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Rock: Da terceira geração aos neoclássicos que ainda permanecem

Por Rodrigo Contrera
Postado em 11 de julho de 2016

Bastou ser apresentado aos clássicos da música erudita para perceber que faltava algo de pegada naquelas melodias e especialmente nas harmonias que perpassaram os séculos e que chegavam a mim naqueles fones rasteiros com os quais eu as ouvia, na fonoteca da ECA-USP. Era como se eu as ouvisse em instrumentos que não me dissessem respeito, de alguma forma. Como se elas precisassem de eletricidade, em suma. Era final da década de 80, o rock clássico já havia passado e ficávamos meio que restritos (pelas gravadoras) a bandas que dominavam o gênero desde a metade da década anterior. Os shows chegavam, até em certa profusão, e os primeiros clássicos (Cochran, Elvis) eram coisa de nossos pais ou até mesmo avós.

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Note-se: meu conhecimento de rock era por bandas como Iron Maiden, Scorpions ou no máximo AC/DC. Não ouvira falar - ou não ligara - no desregramento da geração paz e amor, e esses sucedâneos me eram passados por livros, ou testemunhos de gente que dava aula para mim - e não eram muitos, nem bastante agressivos para eu lhes dar bola. Os clássicos dos 70 eu ouvia só de relance, tipo Led e Deep, e ainda não me pegara a mania de gostar de Hendrix, nem sabia a conexão que havia entre todos eles e o blues, tanto em termos musicais como em universos. Os experimentais eram tocados apenas por minha irmã, e eu tendia a não gostar muito daquilo. Eu era só adrenalina, e gostava de velocidade e nada de ideologia ou romantismo.

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Quando surgiram os guitarristas neoclássicos, eu meio que cobri então essa minha necessidade por timbre - palavra cuja existência só vim a confirmar depois. Sempre fui um conservador, mas ao mesmo tempo nutria necessidade de algo que falasse para mim agora, e os neoclássicos pareciam embarcar nessa comunicação. Claro que havia também a frescura que eles sempre mostraram de dar nomes estranhos às composições, e de apostarem em sentimentos em formatações absolutamente bregas e rasteiras, o que também me atraía. Mas o que me pegava mesmo era o timbre. Aqueles Marshall estourando, as notas espocando aqui e acolá, as mudanças de ritmo e o destaque absoluto às guitarras me conduziam rumo a universos que já haviam ido, mas que pareciam agora falar o que sempre valeria para este garoto que comprava os LPs sem saber exatamente o que extrair deles - mas curtindo.

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Mas era curioso. Eu havia, sim, sido apresentado ao blues naquela época, e havia gostado bastante daquele jeito descompromissado e ao mesmo tempo altaneiro com que aqueles negões (aqui no Brasil, mais branquelas) embalavam aquela galera menos agressiva, menos egolátrica, menos enturmada que os curtia. Eu havia até ido a shows desses caras, em lugares menos afamados, menos lotados e menos curtidos, e até comprado LPs deles, alguns brasileiros de destaque. Mas de alguma forma o pessimismo dos temas, o jeito mancomunado daquela trupe, bem mais unida, e o jeito descompromissado daqueles caras não havia me convencido tanto. Era como se eu buscasse uma turma, que talvez nunca viesse a encontrar, quem sabe. Sei apenas que as baladas do rock tradicional não colavam tanto em mim, e que algo faltava naqueles neoclássicos que realmente fizesse estourar em mim a paixão pelo gênero. Eles - refiro-me especialmente ao Yngwie - respeitavam demais os clássicos para isso conseguir falar tanto comigo.

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Foi assim, em meio a uma pegada meio blues e meio neoclássica, sem ter ouvido muito as grandes bandas dos 70s, que eu fui apresentado a gente que variava em cima, que não ficava restrito às melodias e que avançava com ritmos mais agitados, do tipo do rock dos 80, nessas bandas que faziam nossa cabeça. Macalpine, Moore, Howe, iam por aí, em suma. Isso me satisfazia bastante, e me afastava desse ar compenetrado e megalômano do Yngwie, que parecia não dialogar mais tanto comigo, tanto quanto se exibia. Porém, eles não faziam muito "os clássicos", ou seja, ficavam restritos a pequenas obras, bastante conhecidas, mas não se metiam a colocar o timbre de que eu gostava em Mussorgski, Rashmaninoff, e por aí vai. Eles avançavam muito no rock que me agradava, e até mesmo nos timbres, que não reacendiam (ainda) tanta distorção, mas pouco na clássica, na música que tanto fazia minha cabeça por remeter a momentos gloriosos da história mundial que eu aprendia na faculdade.

