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Iron Maiden: o sonho de Fortaleza enfim se realizou

Resenha - Iron Maiden (Arena Castelão, Fortaleza, 24/03/2016)

Por Leonardo Daniel Tavares da Silva
Postado em 29 de março de 2016

Quando exatamente começa um show do IRON MAIDEN? Em Fortaleza, o show estava marcado para as 21 horas do dia 24 de março. Mas eu posso afirmar que começou muito, muito antes. Teria começado no dia anterior, quando um número de pessoas capaz de lotar algum dos clubes do entorno do Dragão do Mar (ou o Carioca, na capital paulista) assistiu entre gritos e lágrimas a aterrissagem do gigantesco Ed Force One? Ainda não. Teria começado quando pessoas do staff da Arte Produções começaram a postar imagens "sem querer querendo" do Ed Force One? Não, nem aí. Teria começado na capital pernambucana, quando, por duas vezes, caravanas de Fortaleza e de muitas outras cidades nordestinas correram para Recife para ver o sexteto britânico. Não, quase lá, mas ainda não. O show do IRON MAIDEN em Fortaleza começou há sete anos atrás, no primeiro post no Orkut sobre o assunto (sim, quando esta rede social existia e era a preferida dos brasileiros). O sonho de muitos headbangers, metalheads, metaleiros (por que não?) de Fortaleza começava a tomar forma. Sim, eles são ingleses, mas em Fortaleza o IRON MAIDEN redefiniu o significado da expressão "Pontualidade Britânica". E não, não importa se você já chorou em um show do IRON MAIDEN. Você vai chorar de novo.

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De lá pra cá, foram muitas tentativas, todas frustradas. O sonho de ver Bruce Dickinson gritando "Scream For Me Fortaleza" gerava declarações acaloradas no já citado Orkut, mas também no Facebook, de popularidade ainda incipiente, e, claro, nas salas de estar, nos bares, nos shows que receberam outras bandas do gênero, em todo lugar em que estivesse mais de um fã da mais exitosa banda de Heavy Metal do mundo. Às vezes esse sonho chegava bem perto, mas o Ed Force One acabava pousando em outros aeroportos, sempre o de Guarulhos, mas também o de Recife ou o de São José dos Pinhais, na Grande Curitiba. Ficava a frustração. E a reação era sempre recorrer a outros aviões que pousassem nos mesmos aeroportos. Ou caravanas percorrendo as muitas horas de distância e os muitos quilômetros de tempo. Era a vontade extrema de deixar que rolassem pelo rosto de marmanjos barbados as lágrimas escondidas em seus olhos. Era a vontade extrema de chorar ao som de canções como "Hallowed Be Thy Name" e "Wasted Years". E a vontade foi saciada muitas vezes. Mas chorar ao ouvir Bruce vociferar "Scream For Me Fortaleza" ainda era uma dívida. E dívidas tem que ser pagas. Confira abaixo (impossível fazer um texto curto, sinto muito, eu vou falar de um sonho que custou a ser realizado) como foi que essa dívida foi paga na Arena Castelão.

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CHEGADA AO ESTÁDIO

Depois de tantos grandes shows (PAUL MCCARTNEY, ELTON JOHN, a cantora pop BEYONCÉ, o Rei Roberto Carlos) e jogos (três jogos da Copa das Confederações, seis jogos da Copa do Mundo, muitos jogos de Ceará e Fortaleza), o público já sabia que chegar cedo à Arena Castelão era essencial para poder evitar transtornos. Por ser um show numa quinta-feira, nem todos, no entanto, puderam sair mais cedo de seus trabalhos, mas não houve relatos de dificuldades maiores que o normal diante da magnitude do evento. Dois personagens se destacavam na entrada. Um fã estava caracterizado do novo Eddie, incorporando um Índio guerreiro Maia, teve seus minutos de popstar, tendo que posar pra fotos com quem o via.

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Aderson Azevedo, 24 anos, nosso segundo herói da fila, se viu desempregado na época do show de sua vida. Ainda tinha tentado comprar o ingresso no cartão da mãe e da sogra, mas viu sumir suas chances de ver a banda quando as compras foram recusadas. Desesperado, ele foi ao Castelão com uma plaquinha e pediu ajuda de um e de outro. "Teve pessoas que davam cinco, outros dois reais, mas a fila estava grande e em duas horas consegui comprar um ingresso", ele me revelou. Perguntei se ele teve medo de não conseguir e ele me respondeu que "

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Claro ! Era o show da minha vida. Fui ter a ideia a poucas horas do show. Já estava com essa plaquinha desde 13h pedindo ingresso, mas quando deu umas 15h quando a fila estava monstro decidi fazer meu extremo e sair pedindo dinheiro... podia ter faturado muito, mas só pedi o suficiente pra comprar meu ingresso mesmo!". Sim, sonhos extremos exigem medidas extremas.

THE RAVEN AGE

Mesmo desconhecidos, a banda do filho do "Chefe" ainda levantou uns "hey hey hey" no refrão de "Uprising", a canção que abriu a noite. Ao contrário das principais atrações da noite, a banda formada por Michael Burrough (vocal), Matt Cox (baixo), Dan Wright e George Harris (guitarras) e Jai Patel (bateria) veio com novidades no setlist e conseguiu também fazer com que parte da plateia pulasse na segunda, a quase inédita "Promissed Land". "Eye Among The Blind" foi a terceira e mais uma do EP homônimo, único lançamento da banda até agora. Até o fim do show, todas as canções do EP seriam executadas além das novas "Promissed..." (já citada) e "The Merciful One" e da já conhecida em vídeos do YouTube "Salem's Fate", que tem um belo solo. "The Death March", uma das melhores do quinteto, foi um dos pontos altos do show, considerado curto por parte da plateia, longo demais por outra parte. Borrough procurava sempre se comunicar entre uma música e outra ("Vocês, caras, são demais. Que multidão! Que lugar!), mas o que começava a impressionar mesmo quem chegava eram alguns adereços de palco do IRON MAIDEN que já podiam ser vistos atrás do imenso backdrop da RAVEN AGE, posicionado estrategicamente no meio da profundidade do palco.

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Sobre o som dos caras, é apenas correto, não hão de se tornar uma revelação do Heavy Metal e sim, claro, há o preconceito e as indagações. A banda acompanha o gigante IRON MAIDEN porque é de um filho de Harris ou porque realmente fez por merecer? Muitas pessoas na pista estavam mais interessadas em descobrir quem era o tal filho de Harris. Era o de boné? Não, era o loiro? Teve gente que até pensou que era o vocalista.

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Na verdade, a RAVEN AGE mostrou um metal honesto, que deve cair no gosto de fãs de bandas como BLACK VEIL BRIDES e AVENGED SEVENFOLD, mas isso só quando realmente lançarem mais discos. Enquanto isso, só podem manter a cabeça erguida. Tornaram-se conhecidos mundialmente, agora tem que mostrar serviço. Antes da boa "Angel in Disgrace", Burrough fez a educada saudação aos anfitriões, ANTHRAX e IRON MAIDEN e até pediu palmas para um dos seguranças. Como não poderia faltar, o "Obrigado" em português foi a última palavra. Ah, George Harris era o de boné. Não era?

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Setlist
1. Uprising
2. Promised Land
3. The Death March
4. Eye Among the Blind
5. The Merciful One
6. Salem's Fate
7. Angel in Disgrace

