Latin Union Students: Rockabilly e Hot Rods na Califórnia
Resenha - Rockabilly Festival - Latin Union Students (Claremont, CA - 09/03/2013)
Por Cesar Matuza
Postado em 07 de abril de 2013
Salve leitores, hoje vamos falar de artistas e pessoas bem mais modestas e menos conhecidas, mas de grande influência na cultura americana, ou seria o contrário? A cultura Latina influenciando a americana?.. Bem vamos descobrir juntos.
Desde que cheguei à Califórnia, já percebi que Los Angeles e outras cidades ao redor são explicitamente assumidas cidades bilíngues. No aeroporto achei que era pelo fluxo de turistas, mas em todos os lugares que você vá, desde a estação de trem até nos shopping centers, todos têm placas, sinais e instruções em inglês e espanhol. (Vesting Rooms/Quarto de Vestir), (Exit/Salida) .. e por aí vai.
Visto que o estado da Califórnia faz fronteira diretamente com o México, exatamente na fronteira com a cidade de Tijuana, apenas alguns quilômetros (ou milhas) de San Diego, era de se esperar a influência e a presença de estrangeiros, principalmente mexicanos por aqui, que aliás, Los Angeles, Santa Mônica, San Diego, são cidades com nomes em espanhol. Então, aparentemente, a influência hispânica aqui está presente desde o início nessa região.
Essa pequena introdução de história, sociologia, geografia, etc.. foi para ambientar o leitor ao evento que estaremos dando cobertura nesse post, o Rockabilly Festival, organizado pela LSU (Latin Studants Union) – não precisa traduzir né? Ok.
Essa associação está presente em vários Colleges e Universities por aqui, assim como há também as dos asiáticos, estudantes africanos, etc. São associações, tipo centros acadêmicos, que dão apoio e suporte aos estudantes estrangeiros ou de famílias de origem estrangeira, além de promover encontros e debates, discussões políticas e sociais, promover eventos culturais para difundir a cultura, e demais necessidades que os mesmo possam encontrar.
O festival acontece anualmente, essa será a 6ª edição, realizada dentro do campus do Pitzer College, na California. Na verdade não é apenas um festival de música, ele inclui exposição de carros, comportamento, tradição, cultura, venda de artesanato, roupas, comidas típicas mexicanas, tudo relativo a cultura latina. O rockabilly, talvez o mais legítimo rock americano, mas no festival, apenas bandas formadas por latinos ou descendentes, com músicas em inglês ou espanhol, ou típicas músicas hispânicas, enfim, uma mistura interessantíssima. Nas barracas de roupas, artes, etc. o cidadão aqui que lhe escreve, deixou boa parte das verdinhas que tinha comigo.
E uma coisa a ressaltar, falem o que for dos americanos, mas não da educação e respeito, pois não se viu ninguém embriagado, nem sequer vendendo, nem sequer bebendo cerveja dentro do campus, pois é respeitada a recomendação de que em eventos dentro de universidades, não se comercializa nem se consome cerveja ou qualquer bebida alcoólica, e foi absolutamente respeitado. A entrada do campus é aberta, livre, havia barracas vendendo apenas refri, e mesmo assim, ninguém deu um ‘jeitinho’ pra beber. Ah se fosse outro evento com outro tipo de musica, no Brasil. Um dia ainda vão reconhecer que rock é muito mais educação e paz e outros ritmos (que não citarei) é baderna, falta de educação e baixaria.
Os shows estavam programados para começar ao meio dia (o que muitos brasileiros mal acostumados, amigos meus inclusive, diriam "até parece que vai começar meio dia"), mas não duvidei da programação, acordei cedo e entrei no Campus as 9h da manhã e já dou de cara com vários carros incríveis, espetaculares, impecavelmente construídos e conservados, daqueles que eu só via em revistas quando moleque, ou em filmes, e digo-lhes, a sensação de estar presente do lado dessas maquinas é muito surreal. (Obs: óbvio que, isso pra mim, um aficionado por carros desde criança que colecionava carrinhos, gostava de assistir Super Máquina, Ducks of Hazzard e CHiPs – seriados americanos que passavam na TV nos 80, e estudei engenharia mecânica, já tive dois Opalas, um Ômega, um Dodge Dart, dois XR3.. – Não sei se para pessoas normais seria a mesma sensação – risos).
Se fosse apenas pelos carros que vi, já seria suficiente para meu sábado, mas ainda tinha mais, e mais carros, muitos ainda chegariam ao Festival. Tendas sendo montadas, palco sendo preparado, som testando, encontrei minha amada lá em sua residência dentro do campus.. Nada precisava pra ser melhor.
Na frente do palco, perfeitamente montado no terraço do restaurante do Campus, havia a placa com a programação das bandas. Não conhecia nenhuma, mas fiz questão de ver todas, 1 hora para cada, pela programação o festival terminaria exatamente às 18hs, quando o sol se põe e o frio volta a congelar nosso nariz. Ótimo planejamento.