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Note-se que nessa época eu começava a vislumbrar novos ambientes no jazz, e no jazz dos instrumentistas mais avançados, e que com eles eu começava a dialogar na improvisação com os clássicos que eles haviam aprendido e que ainda ouviam. E que por meio disso eu também ia me afastando das supostas novidades desses guitarristas neoclássicos, que avançavam demais nos egos, ou em suposições bastante datadas sobre o momento histórico.

Os artistas de vanguarda me eram apresentados assim pelo jazz, e estes por outro lado se mexiam em direção às artes plásticas, que eu começava a estudar em profusão no curso de Filosofia, e cujas obras, além de admirar, eu passava a entender por meio deles mesmo, de suas pessoas, visitando os seus ateliês, ou mesmo visitando exposições de gente que chegava no Ibirapuera sei lá por que vez. A arte sempre me capturou, e se por um lado a contemporânea me fascinava, a clássica era a que sempre fazia minha cabeça; porque nesta, quando mudamos de compreensão da vida, conseguimos avançar enquanto seres humanos, e a contemporânea sempre me pareceu mais rasa, menos avançada, mais supostamente apenas avançada.

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Foi nessa época que comecei a ler os derivados de Kerouac e outros que pareciam ligados a ele, mas que não foram, e todos que foram lidos pelos roqueiros que mudaram os Estados Unidos - e a partir dele, o mundo - e que também, depois, ao longe, se uniram aos mais avançados da música e das artes plásticas. E foi com todos eles que cheguei finalmente aos bluesmen que deram origem ao rock clássico - depois de Elvis, embora com ele - e que também ajudaram a revolucionar as gerações. Então, tudo se uniu, mas pareceu de alguma forma também se afastar dos clássicos eruditos, que pareciam perdidos no tempo. Ocorre que eu gostava mesmo é de barulho, e que nada mais parecia me satisfazer depois de Cacophony, pois tudo o que veio de barulho depois me parecia raso demais, e não me agradava pela ausência de rigor, por um lado, e por outro lado por uma frescura excessiva. Não havia reparado, contudo, que a história andava, e que se por um lado Yngwie veio me mostrar depois que ele bebera de clássicos de que eu não fizera notícia, por outro lado os mesmos que tanto haviam me agradado pareciam então beber de fontes de que eu também curtira algum tempo, avançando em outros rumos. Isso só para me mostrar que os neoclássicos não haviam morrido. Como em Wolf Hoffmann e Michael Romeo, que bastante tardiamente mostraram frutos bastante animados, e que nem se encontram em verbetes da wikipedia.

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Ocorre que alguns de meus ídolos de final dos 80 ou haviam criado ambiente e fãs no Oriente (como o Marty), ou haviam se perdido em suas doenças calamitosas, como o Jason, e sem ter para onde ir (não havia internet como hoje, e eu havia me casado e envolvido com empreendimentos ligados a materiais), eu senti haver continuado, em mim, como fã, com a tradição do novo tanto nos jazzistas, que se perdiam em virtuosismos ou em achados que ninguém mais entendia, ou nas referências clássicas mais amplas, no caso nas óperas que haviam tanto influenciado meus diretores de teatro, que iriam me tornar ator e até mesmo outro diretor, com uma trupe pequena, ambientada com outras músicas, até mesmo próprias.

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Pois eu sempre entendi que os países mais avançados eram e sempre seriam aqueles que mais avançaram nos conhecimentos antigos de si próprios e que por isso mesmo mais avançariam na tecnologia do novo, e nos empreendimentos baseados nela. Ou seja, Alemanha e Japão, em última instância. E foi assim que reparei que todos os meus maiores sempre ficaram nisso, e que, por outro lado, se houve um Zappa que avançou de outra forma, por outro houve e ficou um John Williams, que este, sim, com seu violão clássico, fez forma àquilo que eu mais queria: a música erudita embalada na guitarra. Se alguém irá levá-la à distorção, isso eu sinceramente não sei. Mas os caras continuam tentando.

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Sobre Rodrigo Contrera

Rodrigo Contrera, 48 anos, separado, é jornalista, estudioso de política, Filosofia, rock e religião, sendo formado em Jornalismo, Filosofia e com pós (sem defesa de tese) em Ciência Política. Nasceu no Chile, viu o golpe de 1973, começou a gostar realmente de rock e de heavy metal com o Iron Maiden, e hoje tem um gosto bastante eclético e mutante. Gosta mais de ouvir do que de falar, mas escreve muito - para se comunicar. A maioria dos seus textos no Whiplash são convites disfarçados para ler as histórias de outros fãs, assim como para ter acesso a viagens internas nesse universo chamado rock. Gosta muito ainda do Iron Maiden, mas suas preferências são o rock instrumental, o Motörhead, e coisas velhas-novas. Tem autorização do filho do Lemmy para "tocar" uma peça com base em sua autobiografia, e está aos poucos levando o projeto adiante.
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