Thiago Monstrinho e Fucking Violence: na luta em nome do hardcore nacional
Por Vagner Mastropaulo e Isabele Miranda
Postado em 06 de setembro de 2020
Hoje em dia, há diferentes meios para se entrevistar um músico: presencialmente, por telefone, email ou, como parte das reinvenções do "novo normal" em tempos de pandemia, via live. A conversa transcrita abaixo normalmente teria acontecido à moda antiga, olho no olho, por se tratar de um artista nacional bastante acessível e por ser a melhor maneira para poder analisar reações, se atentar ao tom de voz, em suma, observar e contextualizar melhor o leitor transportando-o para o tempo e espaço do bate-papo. Vai ficar para a próxima...
Apelando à conveniência do Whatsapp, trocamos uma idéia com Thiago Monstrinho, ex-Worst, e o frontman do Fucking Violence calorosamente "nos recebeu" e foi bem interessante notar que, superado o distanciamento imposto por um aplicativo, o vocalista facilmente quebrou a imagem séria atrelada a ele em seus clipes e shows. E mais, notícias em primeira mão: participação especial com o Cutthroat; live do Fucking Violence em outubro; e tratativas de uma tour com o Oitão. Vamos aos detalhes em elaboradas respostas às nossas vinte perguntas.
Vagner Mastropaulo: Meu primeiro contato com o som de vocês foi através do clipe de Ingratidão. Juro que pensei: "Mas isso é um Biohazard brasileiro!". Realçando a familiaridade, aliás, ainda em seus tempos Worst, vocês gravaram um cover de Urban Discipline em Instinto Ruim (2015). Imagino que os norte-americanos sejam uma das maiores influências para vocês.
Thiago Monstrinho: Com certeza! Não existe falar de hardcore sem tocar no nome do Biohazard! Conheci a banda em 1997, por um amigo do colégio, e depois, ter a honra de contar com o Billy participando desse tributo que gravamos foi foda demais!
VM: Até um tempo atrás, eles não saíam do Brasil. Você chegou a conhecer os caras?
TM: Sim!! O Billy Graziadei tocou com o Fernandão no Endrah e aí nos tornamos amigos. Depois tive amizade com o guitarrista, Bobby Hambel! A gente nunca tinha gravado cover e, no terceiro álbum, achamos que era a hora certa de fazer um tributo. E foi muito foda gravar Urban Discipline, ainda mais com participações especiais como as dos meus amigos Matthias Odysseus (vocalista do Nasty), Carl Schwartz (vocalista do First Blood) e o próprio Billy. Esse som é colossal.
VM: Quais outras bandas, não importando o estilo, te inspiram e são influências? Suponho que Hatebreed esteja entre elas...
TM: Hatebreed, com certeza! Amo muito Madball, Agnostic Front, Obituary, Pantera, Meshuggah, Sepultura, Slayer, Death, Cannibal Corpse, e por aí vai...
VM: Essa é um pouco mais longa e invoca o passado, mas você vai entender o porquê: ainda nos tempos de Worst, apenas o EP Violent Assault From The Southern Sphere (2016), com quatro faixas, possui 100% das letras em inglês, mas a imensa maioria das músicas do seu ex-grupo eram em português. Ingratidão, play de estréia do Fucking Violence, possui dez faixas, oito das quais são cantadas em português e duas em inglês (Numb The Pain e Hard Times). Como funciona na hora de compor? Como você escolhe qual música será cantada em cada língua?
TM: Não tenho uma regra. Sinto o feeling da música quando a componho com os caras. Já houve músicas para as quais escrevi a letra em inglês e não caiu tão bem, aí tentei mudar e também não me agradou. Aí abro mão e não me apego, já escrevo em português, ou vice-versa. A coisa tem que fluir. Mas tenho mais facilidade para escrever em português, nunca escondi isso. Para mim, sai mais fácil, mas não posso esquecer do público que me segue lá fora. Não posso abrir mão da língua universal.
VM: Há quatro participações especiais em Ingratidão. Gostaria que você discorresse sobre como se deu cada uma delas no sentido de: como rolou cada um dos convites? Há alguma estória sobre essas participações que você poderia dividir com a gente?
TM: Meu irmão Fernando Badauí, do CPM22, canta comigo em Respeito É Lei. Eu e ele somos amigos há vinte anos e convivemos, andamos juntos, nos vemos quase toda semana, seja para tocar, trabalhar, fazer churrasco, sair para beber e comer e ele nunca tinha participado de nenhuma banda minha. Então achei que era hora de chamá-lo para fazer parte deste trabalho.
TM: O Neil Roemer, do Cutthroat, é meu irmãozão de Los Angeles. Eles vieram fazer uma tour de oito shows com a gente aqui no Brasil, na época do Worst. Curtimos muito, ficamos muito amigos. Ele era vocalista do downset. e ele tem um estilo mais gangsta de cantar, mais rapper, e quando fiz o convite, deixei que ele escrevesse a parte dele, que ficou insana. Fiquei feliz demais com a participação dele em Numb The Pain. Falando nele, essa semana vou gravar uma participação no disco novo do Cutthroat, num som que se chama They Know. Vai ficar foda!
