Mulheres no Rock: resistência em um meio machista
Por Adriana Chaves
Postado em 01 de janeiro de 2000
Com características libertárias e de contestação ao sistema pré-estabelecido, o Rock se firmou ao longo das décadas com características essencialmente machistas. Apesar de toda a agitação social dos anos 60 em torno da igualdade de condições entre homens e mulheres, elas aparecem quase sempre relegadas a um segundo plano.
No Heavy Metal, estas diferenças são mais evidentes e as bandas femininas continuam sendo minoria. Essa presença só é mais democrática entre os músicos da era Punk, em grupos como X-Rays Specs, Siouxsie & The Banshees, Slits, X, Exene Cervenka e Poly Styrene.
Janis Joplin foi pioneira ao quebrar as barreiras do preconceito durante os anos dourados. Com uma voz poderosa e versões muito próximas ao blues, a cantora personificou a trinca sexo, drogas e rock and roll até sua prematura morte, em 1970.
Cabe à Suzi Quatro, no entanto, a prerrogativa de ser a primeira roqueira com atitude e sonoridade verdadeiramente metálicas. Formou sua primeira banda com as irmãs, aos 15 anos. Já como artista solo, lança o single, "Rolling Stone" (72), mas a explosão só viria no ano seguinte, com "Can the Can", e os clássicos Devil Gate Drive e a insuperável 48 Crash.
Idealizado pelo empresário e produtor Kim Fowley, o grupo The Runaways surgiu em 75, trazendo graça e sensualidade ao universo dos headbangers. Apesar da proposta visivelmente comercial, as garotas conseguiram fugir do estigma de banda manufaturada.
A fama do grupo começou a se firmar em apresentações nos clubes de Los Angeles. No ano seguinte, sai o primeiro álbum, "Runaways", que trazia Joan Jett (vocais e guitarras), Sandy West (bateria), Cherie Currie (vocais), Lita Ford (lead guitar) e Jackie Fox (baixo).
A partir de "Queens of Noise" (77), segundo álbum da banda, começam as brigas internas. A rhythm guitar Joan Jett começa a se sobressair também como cantora e, após a saída de Currie, assume definitivamente os vocais. Começam as mudanças de formação. Ao todo, três baixistas passaram pelo grupo: Jackie Fox, Laurie McCallister e Vicki Blue.
A turnê japonesa agrava a crise interna, mas não impede o lançamento de um disco ao vivo. "And Now... The Runaways", de 78, marca o declínio da banda, que lançaria ainda "Flaming Schools" (80).
Com o fim do Runaways, Jett partiu para Londres, onde ensaiou uma parceria com os ex-Sex Pistols Steve Jones e Paul Cook, o fracassado compacto "You Don't Own Me". De volta à Califórnia, lança "Bad Reputation". Em 82, I Love Rock And Roll chega ao topo das paradas americanas. Os álbuns seguintes tem pouca repercussão e nem mesmo uma copilação de covers gravada em 90, intitulada "Hit List", conseguiu repetir o sucesso.
Há cerca de quatro anos, Jett se uniu ao The Gist, num tributo ao vocalista e líder da banda, Mia Zapata, raptado e morto em Seattle. Além de ser uma das poucas em atividade, preconizou o movimento Riot Grrrls, de bandas raivosas encabeçadas por mulheres. A identificação com a nova geração é tanta que representantes desse estilo - L7, Bikini Kill e Babes in Toyland - fizeram participações em seu disco "Notorious" (94).
Outra que tentou seguir os passos gloriosos do Runaways foi Lita Ford. Intensificando o estereótipo de wild-girl, Lita conseguiu muito mais notoriedade pelos seus atributos físicos do que propriamente pela música. "Out for Blood" marcou o início de sua carreira solo, em 83.
Lita teve repercussão com "Dancing on the Edge" (84), "Lita (88), Stilleto" (90), mas as histórias envolvendo as gravações e sua vida particular sempre despertaram maior interesse. Os romances com rockstars, por exemplo, compõem um capítulo à parte em sua biografia. Além da união com o guitarrista do WASP, Chris Holmes, Lita namorou o guitarrista Tony Iommi, do Black Sabbath, e Nikki Sixxi, do Motley Crue.
Algumas de suas parcerias musicais também tornaram-se célebres. Quem não se comoveu com a melosa Close My Eyes Forever, gravada ao lado do madman Ozzy Osbourne no final dos anos 80? O hit chegou ao topo das paradas e deu uma guinada na carreira da dupla.
A música Dangerous Curves, composta por Sammy Hagar para homenageá-la, acabou nomeando um de seus álbuns, lançado em 91. Vez por outra, Lita ressurge, mas sem o mesmo brilho do passado. Casada com o ex-vocalista do Nitro, Jim Gillette desde 94, ela curte o primeiro filho, nascido há dois anos, enquanto adia os planos de retorno ao showbusiness.
Mas o vanguardismo das bandas femininas de heavy metal não é monopólio americano. No embalo da New Wave of British Heavy Metal (NWOBHM) - que revelou gigantes como Iron Maiden, Judas Priest, Def Leppard, Venon e Saxon, surgidos na metade da década de 70 -, as inglesas também deram seu recado com competência e muita personalidade.
De uma despretensiosa banda de colégio, chamada Painted Lady, surge o Girscholl em 78. Di "Enid" Williams (baixo) e Kim McAuliffe (guitarra e vocais), Denise Duffort (bateria) e Kathy Valentine (guitarra) - posteriormente substituída por Kelly Johnson -, conseguiram aliar a fúria punk às bases de metal, revelando uma insuspeita qualidade instrumental, sem qualquer apelo sexual num universo repleto de posers.
O reconhecimento do público viria no ano seguinte, quando excursionaram com os "padrinhos" Motorhead. O disco "Demolition" foi gravado pela independente Bronze Records, a mesma de Lemmy Kilmister e sua trupe na época. Em 81, sai o álbum "Hit and Run" e as duas bandas lançam um EP juntas "The St. Valentine Day's Massacre".
Durante a turnê pelo Japão, acontece a segunda baixa: sai Enid e em seu lugar entra Gil Weston. Com os discos "Screaming Blue Murder" e "Play Dirty" elas atingem o ápice. O êxito não impede que Kelly abandone o posto e o grupo é oficialmente dissolvido em 84.
Dentro da cena britânica, as adolescentes da Rock Godess obtiveram algum respaldo do público até metade da década de 80. Formado pela baixista Tracy Lamb e pelas irmãs Jodie e Julie Turner, respectivamente guitarrista e baterista, o primeiro contrato do grupo só foi assinado em 83, quase cinco anos após a formação.
Os anos 80 foram mais frutíferos para as bandas femininas e muitas pegaram carona na onda glam do Hard Rock. Com um som explicitamente comercial e muita maquiagem, o Vixen vendeu milhões com seu disco de estréia, em 88. Janet Gardner (vocais), Jan Kuehnemund (guitarra), Share Pedersen (baixo) e Roxy Petrucci (bateria) não conseguiram repetir o feito com "Ver It Up" (90) e "Tangerine" (98).
Sob a produção de Marty Friedman, que logo em seguida entraria no Megadeth, a garotas do Phantom Blue lançaram o primeiro disco em 89. Composto pela vocalista Gigi Hangach, a baterista Linda McDonald, a baixista Kim Nielsen e as guitarristas Michele Meldrum e Nicole Couch, o trabalho seguinte, "Built to Perform", foi prensado com atraso e só chegou às lojas em 93. Logo após, Nielsen foi substituída por Rana Ross.
As mulheres que construíram carreiras de maior longevidade são justamente as que optaram por posturas mais pop. É o que comprova o Blondie, liderado pela cantora Deborah (Debbie) Harry, que vendeu mais de 40 milhões de álbuns em todo o mundo. A turnê "No Exit", iniciada em 99, marca o retorno da banda aos palcos depois de 16 anos de silêncio.
Já o Heart, das irmãs Ann e Nancy Wilson, sempre privilegiou a parte instrumental das composições. O primeiro LP, "Dreamboat Annie" (76) trazia uma mistura de folk e hard rock, com destaque para os singles Crazy On You e Magic Man. O auge veio com "Bad Animal" (87). Tentando adaptar-se aos novos tempos, a dupla retomou suas raízes em Seattle (EUA).
A influência grunge é nítida em "Desire Walks On" (93), cuja faixa Lovemongers foi incluída na trilha do filme Singles, dirigido por Cameron Crowe. O baixista do Led Zeppelin, John Paul Jones, se encarregou da produção do acústico "The Road Home".
Uma das poucas remanescentes da linha Hard Rock, a alemã Doro Pesch alia beleza, carisma e talento ao profissionalismo da banda que a acompanha. Depois de algum sucesso nos Estados Unidos no início dos anos 90 como Warlock, a banda mudou o nome para Doro.
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