Roça 'n' Roll: O Metal está ai para mostrar que não somos lixo
Resenha - Roça 'n' Roll 18ª Expedição (Fazenda Estrela, Varginha, 28/05/2016)
Por Willba Dissidente
Postado em 26 de junho de 2016
Dezoito anos, dezoito edições do maior festival de Rock de Minas Gerais, a festa de maioridade de um dos mais antigos 'Open Air' do Brasil e do mundo. Essa comemoração que tomou de assalto Varginha, a cidade do ET, ao sul do estado das alterosas, responde por um único nome: Roça 'n' Roll! Em meio ao desgaste natural causado pela regularidade de edições e o estresse em se manter a estrutura onde se apresentam na zona rural mais de 20 bandas, o Roça 'n' Roll passou por diversas perdas de apoio para a realização do festival, mas que felizmente foram superadas para que os headbangers reunidos na Fazendo Estrela, os rocers, pudessem continuar com sua diversão. Acontecendo a menos de um mês do golpe de estado pelo qual o Brasil está passando e na semana em que houve casos emblemáticos de feminicidio, o palco do Roça 'n' Roll também abrigou protestos políticos. Acompanhe, a seguir, um pouco de como foi a mueção do ano de 2016!
Se engana quem pensa que o Roça 'n' Roll é simplesmente dois palcos gigantes com uma banda tocando em um cenário e esta acabando já começa apresentação de outro conjunto na estrutura ao lado. O diferencial do festival começa quando se chega ao mesmo. Não é uma mera arena montada e deixada ao relento no meio do mato. Além da natureza belíssima, a área de fora do festival tem várias barracas vendendo comida (refeição também, não só um sanduíche ou pedaço de pizza etc), bebidas (águas, cervejas, doses, refris) e gente fazendo churrasco, conversando, ouvindo som, descansando, em suma: ambiente apropriado para se curtir um pouco da vida underground no mundo verde. É encontrar e fazer novas amizades com o pessoal de sua cidade e socializar com as vans e ônibus de excursão chegando. Quem está em Varginha tem ônibus à R$2,60 partindo das 12 às 23 da nave do ET (centro) para a Fazenda Estrela e voltando das 13 às 05 da manhã pelo mesmo preço.
Quando o som começa a rolar, às 15, o público já pode entrar desde duas horas antes, forma-se uma fila enorme e demorada. Claro, os seguranças precisam revistar a todos para garantir o andamento pacífico do evento (como foi essa edição, sem qualquer briga registrada). Ainda faz sol e está calor, mas a dica para quem deseja assistir as primeiras bandas é não bobear, pois quando se ouve o Rock vindo de dentro da armação do festival é que o bixo começa a pegar.
Quem entra cedo, ou nas primeiras horas do festival, pode ainda aproveitar melhor os outros atrativos do evento que não somente as bandas. Esse ano tivemos exposição de pinturas do artista Lucas Abreu (que pinta sem os braços e há oito anos expõe seus trabalhos no Roça) e também a poesia de varal do poeta Edmar Alves, que veio de Belo Horizonte para expor no espetáculo. Ambos estiveram presentes no festival das 13 às 18. Esse ano o Roça também contou com caricaturas do artista local Ender Senhos, que ficou até a noite trabalhando em fazer charges dos rocers.
Além de toda essa diversidade típica do Roça 'n'Roll, o festival ainda dá mais um show digno de nota fora dos palcos. Dentro do evento há venda de merchandising oficial de todos os grupos que se apresentaram, fora discos (lp / cd) e dvds diversos, camisetas de bandas, ampla praça de alimentação (churrasco, lanche, pizza, caldos etc) e bar (doses, água, cerveja e refrigerante). Além disso, os rocers tem à disposição muitos banheiros químicos para evitar filas soviéticas e também guarda volumes.
Entrevistamos Mike José, que vêm de Lavras para o Roça in Roll repetidamente por 15 anos. "São sempre dois busos para sessenta pessoas cada que organizo de minha cidade para o Roça", contou o entusiasmado jovem à nossa reportagem. Tentamos, de sacanagem, cortar essa animação perguntando se o festival não estaria se tornando repetitivo. "Tá não, sô", já somos interrompidos. "A escolha de bandas está boa e diversificada", informa, "esse ano repetiram quatro bandas que já se apresentaram antes", ele admite, "mas também vai conseguir 20 bandas diferentes e legais todos os anos, quero ver", ele desafia. Para Mike, o festival estabilizou em termos de público há quatro anos, mas se mantém "grande e underground ao mesmo tempo". Tal jucundidade, qual demonstrada pelo nosso entrevistado, é facilmente encontrada em muitos rocers, ainda que não frequentem o Roça há tanto tempo. Grande parte disso vêm dos shows que rolam na fazenda. Vamos a eles agora.
Sob o comando do jornalista e cerimonialista Ivanei Salgado, dono de voz sacana que condiz com a postura debochada e humorística com a qual comunica com a platéia, pontualmente às três da tarde abrem-se as cortinas e começa o espetáculo. O LYRIA foi a primeira banda a começar a embalar o público que ia entrando no Roça. A banda originalmente tocaria na Tenda Combate (vamos explicar a seguir), mas com o cancelamento dos maranhenses do JACKDEVIL (que produção informou a esta reportagem serem referentes à logística do empresário da banda), o quarteto passou para um dos palcos principais, o Tira Couro.
Não obstante os cariocas reivindicarem ser Symphonic Alternative Metal, fica difícil não classificá-lo numa ceara do Metal Gótico. Não pelo instrumental (que é até mais metal tradicional), mas pelo vocal de Aline Happ, facilmente associada à linha de som supracitada . O grupo atacou com músicas do seu disco "Catharsis", destaque para "Jester (mais conhecido do público por ter vídeo-clipe). Todavia, a música mais ovacionada foi a versão de "Demo" do NIGHTWISH (bem que nós falamos, rs).
A ordem na Fazenda Estrela é a seguinte. Acaba um show no Palco Tira Couro e o Ivanei com seu cinto de bala já está no palco Sete Orelhas apresentado a próxima banda e vice-versa. E quem estreou o Sete Orelhas é um grupo mineiro de Itaúna que já tocou na tenda Combate em 2010 e agora vêm com tudo para os palcos principais impondo uma nova disciplina: bateção de cabeça e roda! Estamos, é claro, falando do DEADLINESS o segundo grupo mais antigo se apresentando no festival, já que seus primeiros shows datam do distante ano de 1989! E como o público mineiro gosta do Thrash Metal groove! Não obstante a longa carreira, a apresentação foi centrada no disco "Guerreiros do Metal", de 2014. Com muita fúria, o público curtiu sons como "Sanguinários do Poder", "Vida Morta", "Hate", "Overdose," demonstrando curtir mais as canções em português dos que as em inglês. À exceção foi, claro, para o cover de "Ace of Spades" do MOTÖRHEAD. Porém, esse ás de espadas é na verdade um super trunfo imbatível!
O True Heavy Metal veio navegando de Mogi Mirim, SP, para Minas Gerais! E os piratas do BARBARIA não ficaram boiando ou nadando para morrer na praia. Da abertura com "Under the Black Flag", da primeira demo (2011) ao fechamento com "Blackbeard", do debut "Watery Grave" (2013), o quinteto destacou entrosamento e peso no som inspirado por nomes como JUDAS PRIEST, ACCEPT e RUNNING WILD. Ponto alto é a performance do vocalista Draco, num misto de dança burlesca e bateção de cabeça; isso sem contar que é muito divertido assistir à banda tocar caracterizada como piratas holandeses do Século XVI. O set-list contou com algumas composições novas em português, indicando que o nosso idioma será o oceano que trilharão estes desbravadores dos sete mares em suas próximas viagens. A julgar pela resposta do público rocer, o BARBARIA encontrará seu tesouro.
