Helloween: determinados a ser relevantes
Resenha - Gambling with the Devil - Helloween
Por Igor Natusch
Postado em 15 de outubro de 2007
Não é de agora que os alemães do Helloween andavam dando motivos de preocupação para os seus fãs. Em uma análise rigorosa, pode-se dizer que desde "Better Than Raw" (1998) o grupo vinha dando algumas escorregadas – que, felizmente, eram amplamente suplantadas pelos acertos no disco em questão. No entanto, a espiral da abóbora passou a ser descendente, e acabamos presenteados com álbuns ora confusos ("The Dark Ride"), ora quase inúteis (como o disco de covers "Metal Jukebox"), quando não carentes mesmo de inspiração ("Rabbit Don’t Come Easy").
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Por fim, veio a muito infeliz idéia de gravar um CD duplo e chamá-lo "Keeper of the Seven Keys – The Legacy". Além de gerar imediatamente uma comparação severa com os dois maiores clássicos do Helloween, deixou ainda mais escancarada a falta de regularidade das composições em um disco apenas mediano. Depois de tudo isso, não surpreende que "Gambling with the Devil" seja recebido com considerável desconfiança por imprensa e público. E não é que o disco é uma pedrada, um trabalho de alto nível que chega a lembrar até os já um tanto velhos tempos de "Master of the Rings" e "Time of the Oath"?
Após a intro "Crack the Riddle" (que conta com a ilustre participação de Biff Byford, do Saxon, e lembra o início de "The Dark Ride", a música), temos "Kill It", uma faixa absolutamente demolidora. Andi Deris dá um show em diferentes entonações de voz, Dani Löble destruindo tudo na bateria e um clima que lembra "Push" do "Better than Raw", mas em uma música que consegue ser bem mais efetiva e empolgante. É uma faixa surpreendente, que cria uma alta expectativa para o que virá a seguir. E a seguir vem "The Saints", que deve ser uma composição de Michael Weikath, a julgar pelas características: bumbo duplo no talo, melodias aos montes e uma linha vocal marcante e grandiosa. Lembra "The Tune" (para mim, a melhor canção de "Rabbit Don’t Come Easy") e tem uma seção instrumental inspiradíssima, com duelos de guitarras empolgantes de Weikath e do já não tão novato Sascha Gerstner. Um ótimo começo, acreditem.
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"As Long As I Fall" é o primeiro single, e essa com certeza é música de Andi Deris – um ar hard rock conduz a música, que tem um refrão marcante e mais uma ótima seção instrumental. Aqui já fica claro qual é a do novo Helloween: fazer basicamente o mesmo que tem feito nos últimos anos, mas com uma qualidade muito superior ao que seu passado recente poderia dar a supor. Já "Paint A New World" é pesadíssima, com um timbre de guitarras saturado ao extremo e mais um grande desempenho de Deris. Parece que ele resolveu calar a boca da oposição de vez, e durante todo o disco sua convicção e versatilidade impressionam qualquer um que ouça sem idéias pré-concebidas. E na seqüência, "Final Fortune", uma pérola. Dizem que é uma composição de Markus Grosskopf, que nunca foi muito de escrever músicas para a banda, e se for mesmo eu bato palmas de pé para o homem – afinal, que música foda! Tudo nela é inspirado, bem construído e executado, um show de musicalidade e bom gosto. No momento, é minha música favorita, e vou agitar como um louco se tocarem esse petardo ao vivo!
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"The Bells of the Seven Hells" é uma música menos impactante, mas conta com um refrão simples e grudento, além de mais uma vez escancarar a qualidade de Dani Löble na bateria. O cara é um cavalo, capaz de arranjos criativos e variados mesmo nas partes mais velozes e complicadas, e acaba sendo um dos destaques do CD. Emendada com os sinos dos sete infernos, vem "Fallen to Pieces", uma semi-balada até interessante, que consegue superar o refrão chatinho (o mais fraco do CD, com certeza) com arranjos dinâmicos e mais um grande desempenho da cozinha – e eu digo desde sempre que Markus é um dos melhores baixistas que o Heavy Metal conhece, mas não reconhece. Uma seção instrumental bem pesada é inserida no meio, e acaba dando um pouco mais vibração para a música. Mais uma emenda entre faixas, e "I.M.E." surge, com mais um trabalho excepcional de guitarras a serviço de uma composição forte e marcante. Fugindo dos clichês estruturais do Metal melódico, temos riffs quebrados, bateria variada e um andamento não muito veloz, mas que conduz a música com perfeição. Essa deve ser daquelas que crescem no ouvinte à medida que vamos nos acostumando com ela.
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"Can Do It" é quase pop, mas mesmo assim é sensacional. Como parâmetro mais próximo de comparação, me ocorre "Living Ain’t No Crime", obscuro lado B que aparece apenas em coletâneas da banda. Ambas são grudentas, com linhas vocais que são inteiras um grande refrão (se é que me faço entender) e que são realçadas pelo peso do instrumental e pela inventividade dos solos de guitarra. Soa despretensioso, contagiante e sumamente divertido. "Dreambound" começa climática e evolui para mais uma canção de andamento veloz e grandes melodias vocais. Não chega a ser um som memorável, mas mantém alto o nível de um disco já muito bem cotado. Por fim, "Heaven Tells No Lies", uma música de bons arranjos (em especial na entrada da seção instrumental, de fato inspiradíssima) e com uma energia bastante positiva, ao contrário da maioria dos últimos encerramentos de disco do Helloween, que eram mais "down". Um bom encerramento para um trabalho de alto nível.
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De modo geral, o que surpreende positivamente no Helloween 2007 é a volta da empolgação. Era inevitável ouvir os últimos discos e ficar com um sentimento esquisito, como se as músicas fossem escritas por obrigação e o disco fosse apenas o cumprimento de um dever contratual. Aqui, definitivamente, não é o caso – e temos diante de nós uma banda determinada a ser relevante, a escrever boas músicas, a acrescentar algo nesses tempos tão confusos para o Heavy Metal e para a música em geral. "Gambling with the Devil" é um CD forte, vindo de uma banda que demonstra querer superar todas as dificuldades do passado recente e que ainda pode oferecer muito aos fãs de Metal.
Altamente recomendável.
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