Roger Waters: "Is This The Life..." é seu Inferno de Dante
Resenha - Is This the Life We Really Want - Roger Waters
Por André Floyd
Postado em 13 de junho de 2017
Em vinte e cinco anos Roger Waters viveu artisticamente de seu vasto legado deixado no Pink Floyd, com shows-releituras de "The Dark Side of The Moon" e "The Wall" e em seus álbuns solo, sobretudo "Pros And Cons of Hitchhiking" (1984) e "Amused to Death" (1992) e nem tanto ou praticamente nada "Radio K.A.O.S." (1987), chegando até mesmo a lançar um surpreendente álbum duplo de ópera, "Ça Ira" (2005), baseado na Revolução Francesa e encenado pelo mundo.
Ao longo de seus 73 anos de idade e chegando em setembro próximo nos 74, Waters combate de forma supra-ácida o "establishment" desde os seus trinta´, começando ao assumir a confecção integral das letras de "The Dark Side of The Moon" e cristalizando todo o seu inconformismo a partir de 1977 com o político-punk-progressivo "The Animals", um disco de sonoridade dentro do rock progressivo mas muito bem encaixado dentro do que o crescente movimento punk bretão vomitava à época: porrada no Sistema, aqui largamente inspirado pelo best seller "The Farm", de George Orwell.
O tempo passou, Roger envelheceu e pelo visto e ouvido, o próprio parece achar que o mundo piorou e bastante.
É essa a ideia constantemente transmitida em seu novo e excelente álbum "Is This The Life We Really Want", que deveria vir com uma irônica dedicatória autografada para o presidente norte-americano atual Donald Trump e com singela homenagem ao russo Vladimir Putin.
A capa traz o título como se fosse o único fragmento que passou de um texto censurado.
"Para vocês que entram, podem perder as esperanças", já dizia a tabuleta da porta do Inferno de Dante Alighieri em se clássico livro "A Divina Coméda".
Em "Is This The Life We Really Want" Waters nos parece informar que para nós que estamos nesse mundo não há muitas esperanças ou o velho "a esperança é a última que morre, mas morre".
O disco tem uma produção primorosa, que ficou a cargo de Nigel Godrich, o "George Martin" do Radiohead.
Diferenciado, desta vez o álbum solo de Roger Waters despreocupou-se de trazer um grande guitarrista solista, como foi o caso de Eric Clapton em "Pros And Cons" e "Jeff Beck em "Amused to Death", talvez por manter algum traço competitivo com o então Pink Floyd de David Gilmour, para investir num trabalho de um todo instrumental elaborado, repleto de efeitos sonoros, formando-se uma atmosfera perfeita para a poesia paranóico-magoada de Waters, que discorre "trocentos" palavrões nas canções, "homenageia solenemente" Trump e se coloca enquanto ser indiginado, onipresente e solidário quanto aos refugiados pelo mundo que irrompem fronteiras em busca de vida ao invés de sobrevida.
Por sinal, a atmosfera sonora deste álbum traz muitos ares de Richard Wright (não propositalmente, claro). As bases de teclados climatizadoras nos remete a trabalhos de Wright tais como realizados em Meddle, More (Main Theme), "Dark Side" e principalmente no álbum "Broken China"(1996), o último solo de Richard Wright.
A quarta faixa "Picture That" por exemplo pode ser considerada a nova "Sheep", de "Animals", a terceira, "Déja vu", talvez uma nova "Two Suns in the Sunset", de "The Final Cut" e "Broken Bones", uma nova "Run Like Hell", de "The Wall", aqui não pelo ritmo e andamento, mas pela temática.
Enfim, "Is This The Life We Really Want" é uma ode à desesperança diante de um mundo cada vez mais dividido pelos muros tão vastamente tratados por Waters desde a icônica ópera-rock, ainda que tais muros sejam cada vez mais mentais pela alienação humana do que propriamente físicos.
Apesar disso, Roger nos sopra um pequeno alento a la "A Insustentável Leveza do Ser" na canção Smell The Roses", onde nos convida parar para cheiras as rosas, apesar de tanta merda acontecendo ao nosso redor. Canção com essência que nos remete aos tempos de "Have a Cigar", do aclamado "Wish You Were Here".
Se há algo de bom a se tirar do caos, Roger Waters segue especialista em tal proeza e nos suaviza com o prazer da turnê mundial "Us + Them", já em andamento.
OUÇA AQUI:
https://open.spotify.com/album/2XhQwji1ixgjca0XzkiTek
Tracklist:
1. When We Were Young
2. Déjà Vu
3. The Last Refugee
4. Picture That
5. Broken Bones
6. Is This the Life We Really Want?
7. Bird In A Gale
8. The Most Beautiful Girl
9. Smell the Roses
10. Wait for Her
11. Oceans Apart
12. Part of Me Died
A banda:
Roger Waters – vocais, violão, baixo
Nigel Godrich – produção musical, teclados, guitarras, efeitos sonoros, arranjos
Gus Seyffert – guitarras, teclados, baixo
Jonathan Wilson – guitarras, teclados
Roger Joseph Manning, Jr. – teclados
Lee Pardini – teclados
Joey Waronker – bateria
Jessica Wolfe – backing vocal
Holly Laessig – backing vocal
Comente: O que você achou do novo álbum de Roger Waters?
Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps