. Canção direta, eficiente, que tem como pecado a falta de um peso maior, de um pouco mais de distorção nas guitarras, o que certamente a deixaria mais marcante.

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É a partir daqui que "The Final Frontier" dá mais uma virada, dessa vez em direção a uma sonoridade com influência bem mais progressiva. É a partir daqui que o Maiden mergulha cada vez mais em territórios não muito familiares. É a partir daqui também que a banda apresenta alguns de seus momentos mais inspirados em termos de técnica, boas ideias e riqueza musical. E provavelmente (e curiosamente) será a partir daqui que o álbum deverá despertar reações de amor e ódio em proporções bastante próximas. "Isle Of Avalon" começa com aquele esquema já manjado de introdução lenta e vocal calmo, mas aqui a banda consegue criar um clima único, mais uma vez totalmente em acordo com o que a letra pede. Até mesmo a demora para iniciar a parte mais pesada tem aqui sua razão de ser. E quando a parte mais forte começa, temos um Bruce Dickinson cantando nas alturas. Fica evidente aqui o quanto o vocalista cresceu em termos de técnica e afinação, e o quanto perdeu em termos de potência em relação à primeira década do IRON MAIDEN. O ritmo agitado segue até cairmos num momento que remete de imediato a algumas passagens do RUSH, onde o guitarrista Adrian Smith exibe toda sua elegância, com solos extremamente bem colocados, sobre alguns riffs mais complicados. Uma das melhores músicas do álbum e também entre as melhores da banda nesses últimos anos. "Starblind" começa com mais uma introdução lenta que, diferente da música anterior, aqui se mostra dispensável, mas que dá lugar a uma progressão vigorosa, intricada, meio psicodélica e com uma excelente melodia. Em determinado momento, a canção pode fazer o ouvinte se lembrar de "Infinite Dreams". A faixa segue com ótimas passagens instrumentais. Uma canção maravilhosa, mas que corre o risco de não ser bem aceita, devido à sua cadência e à sua maior complexidade.

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"The Talisman" é carregada de influência celta, com uma introdução acústica que remete à imagem de um poema declamado apenas com voz e violão ao redor de uma fogueira, onde Bruce mostra toda sua capacidade de interpretação. A introdução da música lembra demais "The Legacy", do "A Matter Of Life And Death", porém quando a coisa esquenta, temos uma canção muito mais enérgica e vigorosa. Pode-se dizer que, dentre as músicas mais ‘progressivas’ do disco, esta é a que mais traz elementos consagrados pelo ‘antigo Maiden’. O vocal está em boa parte do tempo em nível praticamente máximo. No entanto, faltou ao produtor Kevin Shirley um maior cuidado no momento mais crítico do álbum em termos de vocal, que é o refrão dessa música, onde não faria mal nenhum descer meio tom, para que a voz de Dickinson não soasse forçada. Talvez até aqui, o melhor material do álbum. Na sequência, uma introdução belíssima apresenta "The Man Who Would Be King". Só que, apesar da beleza da passagem, assim como em "Starblind", talvez ela não fosse necessária, já que a sequência dela com uma daquelas melodias típicas de Dave Murray poderia ter sido uma introdução até melhor em termos instrumentais. Um bom andamento, que consegue variar entre o épico e o despojado, dá lugar a outro refrão dos melhores em "The Final Frontier". Seguindo o refrão, temos uma das passagens mais interessantes do disco, onde há um excepcional solo de guitarra, acompanhado por um som que mescla elementos totalmente psicodélicos e uma sonoridade que chega a lembrar alguns momentos do U2 (sim, você não leu errado, U2), mas que, por incrível que pareça, caiu como uma luva na canção.

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Guardadas as devidas proporções, se os BEATLES tocassem metal, talvez soassem como o IRON MAIDEN em "When The Wild Wind Blows". Isto porque a Donzela consegue aqui trabalhar de forma espetacular uma profusão de melodias marcantes e carregadas de sentimento, onde cada melodia leva naturalmente à outra, e tudo isso de forma contida. Essa faixa traz vários momentos que deixam claras as características das canções compostas por Steve Harris, mas sem cair no clichê. Uma música voltada para o vocal, mas que ainda assim apresenta momentos instrumentais altamente inspirados. Não é um heavy metal clássico em sua essência, em seu clima. Remete mais a um rock, só que tocado com guitarras pesadas. Por isso mesmo, deverá encontrar resistência de boa parte dos fãs, mesmo sendo talvez a melhor música de "The Final Frontier".