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ANTHRAX

Recebidos aos gritos de "Anthrax, Anthrax, Anthrax", o quinteto norte-americano fez com que, pela primeira vez desde que foi inaugurado, o Castelão visse um moshpit. E isso foi logo na primeira faixa, que atende pelo sugestivo nove de "Caught In A Mosh". E como se isso não fosse o bastante, na versão já bem incorporada ao repertório do ANTHRAX para a canção de JOE JACKSON, "Got The Time", o Castelão também pousou seus olhos pela primeira vez em um crowd surfing. E foi um atrás do outro. É música rápida, veloz, ligeira e a resposta só pode ser esta. O quinteto, formado pelo sobrancelhudo Scott Ian e pelo novato Jon Donnais nas guitarras, pelo vocalista Joey Belladonna (o melhor dos que ocuparam o posto na banda), pelo baixista Frank Bello e por seu tio, Charlie Benante (infelizmente ausente, mas substituído pelo pau-pra-toda-obra Jon Dette), era energia pura no palco, contagiando o público, tanto na pista quanto nas arquibancadas. Belladonna também puxa o coro "ô ô ô" (ainda falaremos muito antes disso hoje), iniciando "Antisocial", dos franceses do TRUST. E enquanto Donais faz seus solos de guitarra, o vocalista conversa, gesticula, faz sinal de que "eu sei que você fuma um negocinho" com quem estava na grade. Frank Bello, por sua vez, é um leão, agitando o tempo todo, assim como Ian, alma do ANTHRAX. Dette é apenas correto. Faz um bom trabalho, mas não se destaca nem positiva, nem negativamente. Belladonna alterna entre melodia (mais que o padrão do thrash), agressividade e energia (comuns no thrash) e a velocidade do rap (que, embora não esteja explicitamente presente, ainda pode ter alguns resquícios notados).

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"Fight'Em 'Till You Can't" é a representante do "Among The Living", mas mais músicas desse álbum seriam muito bem recebidas. Belladonna joga garrafas d'água para o público, mas avisa pra quem pegou: é pra dividir. Se dirigindo a todo a Arena ele afirma: "já não era sem tempo. Estamos esperando há 30 anos pra tocar pra vocês, então, obrigado". E em português, "obrigado, Fortaleza". "Eu tenho uma questão pra vocês, meus amigos", ele continua, "vocês amam thrash metal? Estamos lançando nosso décimo primeiro álbum. Escutem-no". É a deixa para "Evil Twin". Eu tinha conversado com Benante sobre a canção e ele me falou que "Eu acho que 'Evil Twin', como canção é muito tópica sobre o que está acontendo, sobre o que tem acontecido no mundo, sobre estes extremistas que trazem o seu terror para pessoas inocentes que, claro, não tem nada a ver com a razão porque essas pessoas estão fazendo terrorismo com as outras. Eu apenas apenas acho que as pessoas acham que podem fazer esses atos e ser aplaudidas pelos outros terrorristas e se tornar mártires. Eles não são mártires. Eles são apenas cuzões do inferno, basicamente. É tão triste que hajam pessoas que tem que viver num lugar em que haja isso agora".

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Leia a entrevista completa no link abaixo.

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Voltando no tempo, para os primórdios da banda, o clássico "Medusa", do álbum "Spreading The Disease", de 1985, leva os fãs do ANTHRAX ao êxtase. E os torcedores do Ceará Sporting Club ainda foram presenteados com o vocalista exibindo a bandeira do time (ele mesmo que pediu), entre aplausos e vaias (da torcida do Fortaleza). Outro clássico que não poderia faltar, era "Madhouse", mas este, infelizmente, ficou de fora em toda a turnê. Aproximando-se do final do curtíssimo show, Belladonna mostrou o backdrop que remete à capa do recém-lançado "For All Kings". É dele que também vem a melodiosa "Breathing Lightning". Coincidentemente ou não, há apenas quatro skulls no backdrop (seria Benante a caveira ausente?). O vocalista ainda faz o sinal universal do mosh, pedindo mais rodas, no maior de todos os clássicos do ANTHRAX. Claro, que falamos de "Indians". Oito músicas para um show do ANTHRAX é muito pouco. Eu não considero que alguém se incomodaria de ouvi-los um pouco mais. O show podia até começar de novo. Pelo menos Ian se despediu dizendo "vejo vocês de novo no ano que vem". Tomara. E tomara que venham como headliners.

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setlist:
1. Caught in a Mosh
2. Got the Time (Joe Jackson cover)
3. Antisocial (Trust cover)
4. Fight 'Em 'Til You Can't
5. Evil Twin
6. Medusa
7. Breathing Lightning
8. Indians

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IRON MAIDEN

Se há uma canção capaz de levar uma porção de camisas pretas ao delírio, mesmo que não seja ao vivo, ela é "Doctor Doctor", do UFO (mentira! " The Ecstasy of Gold", de Ennio Morricone, também tem o mesmo efeito nos shows do METALLICA). O público canta alegremente o refrão da canção de 1974 que tocava nos PAs, já sabendo que em segundos o show da vida de muitos iria começar.

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Com um pequeno atraso. Às 21:20, o sacrifício começa (eu não falei que o MAIDEN estava redefinindo o conceito de pontualidade britânica?). O calor da cidade, do Castelão, do público é amplificado pelas chamas. Há muito empurra-empurra, muita emoção, muitos olhos muito abertos, ansiosos para ver cada detalhe, prontos para verter muitas lágrimas. Bruce "Air Raid Siren" Dickinson está ali, de capuz, dando início ao sacrifício maia, tema do disco, tema da turnê, logo acompanhado por Steve Harris com seu característico baixo galopante, Janick Gers fazendo macacada, Adrian Smith duelando com Dave Murray e Nicko McBrain escondido atrás de um kit de bateria que só deixava ver, de vez em quando, muito de vez em quando, uma baqueta subindo para logo depois descer. Empurra-empurra, emoção, "If Eternity Should Fail" abre o disco, abre o show, abre a realização do sonho. A música não se intimida em terminar com o trecho falado do "Dr. Necrópolis", do suspenso novo álbum solo de Dickinson, mesmo que isso não faça o menor sentido.

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As piras de fogo se apagam para "Speed of Light", primeiro single que se revelou desse álbum "The Book of Souls". E era ali também que Bruce, pela primeira vez, grita o grito que estava engasgado não em sua garganta, mas na de milhares de fãs cearenses. "Scream For Me, Fortaleza". Sim, o sonho se realizou. E isso já pode ser registrado em cartório. Muitas lágrimas. Muitas lágrimas. Nem todo mundo viu a queda de Harris. Foi tudo tão rápido. E haviam muitas lágrimas atrapalhando os olhos.

Bruce saúda o público de todos os setores, 26 mil pessoas, o maior da parte brasileira da turnê até então. E, 31 anos depois de ter ingressado na banda, seus agudos ainda impressionam. "Children of The Damned", que a banda não tocava desde 2009 é de "The Number of The Beast", sua estréia com o IRON MAIDEN.

Voltando a se comunicar com o público, ele ri e ia dizer algo, mas é interrompido pelos gritos de Maiden, Maiden, Maiden. Concluindo a fala, ele avisa que a próxima canção é muito triste e fala sobre um cavalheiro chamado Robert Williams. No fundo do palco, a rainha, o ás e o rei ilustram a tocante (e pesada) homenagem.

Harris, sozinho no palco, faz a introdução no baixo para mais uma canção do novo álbum. Logo o resto da banda volta para tocar uma das melhores canções do novo álbum, muito provavelmente inspirada em "Le Rouge et Le Noir", o livro de Stendhal. Todo mundo sabia que aquele "ô ô ô" em "The Red and The Black" seria um coro. E não é desde Fort Lauderdale que sabiam disso. É desde que o disco foi lançado. E é exatamente isso que acontece. Não há mais muito espaço para surpresas no show. No fundo, a imagem do disco físico. Não seria melhor, nessa canção, continuar as cartas de baralho? Ou estaria ali a própria roleta, com seu vermelho, seu negro? Quantas chances alguém pode ter?

A música se divide em duas partes. É um novo hino. Smith sola. Murray sola. Smith, de novo. Incrível o que esses caras são capazes de fazer. Um pai com seu filho de 5, 6, 7 anos no "tumtum", vê o hino no meio da pista, bem próximo à grade. O menino balança as mãos maravilhado. É o público que se renova. É o IRON MAIDEN fazendo o que Bach, Mozart, Beethoven fizeram séculos atrás.

O fundo troca para o soldado inglês. Claro que todos já sabem o que vai acontecer. Claro que todos enlouquecem. É o primeiro clássico, "The Trooper". E Bruce, claro, está vestido de soldado. Na pista, a movimentação é intensa enquanto as arquibancadas viram um céu estrelado. No solo, Janick toca, ou finge tocar, com a cabeça coberta pela bandeira de Bruce.

