Ian Anderson: ele ainda tem muita lenha para queimar
Resenha - Thick As a Brick 2 - Ian Anderson
Por Roberto Rillo Bíscaro
Postado em 07 de janeiro de 2019
Nota: 8
1972: uma banda de folk progressivo lançou ambicioso álbum conceitual com apenas uma faixa. Na era em que mudava o vinil de lado, o grupo resolveu a questão colocando som de vento no final do A e no começo do B, para fingir que era fim e começo de música. Fracasso comercial? Pelo contrário, Thick as a Brick, dos escoceses do Jethro Tull, não apenas se tornou pedra lapidar do prog rock, como alcançou o topo da resistente parada norte-americana.
Os 44 bombásticos minutos da canção-álbum são recheados de instrumentos e variações de ritmo e andamento. Ian Anderson gaba-se de que o projeto é paródia aos meagalomaníacos álbuns conceituais de bandas prog, como o Yes. Só que em 72, o grupo de Jon Anderson ainda não lançara álbum conceitual. Pode até ser paródia, mas a menção ao Yes – se não for invenção da imprensa – é farpa de diva.
Ian Anderson criou uma personagem, o garoto-prodígio Gerald Bostock, que, aos 8 anos, ganhou concurso literário com intrincado poema épico, para, em seguida, ser desclassificado devido a supostos problemas mentais. A letra de Thick as a Brick seria o poema desse "pequeno Milton" (alusão a John Milton, de Paradise Lost), adaptado pela banda. Para completar o pacote, a capa do álbum era réplica de jornal de interior, contando a história do garoto, do uso de seu poema pela banda etc. Tudo com fotos e anúncios.
Monumental, Thick as a Brick, traz Ian Anderson caprichando nas letras e incendiando na guitarra e na flauta, tocada ao vivo com o músico apoiado numa única perna. Com sua barba e cabelo fartos, parecia o Tom Bombadil, de Tolkien.
2012: sem cabelo ou barba, Anderson continuou o álbum. Também sem o Jethro Tull, pois o maior criador de salmão da Escócia decidiu que Thick as a Brick 2 – Whatever Happened to Gerald Bostock fosse lançado como trabalho solo. Na era de estrelas pop de nomes como Ke$ha e will.i.am, o álbum ficou conhecido como TAAB 2. Puristas não devem se assustar: esse é o único laivo de contemporaneidade admitido pelo bardo prog.
Anderson se perguntou o que teria acontecido ao agora cinquentenário Gerald Bostock e bolou possibilidades, exploradas ao longo das 17 faixas de TAAB 2. A multiplicidade temática determinou a picotagem da forma, afinal agora é o narrador falando de diferentes Geralds e não mais o poema do menino.
Gerald pode ter se tornado banqueiro ganancioso, homossexual sem teto, combatente na guerra do Afeganistão, pastor evangélico dinheirista ou dono de pequena loja. Mais para o final, essas identidades se (con)fundem, para revelar seu denominador comum: a solidão.
Na metade de sua sexagenaridade, Anderson cria futuro desiludido para o pobre Gerald. Musicalmente, o roqueiro também está bem menos bombástico, embora TAAB 2 não descambe para a sacarinose. Pelo contrário, há ótimos momentos de duelo entre flauta e guitarra, só que agora, o tom é mais soft rock. As referências de música folk inglesa e música erudita também continuam lá.
TAAB 2 começa onde Thick as a Brick terminara em termos de melodia. É realmente como se ouvíssemos a continuação da obra. E acaba com os mesmos versos do início do primeiro, com o acréscimo de discreto "two".
Para completar o pacote, novo jornal fictício de província foi criado, inclusive com a notícia de que "velha estrela do rock" abriria show no ginásio da pequena cidade.
TAAB 2 provavelmente não angariou muitos novos fãs para Ian Anderson e até desagradou alguns velhos admiradores que esperavam álbum tão exuberante como o de 72. Muito pouco realista querer que alguém permaneça igual depois de 40 anos.
Longe de ser básico como o álbum do apogeu do Jethro, TAAB 2 demonstra que Ian Anderson ainda tem muita lenha para queimar.
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