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Tecnicamente, ‘los tres amigos’ encontraram seu melhor entrosamento desde o início dessa formação, além de mostrarem muito bom gosto nos arranjos. Até pela proposta do trabalho, as passagens melódicas e alguns riffs acabaram se mostrando mais marcantes que os solos do disco, o que não significa dizer que não há excelentes solos no álbum. Nicko McBrain parece se sentir absolutamente à vontade nesse estilo de som mais trabalhado, mais intricado e cheio de variações, quebras de ritmo e mudanças de andamento. Individualmente, foi o que mais se destacou no disco. Steve Harris esteve curiosamente mais discreto que em períodos anteriores, mas seu baixo continua sendo, de todas, a marca mais registrada do Maiden. Quanto a Bruce Dickinson, é incrível que alguém ainda possa considerar que o sujeito não continue sendo um dos maiores vocalistas tanto da atualidade quanto de todos os tempos no heavy metal. Sua técnica hoje é muito superior à que apresentava no passado. É possível que não exista ninguém melhor que ele quando o assunto é interpretar o que está sendo dito nas letras e dar a dose certa de emoção a cada palavra cantada. No entanto, é impossível não perceber que a idade começa a cobrar seu preço e que a potência de sua voz já não é a mesma de outros tempos.

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A produção de Kevin Shirley, no sentido da captação do som, é ótima. ‘Caveman’, a julgar por esse disco, deveria ser o produtor com o qual todo baterista desejasse trabalhar. No entanto, aparentemente, salvo no caso de ser mesmo uma opção da banda, ainda não conseguiu encontrar o melhor meio de tirar um peso maior do som do trio de guitarras. Além disso, é preciso um cuidado muito maior com o vocal do que aquele apresentado. E o principal: não se sabe até onde o Maiden (leia-se Steve Harris) dá liberdade ao produtor, mas o mesmo tem que ser ativo na procura de soluções para certas passagens, mesmo que a banda tenha que mexer em determinados momentos da estrutura da música.

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"The Final Frontier" não é um disco perfeito. Tem muitos pontos altos e alguns pontos mais baixos. Com certeza, na visão de parte dos fãs, existirão as críticas por sua cadência excessiva, pela sua forte influência progressiva e pela falta de toda aquela eletricidade que transbordava em várias músicas do Maiden de outras épocas. Aquele que procura um disco com canções facilmente assobiáveis, com músicas velozes, com aquela profusão de energia que faz o indivíduo querer sair agitando e batendo cabeça, possivelmente encontrará muitas dificuldades aqui e ainda continuará aguardando um trabalho que seja uma unanimidade. No entanto, a exploração de novas sonoridades, de novas ideias, associada a toda a riqueza musical e melódica fazem dele um ótimo disco. Aquele que quer ouvir um disco prestando atenção a cada mínimo detalhe e que se deixa levar pelo clima das canções certamente perceberá o quão rico é este trabalho. Antagônico, contraditório e talvez por isso mesmo, um trabalho muito bom da banda. Só que, também justamente por isso, sempre dividirá opiniões.

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IRON MAIDEN – THE FINAL FRONTIER
EMI RECORDS LTD. - 2010

TRACK LIST
1. Satellite 15… The Final Frontier – 8’40"
2. 2. El Dorado – 6’49"
3. Mother Of Mercy – 5’20"
4. Coming Home – 5’52"
5. The Alchemist – 4’29"
6. Isle Of Avalon – 9’06"
7. Starblind – 7’48"
8. The Talisman – 9’03"
9. The Man Who Would Be King – 8’28"
10. When The Wild Wind Blows – 10’59"

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Sobre Ronaldo Costa

Nascido na capital paulista em meados dos anos 70, teve a sorte de, ainda bem jovem, descobrir por meio de um primo o debut do Iron Maiden. Quando ouviu "Prowler" pela primeira vez, logo entendeu que aquilo passaria a fazer parte de sua vida. Gosta sobretudo dos clássicos, como Maiden, Judas, Sabbath, Purple, Zeppelin, Metallica, AC/DC, Slayer, mas ouve desde um hard bem leve até um bom death metal. Além da paixão pelo metal e pelo rock em geral, também adora cinema e um bom futebol.
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