Lá estava eu pensando em que eu iria almoçar, quando exatamente ao meio dia (12:00 – Noon) a banda Los Bandits manda o primeiro salve do dia (Holla, que passa Pitzer College?)... era o pontapé inicial da música no evento. .. hahá.. sim, a organização realmente organiza, não como vemos por aí. Os shows começam exatamente na hora marcada.
Claro que a banda de rockabilly que se preza ,só podia entrar com um contrabaixão, topete, guitarras vintage e um rockabilly quase punkabilly, rápido e muito dançante. Se fosse um show em ambiente fechado, à noite, com certeza na primeira música o local já entraria em colapso tamanho o caos que tomaria a galera, mas era um sábado ensolarado ao ar livre ambiente familiar e início de festa, mas mesmo assim não perderam o punch.
A primeira banda deveria ser a mais fraca? Esquece. Banda muito boa, com músicos muito competentes, que sabem exatamente como tocar seus instrumentos, precisos, com presença de palco e músicas bem tocadas. Já queria comprar o CD, mas o despreparado escritor aqui levou uma quantidade limitada de Ca$h, e as barracas não aceitavam cartão. Mifú.. enfim, filmei um pouco de cada banda mas a captação do som ficou uma porcalamizeria, então alguns vídeos são emprestados do youtube. Confere aí:
Exatamente 12:50h, a banda encerra, e penso eu: "Todos vão tocar na bateria de setup tão pessoal dos Bandits? (tom 8 e 10") Inclusive como a logo no bumbo?".. kkk.. reles engano de quem não está acostumado com a competência. Todo o set de bateria é trocado e microfonado nos 10 min de intervalo (chora organização de festivais que disponibilizam baterias toscas mal afinadas para todos) e a batera da segunda banda Jonny Come Lately estava pronta às 13hs para iniciar o segundo show.
A segunda banda chega ao palco com um visual modernex, calças coladas, óculos nerds,.. ihhh.. mas com um baixão acústico e um instrumento de sobro aborígene australiano, ok, ganhou meu respeito, vamos ver no que dá. Queria voltar no tempo e filmar esses caras tocando de novo com uma qualidade melhor, mas vocês devem achar pelo youtube, afinal, não basta trazer um instrumento exótico no palco e tocar pra todo mundo ver que você sabe tocar, o lance é tocar um bom rock'n'roll instrumental usando esse instrumento estranho dentro do contexto musical. Comunicativos, competentes, ótimos músicos e criativos, mais um puta show na fria tarde de sábado que começava a esquentar com o sol, o som e com o público cada vez maior.
Mandaram bem o recado, apesar de jovens, muito competentes. Pensei comigo, na minha avaliação, ‘tem muito futuro’, depois soube procurando os vídeos na internet que eles já estiveram no Americans Got Talent (da Sra. Osbourne), em 2009, com apenas 15 anos, mandando muito bem, que em uma conta fácil, chegamos a idade de 18 aninhos atualmente. Foda que estão no país mais competitivo que uma banda poderia estar, mas tem competência.
Apenas 10 minutos e o palco estava pronto para a terceira banda, foi então que percebi que não era apenas a bateria que tinha seu setup todo trocado, mas também as caixas da guitarra e do baixo também, cada banda toca no seu equipamento, confortável, com os timbres e recursos que estão acostumados (chora equipe de festivais que coloca uma caixa de guitarra pra todo mundo e tem q passar o som cada banda nova que entra pra tocar .. kkk)
MoonLight Trio – a terceira banda - foi a banda mais Mexican do Festival. Nem preciso dizer da qualidade dos músicos e dos instrumentos, pois não são adolescentes que ganham uma guitarra e aprendem 3 acordes e já acham que vai montar uma banda fodona, tá ligado? São músicos profissionais, então, pula essa parte da descrição.
Todos os integrantes da formação cantavam (e muito bem) músicas conhecidas que levantavam o público facilmente, ou originais em inglês com timbres e sonoridade latinas. Destaque para a pegajosa "Chicharon" (aparentemente a trash food gordurenta mais apreciada pelos nuestros hermanos), que nem precisa ser conhecida para cantar junto o refrão – "Chi-chi-chi chicharón... Chi-chi-chi chicharón.. " - Cantada em coro pela galera e a fantástica romântico/brega/hispânica "e volvér.. volveeeer.. a tus braços outra vez".. confere aí:
Esta foi a banda que me fez mais querer aprender mais o espanhol pra entrar nessa cultura e curtir e conhecer mais dessa música. Preciso conhecer mais músicas em espanhol. Estranho porque, os países hispânicos também consideram o Brasil como país latino, mas estamos completamente fora do contexto, a começar pela língua. E eles são muito unidos, não importa a nacionalidade, todos são hispânicos acima de tudo. (e tem neguinho no Brasil que não quer nem ser brasileiro, lamentável pra quem pensa assim).
Enquanto isso, aproveito o intervalo para visitar as tendas com produtos de roupas, artesanatos, artigos para equipar carros e bicicletas. Ainda bem que tinha pouco ca$h, senão tinha falido na minha primeira semana. Camisetas HotRods, uma decoração para casa, mais duas peças de roupas femininas para a minha amada. Fecha a conta que acabou a grana (risos). Uns tacos pra matar a fome. Voltamos ao show.
