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Resenha - Blackstar - David Bowie

Por Ricardo Pagliaro Thomaz
Postado em 20 de fevereiro de 2016

Nota: 10 starstarstarstarstarstarstarstarstarstar

Este novo álbum de David Bowie já sai, e é ouvido pelos fãs, em tom solene. Dois dias após lançar o disco, o artista morre. Sim, artista. É um desserviço se referir à Bowie apenas como cantor ou músico. O cara era um artista completo. Cantor, músico, multi-instrumentista, ator, pintor, produtor, e por aí vai. Possuía também noções sólidas de estética, e acabou fazendo moda nos anos 70 e 80, moda essa que a gente segue até hoje. Enfim, este último álbum do artista, é mais uma prova de sua louca genialidade que vai deixar muita saudade.

Portanto, esta resenha, a primeira minha onde eu falo de Bowie, já é para fechar este ciclo com o artista, muito embora há rumores de que antes de morrer, ele tenha deixado diversas músicas prontas para serem lançadas, então talvez possamos esperar bastante coisas póstumas saindo dele por aí a partir de agora, mas claro, já com aquele sabor agridoce de perda, e sem o controle dele de qualidade e sua grande visão.

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"Blackstar", a primeira faixa do disco, é uma faixa totalmente experimental, onde Bowie mistura a sua música pop com temas de art rock, jazz, e até mesmo cantos gregorianos, que faz a gente se sentir em meio a uma seita, ou algo do tipo. É um experimento longo, de quase 10 minutos, totalmente amalucado, e se a gente ver o vídeo que o artista gravou, a coisa parece fazer menos sentido ainda! Mas analisando com mais cuidado, percebe-se aquela proposta que se vê Bowie explicando, que ele captura aquela ideia dele de homem do espaço, em uma roupa espacial, que na verdade tem um esqueleto, e aquela criatura lida com sua própria condição mortal, muito talvez por causa do câncer que ele estava enfrentando. O pano que usa no rosto, tapando a realidade, é um ensejo do homem cego que segue algo, e há momentos que Bowie até mesmo aparece como senhor da "seita". É um lance que parece bastante maluco, mas tem todo esse sentido por trás, próprio de uma mente geniosa mesmo. Este é para mim o maior destaque do disco, até mesmo pelo absurdo caráter experimental.

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Mas como ground control sempre chama por Major Tom, Major Tom também estabelece comunicação com ground control e temos a segunda faixa, "'Tis a Pity She Was a Whore", uma elucubração doida de Bowie sobre uma prostituta, com passagens de saxofone do jazzista Donny McCaslin, e que faz referência a uma peça de um dramaturgo chamado John Ford, e não, não é o diretor de faroestes do século passado, mas sim um cara do século XVII. Fica aqui novamente o questionamento se Bowie não era mesmo um alien que vivia entre nós, para trazer tal referência!

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Após a faixa de abertura, a terceira faixa, "Lazarus" foi, provavelmente, a segunda que eu mais gostei de todo o disco. Fantástica em todos os sentidos, com tons de jazz contemporâneo e uma performance apaixonante, a música, assim como define o produtor Tony Visconti, trata de um epitáfio do artista sobre a sua própria morte. Bowie sabia já que não havia escapatória de sua própria situação e assim deixou seu comentário em relação a isso, mostrando o homem debilitado na cama, com medo do porvir. Destaque no clip para a menina debaixo da cama, que eu entendo como a morte lhe transportando para uma situação diferente de existência, a mensagem que ele escreve como se fosse suas palavras finais, e o final quando ele entra no armário e abraça a escuridão.

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"Sue (or In A Season Of Crime)" é um acid jazz com letra de traição que apareceu primeiro em uma compilação do artista e sofreu regravações aqui. É uma viagem musical realmente, através do som de metais e saxofone da orquestra de Maria Schneider. Foi lançada primeiramente em 2014 e ganhou um lyric video. A versão do clip está só um pouco diferente em relação à de Blackstar, que reduz a participação dos metais e valoriza os sintetizadores e o baixo, mas vale a pena checar o clipe, que parece um filme noir, todo com estética em preto e branco e rodado em um metrô.

