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Miasthenia: Rebelião à opressão, homogeneização e dogmatismo

Por Ben Ami Scopinho
Postado em 18 de fevereiro de 2009

Natural de Brasília, com três discos, uma trajetória que beira os 14 anos fez do Miasthenia um dos mais respeitados conjuntos da cena Black Metal brasileira. Seu mais novo registro chama-se "Supremacia Ancestral", está sendo liberado através da Somber Music e mostra que o grupo mantém a essência de seu paganismo em grandes histórias de resistência à cristianização na América colonial.

Hécate (voz e teclados), Thormianak (guitarra), Mist (baixo) e Hamon (bateria) fizeram deste álbum o mais sofisticado e épico de sua carreira, e com uma influência de Heavy e Death Metal ainda mais evidente, e desde então "Supremacia Ancestral" vem sendo considerado por muitos como um dos melhores álbuns nacionais de 2008. Aproveitando a boa fase criativa, o Whiplash! conversou com Hécate para saber mais detalhes da atual fase do Miasthenia.

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Whiplash!: Saudações! O Miasthenia está entrando em seu 14º ano de estrada. É um longo tempo, e a maioria dos conjuntos desistiram muito antes disso... Quais foram os momentos realmente marcantes de sua trajetória?

Hécate: A saída de algum membro da banda sempre causa certo desgaste e uma reflexão sobre os trabalhos e relacionamentos no interior da banda. Tivemos duas baixas neste sentido, uma em 1999 e outra em 2004, mas lutamos para superar e continuar. A turnê com o Enthroned (Bélgica) e Evil War, no sul e sudeste do Brasil, está entre os momentos especiais de nossa trajetória e deixou muitas lembranças, especialmente da convivência na estrada.

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Whiplash!: O Miasthenia passou por momentos difíceis enquanto preparava seu segundo álbum, "Batalha Ritual" (04). O que aconteceu nessa época, afinal?

Hécate: Nós sempre tivemos dificuldades de todo tipo, às vezes a banda se torna um inferno em nossas vidas e em outras é tudo o que mais temos de maior prazer e realização. Naquela época optamos por gravar em São José do Rio Preto, no interior de SP, no estúdio Área 13. Ficamos 10 dias numa chácara por conta desta gravação, gastamos tudo que tínhamos, mesmo contando com uma ajuda da gravadora. Fizemos mais quatros viagens de Brasília para o estúdio, para mixagem e masterização, foi tudo muito difícil e cansativo, e no final das contas nem tudo ficou como idealizado, o que gerou alguns desentendimentos entre nós.

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Whiplash!: Creio que o Miasthenia tem em "Supremacia Ancestral" uma pequena obra-prima. Sua abrangência musical e lírica é muito ampla, praticamente uma aula de História. Como rolou o processo de criação destas composições, afinal?

Hécate: Foi tudo muito idealizado com calma e inspiração, durante todo o processo que durou de 2005 a junho de 2007. Trabalhamos em cima de uma idéia para a temática das letras, isso trouxe inspiração e criatividade musical, mas só no mês de janeiro de 2007 é que fiz todas as letras de uma só vez, quando o instrumental já estava pronto. Desse modo foi possível trabalhar de modo conceitual, mais centrado em uma temática. As letras foram inspiradas em leituras de alguns livros e documentos de história da América colonial e resistência ameríndia à catequização e colonização.

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Whiplash!: Algo que realmente apreciei é a forma como vocês transmitem suas convicções em relação ao Cristianismo. O Miasthenia simplesmente mostra fatos históricos, com todas as tentativas de resistência dos povos indígenas em prol de sua cultura, e o público interessado que tire suas próprias conclusões. É uma interessante forma de rebelião, concorda?

Hécate: Concordo, esse álbum representa uma forma de rebelião à opressão, homogeneização e dogmatismo impostos pelo cristianismo na América, lembrar é resistir! Esse é nosso opus de resistência, um petardo de memória ancestral que faz parte da nossa identidade no presente.

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Whiplash!: "Supremacia Ancestral" conta com a presença do novo baterista Hamon, também do Mythological Cold Towers. Considerando que ele more na região de Osasco (SP). Como vocês veem se organizando para os ensaios, apresentações, etc?

Hécate: Ensaiamos sem a presença de Hamon toda semana. Temos um arquivo só com as linhas de bateria gravadas. Com um notebook, plugado a uma mesa de som, realizamos nossos ensaios em casa. Quando acontecem shows tentamos ensaiar com Hamon alguns dias antes. Às vezes isso não é possível, ficamos até três meses sem um ensaio presencial e só ensaiamos juntos no dia do show, mas isso não interfere no nosso entrosamento e desempenho nos shows. Hamon é muito competente, excelente baterista. Sempre que podemos nos encontramos para ensaios, especialmente nos feriados ao longo do ano.

