Três lançamentos e uma análise
Por Anderson Nascimento
Postado em 10 de novembro de 2003
Este mês trazemos as análises de quatro álbuns: os novos dos Titãs, Nenhum de Nós, Charlie Brown Jr. e o último trabalho de estúdio de Paul McCartney.
"Acústico e Ao Vivo Vol.2" - Nenhum de Nós (2003)
Quase dez anos após gravar o álbum "Acústico Ao Vivo" no Theatro São Pedro, a banda gaúcha Nenhum de Nós volta com o volume dois do "Acústico Ao Vivo". Esperem aí, para os desavisados este não traz o carimbo MTV Acústico. O projeto trata-se de releituras de sucessos, ou não, da banda.
Neste álbum, apesar de passear por toda sua carreira, a banda concentra-se em músicas de álbuns mais recentes, inclusive deixando todos os clássicos tocados no álbum anterior de fora, ou seja, "Camila, Camila", "Astronauta de Mármore", "Sobre o tempo", "Ao meu redor"... e aí é que está o bacana do cd, músicas que em sua época original de lançamento passaram desapercebidas, estão agora com novos arranjos e com grande destaque dentro da obra.
Além dos destaques "Você vai lembrar de mim", em uma interpretação emocionada de Teddy Correa (que mostra-se melhor cantor a cada ano que passa), "Julho de 83" e "Das coisas que eu não entendo", o disco ainda traz uma bonita releitura à gaúcha da música dos mineiros Lô e Márcio Borges "Um girassol da cor dos seus cabelos". Outro momento maravilhoso do cd é a quase desconhecida "Da janela", com arranjos encantados de piano e solo de acordeom.
A forma na qual os gaúchos da banda encontraram para passar a limpo parte da carreira funciona muito bem. O resgate de várias de suas canções, não somente sucessos, acrescidas de novos arranjos, sem a obrigação de atender a interesses diversos, é muito mais sensata do que lançar uma coletânea, ou um álbum fácil, como estamos acostumados a ver. Eles acertaram em todos os aspectos, desde a escolha do repertório até a opção de participação do público de forma discreta, o que valoriza ainda mais o disco.
O som do rock tipicamente gaúcho e com marca registrada do Nenhum de Nós permeia todo o cd, valoriza a obra da banda e acaba resultando em um grande trabalho, com espaço garantido na coleção de qualquer um que admire a boa música.
"Como estão vocês?" - Titãs (2003)
UFA! Respirei aliviado ao ouvir o novo álbum dos Titãs, que bom... são os Titãs! De primeira, a capa assusta. A arte do disco faz lembrar aqueles cds que acompanham jornais dominicais, onde você compra o jornal e com mais R$5,00 leva o cd. Mas o susto é logo recompensado quando o álbum começa a tocar.
Os Titãs voltam efetivamente às suas raízes, fazendo um álbum Rock'n'Roll com músicas agradáveis e inteligentes. É claro, que nem eu, nem ninguém, espera mais encontrar um álbum no estilo "Titanomaquia" ou "Tudo ao mesmo tempo agora". Os tempos são outros. Mas quem ouve o novo álbum dos Titãs é arremessado diretamente à fase 80's da banda, para nossa felicidade.
Visto que os Titãs ganharam muita grana com a fase Mtv, e posteriormente se perderam musicalmente, em termos de novidades, e em desentendimentos dentro da banda, o que gerou inclusive a saída do multi-talentoso Nando Reis, temos aqui um grande álbum. Bem diferente daquela "coisa" que foi o "A Melhor banda de todos os tempos da última semana", onde encontrávamos as bizarras "Mundo Cão", "Bananas" e a própria faixa título, este álbum está mais denso, sem muitas arestas para serem aparadas.
Neste álbum, as músicas têm a cara dos Titãs, as letras foram em sua maioria compostas em parceria, seja em dupla, trio, ou por toda a banda, dando a impressão de união e coesão da banda.
Mas vamos lá, de cara o ouvinte é recebido por um Rock seco, de instrumental e arranjos vocais Titânicos.
- "Nós estamos bem", espanta qualquer fantasma azarão que por ventura queira pairar nesta nova fase dos Titãs. Além de parecer mandar uma mensagem para alguém: "...agora estamos muito bem, ..., podemos viver sem, o que a gente não tem...".
- "Você é minha", tem na simplicidade da letra, e na bela performance vocal de Sérgio Britto, suas principais características. É um rock bem feito, muito bem tocado e também agrada.
- "Gina Superstar", entrega as vicissitudes do mundo artístico e a forma ramdômica como o mesmo funciona. É um rock muito legal, que nos remete ao início da carreira dos Titãs, e quase nos faz acreditar que uma daquelas vozes da música pertence ao Arnaldo Antunes.
- "KGB", reduz um pouco do ritmo do disco, numa grande interpretação de Paulo Miklos, com uma letra super inteligente. Esta é, sem dúvida alguma, a melhor música do disco.
