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Waters: Espetáculo visual, sonoro, técnico e filosófico

Resenha - Roger Waters (Praça da Apoteose, Rio de Janeiro, 23/03/2007)

Por Maurício Gomes Angelo
Postado em 27 de março de 2007

Agora são nove e meia da manhã de uma ensolarada terça-feira, dia 27 de março. Passado o frisson inicial, após ondas de choque e regozijo que ecoaram por toda terra brasilis, sento-me para traduzir em palavras a segunda turnê de George Roger Waters pelo nosso país.

A tarefa é espinhosa por um motivo simples: Waters não traz somente uma execução de músicas para uma platéia atenta. Temos, em contrapartida, um espetáculo visual, sonoro, artístico, técnico, político e filosófico sem comparações nos dias atuais. Além disto, o Pink Floyd foi o precursor de mega eventos como este, na época em que Syd Barret começava a brincar com efeitos de luz...

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Quando "In The Flesh" começa a aparecer, impossível não observar que sua letra é sintomática. A multidão, de aproximadamente 40 mil pessoas, ainda está se acomodando na Praça da Apoteose. São apenas as primeiras notas, a introdução para as duas horas e meia que viriam a seguir. Diversas gerações, pessoas de toda parte do Brasil ansiosas por verem ao vivo, talvez pela última vez, um dos maiores ícones da música contemporânea.

Urros de incredulidade e xingamentos de satisfação são expurgados continuamente atrás de mim, como se aquilo simplesmente não estivesse acontecendo. Aos 63 anos, Waters, que exorcizou em "The Wall" todos os conflitos de sua vida e os rumos que sua carreira estava tomando, inclusive no contato com o público – o muro construído entre os dois, entre nós em nossas relações com o mundo e as pessoas – parece definitivamente encontrar a paz para se apresentar em estádios e também com o passado da banda. Trocando os atritos pela ponderação, e com o desprendimento necessário para executar "The Dark Side Of The Moon" na íntegra. Ali, no palco com ele, tocando hammond, estava seu filho: Harry Waters. Ali soavam as primeiras notas da belíssima "Mother". E para muitos dos milhares de presentes, Roger foi o pai que nunca tiveram. Uma espécie de tutor, de mestre – irônico, sarcástico e imperfeito – deixando mensagens e caminhos sutis através das letras que escreve, daquilo que compõe, diz e faz.

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"Set The Controls For The Heart Of The Sun", deliciosamente sombria, explodiu na galáxia que abriu espaço para que "Shine On You Crazy Diamond" fosse saboreada lentamente pelo público, em êxtase através de seu solo fenomenal. "Have A Cigar" e "Wish You Were Here" completaram a tríade do álbum homônimo. A última, aguardada ansiosamente e um dos poucos "hits" da carreira do Floyd foi, assim como várias outras, acompanhada em uníssono por todos, entoando cada frase da letra direcionada ao velho Syd. Um momento ainda mais emocionante e significativo porque ele, de fato, já não está mais entre nós. E se a banda toda não se propôs a homenageá-lo de uma forma mais "oficial", Waters presta um notável tributo à mente perturbada de importância vital na ascendência floydiana.

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"Southampton Dock" e "The Fletcher Memorial Home" iniciaram a parte definitivamente política do show. Ataques frontais a George W. Bush, tratado impiedosamente em diversos momentos, Josef Stálin, Saddam Hussein e Tony Blair eram direcionados no telão, exibindo fotos manchadas de sangue e pequenos excertos da "filosofia" destes.

Já "Perfect Sense" resumiu em seu refrão, com a simplicidade caústica de Waters, a essência da coisa: "Você não vê?/Tudo isto faz um perfeito sentido/Expresso em dolars e cents/Libras, shillings e pence".

No final dela, uma pane no sistema de energia fez com que o show fosse interrompido por uns 15 minutos. Na volta, Waters brinca: "vocês cantaram tão alto que o equipamento não suportou".

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"Leaving Beirut", composição mais recente de sua carreira, veio em tom quase didático, com uma história em quadrinhos no telão explicando sua letra - longa, profunda e direta. Mais uma vez não só "os motivos" de Bush e Blair para propagar guerras foi questionado, mas a própria capacidade destes. Dois trechos que arrancaram urros do presentes: "Oh George, a educação do Texas ferrou com você quando era criança" e "América, América, você tem liberdade de expressão, belas praias e regiões, não deixe o poder e a direita cristã foder com você e o resto do mundo". "Leaving..." é uma narrativa política baseada, também, numa experiência real de Waters que ele conseguiu musicar com grande competência.

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Eis que veio "Sheep". Alguns poderiam querer "Dogs" ou "Pigs (Three Different Ones)". Mas as três peças principais de "Animals" têm vida própria e cada uma de valor imensurável. Foi outro ápice. Imensas labaredas de fogo nas laterais do palco e até atrás da banda, além do tão esperado surgimento do imenso porco inflável, figura clássica do álbum citado, recheado de mensagens anti-belicistas, críticas e revoltosas enviadas por fãs de toda parte do globo. Executada com maestria, "Sheep" demonstrou o quanto a banda formada por Andy Fairweather Low, Snowy White e Dave Kilminster na guitarra, Graham Broad na bateria, Jon Carin nos teclados, Harry Waters no hammond, Ian Ritchie no saxofone e Katie Kissoon, PP Arnold e Carol Kenyon nos backing vocals estava afiada. Imprimindo o punch necessário em seus momentos mais intensos e a habilidade exigida em seus detalhes.