No fundo, volta a rainha. Ela é a "Powerslave" da vez. Mais fogos e Bruce, com máscara de lutador mexicano de mucha lucha. E mais uma vez ele pede, "Scream For Me Fortaleza". É difícil não se emocionar com os solos da música que postulam o posto de mais belos do Heavy Metal.

No fundo, a rainha recebe a companhia de Eddie. A próxima é "Death or Glory", sobre o Barão Vermelho (o aviador alemão, não a banda), uma canção mais veloz, que tem agradado mais a quem curtia mais as primeiras canções da banda, da chamada (injustamente) "era punk". Com o mesmo tema, a canção até pode ser considerada a nova "Aces High", mas não chega aos pés da canção que abre o álbum "Powerslave". Ela é certamente um dos clássicos que faltaram no show, assim como "Run To The Hills", "2 Minutes To Midnight", "The Evil That Man Do". A lista é extensa...

A voz de Smith e Harris fazem-se ouvir junto com a de Bruce, que, nos solos, anda de um lado pro outro, menino malino atrás do que aprontar. O vocalista percebe que Smith deixara o dedal cair no chão e gentilmente tenta devolver, mas o amigo está ocupado, solando.

Bruce volta a se comunicar diretamente com o público. Ele lembra que estão tocando algumas canções do álbum novo, que está maravilhosamente... Ele não consegue se concentrar. Acena pra alguém. Diz alô pra outro. É hiperativo (ora, o homem é historiador, esgrimista, piloto, vencedor de uma batalha contra o câncer, palestrante, ...). Ele volta pra falar que o álbum está vendendo bem, não sabe quanto vendeu no Brasil, mas garante que o suficiente para voltar ao Brasil por muito tempo, que os brasileiros são um povo bom, com quem quer beber cerveja por muito tempo. Depois do discurso, Janick dá início, em um violão especialmente posicionado à faixa-título de "The Book of Souls". Na faixa, o mais traquino dos guitarristas faz de tudo, dá uma de Entwistle, sola, aponta a guitarra como arma. No interlúdio da canção, fogos sobem novamente a cada nota de Harris. Até que entra o Eddie no palco. Em uma das partes mais teatrais do show, Janick passa por entre suas pernas, pra lá e pra cá. Até que o bicho se envolve num duelo com Bruce, que desajeitadamente lhe arranca o coração. Depois de simular mais um sacrifício maia, Bruce atira o coração em direção a plateia. O sortudo a assegurar para si a posse do órgão é Pablo Juan, estudante de Engenharia Civil de Teresina (uma das muitas cidades de onde vieram vários fãs). Ele já tinha ido ao Rio de Janeiro ver o IRON MAIDEN no Rock In Rio e veio ver novamente a banda em Fortaleza, com o amigo Filipe Ramos, estudante de Engenharia Elétrica, em seu primeiro show do MAIDEN.

De volta ao repertório, "Hallowed Be Thy Name" parece não ter a mesma força, o mesmo impacto, de antes, quando encerrava os shows, mas ainda é uma canção poderosíssima. Com a corda no pescoço, o personagem de Bruce prepara-se para despedir-se da vida e grita novamente "Scream For Me Fortaleza" (sim, o grito estava engasgado, cada vez tem que ser registrada), enquanto Harris e Gers correm de um lado pro outro. Já o coro, logo nos primeiros acordes de "Fear Of The Dark" indica que, embora muitos agora torçam o nariz para a canção, ela ainda tem muitos, muitos fãs.

Quantas vezes vemos Bruce dar seus pulos em DVDs. E Janick rodopiar a guitarra? Mas, agora, é de verdade, não através de uma tela fria. E ouvir Bruce mais uma vez "Scream For Me Fortaleza" enquanto a cabeça do Eddie gigante, um balão com uma pintura extremamente realista, surge atrás do palco na canção que dá nome à banda, "Iron Maiden", é algo que resume todas estas muitas palavras no corriqueiro comentário "sem palavras". Difícil é depois encontrar no escuro e no meio da multidão o queixo que ficou no chão, enquanto a banda se despede (Nicko mais demoradamente, afinal, ele impôs o ritmo de todo o show mas nem pode ser visto).