Sai o Metal anos oitenta e vêm para o Sete Orelhas o Hard Rock setentista com afinações baixas. Estamos falando do CONCRETO, que veio de Belo Horizonte, e desde 1994 se encontra ativo. O quarteto que canta em português tem por hábito dividir os vocais das músicas, como faziam, KISS, STYX e outros medalhões das pauleiras. Já no quinto disco, a banda iniciou com uma longa introdução instrumental e foi prejudicada pela falha no som, microfonia e sumindo instrumentos, que só foi normalizado na terceira música "O Anjo da Morte".
Com coordenação e cerimonialismo de Giovani Gomes (baixista do TUATHA DE DANANN), a tenda combate é um espaço underground dentro do Roça in Roll. Coberta, a tenda abriga bandas que estão que começando e ainda não conhecidas do grande público. Os shows aqui acontecem independente e concomitantemente com o palcos principais e também começam às 15. Enquanto um rocer consegue assistir a todas as apresentações nos palcos principais, ele tem de se abster dos mesmos para curtir os shows menores - mas não menos empolgantes - na tenda. Em 2016, as atrações, em ordem, foram MICHEL & OS HOMOS SAPIENS (formada pela lenda local Michel Bacana exclusivamente para o evento), REPÚDIO (Black Metal, Varginha/MG, que conta com o baixista Edson Guerra do DESCEREBRATION), SILENCE (Power Metal, Pouso Alegre/MG), MEAT (Thrash Metal, Poços de Caldas/MG) e MASTURBATOR (Franca / SP).
Essa edição pode conferir, na integra, a apresentação do SILENCE. Fãs confessos de HELLOWEEN, QUEENSRYCHE, MERCYFULL FATE e outros, o sexteto pouso-alegrense tocou pela segunda vez na tenda. Da primeira vez, o grupo fez covers de seus heróis, já nessa feita apresentou os sons autorais, muitos dos quais estão no EP "Mr. Lie" e também novidades que deverão acompanhar o disco que abrigará o single "Phoenix", com previsão de lançamento esse ano. Como meio de agradecer o público que prestigiou seu Power Metal Melódico, o grupo mandou a longa "Caught Somewhere in Time" dos tradicionais IRON MAIDEN. Atenção produção, o SILENCE já está pronto para rasgar o silêncio dos palcos maiores numa futura edição!
Momento das fardas camufladas e metralhadoras tomaram a Fazenda Estrela, era chegada a hora de um do eventos mais esperados: o show do HOLOCAUSTO, formado em 1985. O grupo participou da aclamada coletânea "Warfare Noise I", nas quais estavam presentes CHAKAL, MUTILATOR e SARCÓFAGO. No ano seguinte, 1987, saiu o LP "Campo de Extermínio, cuja a capa, o manequim da banda e as letras tratando de temas nazistas chamou mais atenção que a sua música propriamente gravada. Foi o line-up de 1986 que voltou para se apresentar pela primeira vez no Roça 'n' Roll. Com sonoridade que se aproxima do barulho de um tanque de guerra em manobras de combate, o grupo atirou músicas furiosas de Black / Thrash metal brutal. Destaque para o baixista Anderson Guerrilheiro que fez a voz principal em algumas músicas. Como o gênero do HOLOCAUSTO é intitulado "War Metal, o vocalista Rodrigo Führer imitava para a platéia uma metralhadora com os braços nos dois bumbos ultra-velozes que faziam o barulho trtrtrtr de disparos.
Aos sobreviventes da guerra, o impacto de ser atropelado por um carro que pesa uma tonelada de Metal! Eis o MAVERICK, do interior de SP, chegando com seu Thrash Groove Metal Core, divulgando seu único registro "The Motor Becomes my Voice"! De introdução e começo brincando que eles iam tocar samba, o quarteto cacetou quase que seu cd inteiro só retirando a faixa "Shadows Inc" pela nova "Redneck". Show que teve impacto de um atropelamento para quem aguentou ficar na grade.