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Whiplash!: Hécate, um dos pontos decisivos na musicalidade do Miasthenia são suas excelentes linhas vocais. Considerando que você canta há tanto tempo, poderia nos dizer quais foram suas influências?

Hécate: Obrigada pelo reconhecimento! Desde 1993 tenho como inspiração e influências vocais bandas como Carcass, Samael na fase "Blood Ritual" e "Worship Him", Obituary em "Slowly We Root" e Emperor.

Whiplash!: São influências de respeito... As pinturas faciais dos integrantes do Miasthenia teem uma característica bastante distinta se comparado às já tão tradicionais maquiagens empregadas pela maioria dos grupos do Black Metal contemporâneo. Existe alguma ligação entre suas pinturas e a temática ligada aos povos indígenas que vocês adotaram ao longo dos anos?

Hécate: Inspiramo-nos tanto em pinturas rituais indígenas como no tradicional corpse paint Black Metal. Cada membro da banda mescla livremente vários elementos, usamos também tons de terra e vermelho. Gostamos de nos apresentar dessa forma, cria uma atmosfera mais mágica, teatral e conceitual nos shows. Ainda nos divertimos com isso!

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Whiplash!: O fato de o Miasthenia cantar em português resultou em alguma dificuldade real para seus discos penetrarem no mercado underground internacional?

Hécate: Percebemos que o maior problema para repercussão internacional não é só a língua, mas a falta de divulgação e merchandise no exterior. Sabemos que o nosso trabalho é pouco conhecido no exterior, faltam resenhas e entrevistas com a banda na mídia internacional. São raras as entrevistas no exterior. É preciso expor o trabalho de alguma forma, e durante estes anos não tivemos tempo suficiente para nos dedicar à divulgação e contatos. Este ano começamos a investir mais nesse sentido, estamos enviando materiais para rádios e zines de fora, e melhoramos o myspace da banda. Os comentários lá fora são muito bons.

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Whiplash!: Independente dos motivos, ao longo dos anos o Miasthenia fez poucas apresentações por outros estados do Brasil. Existe um planejamento para mudar isso com o lançamento de "Supremacia Ancestral"?

Hécate: Com certeza, o lançamento desse álbum trouxe novas perspectivas para a banda, estamos empenhados e interessados em fazer mais shows. Infelizmente vem sendo difícil negociar nossas apresentações em lugares mais distantes de Brasília, porque a maior parte dos eventos é bem underground e sofre com a falta de recursos financeiros para arcar com as passagens da banda.

Whiplash!: Falando em apresentações, em outubro de 2008 vocês tocaram ao lado do norueguês Mayhem em São Paulo. Como o público reagiu frente às novas canções?

Hécate: Com certeza boa parte do público ali presente ainda não conhecia o "Supremacia Ancestral", e só tocamos sons desse álbum. Nosso show foi bem curto, mas foi o suficiente para perceber o respeito, agitação e apreciação do público. O show teve comentários positivos por parte mídia Metal. Além disso, este álbum tem recebido muitos elogios por parte do público no Brasil.

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Whiplash!: É consenso geral que há muito a ser feito pelo underground brasileiro. Que medidas você acha que seriam viáveis para se aplicar no sentido de melhorar efetivamente a estrutura de nosso cenário?

Hécate: Falta qualidade e profissionalismo tanto por parte das bandas como de eventos. Cansamos de tocar em shows que prometiam boa aparelhagem ou ajuda de custo para as passagens, e depois nada disso aconteceu. Falta comprometimento e seriedade, não só da parte dos organizadores de shows, mas também de algumas bandas, zines e selos especializados em Metal Extremo.

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Whiplash!: Certo, pessoal. Agradeço pela entrevista e espero ter a oportunidade de ver o Miasthenia tocando aqui pela região sul! Fiquem à vontade para algum comentário final aos leitores do Whiplash!

Hécate: Agradecemos pelo espaço e apoio ao nosso trabalho. Queremos parabenizar o Whiplash! pela qualidade e seriedade de seus trabalhos. "Autos de fé inquisitoriais vieram de além-mar, trazendo a cruz e a espada, violando os altares ancestrais do Novo Mundo, mas este Novo Mundo era tão antigo quanto o seu..." Escutem o "Supremacia Ancestral" e saiba o porquê. Força e honra sempre!!!

Contato: www.miasthenia.com

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Sobre Ben Ami Scopinho

Ben Ami é paulistano, porém reside em Florianópolis (SC) desde o início dos anos 1990, onde passou a trabalhar como técnico gráfico e ilustrador. Desde a década anterior, adolescente ainda, já vinha acompanhando o desenvolvimento do Heavy Metal e Hard Rock, e sua paixão pelos discos permitiu que passasse a colaborar com o Whiplash! a partir de 2004 com resenhas, entrevistas e na coluna "Hard Rock - Aqueles que ficaram para trás".
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