Nazareth: os heróis de Dunfermline
Por Ricardo G. dos Santos
Postado em 10 de novembro de 2008
A Escócia tem uma população de cerca de 5,1 milhões de habitantes e uma superfície de 78.772 km², que equivale a aproximadamente 30% do território total do Reino Unido. Antigamente chamada de Caledônia pelos Romanos, possui, desde os tempos mais remotos, uma história rica em acontecimentos importantes, dentre eles inúmeros mistérios e lendas, envolvendo batalhas e antigos castelos. E é também, inegavelmente, o cenário de algumas das mais marcantes paisagens do mundo.
Foto da chamada: Makila Crowley
Mas – acredite – a Escócia é ainda muito mais do que isso!
Este belo País é dividido em várias regiões, sendo que uma delas é a região de Fife. Dentro de Fife, há o Distrito de Dunfermline, do qual a cidade de Dunfermline é o centro administrativo. A origem do nome "Dunfermline" vem do gaélico escocês "Dùn Fearam Linn", que significa, em tradução livre, "Castelo na curva do rio".
Atualmente, as maiores cidades da Escócia são Edimburgo, Dundee, Glasgow, Aberdeen, Stirling e Inverness. Edimburgo é a Capital.
Mas nem sempre foi assim. Se, hoje em dia, Dunfermline não pode ser considerada uma das maiores cidades escocesas (sua população atual é de cerca de 50.000 habitantes), o mesmo não se pode dizer quanto a tempos mais remotos, quando foi uma das regiões mais prósperas daquele país, tendo sido, inclusive, Capital da Escócia durante a Idade Média.
Dunfermline, aliás, abriga alguns dos locais históricos mais importantes da Escócia. Em um deles - a Abadia de Dunfermline - jazem os corpos de muitos monarcas escoceses. O mais famoso deles é, provavelmente, o Rei Roberto I (em inglês moderno, "Robert The Bruce" e, em gaélico escocês, "Roibert a Briuis").
De acordo com artigo publicado na Wikipedia, "Roberto Bruce foi um dos maiores reis da Escócia e um dos mais famosos guerreiros de sua geração". Coroado em 1306, "Comandou os escoceses durante as Guerras de Independência Escocesa contra a Inglaterra", tendo derrotado, em 1314, na Batalha de Bannockburn, o exército inglês de Eduardo II. Ainda segundo o mesmo artigo, "No final de sua vida, vê-se que Bruce conseguira aquilo pelo qual lutara. A Escócia, de novo um reino independente, o relembrará sempre como o Bom Rei Roberto e seu triunfo em Bannockburn é o legado que une os escoceses em qualquer lugar onde se achem. A Escócia nunca mais foi conquistada. O legado final de Bruce foi confirmar a Escócia como nação separada e distinta, não apenas um reino mas uma comunidade, um povo, no fim de tudo uma nação".
De fato, em 1328, a Inglaterra finalmente aceitou, por intermédio do Tratado de Northampton, a independência da Escócia. Embora o Parlamento escocês tenha admitido, em 1707, a anexação da Escócia ao Reino Unido da Grã-Bretanha, os escoceses tiveram reconhecido o direito de manter sua liberdade e autonomia como Nação, "possuindo seu próprio sistema jurídico, político e religioso".
Com relação especificamente à Dunfermline, esta cidade tão importante para a história escocesa possui, além de importantes monumentos históricos, como a citada Abadia de Dunfermline, também muitos outros belos locais para serem apreciados.
E foi nesta cidade que nasceram algumas das pessoas que mais orgulho trazem para o povo escocês.
O filho mais famoso de Dunfermline é, na opinião de muitos, o filantropista Andrew Carnegie. Andrew nasceu em 25 de novembro de 1835. Segundo ele, "um empreendedor só seria bem sucedido se acumulasse riqueza para, em seguida, redistribuí-la". Andrew foi um homem que não se limitava a pregar as boas ações: ele realmente as colocava em prática. Este herói de Dunfermline chegou a doar "cerca de 56 milhões de dólares para a construção de mais de duas mil e quinhentas Bibliotecas Públicas Carnegie, nos Estados Unidos e em vários países de língua inglesa". Além disso, de acordo com o site NetSaber, ele também "montou fundações, fez doações para universidades, e construiu o famoso Carnegie Hall, em New York e o Peace Palace, em The Hague. Subvencionou numerosas obras e fundações, como o Carnegie Institute of Pittisburgh (1896), a Carnegie Institution of New York (1902) e a Carnegie Corporation of New York (1911). Aposentado (1901), escreveu um famoso artigo, Wealth (1889) ou O evangelho da riqueza, pregando o exercício da filantropia, e (1919) aos oitenta-três anos, morreu em Massachusetts, em estado de graça".