Vocal gutural de Metal Extremo combina com som mais cadenciado do Doom Metal? Essa foi a proposta do quarteto osasquense MYTHOLOGICAL COLD TOWERS. Músicos competentes com boas composições, os paulistanos, que estão na ativa desde 1994, fizeram set-list focado nos seus primeiro e últimos álbuns - a saber, respectivamente, "Sphere of Nebaddon: The Dawn of a Dying Tyffereth" (1996) e "Monvmenta Antiqva" (2014) - com algumas canções dos outros discos também. Não que a banda não tenha agradado, porém falhou ao não trazer um baixista ao vivo; o que deixou o som aquém do que poderia ser. A banda, que já usa teclados gravados em playback ao vivo, não tem membro fixo para as quatro cordas desde o disco "Immemorial", 2011, mas em estúdio há a gravação do instrumento, o que torna inadmissível a ausência de um baixista ao vivo. Metal sem baixo é um pecado tão grande quanto desrespeitar as culturas dos povos do passado, as quais o MYTHOLOGICAL COLD TOWERS tanto enaltece.
Um dos momentos mais esperados do festival, sobe ao palco o músico mais antigo do cast (desde 1982 um garoto podre). Vestido com jaleco e luvas idênticas à personagem Dr. No, do filme de estreia do espião 007 (de 1962), o ex- vocalista do GAROTOS PODRES, Mao, que agora encabeça O SATÂNICO DR. MAO E OS ESPIÕES SECRETOS. O quarteto chegou disparando músicas dos GAROTOS PODRES e também composições do seu cd "Contra os Coxinhas Renegados Inimigos do Povo". O show pode ser dividido em duas partes. Na primeira, ex- GAROTOS (agora coroas?) Mao e Cacá (guitarra) tem inteiração mais cênica brincando com o público e fazendo interpretações e trocadilhos teatrais com os nomes das músicas. Na segunda parte, a coisa é séria. Mao assume a postura de professor de História e explica, antes das músicas, por exemplo, a origem do hino da internacional, a ditadura Salazar, as minas terrestres do IRA a greve da Companhia Siderúrgica Nacional em 1988.
Punk Rock de esquerda pró-proletariado, a situação atual do Brasil, foi citada pelo vocalista, se opondo ao atual golpe de estado. A música "Vomitaram no Trem", se torna "Vomitar no Trem do Temer". O povo que estava na frente aprovou. Já a galera do fundão vaiou.
Interessante notar que essa banda surgiu da impossibilidade de usar o nome GAROTOS PODRES, que está sendo decidida na justiça. Não obstante, os clássicos das antigas como "Johnny", "Papai Noel Velho Batuta", "Maldita Preguiça", as falas do vocalista dão a entender que se trata do mesmo grupo. Destaque também para a nova "Repressão Policial", que possui clipe no youtube. O show foi polêmica na política, mas é unanimidade que foi um dos melhores do festival!
Antes do show do TORTURE SQUAD, Ivanei chamou ao palco Clinger Teixeira do programa web Heavy Metal on-line. O apresentador estava no festival gravando um documentário chamado "O Metal é só para homem?" e adiantou que o próximo filme será sobre o grupo HEADHUNTER DC. Cerrada a breve explicação, chega a horda de devastação do TORTURE SQUAD. O quarteto divulga o recém lançado EP "Return of Evil", apresentando os novos alistados Mayara Puertas (vocal) e Renê Simionato (guitarra), já totalmente integrados à cozinha de guerra formada pelos veteranos Amilcar (bateria) e Castor (aquele fã de KISS no baixo). Como o novo disquinho tem só cinco faixas, o show também mesclou um bom apanhado da carreira do grupo; com o Death Metal fazendo a alegria da galera que se divertia nas inúmeras rodas que surgiam a cada canção.
A vocalista Mayara s protestou contra os casos de femincídio ocorridos no estado do Rio de Janeiro próximos a realização do evento. A saber, o de uma menor que foi estuprada por 33 homens e o assassinato de Raíssa Ribeiro. Essa última, headbanger que foi torturada e queimada viva voltando para casa de um show da banda VINGADOR em uma escola estadual ocupada em 22 de maio, na cidade de Cabo Frio. Saiba mais sobre o caso:
http://rockdissidente.blogspot.com.br/2016/05/vingador.html
"O Heavy Metal está ai para mostrar que nós não somos parte desse lixo", berrou a cantora se opondo à violência contra a mulher. A banda foi ovacionada por sua postura contra a misoginia e o machismo. Muito foda, opinião da nossa reportagem, as bandas trazerem aos palcos do Roça as pautas políticas que também, óbvio, interferem na vida dos headbangers. Acaba o show com a nova vocalista sentada no chão, de \m/ ao alto nas duas mãos agradecendo o público rocer!