- "Livre para escolher", dá novamente a sensação de volta ao glorioso passado titânico, é outra música que encontramos um belo arranjo vocal da banda.
- "Eu não sou um bom lugar", é o primeiro single do disco, é uma música legal, mas não reflete o que reserva o disco, em termos de sonoridade. Não deveria ter sido escolhida para o primeiro single.
- "Pra você ficar", traz um clima bem descontraído no qual a banda passou durante a gravação do disco.
- "Enquanto houver sol", já está tocando na novela e promete ser um dos maiores sucessos deste álbum. A letra, composta por Sérgio Britto é linda e fala sobre esperança. Sérgio, que vem se destacando com a composição de baladas, desta vez, consegue fazer uma balada sem a apelação que foi a música "Epitáfio", um verdadeiro Epitáfio na obra dos Titãs.
- "Esperando para atravessar a rua", traz a voz de Branco alterada e tem a letra escrita em parceria com Arnaldo Antunes. A música tem a cara do ex-Titã, e fala sobre algo bem comum em nosso dia-a-dia, a espera do sinal vermelho aparecer no semáforo para podermos atravessar a rua. Muito legal, Titãs puro! "Provas de amor", de Paulo Miklos, é uma baladinha açucarada que fala sobre o amor nos dias de hoje.
- "Ser estranho", outra que faz parte do time das melhores do álbum, é outra canção de sonoridade tranqüila que traça em sua letra um cerrto paralelo com a letra Gita de Raul Seixas.
- "Vou duvidar", reacende o clima do disco, é um rock visceral que cresce ainda mais com a interpretação inflamada de Sérgio Britto. Esta com certeza vai levantar a galera nos shows.
- "Pelo avesso", é talvez uma das canções mais diferentes do álbum. Possui letra extensa e uma interpretação vocal urgente de Sérgio Britto, além de uma jogada vocal bem bolada.
- "A guerra é aqui", sua letra fala sobre a violência, é atualíssima, urgente, contestadora o que acaba resultando em um Rock tenso numa brilhante interpretação de Branco Mello.
- "As Aventuras de um guitarrista gourmet...", é uma homenagem à Marcelo Frommer que já está ausente há dois álbuns. A letra é até legal, mas a música é incrivelmente chata, e acaba destoando-se de todo o disco. Esta é a única bobagem que os Titãs cometeram neste álbum, que por sinal, ainda traz a opção multimídia onde podem ser visualizadas no computador as fotos, trechos dos ensaios e das gravações.
Enfim, este disco é o que estávamos esperando que os Titãs fizessem, um álbum livre, que honrasse a tradição e o nome da banda. Esqueçam todas as bobagens do álbum anterior, pois aqui estão novamente os verdadeiros TITÃS!!!
"Acústico Mtv" - Charlie Brown Jr. (2003)
Caramba! Quem são as maiores bandas brasileiras da atualidade? Difícil esta pergunta? Há quinze anos atrás era moleza... "Legião" ou "Engenheiros" ou "Barão Vermelho", "Capital" ou "Ira!" ou "Ultraje" ou "Biquíni" ou "Paralamas" ou "Titãs".... ufa! Chega né? Mas poderia ficar citando nomes por mais umas cinco linhas... E hoje? É difícil. Levando em consideração as bandas que temos hoje no cenário do Rock nacional, podemos dizer que CBJ está entre elas. Afinal de contas, apesar de eles terem músicas com letras bisonhas como "Papo reto", lá se vão quase dez anos de carreira, e seis discos gravados. Mas, já estava na hora de um acústico? Talvez sim. A fórmula dos acústicos reza que ou a banda está no auge da carreira e tem que alcançar o marco "Acústico", ou a banda está caidassa e os caras fazem o acústico para dar uma força, lembram do Capital Inicial? No caso do CBJ eles foram escolhidos pelo primeiro motivo.
[an error occurred while processing this directive]Pois bem, vamos lá. O acústico do Charlie Brown ficou legal as pampas. A banda dá um show de competência na execução de suas músicas. E toca quase todos os sucessos. Ficam devendo os hits "Te Levar" e "Confisco" que é uma das músicas mais legais do repertório da banda. A banda manda bem na música nova, a bacana "Vícios e virtudes", além de caprichar nas participações especiais, Marcelo D2, Negra Li e Marcelo Nova, que dá um show em "Hoje", que junto com Chorão e banda transforma a canção em um dos maiores destaques do disco.
Os vacilos ficam por conta das vezes que Chorão larga o microfone e deixa a galera cantar, como nas faixas "Zóio de Lula" e "Tudo que ela gosta de escutar". Além disso a banda exagera na quantidade de palavrões deferidas durante o álbum. A música "Não uso sapato", apesar de ter uma melodia super legal, exagera! Na música "Papo reto", por exemplo, o número de palavrões são triplicados a partir da versão que toca nas rádios, o CBJ precisa sacar essa parada.
Mas é obvio que isso não afeta o resultado final, que é mais um acústico muito bem produzido pela Mtv. E mais um marco alcançado pela banda CBJ.
