Música para Bundões: para onde foi a raiva no Rock e no Metal?
Por Nacho Belgrande
Fonte: Playa Del Nacho
Postado em 29 de maio de 2015
Texto original de JOHNNY SHARP para a revista inglesa CLASSIC ROCK, maio de 2015.
É 2015, o mundo está afundado no caos, mas você nunca saberia disso ouvindo música. Aonde estão as bandas de rock com raiva?
"Raiva é energia", disse certa vez um sábio. E ao longo da história do rock emoções negativas, fúria e cólera à esmo têm fomentado uma enorme variedade de rock de excelente qualidade. Muito mais, na verdade, do que alegria em êxtase, felicidade amorosa ou euforia festiva.
Então por que é que em 2015, parece haver tão pouco rock genuinamente raivoso? Enquanto 10 ou 20 anos atrás, bandas como o RAGE AGAINST THE MACHINE ou o SYSTEM OF A DOWN talharam muito de sua identidade artística calcados em indignação, os descendentes espirituais e políticos desses artistas parecem não estar emergindo – ou se estão, não têm feito música poderosa o suficiente para fazer com que seus sentimentos sejam levados em consideração.
Não me entenda mal, há tanto do que Shakespeare chamava de ‘som e fúria’ hoje como havia antes, mas também mais do que nunca, isso parece não querer dizer nada.
Uma causa de desdém maior é o fato de que o rock parece ter se tornado o gênero mais apático da música. Os fãs de rock com sua mentalidade tribal acham que o pop e o r&b são para acéfalos, música comercial sem garra, coragem ou moral. Mas quem é que tem mostrado tais qualidades quando se trata de comentários sociais?
As recentes tensões entre a comunidade negra e a polícia em Ferguson e Baltimore viram os artistas de hip-hop unidos em discursos pré-show [vide as declarações de Killer Mike em Saint Louis] e sons tratando do assunto como ‘Be Free’, de J Cole, e até os geralmente isento de ativismo Prince [com ‘Baltimore’] e Lauryn Hill [com ‘Black Rage’] se mobilizaram ante a situação.
Enquanto isso, quando Paloma Faith está levando o escritor esquerdista Owen Jones em turnê com ela, o rock precisa dar uma longa olhada para si próprio e perguntar-se para onde foram seus valores.
Eu sei, há muita música boa sendo feita, e eu seria o último a sugerir que queremos que todo mundo fique discursando sobre questões sociais. Mas vejam os indicados para o prêmio de Melhor Banda Nova na celebração dos Classic Rock Awards em novembro passado: Blackwolf, Massive, Cadillac Three, The Golden Grass, No Sinner e Blues Pills, todos saturados de rock para a festinha. E por que não? Enquanto isso, Purson and The Strypes revira a onda retrô. Até mesmo o poderoso Royal Blood, com todo o seu punch, parece lidar, no que tange a letras, em destilar antipatia pessoal ao invés de qualquer coisa que chegue perto de rock de agitação com consciência social.
Claro, os leitores de uma revista chamada CLASSIC ROCK sempre tendem a preferir a música um pouco mais tradicional, mas o que aconteceu à tradição de afiar seus riffs com uma questão nas letras?
Enquanto isso, a geração geralmente dada a ficar irritada com qualquer coisa desde mensalidades escolares até desarmamento nuclear parece se importar mais comem que parte do corpo vai fazer sua próxima tatuagem de citações vagas, mas poeticamente inspiradoras.
E seus novos ídolos não estão ajudando. As atuais sensações do metal como You Me At Six parecem estar mais interessadas em promover suas lucrativas coleções de roupas do que em mudar o mundo, ao mesmo tempo em que bandas como o Black Veil Brides podem até permear seu hair metal com uma pitada de melodrama gótico, mas elas preferem emocionar garotas adolescentes e aborrecer a seus pais do que derrubar ícones.
Seria de se supor que o espectro mais blues do rock pudesse catapultar uma retórica um pouco mais correta. Ainda assim, mesmo com os Black Keys e os White Stripes antes deles tendo recalibrado o blues e dado uma nova energia e corte a ele ao longo da última década e meia, tem havido pouco do tradicional espírito de protesto do blues por aí.
