Titãs: Um disco de rock inquieto e surpreendente
Resenha - Nheengatu - Titãs
Por Thiago El Cid Cardim
Postado em 30 de maio de 2014
Preciso confessar que me enche de orgulho escrever esta frase: os Titãs, enfim, estão de volta. De nome complicado e enrolado de pronunciar, Nheengatu é um dos discos do ano no cenário fonográfico brasileiro. O melhor álbum da banda desde Titanomaquia, lançado em 1993. Herdeiro musical direto e reto de Cabeça Dinossauro. Pesado, sujo e malvado, conforme prometeu Paulo Miklos. E longe, mas muito longe das melodias pop fáceis e radiofônicos.
Vejam, antes de mais nada, é preciso esclarecer: nada contra que uma banda de rock resolva esticar e testar os limites de sua sonoridade, que cruze as barreiras do pop, que se torne queridinha das paradas de sucesso. Sem problemas. Mas não deixa de ser uma pena que isso aconteça com uma banda como os Titãs, cujo potencial mostrado em Cabeça Dinossauro não poderia ignorado. Era uma cena triste que uma banda como a de Titanomaquia se escondesse por trás de letras baba-românticas e melodias genéricas e simplórias.
Reduzidos a um quarteto, com a saída do baterista Charles Gavin, eles passaram boa parte de 2012 comemorando o aniversário de Cabeça Dinossauro e executando o disco na íntegra. Revisitar seu passado de maneira tão intensa talvez tenha sido o ponto de partida para Nheengatu - o título do álbum faz referência direta à língua criada pelos jesuítas para facilitar a comunicação entre os povos indígenas do Brasil e os colonizadores portugueses. Não por acaso, a bolacha abre com uma pedrada, Fardado, uma espécie de continuação direta de Polícia, só que evocando justamente a violência policial nos protestos dos últimos meses, e pedindo aos oficiais que se coloquem no lugar da população.
Aliás, o momento de atribulação e contestação que toma conta das ruas brasileiras parece ter servido de inspiração para o questionamento que permeia as letras do disco - e que passeiam por uma série de assuntos cabeludos, sem medo de cutucar feridas. Pedofilia, por exemplo, é uma faixa de letra incômoda e violenta que aborda o abuso a menores. Tão poderosa e intensa quanto é Flores para Ela, que aborda o assunto da violência contra as mulheres. Tudo com um peso que há anos não dava as caras, colocando a guitarra de Tony Bellotto como protagonista absoluta do disco.
Sobra ainda para a sociedade do consumo fútil e desenfreado na dobradinha de deliciosos skas República dos Bananas e Eu Me Sinto Bem; para os mandões politicamente corretos no groove do baixo de Não Pode; para a religião mercantilista no punk 1-2-3 básico de Senhor. Na irresistível Baião de Dois, eles rasgam o verbo numa versão moderna e pouco romântica de Romeu e Julieta - enquanto a guitarra dá um contorno roqueiro a uma batida tipicamente nordestina.
Talvez um dos momentos mais inspirados, não apenas musicalmente mas em termos de letras, esteja em Mensageiro da Desgraça. Desacelerando no andamento e com uma letra declamada como numa poesia urbano-infernal, eles versam sobre as condições miseráveis e sobre a loucura que toma conta de quem mora nas ruas. Para encerrar o disco, os Titãs conversam com os Ramones e convidam para a roda de pogo + bate-cabeça enquanto questionam o preconceito em Quem São os Animais?. Um encerramento em altíssima octanagem para um disco praticamente irrepreensível.
Pois é, Titãs. Vocês provaram, para o mundo e para si mesmos, que não são apenas os jovens de 20 anos de idade que conseguem fazer um disco de rock inquieto e surpreendente. Espero que tenham aprendido a lição. E que este não seja o canto de cisne, mas apenas um promissor recomeço.
Line-up:
Paulo Miklos - Vocal/Guitarra
Branco Mello - Vocal/Baixo
Sérgio Britto - Voz/Teclados
Tony Bellotto - Guitarra
Tracklist:
01. Fardado
02. Mensageiro da Desgraça
03. República dos Bananas
04. Fala, Renata
05. Cadáver Sobre Cadáver
06. Canalha (cover de Walter Franco)
07. Pedofilia
08. Chegada ao Brasil (Terra à Vista)
09. Eu Me Sinto Bem
10. Flores Para Ela
11. Não Pode
12. Senhor
13. Baião de Dois
14. Quem São os Animais?
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