Vindos da terra dos mil lagos, o sexteto finlandês AMORPHIS é apresentado como um grupo que desde as primeiras edições os organizadores do Roça os queria nos eventos. Ao julgar pela empolgação do público após a introdução de teclado em escalas baixas com sons sintetizados de flauta, o público há muito ansiava por essa apresentação. Trazendo um set de dezessete canções, o de maior duração do Roça esse ano, o AMORPHIS, cujo debut saiu há 24 anos, pôde passear do Death ao Doom Metal com pitadas progressivas e de Metal tradicional. Sob também o maior backdrop da apresentação, destaque para o vocalista Pasi Koskinen, que além de variar a voz do gutural ao limpo usa um microfone um tanto peculiar, talvez algo como seria o martelo de Thor se ele tivesse sido inventado pelo Homem de Ferro. Os fãs da banda consultados não souberam informar do que se tratava tal artefato; quiças o cantor foi inspirado pelo nome do grupo, que significado do grego "sem forma definida".
O AMORPHIS parecia tocar num show só deles, e não num festival; inclusive fazendo uma pausa após "House of Sleep", do disco "Eclipse", de 2006, tocou sons instrumentais e dedicaram "Silver Bride" para todas as moças na grade do show. "Black Winter Day", 1994, do segundo disco completo da banda, encerrou a apresentação arrebatando os presentes.
Formado em 2013 pelo baixista e o vocalista que entraram no SHAMAN em 2007,o NOTURNALL havia se apresentado no dia anterior do evento em Belo Horizonte, mas isso não tirou pique ou disposição do quinteto. Músicos todos virtuosos, a apresentação começou com introdução do tecladista Juninho Carelli no que parecia ser um tablet. O set apresentado mostrou músicas dos dois discos, um cover do SHAMAN ("Inferno Veil") e muitas passagens instrumentais. O baterista Aquiles Priester fez um longo solo de bateria sob o fundo de sons regionais brasileiros no playback, então veio solo de guitarra do estadunidense recém chegado Mike Orlando (ADERNALINE MOB), seguido pela apresentação do grupo e outro tema instrumental antes de voltar a dois números normais mais pauleira. Para os fãs do grupo foi um deleite; todavia, para quem ainda não conhecia a banda foi uma quebrada de clima. Seria algo para NOTURNALL repensar e em festivais alterar seu set-list habitual retirando algumas passagens mais instrumentais por outros sons autorais com voz; o que certamente prenderia mais o público em geral (já que em festival a audiência é bem variada). Após fechamento de peso com "Noturnal Human Side", o já citado baterista faz que vai atirar peças da bateria em agradecimento à receptividade do público.
A vez e ocasião para as tradicionais danças medievais e passos celtas no Roça in Roll, vinham com o TUATHA DE DANNAN, grupo de Folk Metal Celta em que tocam alguns dos responsáveis por todo o festival. Se apresentando em todas as edições, o show de 2016 foi mais variado em termos de set-list, já que o da décima sétima edição ficou mais recém-lançado, à ocasião, "Dawn of the New Sun". O sexteto tocou sem convidados ou ajuda no mise-en-cene que não fosse a extrema competência e virtuosismo dos músicos (com destaque para Bruno Maia na guitarra, voz, bandolin e flauta transversal). A banda brincou chamando uma faixa instrumental de "forrozeiros do inferno", antes da acertada finalização com seu maior clássico "Finganforn". Se faz necessário lembrar que o grupo relançou após o evento a sua demo de 1999 em cd com diversas bônus e alguns temas rolaram no show.