Talvez em um tempo de recessão, prefiramos ouvir a alguém como Seasick Stevie cantando modas alegres mais do que ficar emputecidos de fato com a pobreza e incomodar esse público composto em sua maioria de classe média e meia-idade.
O problema é que, mesmo quando você tem uma causa para a sua rebeldia, sempre há a questão intrínseca de se fazer música de qualidade em cima dela, de modo que as pessoas de fato a ouça. O Pussy Riot ganhou fama mundial por seus atos ousados de publicidade e consequente encarceramento na Rússia, mas muito pouca gente as viu tocando ao vivo, e tal como qualquer um que as viu vai corroborar, há um bom motivo pelo qual quase ninguém da mídia vai querer estragar uma matéria boa ao falar demais do trabalho delas.
Mas mesmo um módico de talento musical pode ser transformado em algo emocionante com a postura certa. A volta do BODY COUNT coloca todos os bicholas emo e chorões do rock alternativo confinados apavorados em suas zonas de conforto, e nos lembra que simplesmente não há bandas de metal no cenário de hoje que possam ser tão ousadas e radicais em termos de letras como o grupo de ICE-T com toda sua atitude [nota: de fato, o último álbum do grupo, de 2014, é um soco no estômago quando se fala de letra e absolutamente nenhum outro disco ou banda do mainstream chegou sequer perto de algo tão forte ano passado].
Há poucas e notáveis exceções, mas tal como o Body Count, estas são oriundas de uma velha guarda de músicos, e não de um novo e jovem front raivoso.
O Skindred pode até canalizar a retidão da ira do reggae, mas eles são essencialmente formandos da explosão da fusão rap/rock do começo dos anos 90 e do metal eclético que lançou seus antecessores, o Dub War.
Em outro canto genérico, Steven Wilson quase nunca ficou sem ter coisas significativas para dizer sobre o mundo em que vivemos, tanto sem seus lançamentos solo recentes como no Porcupine Tree, mas ele não é muito o tipo que fica indignado com as coisas.
Grupos como o Dream Theater também tiveram seus momentos de expressar opinião a respeito da situação do mundo, mas, no fim das contas, com todo o respeito, estamos falando de homens de meia-idade, não aríetes jovens com a energia ou bala na agulha para ter de fato um impacto autêntico no futuro da música.
Eu não estou apenas falando de uma estiagem de raiva política aqui tampouco. Ouça à fúria figadal e ira alienada dos melhores trabalhos do Nirvana. Pode soar essencialmente niilista, mas, pelamor, aquilo fazia sua pulsação acelerar, e toda a postura deles, assim como a abordagem da arte era suficientemente radical e aguda para tornar aquilo político, mesmo que com ‘P’ minúsculo.
Por toda a influência que Kurt e sua banda exerceram ao longo dos últimos 20 anos, você há de perguntar, cadê o grosso da coisa? Muito da música que eles influenciaram é ‘meio’ raivosa, vagamente emputecida, e quase nunca focada.
A exceção mais óbvia à regra apolítica entre as bandas jovens é o ENTER SHIKARI. Eles também são originários da década passada, mais do que porta-estandartes de uma nova geração, mas pelo menos eles apontaram para o lado certo: "Para nós é uma segunda natureza", disse o frontman Rou Reynolds no começo desse ano. "É pra isso que serve essa música. Se você retira a crítica social, não é punk, é pop com barulho. "
Ele pode ter razão, e isso raramente se discuta ou é repetido em 2015. Ao mesmo tempo em que, certamente, muitas bandas novas se consideram como detentoras de uma levada punk, o que é o punk sem uma visão de mundo anti-establishment, e um ódio saudável do status quo? E eu não estou falando sobre bandas meia-bomba sexagenárias, apesar de que, caso alguém quiser comentar a respeito, a recente transição de Rossi e Parfitt para instrumentos acústicos é um excelente tema para lhe enervar…
[an error occurred while processing this directive]Então quem mais vai se erguer e se fazer notado? Quem vai ser a ponta de lança de um novo movimento de bandas de rock com algo a dizer sobre o atual estado do mundo, e com meios para fazê-lo? Pode não estar na moda, pode não ser o caminho mais fácil para ser contratado por uma grande gravadora. Mas você com certeza vai se destacar dos demais.
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