Andrew não era apenas benevolente, mas também um grande empreendedor. Sábio, são também de sua autoria as frases "À medida que envelheço, presto menos atenção ao que as pessoas dizem; simplesmente observo o que fazem"; e "Dois importantes fatos, nesta vida, saltam aos olhos: primeiro, que cada um de nós sofre inevitavelmente derrotas temporárias, de formas diferentes, nas ocasiões mais diversas. Segundo, que cada adversidade traz consigo a semente de um benefício equivalente. Ainda não encontrei homem algum bem-sucedido na vida que não houvesse antes sofrido derrotas temporárias. Sempre que um homem supera os reveses, torna-se mental e espiritualmente mais forte...".
Por outro lado, dentre os personagens atuais desta histórica cidade, seus filhos mais ilustres certamente são os músicos da banda Nazareth Dan McCafferty (vocalista) e Pete Agnew (baixista), que têm levado, na qualidade de músicos competentes e respeitados, o nome de Dunfermline às mais diversas e remotas regiões do planeta desde o final dos anos 60.
Amigos desde os 5 anos de idade, Dan e Pete construíram juntos uma trajetória de sucesso, respeitada e admirada por músicos de várias gerações.
Vale a pena conhecer um pouco da trajetória artística destes dois talentosos escoceses, grandes ícones do rock e personagens ilustres de Dunfermline.
Pete nasceu em 14 de setembro de 1946. Já Dan, seu amigo desde a infância, nasceu exatamente um mês depois. O baixista iniciou sua trajetória musical ainda muito jovem, em 1961, numa banda local chamada The Shadettes. Seu amigo William (Dan McCafferty) ingressou no grupo em 1965. Nesta época, já integrava o The Shadettes o baterista Darrel Sweet - mais um grande orgulho da cidade de Dunfermline. Darrel, vale dizer, esteve ao lado de seus amigos Dan e Pete até 30 de abril de 1999, quando faleceu, vítima de um ataque cardíaco.
Em 1968, com o ingresso do espanhol Manuel "Manny" Charlton no grupo, o The Shadettes mudou de nome para Nazareth e, após alguns anos de trabalho duro, tornou-se um megasucesso mundial, levando orgulho não só aos habitantes desta antiga Capital, mas também a todos os escoceses.
O primeiro álbum do Nazareth veio em 1971. Apesar da inexperiência do grupo com trabalhos em estúdio, neste primeiro álbum já ficou evidenciado que se tratava de uma banda diferenciada, versátil e muito talentosa.
No ano seguinte, foi a vez de Exercises, o album mais lento do Nazareth, que tem baladas muito bonitas e pouco conhecidas, como Madelaine e Sad Song. Mas, em termos de registro histórico, a faixa mais importante deste álbum é Glencoe Massacre. Esta música que conta a história de um acontecimento muito triste da história escocesa, quando, por divergências políticas, o chefe dos MacDonalds de Glencoe, bem como dezenas de outras pessoas pertencentes ao clã dos McDonalds (das Terras Altas da Escócia – os chamados "Highlanders"), foram brutalmente assassinadas por soldados no Valle de Glencoe, em 13 de fevereiro de 1692, após os terem recebido cordialmente em suas terras. Este ato de traição é um acontecimento importante ser lembrado, para que nunca mais torne a ocorrer fato semelhante nas belas e lendárias terras escocesas.
Mas voltemos à Dan e Pete. Até então, o Nazareth ainda não tinha conseguido o sucesso merecido, mas os grandes conhecedores de rock já estavam dedicando maior atenção à banda, pois já haviam percebido seu potencial.
Em seguida, Roger Glover, do Deep Purple, veio a ser o produtor de seu próximo album - Razamanaz - que apresentou um som bem mais pesado e vigoroso que o dos álbums anteriores. O resultado foi um estrondoso sucesso em todas as partes do mundo, sendo que até hoje a faixa título ainda é considerada um dos maiores clássicos da história do rock.
Finalmente, o Nazareth começava a ter o merecido reconhecimento. Ainda em 1973, mais um clássico: Loud ‘N’ Proud. Em 1974, chegou Rampant, também muito bem recebido.
No ano seguinte, surgiu o álbum Hair Of The Dog. Com ele, veio a consagração definitiva para a banda no cenário do rock mundial. E assim, ao mesmo tempo em que ouviam sucessos como Broken Down Angel, Razamanaz, Hair Of The Dog e Love Hurts no rádio, o mundo ia redescobrindo Dunfermline.