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15 minutos de intervalo e era hora da segunda parte do concerto. "The Dark Side Of The Moon" apresentado na íntegra, fielmente de acordo com sua concepção original. Creio ser desnecessário relatar os números astronômicos da obra, os inúmeros recordes que quebrou. Sobretudo, é seu conteúdo que importa. Todo o impacto que trouxe para a música atual. A importância de sua simbologia, seu conceito, seu legado. De cada segundo presente naquela bolacha que fez com que nada mais fosse como antes. Para o extasiado público, foram 10 composições. 10 orgasmos. Seguidos. Provavelmente o gozo coletivo mais prolongado da história. Arrisco dizer que, de todos os álbuns do Floyd, ele é o mais perfeito. Não necessariamente o melhor. Mas nenhum outro é tão harmonioso, tão fluído. Nenhum outro é tão absolutamente sublime em cada detalhe que o compõe. A arte enigmática de Storm Thorgerson, sem poluição, apenas o prisma, de desenvolvimento e simbologia imortal. O nome. Seis palavras dotadas de fantástico poder de síntese: "the dark side of the moon". O coração pulsando no início de "Speak To Me" e o mesmo coração ao final de "Eclipse". O conceito, indestrutível e atemporal, pois sempre teremos que lidar com ele. Cada efeito, intervenção, diálogo. A produção inovadora de Alan Parsons. A banda, como conjunto, em seu momento mais inspirado. As letras cortantes de Waters.

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"Dark side..." é perfeito. Ao vivo, a experiência se torna ainda mais sensorial. E a obra está tão impregnada nas células de cada presente ali, suas letras já foram tão decifradas e absorvidas por todos, que o gozo, múltiplo, de intensidade variada, é conduzido impecavelmente por Waters. "Breathe", "Time", "Money", "Us And Them", "Brain Damage"...o espetáculo de apreciação em "The Great Gig In The Sky" – que outra banda faz uma música dessas?. O domínio e a intimidade do público é tamanho que a sensação que se tem é que não estamos acompanhando a execução do álbum, nós somos ele!

"The Dark Side Of The Moon" é cada um de nós em nossas relações tumultuosas e conflitivas com o dinheiro, o tempo, o sexo, o isolamento, a loucura, a sociedade, o próximo, a guerra, os paradoxos, limitações e dúvidas. Com a vida, em especial.

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Difícil dizer qual momento mais intenso. Nestes 45 minutos, o público toma o show para si. Agora, ele faz o espetáculo. E, apoiados pela estrutura e surpresinhas aprontadas por Mark Fisher, o mesmo arquiteto da turnê de "The Wall", tudo fica melhor. O som quadrifônico, de 360 graus, torna a experiência auditiva única, o telão exibe pequenos curtas metragens de apelo palpável, sempre rico, e os inteligentes efeitos de luzes coroam as viagens floydianas.

Waters deixou Dave Kilminster responsável por cantar "Money" e Jon Carin por "Us And Them". Nas outras, quando não apenas acompanhava o público, seu entusiasmo e satisfação eram notáveis. "Eclipse" e sua "letra-resumo" de toda a obra, foi, naturalmente, o encerramento perfeito.

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Após pequena pausa, deixando o público voltar a si, a banda retorna para o bis. "The Happiest Days Of Our Lives/Another Brick In The Wall Pt. II", dobradinha emblemática, levantou o maior coro da noite e teve também a presença – simbólica – do coral infantil da Universidade Federal do Rio de Janeiro, despedido com doçura por Waters, dando um beijo em cada componente. A angustiante "Vera" veio em seguida, com a arrepiante interpretação de Roger. A platéia, sem dúvida, presenciaria satisfeita mais duas horas de show, mas "Comfortably Numb" encerrou a noite. Uma das composições mais fortes do Floyd teve os solos divididos por Kilminster e White, ficando, óbvio, aquém de David Gilmour. Nada que a deixasse menos sublime do que sempre foi. Luzes apagadas, um standard do jazz embalava o público, ainda incrédulo, recusando-se a sair dali, de volta pra casa.

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Em "Leaving Beirut" Waters pergunta: "how does the story ends?". No final, somos apenas homens comuns. Seres limitados e imperfeitos. Por vezes vis, outras admiráveis. Contraditórios. Bons ou cruéis. Finitos. Ele tem plena consciência disso. Em verdade, a história não acaba nunca. É viva, multiforme, com infinda capacidade de adaptação e transformação. Sofre nossa influência, mas não temos controle sobre ela. Ali, ao final de quase três horas de concerto, ao copular com um artista que reflete profundamente sobre o interior do homem mas ao mesmo tempo traz espetáculos grandiosos e imponentes, que podem criar um distanciamento perigoso entre o ele e o público, como já admitiu, Waters parece encontrar o equilíbrio das coisas, a razão áurea da existência.

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Após o eclipse, estamos prontos para enfrentar todo o resto. Para nos apropriarmos do conteúdo artístico e levar, cada um de acordo com sua própria vivencia e interpretação, o que sobrou de nós. Waters nos dá as ferramentas para a (des-) construção. Para tentar enxergar a magnitude da vida em sua infinda pequenez. E nós tentamos acompanhar, gratos e enriquecidos, nos labirintos das idiossincrasias, aquilo que nos identifica, nos torna, de modo estranho porém nítido, tão próximos um dos outros. Entre ser eclipsado ou não, cabe a você escolher.

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Sobre Maurício Gomes Angelo

Jornalista. Escreve sobre cultura pop (e não pop), política, economia, literatura e artigos em várias áreas desde 2003. Fundador da Revista Movin' Up (www.revistamovinup.com) e da revrbr (www.revrbr.com), agência de comunicação digital. Começou a escrever para o Whiplash! em 2004 e passou também pela revista Roadie Crew.
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