Na volta para o bis, o sonho transforma-se em um pesadelo demoníaco. As palavras do Apocalipse de São João são declamadas em coro como se fossem o refrão de uma canção. E elas vem acompanhadas de um gigantesco Belzebu de braços cruzados e olhos inquisidores. Imagino como muitos podem ter se chocado naquele inferno em plena semana santa. O "boizebu" é parte do teatro, do espetáculo mais que musical do show do IRON MAIDEN. E a banda é independente de qualquer denominação religiosa que alguém possa querer lhe atribuir. E não é White Metal por "Hallowed Be Thy Name", nem Black Metal por "The Number of The Beast". É só música. E música boa. É Heavy Metal. Outro ponto a se notar são os fogos e como são desenhados. É tudo milimetricamente calculado. As chamas chegam sempre bem perto do círculo que repousa sobre o palco e do boneco do cramunhão, mas não acontece nada.

Na última vez que se dirige ao público, Bruce declara que a grande coisa do IRON MAIDEN são os fãs. "Nós pulamos, tocamos, não atiramos em ninguém, não temos coisas de gangue. Só nos divertimos. Somos irmãos de sangue", complementa o vocalista antes de "Blood Brothers", do álbum que o trouxe de volta ao MAIDEN, "Brave New World". A estrutura circular finalmente baixa-se, mas de forma inclinada. E aparecem estrelas no fundo, estrelas na arquibancada, estrelas no céu. A Lua, competindo com o grande círculo maia, posicionou-se bem perto do palco, louca pra também participar daquela realização de sonho. Em um trecho da canção, Bruce, sofrendo com o calor infernal de Fortaleza, torce a camisa fazendo cair uma cachoeira de suor.

Mas tudo tem que ter um fim. Como poderemos continuar sonhando, ter sonhos novos, se não prosseguirmos. Todos os Eddies no fundo marcam a despedida real da banda. É "Wasted Years". E este repórter mandou o profissionalismo à "baixa da égua". Era hora de chorar. Assim como na Arena Anhembi, dois anos e alguns meses antes, os versos da canção se transformaram em lágrimas. E choramos novamente. É isso. Não importa se você já chorou. Você vai chorar. Talvez numa mesma música, talvez noutra, mas você vai chorar. E copiosamente.

"Always look on the bright side of life" nos PAs encerra o show. Não seria melhor agora chamar "Doctor Doctor, please" novamente?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Arte Produções mostrou-se arrojada trazendo dois grandes shows no mesmo mês (na semana anterior a banda MAROON 5 apresentara-se no Marina Park) e merece o sentimento de gratidão dos headbangers cearenses. A produtora (junto com a Move Concert) foi responsável pela grande estrutura e realização do show do IRON MAIDEN em Fortaleza, visando a segurança e o conforto do público que lotou a Arena Castelão. Foram 400 seguranças particulares, 4 saídas de emergência, 74 brigadistas, 39 médicos, enfermeiros e auxiliares distribuídos nos 8 postos médicos, 65 policiais militares, 19 policiais civis, viaturas e agentes do Detran. Também devemos elogiar o apoio dado aos portadores de necessidades especiais. Conversamos com Francisco Wilker Girão e deixaremos que ele próprio fale sobre como foi tratado. "O local pra esse show foi melhor do que pro do Guns (espaço elevado e espaçoso), sem falar na atenção do pessoal. Deram suporte tanto na chegada quanto na saída".

Entre os pontos que podem ser melhorados em 2018 (sim, nós queremos - e podemos - ter o IRON MAIDEN no Castelão de novo na próxima turnê) podemos citar que há relatos de que a cerveja acabou antes do final do evento, mesmo o evento tendo uma marca de cerveja no patrocínio. A grande torre posicionada no centro da Budzone também poderia ser repensada, uma vez que atrapalhava a visibilidade de parte do público nas cadeiras centrais. Os camarotes também podem ser redesenhados, pois, distantes do palco e com um preço mais caro (afinal havia open-bar) não atraíram muitos fãs, sendo o único setor que destoava dos demais, completamente lotados.