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A quinta faixa, "Girls Love Me", me remeteu diretamente ao estilo musical de Peter Gabriel, ex-Genesis. Toda experimental, ela é mais um art-pop, que inclusive conta com a linguagem complicada dos drugues do livro de Anthony Burgess, A Clockwork Orange. Com sonoridade sombria e misteriosa, Bowie faz um jogo de palavras nessa faixa que realmente é algo que merece várias escutadas para se compreender.

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Fechando o álbum, temos "Dollar Days" e suas melodias jazzísticas, contando mais uma vez com trabalho do saxofonista Donny McCaslin, e as letras cheias de sentido hoje, que Bowie escreveu, quando canta "I'm dying too, I'm trying to", e, se despedindo de nós com o seu canto do cisne, Bowie, de maneira doce e misteriosa nos dá o aceno final com sua confissão em "I Can't Give Everything Away"; digo confissão, porque ele decide, até seus momentos finais, manter sua aura de mistério que permeou toda sua carreira, um enigma que talvez jamais será desvendado, nem nessa vida e nem na próxima.

Dessa forma, com um trabalho final genial e que fecha sua carreira prolífica de forma fabulosa, Ziggy Stardust entra em sua espaçonave e finalmente nos deixa. Eu confesso que não conheço toda sua discografia, como eu falei já uma vez, nunca fui um fã afoito do cara, mas gostava de muita coisa que ele fazia. E entre todas estas memórias que tenho do artista, posso assegurar que Blackstar será uma que vou querer manter também, para o resto dos meus dias, até que todos nós também nos transformemos em pássaros azuis e nos libertemos das amarras desta existência. Um álbum final formidável, e que sem dúvida, entrará para a galeria de Bowie como um de seus mais brilhantes trabalhos.

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Até logo, Ziggy Stardust! Um dia, se Deus quiser, todos nós te veremos novamente do outro lado.

Blackstar (2016)
(David Bowie)

Tracklist:
01. Blackstar
02. Tis a Pity She Was a Whore
03. Lazarus
04. Sue (Or in a Season of Crime)
05. Girl Loves Me
06. Dollar Days
07. I Can't Give Everything Away

Selos: ISO / RCA / Columbia / Sony

Banda:
David Bowie: voz, violão, guitarra Fender, gaita, arranjos de cordas
Donny McCaslin: flauta, saxofone, madeiras
Ben Monder: guitarra
Jason Lindner: piano, órgão, teclados
Tim Lefebvre: baixo
Mark Guiliana: bateria, percussão

Discografia anterior:
- The Next Day (2013)
- Reality (2003)
- Heathen (2002)
- 'Hours...' (1999)
- Earthling (1997)
- Outside (1995)
- The Buddha of Suburbia (1993)
- Black Tie White Noise (1993)
- Never Let Me Down (1987)
- Tonight (1984)
- Let's Dance (1983)
- Scary Monsters (And Super Creeps) (1980)
- Lodger (1979)
- "Heroes" (1977)
- Low (1977)
- Station to Station (1976)
- Young Americans (1975)
- Diamond Dogs (1974)
- Pin Ups (1973)
- Aladdin Sane (1973)
- The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972)
- Hunky Dory (1971)
- The Man Who Sold the World (1970)
- David Bowie (ou Space Oddity) (1969)
- David Bowie (1967)

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Site oficial:
http://www.davidbowie.com

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http://www.acienciadaopiniao.blogspot.com.br

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Sobre Ricardo Pagliaro Thomaz

Roqueiro e apreciador da boa música desde os 9 anos de idade, quando mamãe me dizia para "parar de miar que nem gato" quando tentava cantarolar "Sweet Child O'Mine" ou "Paradise City". Primeiro disco de rock que ganhei: RPM - Rádio Pirata ao Vivo, e por mais que isso possa soar galhofa hoje em dia, escolhi o disco justamente por causa da caveira da capa e sim, hoje me envergonho disso! Sou também grande apreciador do hardão dos anos 70 e de rock progressivo, com algumas incursões na música pop de qualidade. Também aprecio o bom metal, embora minhas raízes roqueiras sejam mais calcadas no blues. Considero Freddie Mercury o cantor supremo que habita o cosmos do universo e não acredito que há a mínima possibilidade de alguém superá-lo um dia, pelo menos até o dia em que o Planeta Terra derreter e virar uma massa cinzenta sem vida.
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