A banda seguinte já havia me chamado a atenção pelo nome desde que saiu a programação, a The Wise Guys Big Band Machine. Esse Big Band no nome me criou enorme expectativa. BigBands eram (ou são) aquelas bandas de jazz com naipes incríveis de metais, com músicos de formação em jazz (a música suprema), que tocam quase como uma orquestra.. muito famosas nos anos 50 e 60 (anos de origem ou expansão do Rockabilly). Também me lembrou a nova banda de Brian Setzer (ex StrayCats) que ele montou após o fim do Cats, que tem estilo orquestra de rockabilly. Bem, essa expectativa estava certa, começaram a chegar as bancadas dos sopros, instrumentos de todo lado.. "isso vai ser muito louco" (pensei comigo).
Meus amigos, nunca tinha visto uma BigBand ao vivo. As 4p.m. (no horário) a Wiseguys abre os trabalhos. É de chorar, me arrepiava a cada entrada dos metais, trompetes, sax de todos tamanhos, pistons, e mais uns que nem devo saber o nome. Tocaram músicas dos anos de vovó criancinha, algumas trilhas sonoras dos discos de Henry Mancini (que escreveu a maioria das músicas temas de filmes e séries dos anos 70 e 80) de quem meu pai tinha um disco (onde será que anda esse disco?).
Se a galera já estava totalmente entregue – no gramado e áreas ao redor já tomados – imagine o que aconteceu quando eles meteram na testa da galera a clássica – Rock This Town (StrayCats) – Com toda a munição musical de 12 sopros, teclado, baixo, percussão, bateria e um grande (e grande) guitarrista. Esse foi o resultado:
Fim de show da Wiseguys Big Band Machine, percebi porque haviam pessoas com a camiseta dessa banda pelo festival, realmente é um lance musical muito acima do que uma simples banda, e cada um tocava seu instrumento com grau de dificuldade de uma criança chupar pirulito (risos). Fantástico. Quero tocar em uma BigBand agora (mais risos). Pobre da ultima atração da tarde, o que fazer depois dessa banda?
Algo estranho acontece antes da última banda ganhar o palco.. as pessoas começam a se chegar e fecha a frente do palco, educada e confortavelmente, é claro. (nenhum ridículo querendo dar soco em alguém pra se dizer o cara doido que é o mais roqueiro de todos porque dá e leva porrada – sacou?). Então estava claro que a ultima atração tinha seu prestígio local.
E então aquela figura que andava pelo evento, uma pinup quase caricata, quase em um visual dragqueen, sobe ao palco. Ela era a Vicky Tafoya. (Dica: nunca subestimem alguém por achar que a aparência da pessoa não traduz o que ela é capaz de fazer).
Vicky Tafoya and the Big Beat abre o último show da tarde, já na quase gelada Pitzer College. Pelo instrumental e pelo estilo dos músicos, já entrou mostrando a que veio e porque era a atração principal do festival. Um JazzBilly (se isso existir) fantástico, misturando tudo de melhor nos estilos, E quando essa mulher manda a primeira frase da primeira música, compreensível porque ela tem tantos fãs. Meu deus? Que voz é essa? De onde vem isso??
Inacreditável a voz (e ao vivo, sem recursos de estúdio) dessa mulher. Nem sei a que devo comparar para vocês leitores terem idéia. Veja o vídeo (o som tá novamente uma fuckin shit, mas dá pra perceber do que estou falando).
Nada mais a declarar. Perfeito encerramento para uma tarde de sábado de rock´n roll, carros, diversão, sol, gente legal, educada, respeitosa, estilosa, de todos os cantos do mundo, em perfeita harmonia e respeito um pelo outro, em um local incrivelmente bonito e agradável, com um sol camarada, que não frita, apenas aquece. Simples assim para ser perfeito. E o festival encerra-se às 18hs, com tempo suficiente para ir até o shopping, comer frango frito e ainda chegar cedo em casa. Ótima fórmula para uma cidade de um clima frio. Fico admirando os carros saindo do campus, cada um mais bonito que o outro, e em movimento, fica ainda mais legal.
E assim o sol se põe ao leste no estado americano da Califórnia, refletindo nas pinturas brilhantes e nos cromos perfeitamente polidos, daqueles que são mais que carros, são obras de arte sobre rodas. E o sol sai de cena, quase já sem forças pra aquecer do frio que volta ao cair da tarde, mas com beleza suficiente pra fechar um dia maravilhoso de paz, musica, arte, respeito e orgulho dos povos pela sua cultura.
E sabe de uma coisa, mudei de idéia, sabe aquele sonho "Ah.. se eu morasse nos Estados Unidos teria um Camaro".. puff.. nem fudendo..
Eu teria um HotRod..
Fico por aqui,
Cesar Matuza - baterista da banda Veludo Branco e colunista do Blog RoraimaRocknRoll.blogspot.com.
Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps