Duffy: Um grito perdido do hard rock setentista
Resenha - Just in Case You're Interested - Duffy
Por Giancarlo D'Anello
Fonte: Medium
Postado em 29 de junho de 2016
No baú do rock encontram-se muitos fundos. Nos lapsos obscuros da história do gênero, muitas bandas transitam entre o semiesquecimento e o resgate seletivo em antologias, documentários e reimpressões, que ajudam a manter a memória de um empreendimento musical entre aqueles que cultuam as pedras rolantes não só como estilo musical, mas também como um estilo de se relacionar com o próprio tempo.
A banda Duffy foi formada em Londres, no início dos anos 70, por 5 caras com pouco mais de 20 anos de idade à época: Stuart Reffold, vocalista, Barry Coote, guitarrista, Joe Nanson, tecladista, Patrick Sarjeant, baixista e Will Wright, baterista, amigos que se conheceram nos circuitos universitários de Cambridge e Londres.
Nos ensaios, a musicalidade que foi se desenvolvendo possuía claras influências da sonoridade dos primórdios do Deep Purple, Uriah Heep, Humble Pie e Jethro Tull, o tipo de som que estava em voga entre os jovens britânicos do início da década e que podia agradar a vários tipos de gostos rockeiros da época. Não possuía a marca pesada da cena de Birmingham, que já ia delineando o heavy metal primitivo, nem tão progressiva como a cena londrina, que começava a ver o estopim de Pink Floyd e Yes. Era um som de convergência.
Passaram a tocar com frequência nos circuitos universitários, pubs e clubes noturnos de todo o eixo centro-norte da Inglaterra, como o Marquee, Fishmongers Arms e Eel Pie Island, em Londres, The Star Hotel, em Croydon, The Mothers, em Birmighan, entre outros.
Depois que adquiriram algum nome nas cenas locais, passaram a ser convidados para participar de festivais de rock maiores, chegando a abrir para o Deep Purple no Pop Monster em 1971, até que conheceram, durante algum desses shows, o produtor suíço Stephen Sulke, que já havia trabalhado com Santana, Melanie, Aretha Franklin e Buddy Miles.
Sulke se interessou pelas músicas da banda e os convidou para gravar o debut do quinteto na Suíça, onde possuía contatos com estúdios, engenheiros de som e gente ligada à indústria musical que poderia se interessar pelo trabalho do grupo. O resultado foi o disco Just in Case You’re Interested, prensado originalmente pela gravadora alemã Mabel Records em 1971 e lançado no Brasil pela gravadora paulista Central Park Records em 1974.
O lado A começa com "Matchbox", um típico hard rock setentista, com um teclado marcante claramente inspirado no trabalho de Jon Lord e solos de guitarra que se intercalam em sequências melódicas calmas e pesadas.
A próxima música, "Long Lost Friend", é uma balada ritmada com dedilhado no violão que segue num crescente harmônico e vai finalizando com um coro bem presente de backin’ vocals e solo de guitarra de Coote ao mesmo tempo. Uma música delicada e forte, que possui a típica sonoridade do electric folk que marcou artistas como Donovan.
"Judgment Day" inicia com um riff de guitarra pesado e ritmado junto com um órgão bem presente que atinge seu ápice a partir do 1:20, quando a bateria e as cordas entram numa simbiose inesperada e marcante, mudando de ares novamente pouco depois do meio da música até o final, quando o clima se desenvolve para o progressivo. Talvez uma das faixas mais interessantes do álbum.
"Amie" também é uma balada swingada baseada no dedilhado do violão que se alterna entre momentos mais calmos e mais agitados, em que os backin’ vocals crescem e dão força melódica a todo o conjunto. Uma característica da banda presente em todo o álbum.
"It’s My Life" é uma vertida de estrutura mais pop da banda. Uma música com um refrão inteligente que agrada logo de cara e que complementa organicamente o início da canção, mais calmo e indefinido.
O lado B abre com o single do disco. "Rock Solid" segue a linha clássica do hard rock setentista: é calcado no riff de guitarra inicial que muda de sequência harmônica para afluir no refrão, que antecede o solo de guitarra, para então voltar ciclicamente à sua fase inicial. Esta música obteve algum êxito comercial, e chegou a fazer parte de coletâneas de artistas diversos nos anos 70.
A próxima música com certeza é o ponto mais alto do disco. A releitura de "Don’t let me be Misunderstood", canção que ficou famosa na voz de Nina Simone, é genial, e mostra Duffy em seu momento mais brilhante do disco. A releitura inicia-se com um clima totalmente progressivo, com o órgão e baixo pautando e desenvolvendo gradualmente a estrutura da música, até que entram a guitarra de Cooter e a voz de Stuart Reffold. A releitura intercala rítmicas e surpreende pela execução, não alcançando nenhum resultado óbvio, pelo contrário. Extremamente recomendável.
"Tell Me" é a segunda música de trabalho do disco, que serviu de lado B para o single de Rock Solid. Segue com características típicas da sonoridade do disco, entre as quais as intercalações de sequências harmônicas, a excelente elaboração de backing vocals e os belos dedilhados, misturando o folk e o progressivo.
A próxima música é "Riverside", um hard rock mais swingado, com o uso do wah-wah na execução do riff e com solos de guitarra contínuos, perpassando por todo o tempo. Canção bem interessante e que se destaca no conjunto da obra.
Por fim temos "Place to Die", a canção que fecha o disco. Belíssima, inicia com o dedilhado mais melódico de todas as músicas da banda e mantém o prog-folk acústico durante todo o tempo, sem o uso de guitarras. Destaque também para a letra, uma das mais trabalhadas. Place to Die encerra o disco de forma bela, soturna e sublime.
Apesar de tudo, Just In Case You’re Interested não alcançou êxito nos circuitos comerciais, sendo condenado quase ao esquecimento. Foi lançado apenas na Alemanha (Mabel Records), França (Soul Records) e Brasil (Central Park Records), não tendo recebido nenhuma prensagem no Reino Unido. Alguns anos depois, a banda mudou de nome para Scruffy Duffy e lançou outro ótimo álbum em 1974, mas que também não vingou, fazendo com que a banda encerrasse suas atividades logo em seguida.
Recentemente o álbum foi relançado pela Central Park Records em formato digital e citado pelo professor e pesquisador musical brasileiro Wagner Xavier, em sua enciclopédia musical "Rock Raro vol. II", como um dos melhores discos do rock obscuro da década de 70. Vale a pena conferir, apenas no caso de você se interessar.
Tracklist:
A1 Matchmaker
A2 Long Lost Friend
A3 Judgement Day
A4 Amie
A5 It's My Life
B1 Rock Solid
B2 Don't Let Me Be Misunderstood
B3 Tell Me
B4 Riverside
B5 Place To Lie
Link para o disco no Spotify
https://play.spotify.com/album/2yNox6K7R8HOo64pq5LGhL
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