Na ativa desde 1999, os paulistanos do CRAKER BLUES poderiam mudar seu slogan de "tocar Rock / Blues como o diabo gosta" para "mandando sonzeira como Roça 'n' Roll adora". Na segunda apresentação no evento, a primeira foi em 2013, o quarteto logrou o improvável êxito de levar o Rock'n'Roll dos anos cinquenta com aquele blues à la o sessentista CREAM, ou ao setentista ZZ TOP, a um público majoritariamente fã dos grupos surgidos à partir da década de 1990. Nessa feita, quase todos os temas foram do novo álbum "Prata do Carrasco". Dois destaques fazemos: o cinturão de peito formado de porta gaitas do vocal Paulo Coruja (o dando um ar de guerreiro pós-apocalíptico dos trens nucleares) e a música "Velha Tatuagem", do disco "Entre o México e o Inferno", com muita gente relembrando dessabores amorosos cantando "eu tatuei o nome dela". É, rapaziada, os brutos não só amam, como se decepcionam e ainda fazem música contando como foi.
É importante lembrar que o grupo gravou esse ano sua versão para o Hino do Roça 'n' Roll (todo ano uma banda participante o faz), faixa que abriu o show. Como o cerimonialista Ivanei Salgado teve um problema na sua caixa de som natural (ficou sem voz por causa do frio), quem fez as honrarias para o CRACKER BLUES foi o próprio Bruno Maia que havia acabado de tocar com o TUATHA.
Para fechar o Roça 'n' Roll com o gosto de quem levou um tapa de ficar surdo na orelha, veio o quarteto carioca HATEFULMURDER. Recrutado de última hora para apresentar os adoradores do ódio, Willba Dissidente (do Triumph Of Metal / Tonelada Rock Fest e outros) enfatizou que o jovem grupo de Thrash Death Metal, na ativa desde 2008, já fez dois giros sulamericanos, mas ainda guarda lembranças de quando tocou em Varginha em 2011. Não deu outra, fazendo jus ao nome do disco "No Peace", a pouca paz que restava na Fazenda Estrela foi definitivamente aniquilada. A banda apresenta a recém integrada vocalista Angelica Burns, que se mostrou muito bem integrada ao trio que lhe acompanhava no massacre aos tímpanos que ainda resistiam; fazendo uma performance mais coordenada e ensaiada também nos trejeitos de palco. Além dos sons do disco e dos EPs o HATEFULMURDER ousou muito bem a colocar faixas novas, demonstrando que a nova formação veio para ficar!
Final de edição, foram 14 horas seguidas de Som pesado-barulhento de diversos lados. Claro que parte da galera já vai voltando antes e dorme nas vans e ônibus de suas cidades, ou quem é de Varginha pega condução de madrugada retornando ao centro. Porém, rocer que resiste até o final tem mais estória para contar, pode curtir mais shows e, ainda que mais 'muído', viveu um trem 'mió'.
Com público estimado em 2800 pagantes, houve quem reclamasse do preço do ingresso estar mais caro que nas edições anteriores. Os valores começaram em R$90,00 no primeiro lote e fecharam em R$120,00 na portaria. Lembramos, todavia, que o preço mais baixo de primeiro lote do show do AMORPHIS - sozinho - em São Paulo era o mesmo do preço mais caro e final do Roça.
A crise econômica mundial, que no Brasil foi desculpa midiática para a crise política que resultou no golpe de estado, não foi suficiente para derrubar o Roça 'n' Roll. O corte dos recursos estaduais tampouco. O levante das elites foi lembrado por Mao, assim como o público aplaudiu a causa feminista trazida por Mayra do TORTURE. Dar o grito que o Metal não concorda e não quer esses lixos saiu dos músicos e foi referendado no público. O Metal é onde lutamos contra nossas frustrações e o Roça esse ano foi uma dessas arenas.
Esse mar de gente, quer ser rocer, essa multidão de headbangers quer o Roça 'n' Roll para folgazar-se e também para soltar suas lamurias. E parafraseando ELVIS PRESLEY, tantos rocers juntos não podem estar errados. O festival é para eles que estavam vivendo cada momento, "eles" que também são você lendo este texto. Os que estavam em edições anteriores e/ou estarão nas próximas vezes. Encerramos esperando 'muer' com vocês e você nas próximas edições; seja a primeira ou uma de muitas vezes.
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