Angra: um breve passeio pela discografia da banda
Por Hugo Alves
Postado em 11 de fevereiro de 2019
O Angra existe de fato desde 1991. Até que se formasse o grupo que originaria o primeiro disco, vários músicos passaram pela banda, como os guitarristas Andre Linhares e Andre "Zaza" Hernandes (ambos no posto que por anos foi de Kiko Loureiro) e o baterista Marco Antunes. Antes de iniciar oficialmente sua carreira, chegaram a gravar a hoje lendária demo "Reaching Horizons".
Em 1993, o Angra lançava seu primeiro disco oficial gravado em estúdio: "Angels Cry", contando com Andre Matos (voz e teclados), Rafael Bittencourt e Kiko Loureiro (guitarras), Luis Mariutti (baixo) e Alex Holzwarth (bateria) – este último foi um músico contratado no último instante apenas para a gravação, dada a inesperada desistência de Marco Antunes – para a turnê, Ricardo Confessori assumiu em definitivo as baquetas da banda. Unindo o erudito ao Heavy Metal numa linha que soa como uma evolução do trabalho iniciado no final dos anos 1980 pela banda alemã Helloween, o Angra encanta em sons como "Carry on", "Time" (estas foram os dois singles e videoclipes), a faixa-título e "Evil Warning", tendo ainda espaço para um fiel e belo tributo a Kate Bush em "Wuthering Heights", além das primeiras pitadas de música brasileira já evidentes em "Never Understand".
Em 1996, o Angra continuava evoluindo, trazendo sua obra máxima no que tange à mistura do Heavy Metal com elementos brasileiros em "Holy Land", disco conceitual que narra uma história baseada no descobrimento do Brasil. Ricardo Confessori, em sua primeira gravação com a banda, brilha ao longo do disco como um percussionista de primeira linha e esbanjando versatilidade, passando por petardos como "Nothing to Say", "Carolina IV" e "Z.I.T.O.", além dos trabalhos inspiradíssimos em "Silence and Distance", "Make Believe" e a própria faixa-título, que mostravam uma banda muito mais segura e ousada. Até hoje, e não à toa, "Holy Land" é considerado por muitos fãs como o melhor trabalho já lançado pelo Angra.
Em 1997, dois EPs foram registrados: "Freedom Call", contendo faixas que datavam da época de "Angels Cry" (e até anteriores), além de faixas acústicas gravadas na França, e "Holy Live", também gravado num show na França, mais especificamente num show no Le Zenith em Paris – dizem os fãs mais assíduos que era pra ter sido um disco duplo ao vivo e que até em vídeo ele seria lançado, mas que tais planos foram barrados pela gravadora na época.
Em 1998, a primeira formação do Angra lançava sua derradeira obra, sob a alcunha de "Fireworks". Se nos dois primeiros discos a veia do Power Metal aparece com muito mais força em meio aos elementos eruditos e brasileiros, neste terceiro disco a banda experimentou, partindo para um som muito mais calcado no que grandes bandas praticavam nos anos 1980 sem, no entanto, perder sua essência. O resultado é uma banda muito mais pesada e menos melódica, ainda muito virtuosa e experimental como nunca antes, além dos surpreendentes vocais de Andre Matos, muito menos agudos e mais vigorosos. A lista de clássicos deste disco incluem "Wings of Reality", "Lisbon", "Metal Icarus", "Gentle Change" e "Speed". A primeira formação da banda se separou um ano após o lançamento deste disco, mas encerrou seu capítulo na história da melhor maneira possível.
Em 2001, o Angra já era um novo grupo. De um lado, havia os remanescentes Rafael Bittencourt e Kiko Loureiro (guitarras); de outro, os novatos Edu Falaschi (voz), Felipe Andreoli (baixo) e Aquiles Priester (bateria). A separação que poderia ter posto um fim precoce a uma grande história na verdade acabou servindo como porta de entrada para a persistência, a força de vontade e a renovação. O resultado é "Rebirth", disco que abriu a melhor fase da carreira do Angra, através de clássicos que resgataram a veia mais Power Metal já conhecida na história do grupo, como "Running Alone", "Acid Rain" e "Nova Era", além dos elementos brasileiros na "Unholy Wars". A faixa-título é um hino e, para muitos, o maior clássico da banda (atrás, talvez e somente, de "Carry on", do primeiro disco). O trabalho é indispensável a qualquer fã do Metal brasileiro!
Em 2002, o Angra finalmente conseguiu lançar seu primeiro disco ao vivo, intitulado "Rebirth World Tour: Live in São Paulo", gravado no Via Funchal (e também lançado em DVD), além de um novo EP, chamado "Hunters and Prey", que foi tão bem aceito pelos fãs que, entre alguns, foi elevado ao status de álbum.