Em 1976, é a vez de Close Enough For Rock ‘N’ Roll e Play 'N' The Game, que mantêm o prestígio do Nazareth.
No ano seguinte, mais um grande clássico - Expect No Mercy.
De álbum em álbum, o Nazareth is solidificando cada vez mais o seu nome em todos os cantos do mundo. No Mean City veio apenas em 1979, mas conseguiu melhorar ainda mais a ótima reputação da banda.
O ano de 1980 trouxe Malice In Wonderland e The Fool Circle, mais dois álbums que enriqueceram a carreira destes escoceses de Dunfermline.
Em 1981, ingressou na banda o jovem músico Billy Rankin, também escocês, mas natural de Lennoxtown. Billy, que tinha na época apenas 19 anos, acrescentou muito ao trabalho do Nazareth durante o tempo em que permaneceu no grupo.
2 X S, lançado em 1982, é um dos álbuns mais bem sucedidos na banda, apesar de ter um estilo muito mais "AOR", do que propriamente o conhecido hard rock da banda.
Em seguida foi a vez dos álbuns Sound Elixir, de 1983, e The Catch, de 1984. Billy deixou a banda após a gravação de Sound Elixir, fazendo com que o Nazareth voltasse ao quarteto original.
Dan, Pete, Darrel e Charlton lançaram em 1986 o álbum Cinema, mais um belo trabalho do Nazareth, muito elogiado pela crítica e bem recebido pelos fãs.
Em 1989, surgiu Snakes ‘N’ Ladders e, no ano seguinte, Manny Charlton deixou a banda.
Com a saída de Charlton, Billy Rankin foi novamente chamado para o grupo. Em seguida, surgiu No Jive, sucesso de vendas e aprovado pela crítica.
Em 1994, lançaram Move Me. Em dezembro do mesmo ano, Billy deixou definitivamente o Nazareth e Jimmy Murrison foi escolhido para substituí-lo. Jimmy é também escocês, nascido da cidade de Aberdeen. Grande guitarrista, foi recentemente homenagedo pela Gibson com um modelo especial de guitarra, denominado "Jimmy Murrison Les Paul".
Em 1995, o tecladista Ronnie Leahy reforçou a banda. No ano de 1998, é a vez do lançamento de Boogaloo.
No ano que se seguiu, porém, o baterista Darrel Sweet faleceu, aos 30 de abril de 1999, com apenas 51 anos, após sofrer um ataque cardíaco. Foi uma grande perda para familiares, amigos, fãs e companheiros de banda.
A dor pela perda do amigo foi muito grande, mas era necessário renovar as energias e continuar. E foi assim que Pete convocou seu filho Lee Agnew - mais um membro do Nazareth nascido em Dunfermline -, para substituir o saudoso Darrel Sweet.
O ano de 2003 assistiu a saída de Ronnie Leahy da banda e o retorno do Nazareth a um quarteto. A mudança foi benéfica para o grupo, pois o seu som ao vivo ficou bem mais próximo ao tradicional e respeitado rock pesado do Nazareth, feito sobretudo nos anos 70.
Em novembro de 2005, Pete concedeu uma entrevista, na qual informou que a banda havia recebido uma proposta de uma gravadora alemã para registrar um novo álbum de estúdio. Isto tornou-se realidade em setembro de 2007, quando o grupo – já amplamente reconhecido como um dos mais importantes e influentes na história do rock – finalmente voltou ao estúdio, para alegria dos fãs e amantes da boa música.
A espera certamente valeu a pena. Pode-se dizer que o novo álbum The Newz é, em poucas palavras, um bem-sucedido passeio por vários estilos musicais, provando mais uma vez o talento e a versatilidade dos veteranos escoceses. Um álbum onde todas as músicas chamam a atenção dos ouvintes, frutos do equilíbrio resultante da mescla da experiência de Dan McCafferty e Pete Agnew com a juventude do premiado guitarrista Jimmy Murrison e do baterista Lee Agnew.
Desta forma, o Nazareth, liderado pelos filhos ilustres de Dunfermline Dan McCafferty e Pete Agnew, continua seguindo sua vitoriosa trajetória, superando adversidades, perdas, modismos, mudanças de estilos musicais e todos os demais percalços que somente as pessoas mais obstinadas conseguem superar.
Sem dúvida, Dan e Pete são os dois grandes heróis de Dunfermline na atualidade. Felizmente, não mais são necessárias guerras para provar o valor do povo escocês. A boa música - uma linguagem pacífica e universal - é capaz de fazer isso!
Fontes:
http://www.nazarethdirect.co.uk
(agradecimento especial ao webmaster Cob) ;
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