Ultraje a Rigor Invade Cerquilho e Reafirma o Poder do Rock Nacional
Resenha - Ultraje a Rigor (Cerquilho, 05/10/2025)
Por Flávia Pais da Silva
Postado em 11 de outubro de 2025
Neste domingo, 05 de outubro de 2025, a cidade de Cerquilho/SP viveu uma noite memorável. O tradicional Encontro de Motociclistas recebeu uma das formações mais emblemáticas do rock brasileiro: Ultraje a Rigor. O grupo, que despontou nos anos 1980 com uma mistura explosiva de humor, rebeldia e crítica social, reafirmou em solo cerquilhense por que ainda é sinônimo de autenticidade e resistência dentro da música nacional.
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A presença do Ultraje a Rigor transcende o conceito de show. Trata-se de uma celebração de um legado que ajudou a moldar uma das fases mais vibrantes do rock brasileiro - uma era em que guitarras distorcidas, letras provocativas e atitude contestadora tomaram conta do cenário musical e cultural do país.
A ASCENSÃO DO ROCK NACIONAL NOS ANOS 80
Os anos 1980 foram um divisor de águas para a música brasileira. Em meio à abertura política e à efervescência cultural do período pós-ditadura, o rock nacional emergiu como uma das principais vozes de uma juventude que desejava liberdade, expressão e identidade. Bandas como Legião Urbana, Titãs, Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho tornaram-se porta-vozes de uma geração que, cansada da censura e da mesmice, encontrou na música um meio de questionar, rir e resistir.

Foi nesse contexto que o Ultraje a Rigor surgiu, em São Paulo, com uma proposta única: unir o sarcasmo inteligente à crítica social em canções que, ao mesmo tempo em que provocavam risos, também instigavam reflexão. Roger Moreira, vocalista e principal compositor, soube traduzir o espírito de inconformismo da juventude brasileira, criando letras que ironizavam comportamentos, convenções e instituições sem perder o senso de humor.
O DISCO QUE INVADIU O BRASIL
O marco inicial dessa trajetória veio com o álbum "Nós Vamos Invadir Sua Praia", lançado em 1985. Mais do que um sucesso comercial - alcançando disco de platina e se tornando um dos registros mais icônicos da década -, o trabalho representou um ponto de virada na música brasileira. Com 11 faixas que equilibravam irreverência e crítica, o disco apresentava clássicos como "Ciúme", "Marylou", "Zoraide" e "Independente Futebol Clube". Cada canção refletia o retrato de um país que, aos poucos, redescobria o riso e a liberdade após anos de repressão.

A sonoridade despojada, com influências que iam do punk rock ao pop britânico, e a linguagem direta e bem-humorada de Roger fizeram do Ultraje uma banda acessível, mas nunca simplista. Suas letras, embora permeadas por piadas e trocadilhos, traziam uma leitura crítica da sociedade brasileira e dos papéis de gênero, das relações humanas e da alienação cotidiana. A atitude irreverente do grupo foi, e ainda é, o que o torna indispensável para compreender o DNA do rock nacional.
FORMAÇÃO ATUAL E PRESENÇA TELEVISIVA
Atualmente, o Ultraje a Rigor é composto por Roger Moreira (vocais e guitarra base), Marcos Kleine (guitarra solo), Bacalhau (bateria) e Andria Busic (baixo). A ausência do baixista Mingau, que desde 2023 enfrenta uma longa recuperação após um trágico disparo em Paraty, é sentida por todos, mas sua presença simbólica continua pulsando em cada show. A banda o homenageia constantemente, transformando sua luta em um símbolo de resistência e união.

Além dos palcos, o Ultraje conquistou também o universo televisivo. Desde 2014, integra o elenco fixo do programa "The Noite", no SBT, ao lado de Danilo Gentili. A participação reforçou a imagem de uma banda multifacetada, que sabe se adaptar aos tempos sem perder a essência. Entre riffs, risadas e comentários ácidos, o grupo consolidou sua posição como um elo entre diferentes gerações, mantendo o espírito roqueiro vivo na cultura pop brasileira.
O SHOW EM CERQUILHO: ENERGIA E IDENTIDADE
Quando o relógio marcou 16h, as primeiras notas ecoaram pelo espaço do Encontro de Motociclistas, e a plateia compreendeu de imediato que estava prestes a presenciar um espetáculo à altura da história da banda. A pontualidade e a entrega foram marcas registradas do show, que não apenas atendeu, mas superou todas as expectativas.


O setlist foi uma viagem pela história do rock brasileiro. "Ciúme", "Zoraide" e "Independente Futebol Clube" reacenderam memórias afetivas de fãs que cresceram ao som do grupo, enquanto "Inútil" e "Mim Quer Tocar" provocaram coros uníssonos que ecoaram pelo recinto. A comunhão entre banda e público foi instantânea, um reflexo da longevidade e da relevância de um repertório que atravessa décadas sem perder vigor.

Entre os clássicos autorais, houve espaço para homenagens ao rock internacional, com versões enérgicas de "Born to Be Wild", "Misirlou" e "Rock and Roll". As escolhas reforçaram a amplitude do repertório do grupo e sua capacidade de transitar entre influências diversas sem jamais perder identidade. Cada solo, cada virada de bateria, cada acorde parecia reafirmar o que o público já sabia: o Ultraje a Rigor continua sendo uma força incontestável do rock brasileiro.
O PALCO, O PÚBLICO E O LEGADO
O público, formado por motociclistas, famílias e fãs de todas as idades, respondeu com entusiasmo a cada música. Havia algo de simbólico naquele encontro - o cenário de liberdade e estrada do evento de motociclistas parecia dialogar perfeitamente com a essência do rock: movimento, resistência e paixão. A cada interação de Roger com a plateia, a atmosfera se tornava mais intensa, mais próxima, mais autêntica.

Em meio ao espetáculo, cada integrante teve seu momento de destaque. Solos de guitarra precisos, linhas de baixo pulsantes e batidas poderosas mostraram o nível de técnica e sintonia de uma banda que domina o palco com naturalidade. É raro ver músicos com tantos anos de estrada ainda entregando apresentações com tamanha energia e prazer evidente em tocar.
O ENCERRAMENTO E O SIGNIFICADO
O encerramento veio em clima de celebração. "Nós Vamos Invadir Sua Praia" foi o ápice, levando o público ao delírio coletivo. O bis trouxe uma sequência apoteótica com "Marylou", "Paranoid", "Eu Gosto de Mulher", "Johnny B. Good", "Roll Over Beethoven" e "Tutti Frutti". Foi o fechamento perfeito de um espetáculo que uniu nostalgia, vigor e respeito mútuo entre banda e fãs.

Mais do que uma apresentação, o show do Ultraje a Rigor em Cerquilho foi uma reafirmação da vitalidade do rock nacional e de sua importância cultural. Em tempos de transições musicais e digitais, o grupo segue como um lembrete de que a autenticidade não se perde - ela apenas amadurece. Roger e seus companheiros continuam a representar o espírito rebelde e inteligente que caracterizou o rock brasileiro dos anos 80, provando que o tempo não apaga o brilho de quem faz história.
O Ultraje a Rigor mostrou, mais uma vez, que o verdadeiro poder do rock está em sua capacidade de unir gerações, provocar reflexão e, acima de tudo, divertir. E se há algo que continua ultrajante, é imaginar o cenário da música nacional sem a irreverência e a força dessa banda lendária. Viva o rock nacional! Vida longa, Ultraje a Rigor!

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