O salmo bíblico que o Pink Floyd adaptou em uma de suas canções mais contundentes
Por Bruce William
Postado em 06 de setembro de 2025
Em busca de inspiração para suas letras, o Pink Floyd recorreu aos lugares mais improváveis que se possa imaginar. Em "Animals" (1977), o álbum em que Roger Waters dividiu a sociedade em "cães", "porcos" e "ovelhas", e que teve inspiração direta no livro "Animal Farm" de George Orwell (lançado no Brasil como "A Revolução dos Bichos"), surgiu uma das passagens mais ousadas da discografia da banda: a reinterpretação de um trecho bíblico dentro da canção "Sheep".


Na época, Waters já havia assumido a liderança criativa do grupo e buscava composições carregadas de crítica social. Em entrevistas posteriores, ele contou que o clima político da Inglaterra dos anos 1970 - com protestos e revoltas em bairros de Londres - ajudou a dar forma ao espírito revolucionário da música.
A letra de "Sheep" fala de um povo conduzido sem questionar, até o momento em que tenta romper esse ciclo. A metáfora lembra o que Zé Ramalho faria no Brasil algum tempo depois em "Admirável Gado Novo", canção que também retrata uma massa que segue resignada, sem perceber o peso da opressão que a cerca, cujo refrão "êh, ôô, vida de gado", se tornou marca registrada.

Para reforçar esse retrato, Waters recorreu ao Salmo 23, um dos mais conhecidos da Bíblia, que começa com a frase "O Senhor é o meu pastor; nada me faltará". No entanto, o que se ouve na faixa não é a versão tradicional, ressalta a Far Out. Em determinado momento, uma voz quase robótica recita uma paródia do salmo, transformando a imagem da proteção divina em algo irônico e sombrio: "The Lord is my shepherd, he converteth me to lamb cutlets..." ("O Senhor é o meu Pastor, ele me converte em costeletas de cordeiro...").
A intenção não era atacar a fé, mas sim usar um símbolo conhecido para transmitir a ideia de manipulação em massa, com pessoas levadas ao "abate" sem perceberem. Waters explicou em 1978 que a canção refletia sua percepção sobre a violência e as tensões sociais que se intensificavam na época.

E ainda hoje, "Sheep" é lembrada como uma das faixas mais pesadas e diretas do Pink Floyd, tanto musicalmente quanto em seu conteúdo. Ao adaptar um texto bíblico para a narrativa do disco, Waters reforçou a dimensão alegórica de "Animals" e mostrou até onde estava disposto a ir para transmitir sua visão de mundo.
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