TM: Do disco, Decepção E Desgosto foi o som mais metal e pesado que eu e o Pablo fizemos e fazia tempo que eu já estava a fim de chamar o Caio MacBeserra, do Project46, para cantar em algum disco meu. Além de sermos muito bons amigos e nossas bandas terem tocado junto milhares de vezes, ele é um dos vocalistas que mais admiro no mundo, no planeta mesmo. O cara tem uma técnica e uma brutalidade muito sinistras. O som ficou assustador!
TM: E Prosperar é um hardcore "pra frente", porrada! Fiz questão de convidar meu mano Laurent Styx, de Montpellier, na França. Ele é vocalista do Nothing From No One e eles abriram muitos shows nossos na Europa. Ele é um cara muito gente boa e um puta vocalista. Achei que ficaria diferente unir português e francês num som. Eu, pelo menos, nunca vi isso no nosso meio.
TM: Nunca fui muito de chamar tantas participações. Nos três primeiros discos do Worst, não tem nenhuma. Sou sozinho, mas me senti à vontade de trilhar esse caminho desta vez.
VM: Mudando de assunto, de onde vem o "Monstrinho"? Quem te deu o apelido?
TM: Eu era um adolescente terrível [risos]. Com 16 anos, fui com dois amigos, Fabiano TJ e Fernandão, a um show do Vader em São Paulo [nota: Thiago se refere à primeira vinda da banda polonesa a São Paulo, na Fofinho Rock Clube em 14/12/02]. Depois fomos a uma festa, "causamos pesado", demos trabalho e os caras eram uns monstros. Eles me olharam e falaram: "Esse aí é o Monstrinho". Acho que foi isso [mais risos].
VM: Finalizando a parte dos nomes, "Fucking Violence" é um nome "fucking" forte sonoramente! Quem o bolou? Deve ter alguma estória por trás dele.
TM: Eu mesmo. Sempre gostei de dizer "fucking" em tudo que falo em inglês. Adoro essa palavra e adoro violência sonora, adoro música violenta. E quando contei para o Pablo: "Vamos montar o Fucking Violence", ele pirou!
VM: Ingratidão foi gravado no Dharma Studios em 2019 e lançado com um show sold out na Jai Club em novembro. A produção e a mixagem ficaram a cargo de Heros Trench e Rodrigo Oliveira (guitarrista e baterista do Korzus, respectivamente). Como foi trabalhar com músicos de uma lenda do metal nacional, porém com eles "do outro lado do balcão", por assim dizer?
TM: Foi simplesmente foda gravar com eles de novo. Eu já tinha gravado o último álbum do Worst, Deserto, com eles e foi uma experiência sem igual. A vibe de gravar com o Rodrigo e o Heros é indiscutível. Os caras sabem muito sobre música e tê-los ali traz uma certa segurança. A gente se dá muito bem no estúdio, flui muito bem e nos divertimos demais também. Falei com o Rodrigo essa semana e vamos gravar dois novos singles até o fim do ano. Preparem-se.
VM: A faixa-título possui clipe lançado em 1º de junho e gravado no centro de São Paulo, mais precisamente no Vale do Anhangabaú. Como foi a filmagem? Ela aconteceu antes da pandemia? E de onde veio a idéia de filmarem lá?
TM: Foi uma semana antes da pandemia. Gravei com meu mano Luringa, um puta diretor e fotógrafo. Somos amigos há mais de quinze anos, ele já tinha trabalhado comigo no clipe de Vencedores, com o qual atingimos mais de 2.5 milhões de views no YouTube [nota: atualmente com mais de 2.8 milhões de visualizações]. Ele sabe o que faz, então tivemos a sacada de gravar o clipe num dia chuvoso e nublado. Ingratidão precisava disso. Tive a idéia da banheira de sangue, o que dá uma sensação de quando a pessoa está realmente afundada na merda.
VM: Uma curiosidade: a filmagem foi feita sem isolar a área, certo? Logo, devia haver transeuntes ocasionais. Conte-nos um pouco a respeito, se houver alguma estória engraçada.
TM: Tinha uns "populares" [risos], mas foi tranquilo. Eles desviavam [mais risos].
VM: Falando um pouco sobre o momento atual, de que modo exatamente a pandemia afetou o Fucking Violence? O que estava marcado e teve de ser temporariamente suspenso?
TM: A gente tinha muitos shows marcados, estávamos engrenando, na sede de tocar, fazer turnê... aí de repente, acabou o mundo. Que bosta...
VM: Não têm rolado uns pedidos para vocês fazerem lives? Como você enxerga esse novo nicho, que bem esperamos que seja temporário ou, no máximo, uma alternativa aos shows?
TM: Vamos fazer uma live no Manifesto em outubro. Parece que vai ter plateia, não sei direito, mas ela será transmitida para os Estados Unidos e a Europa. Lá eles acessam muito o Manifesto. Vai ser bem legal!