O CD vai fazer muito sucesso, não há como não. É a trilha sonora ideal para animar as cervejadas da galera.
"Driving Rain" - Paul McCartney (2001)
O primeiro álbum deste novo milênio de Paul McCartney tem uma razão especial de existir: o ex-Beatle estava novamente apaixonado. "Driving Rain", marca o início do romance, que deu em casamento, com a ex-modelo Heather Mills. E se "Flaming Pie" era um álbum genial, porém, envolto de tristeza devido à iminente morte de Linda McCartney, "Driving Rain" é muito mais rockeiro, é, na verdade, um renascimento do gênio Paul McCartney.
[an error occurred while processing this directive]De forma proposital Paul dá de ombros para a crítica, e esculacha a arte gráfica do disco, enchendo o álbum com fotos preto-e-branco tiradas com uma micro-câmera embutida em seu relógio - horrível!. Como se não bastasse, Paul vai mais além e ilustra a capa com, literalmente, uma aliviante "mijada". Talvez essa "mensagem" à impressa na capa do álbum já dê pistas do que o ouvinte vai encontrar no álbum: um Paul McCartney despretensioso e seguro.
Animado com o momento em que está vivendo, Paul junta-se à novos, porém competentes músicos, que mais tarde estariam com ele na turnê mundial do Driving Rain. E o clima do disco reflete algo como uma grande jam session, com Paul arrasando no estúdio.
Resgatando o clima do álbum anterior, basicamente formado por de covers de rocks antigos, Paul se supera e faz um álbum de estilos desconexos como não me recordo de ouvir em toda a sua carreira.
Dessa forma, se você procura Rock'n'roll, ouça bem alto a primeira faixa do álbum, "Lonely Road" onde Paul dá um show de interpretação, se esgoelando ao vivo no estúdio até o fim da música, exatamente como uma faixa deste tipo deve ser cantada. A faixa título do cd entra no hall dos rocks do álbum, traz um refrão fácil, que se aprende a cantar na primeiro ouvida, mas é uma das mais divertidas do álbum e também é cantada ao vivo no estúdio. "About You", começa violenta com letra que fala sobre o renascimento que citei ainda pouco. "Rinse the raindrops" com incríveis 10 minutos de duração é um rock de tirar o fôlego, e destaca-se pelo instrumental pesado e, claro, pelo vocal inspirado de Paul McCartney.
Se você procura aquelas tradicionais baladas de Paul McCartney, você tem duas opções magníficas neste disco, "From a lover to a Friend" que trava um longo papo com Linda, onde Paul pede licença para amar novamente. Mas o melhor ainda estaria por vir, a faixa 13 "Your Loving Flame", está entre as mais belas canções já composta por Paul McCartney, e há muito tempo, desde "Only Love Remains (1986)", Paul não escreve uma canção que fale de amor tão profundamente como esta o faz, como diria uma amigo meu, "é de chorar"! Detalhe, esta música é dedicada à verdadeira fonte inspiradora deste álbum.
Se você procura experimentalismo, você encontra em "She's Given up Talking", onde Paul toca um kit de bateria eletrônica, tem a voz alterada através de overdubs e tem o seu baixo aplicado à efeitos, e a música ganha ares contemporâneos. Falando em modernidade, "Tiny Bubble", capricha em um inovador (e por que não experiemental?) ritmo neo-retrô. "Spinning on an Axis", é uma das faixas mais que mais se difere do estilo do velho Macca, também repleta de efeitos e bateria eletrônica, além de junto de "Back In The Sunshine Again" ser parceria com o seu filho James McCartney. Ainda neste estilo temos uma das melhores do álbum: "Heathen", uma faixa semi instrumental, apenas na metade do segundo minuto Paul começa a cantar a letra, outro bingo de Paul no álbum, até que a música encerra com o mesmo Paul sussurando o nome de sua amada. Acreditem o disco ainda traz uma faixa à lá George Harrison, "Riding into Jaipur", cheia de sons de instrumentos exóticos, é quase um mantra.
Se você procura aquelas músicas impregnadas de orquestras e arranjos complexos ouça "I Do", uma música super agradável com a cara de Paul McCartney.
Se você procura simplicidade e competência, ouça "Magic", é incrível como quatro pessoas podem tocar uma música tão bem, a letra é bem bonita e é inspirada também em, advinha quem? "Your way" , com ares do disco "McCartney" também segue a mesma linha.
Ah, que eu não me esqueça, para quem procura hinos pacifistas, no estilo "Tug of War", "Pipes of Pieces", o álbum traz a música "Freedom", feita em homenagem às vítimas dos ataques às Torres Gêmeas de Nova Iorque.
É realmente incrível o que a paixão pode fazer com a pessoa. Enfim, "Driving Rain" não é o melhor disco de Paul McCartney, mas com certeza está entre os melhores, e se você procura um álbum de estilos diversificados, com boas músicas e super inspirado, ouça "Driving Rain"!
Long Live Rock
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