Um fato lamentável também aconteceu e não chegou, até agora, ao conhecimento do público. A produção do IRON MAIDEN causou um constrangimento desnecessário para alguns veículos de imprensa. O maior site sobre Rock e Heavy Metal do Brasil e a maior revista impressa especializada que circula em nosso país (Whiplash.net e Roadie Crew, respectivamente) ficaram sem fotos deste show. Ambos foram credenciados previamente pela própria produção do MAIDEN, mas, de última hora, seus fotógrafos foram barrados pois já haviam fotos do show no Rio de Janeiro. Há uma certa lógica nisso, uma vez que fora o que inspire os discursos de Bruce ou um tombo ou outro de algum integrante (Harris caiu em "Speed of Light"), os shows são rigorosamente iguais. Mas, por que credenciaram então? Mudar a regra do jogo no meio da partida não parece algo que costume acontecer nos estádios de futebol. Aconteceu naquela noite no Castelão. Mas não é por isso que vamos ficar sem fotos.

Com o sucesso da campanha IRON MAIDEN em Fortaleza (além da presença de outros grandes nomes como PAUL MCCARTNEY, ELTON JOHN, GUNS N' ROSES, DREAM THEATER, NIGHTWISH), novas campanhas já começaram a surgir. A primeira foi do SCORPIONS, que deve fazer turnê no Brasil em setembro. Uma para trazer o METALLICA também já está em andamento, já tendo recebido o apoio de milhares de fãs em um grupo no Facebook apenas dois dias depois de ter sido iniciada. Outras capitais, como Natal e Salvador, inspiradas pela IMF, também já tem suas campanhas há algum tempo. Enquanto isso, o Heavy Metal do Ceará continua crescendo e atraindo público e produtoras. É também necessário lembrar das veteranas na cena metal: Gallery Productions, Underground Produções, Gino Production e Empire, que, trazendo bandas como TANKARD, POSSESSED, BENEDICTION e OBITUARY também contribuíram para que este 24 de março acontecesse.

Agradecimentos:
- Arte Produções pela atenção e credenciamento, em especial a Thamyres Heros e Jéssica Malheiros.
- Gandhi Guimarães (parceiro de tantos shows), André Rocha (confiram seu trabalho na Roadie Crew), Cristiano Machado (que, sem poder entrar com equipamento profissional, tirou mais que leite, tirou leite-ninho de pedra), João Victor Rebouças, Yago Albuquerque, Lizânia Andrade, João Pedro (Heavy Metal Mania BR), Daniel Mendes e Georgge Plutarco pelas imagens que ilustram esta matéria.

Este texto é dedicado a Edson Tareto, falecido nesta sexta-feira, às 11 da manhã em Icó, quando retornava ao Estado de São Paulo com parte do equipamento alugado para o show. Que sua família possa sobreviver (superar não é a palavra certa) a esta terrível perda.

setlist:
1. If Eternity Should Fail
2. Speed of Light
3. Children of the Damned
4. Tears of a Clown
5. The Red and the Black
6. The Trooper
7. Powerslave
8. Death or Glory
9. The Book of Souls
10. Hallowed Be Thy Name
11. Fear of the Dark
12. Iron Maiden

Bis:
13. The Number of the Beast
14. Blood Brothers
15. Wasted Years

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Sobre Leonardo Daniel Tavares da Silva

Daniel Tavares nasceu quando as melhores bandas estavam sobre a Terra (os anos 70), não sabe tocar nenhum instrumento (com exceção de batucar os dedos na mesa do computador ou os pés no chão) e nem sabe que a próxima nota depois do Dó é o Ré, mas é consumidor voraz de música desde quando o cão era menino. Quando adolescente, voltava a pé da escola, economizando o dinheiro para comprar fitas e gravar nelas os seus discos favoritos de metal. Aprendeu a falar inglês pra saber o que o Axl Rose dizia quando sua banda era boa. Gosta de falar dos discos que escuta e procura em seus textos apoiar a cena musical de Fortaleza, cidade onde mora. É apaixonado pela Sílvia Amora (com quem casou após levar fora dela por 13 anos) e pai do João Daniel, de 1 ano (que gosta de dormir ouvindo Iron Maiden).
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