VM: Mesclando passado e presente, o que você traz dos tempos de Worst que serviu para a criação do Fucking Violence, seja em termos musicais quanto em gerenciamento da carreira?
TM: Tudo. O Worst foi e é minha vida, mudou minha vida, viajei o mundo e conheci gente que jamais imaginei com tatuagens da minha banda, das letras, pessoas que realmente viviam a parada que eu escrevia, mesmo em português. Aprendi muito, musicalmente e do business, de como me sustentar, como ser manager. Tudo!
VM: Posso estar errado, mas tenho a sensação de que os fãs e a equipe do Worst eram extremamente importantes. Pessoalmente, sou amigo do Douglas Miranda, o Douglinhas, ex-integrante da Worst Crew, que sempre posta fotos referentes a essa época no status do Whatsapp. Como é sua relação com os fãs e com a equipe técnica atual e do passado?
TM: Hoje virou Fucking Violence Crew. Todos meus fãs estão comigo. Eu falo a verdade, canto o que eles e eu vivemos. Sou amigo de todos, trabalhamos juntos ainda e estaremos sempre juntos. É amizade verdadeira.
VM: O Douglinhas, aliás, me contou que você anda postando fotos de shows no Instagram. Imagino a saudade que vocês estão dos palcos...
TM: "Abstinência", sempre faço posts com essa palavra. Estou passando mal, nunca fiquei tanto tempo sem tocar. Já são seis meses. O último show foi em 07/03 e uma semana depois começou o lockdown...
VM: E como o espaço é democrático, pedi para ele elaborar uma pergunta especialmente para você: "Qual banda você vai chamar para fazer uma tour com o Fucking Violence quando tudo isso passar?". Senti uma ponta de piada interna!
TM: Toda vez ele me pede: Lionheart e Nasty, talvez Deez Nuts ou First Blood. Ou Malevolence ou Cutthroat. Vamos ver... Mas estou combinando uma tour com o Oitão, do meu irmão Henrique Fogaça, logo que isso acabar. E também quero armar uma tour com o Marca de Honra, banda foda dos meus irmãos Hóspede e Rodolfo. Fazer turnê com o Hóspede é uma das coisas mais divertidas que têm no planeta.
VM: Tanto as letras do Fucking Violence quanto sua proposta artística são bem diretas. É super comum te ver sério nos clipes e shows. O que te muda o humor e te faz sorrir e se divertir?
TM: No dia a dia, sou até que bem sorridente. Sou de bem com a vida, energia boa, sempre recebo os fãs sorrindo, sempre estou com meus amigos, meu filho, minha família, sempre sorrindo e brincando. Descarrego tudo, meu ódio, revolta e indignação nas músicas, nos shows e clipes. Realmente sou aquilo ali também, é meu lado sombrio. Mas as coisas simples me fazem sorrir: estar com meu filho, minha mulher, minha família, sair para beber com meus irmãos. Gosto de fazer festa, bagunça pesada, viajar, relaxar. Isso me faz sorrir.
VM: Saindo um pouco do hardcore, se apurei bem, você é personal trainer especializado em Kickboxing, certo? Além da banda, suponho que a rotina de treinos, aulas e competições seja uma outra paixão sua. O quão importante é, para você, equilibrar o lado lutador com a parte músico? Estar em forma deve ajudar e muito a segurar a onda nos palcos.
TM: Na verdade, sou faixa preta em Muay Thai. A diferença entre Muay Thai e Kickboxing é que, no primeiro, além das mãos e pernas, se usam também cotoveladas e joelhadas. Dei aulas em academias por muito tempo, na própria Chute Boxe, onde comecei a lutar. Mas hoje só tenho alunos de personal e foi o que me salvou na pandemia, para pagar as contas, pois, sem shows, estaria morrendo de fome. Parei de lutar profissionalmente, pois não conseguia manter dietas e me dedicar 100% à luta. Sair na porrada não é brincadeira. Quando você sobe no ringue ou no octógono, ali o bicho pega. É matar ou morrer. Mas com certeza meus treinos diários me ajudam muito a segurar a onda nos shows. Não é fácil fazer trinta e três shows seguidos em trinta e quatro dias numa turnê européia. Você tem que estar com o gás num nível alto.
VM: Passada a pausa forçada devido à pandemia, quais os planos imediatos do Fucking Violence? Digo, o que estava programado, precisou ser engavetado e será retomado em breve?
TM: Shows, turnês e clipes... turnês, shows e clipes... turnês, clipes e shows...
VM: Por fim, deixe um salve para os fãs que abraçaram sua mais nova empreitada musical!
TM: De coração, obrigado a vocês por essa entrevista irada. E obrigado a todos que me acompanham. Sem vocês, não haveria nada disso. Obrigado mesmo, nunca vou decepcionar!!!
Fucking Violence é: Thiago Monstrinho (vocais), Pablo Lucente (guitarra), Carlos Souza (baixo) e André Atibaia (bateria)
Facebook:
https://www.facebook.com/fvhardcore/
FONTE: IM Press&MKT
https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=1989148517884397&id=733074416825153
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