Em 2004, ainda respirando os ótimos ares que os anos de turnê do disco anterior proporcionaram, Rafael Bittencourt escreveu a história que serviu como pano de fundo para um novo disco do Angra. "Temple of Shadows" narra a história de um cavaleiro templário que começa a questionar tudo ao seu redor – incluindo sua própria existência. Não existiu na história do Heavy Metal brasileiro – nem antes, nem depois – épico maior. As provas vêm nas formas de "Spread your Fire", "Angels and Demons", "Waiting Silence", "Wishing Well", "The Temple of Hate", entre várias outras canções inspiradíssimas e inesquecíveis. O disco ainda contou com participações de peso: Kai Hansen (ex-Helloween, Gamma Ray), Sabine Edelsbacher (Edenbridge), Hansi Kursch (Blind Guardian) e o brasileiro Milton Nascimento. O trabalho final resultou no disco mais inspirado do Angra – que, infelizmente, veio a ser o último trabalho imbatível na discografia do grupo, fechando um período de discos clássicos na carreira da banda.
Em 2006, após uma longa turnê promovendo o disco anterior, o Angra lançou seu sexto disco de estúdio. Intitulado "Aurora Consurgens", mesmo nome do livro escrito por São Tomás de Aquino que serviu de inspiração para os temas recorrentes no disco (suicídio, depressão, existencialismo), este parece uma releitura da fase vivida em "Fireworks": a banda experimentou mais, mas parece ter acertado menos. A despeito de haver grandes canções aqui, como "The Course of Nature", "The Voice Commanding You", "Breaking Ties" e "Salvation: Suicide", a fase vivida pela banda não era das melhores – Edu Falaschi começou a enfrentar notáveis problemas de voz, e Aquiles Priester deixou a banda um ano depois do lançamento do disco, abrindo um hiato total na carreira da banda que durou quase três anos, e quase resultou no encerramento das atividades.
Em 2009, Ricardo Confessori reassumiu o posto como baterista do Angra e, um ano depois, chegou ao mercado "Aqua", disco conceitual que reconta a história "A Tempestade", de William Shakespeare. A produção foi duramente criticada pelos fãs, mas isso em nada compromete as ótimas canções do disco, que inclui petardos do naipe de "A Monster in her Eyes", "The Rage of the Waters", "Awake from Darkness" e "Arising Thunder". Ao fim da turnê – e após um show desastroso no Rock in Rio, que não fez jus às histórias do vocalista em separado e do grupo como um todo –, Edu Falaschi anunciou sua saída da banda, após 12 anos à frente do Angra. Ricardo Confessori ainda permaneceu na banda por mais três anos após o lançamento deste disco, que também acabou sendo seu último junto aos demais músicos.
Entre o sétimo e o oitavo discos de estúdio, e modificando sua formação aos poucos, o Angra ainda editou duas versões de sua primeira coletânea oficial – "Best Reached Horizons" – e comemorou os 20 anos do primeiro disco lançando um DVD que contou com participações ilustres, como Tarja Turunen (ex-vocalista do Nightwish), Uli Jon Roth (ex-guitarrista do Scorpions), Amílcar Christófaro (baterista do Torture Squad) e a Família Lima.
Cinco anos após o disco anterior, o Angra já era novamente uma outra banda: Fabio Lione (ex-Rhapsody of Fire, ex-Visions Divine) assumiu a voz e Bruno Valverde (ex-Kiko Loureiro Trio) fez da bateria seu trono. Desta nova fase, nasceu "Secret Garden", um novo disco conceitual que traz a história de um homem que luta contra a própria insanidade após a morte de sua amada. O disco, apesar de levemente inconstante, traz ótimos momentos, como "Newborn Me", "Black Hearted Soul", "Perfect Symmetry" e "Upper Levels" (esta última cravando em definitivo o Angra como uma banda muito mais Prog do que Power nos tempos atuais), além de "Silent Call", primeira canção totalmente cantada por Rafael Bittencourt na história da banda (o guitarrista também canta algumas linhas específicas de outras canções ao longo da bolacha). Por fim, "Secret Garden" encerrou a história de Kiko Loureiro com o Angra, pois este foi convidado a substituir Chris Broderick no Megadeth.
O Angra sacramentou em "OMNI" a formação que conta com Fabio Lione (voz), Rafael Bittencourt e Marcelo Barbosa (guitarras), Felipe Andreoli (baixo) e Bruno Valverde (bateria). Segundo Bittencourt, o conceito do disco é a junção dos conceitos de todos os discos anteriores, formando uma nova história e abrindo as portas do passado para construir as do futuro. O disco é simplesmente a melhor coisa já lançada pelo Angra desde "Temple of Shadows" (2004). Contando com a participação de Kiko Loureiro em "War Horns" e de Alissa White-Gluz (Arch Enemy) e a brasileira Sandy Leah em "Black Widow’s Web", o Angra, num momento de inspiração como há anos não se via, ainda traz clássicos instantâneos como "Travellers of Time" e "Insania", resgata as raízes tupiniquins em "Caveman" e enfia ainda mais os dois pés no Prog Metal com "Magic Mirror", além de revisitar a grandeza anteriormente atingida em "The Shadow Hunter" com "OMNI – Silence Inside". Ainda em 2018, eles editaram uma nova coletânea para o mercado japonês, "On the Back of the Angels".
Pode parecer um pouco cedo para dizer isso, mas grandes são as chances de o Angra ter conseguido iniciar uma nova fase clássica em sua carreira, tão inspirada quanto no período entre 1993 e 2004. O futuro dirá...
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