Jornalismo musical: um papo com Bruno Ascari
Por Ricardo Seelig
Fonte: Collectors Room
Postado em 26 de junho de 2019
Acompanho o trabalho do Bruno Ascari há um bom tempo. Um cara tranqüilo, apaixonado por música e que produz o Som de Peso, um dos melhores canais sobre o assunto no YouTube.
Dando sequência na série sobre o papel do jornalismo musical hoje em dia, conversei com o Bruno sobre o presente e o futuro da nossa atividade, e ele apontou os seus certeiros pontos de vista.
Para acompanhar o trabalho do Bruno, siga o Som de Peso agora mesmo.
Pra começar, fale um pouco sobre a sua trajetória profissional. Onde começou, em quais lugares já trabalhou e onde podemos encontrar os seus textos hoje em dia. Quando você começou a produzir material sobre música?
Eu comecei a escrever sobre música com um grande amigo meu, Hernan Herrero, em um blog que também se chamava Som de Peso. Na época, tínhamos cerca de 14, 15 anos e escrevíamos por diversão mesmo, compartilhando com os outros o que estávamos ouvindo na época. Inclusive, um dos textos dessa época, sobre o Ginger Baker's Air Force, banda do ex-baterista do Cream, foi publicado também na Collector's Room.
Depois disso, eu parei de escrever sobre música, mas continuei no caminho da escrita. Eu me formei em Publicidade e Propaganda e trabalhei por uns anos como redator publicitário, mas a vontade de escrever, de falar sobre música, começou a falar mais alto.
Eu larguei meu emprego e fiquei um tempo maturando a ideia. Cheguei a escrever para outros blogs como o Tenho Mais Discos Que Amigos, mas sentia a necessidade de fazer algo meu, que fosse mais a minha cara. E foi assim que a ideia de criar o canal surgiu.
O que o motivou a escrever sobre música?
Eu gosto de música desde que me entendo como pessoa e a paixão por escrever começou na adolescência, então foi algo natural juntar as duas coisas. Acredito que, como muitos que escrevem sobre música, a maior vontade é de compartilhar informações, bandas, músicas com os outros. Eu acredito no poder e na importância desta arte na nossa vida, então poder indicar algo para alguém e essa pessoa dizer que adorou, que se emocionou, enfim, é algo que me enche de alegria.
Sobre quais gêneros musicais você produz material?
No começo, eu só escrevia sobre rock, em especial o chamado classic rock, mas também comentava um pouco sobre progressivo e psicodélico. Conforme fui ficando mais velho, fui descobrindo outros gêneros como o jazz, funk, blues, soul e, principalmente, a música brasileira e suas diversas vertentes. Atualmente, através dos vídeos, procuro trazer todos esses gêneros que tanto gosto e que, muitos deles, não têm uma visibilidade como deveriam.
Quais foram as suas principais influências no jornalismo musical?
Desde minha adolescência acompanho o trabalho do Bento Araújo na revista poeira Zine, então sinto que isto me ajudou bastante a tratar de forma detalhada vários artistas de gêneros, países e épocas diferentes.
O que você mais gosta de produzir dentro do jornalismo musical?
O que mais me agrada é fazer análises de álbuns, sejam clássicos ou recentes, além de fazer vídeos sobre momentos históricos ou uma espécie de "vídeo-ensaio" em que eu explico mais profundamente um estilo ou determinado momento de um artista. Mas confesso que estou ansioso para começar a trazer entrevistas com músicos e bandas para o canal.
Na hora de analisar um disco, quais aspectos da obra você costuma avaliar e dar mais peso para chegar a uma conclusão sobre o álbum?
Se estou falando sobre um álbum mais antigo, sempre penso na importância histórica dele, no quanto ele impactou os ouvintes, o mercado e também os outros músicos. Além disso, é importante analisar qual a importância daquele disco dentro da obra do artista/banda, se ele mostra alguma evolução ou mudança de caminho e sonoridade.
Outros aspectos que sempre levo em conta são a qualidade das composições, das gravações, as letras, as histórias que a música quer contar e, num grau mais subjetivo, o quanto aquilo me chamou a atenção, qual sentimento as faixas trazem, os pensamentos e reflexões que me causaram.
Como é o seu método de trabalho? Como é a sua rotina na hora de analisar um disco ou produzir uma matéria? Sai tudo de uma vez ou esse processo leva alguns dias?
Para o método de escrita, vou falar da maneira como roteirizo os vídeos. O processo de análise de um disco é sempre dividido em duas partes: primeiramente, eu faço as pesquisas sobre o momento do artista, escrevo sobre sua discografia até então e como foi o processo de gravação do álbum.
Depois vem a parte mais trabalhosa, que é analisar e escrever sobre todas as faixas. Esse processo depende do álbum, pois varia de três audições até mais de dez, dependendo do que estou ouvindo. As primeiras vezes que escuto, é sempre pra entender a fluência do álbum, como as músicas conversam entre si e como é a ideia do disco, o sentimento que ele passa. Em seguida, escuto várias vezes a mesma faixa, para entender o que cada instrumento está fazendo, como eles interagem e, no fim, analisar a letra.
Quais jornalistas musicais você gosta de ler e influenciaram o seu trabalho?
Além da Collectors Room, costumo acompanhar o trabalho de outros canais no YouTube como o do Gastão Moreira, os meninos da Vinilteca e as reportagens do Rodrigo Faour sobre a música brasileira. Preciso citar também os textos do Sergio Martins, do Ivisson Carvalho (que escreve no Instagram @meucarovinho), do Marcelo Pinheiro na página do Facebook Quintessência - Música Atemporal Brasileira, os textos do Igor Miranda e algumas matérias no Tenho Mais Discos Que Amigos.
Quais veículos sobre música você indica não apenas pra quem quer se informar sobre o assunto, mas também para quem deseja encontrar matérias de qualidade e que podem ser úteis para iniciar no jornalismo rocker?
Olha, dentro do jornalismo de rock, eu costumo acompanhar as notícias por sites como a própria Collectors Room, além de sites gringos como a Rolling Stone e Pitchfork.
Mas, para acompanhar matérias de qualidade dentro de vários estilos musicais, dá pra seguir todos os nomes que citei na pergunta anterior.
Em uma época onde as opiniões são instantâneas, a crítica musical ainda importa e segue sendo relevante?
Acredito que a crítica musical ainda importa, mas é menos relevante do que no passado, nos moldes que estamos acostumados, no quesito de dar uma nota quantitativa ou dizer se algo é bom ou ruim.
Cada vez mais, eu sinto que o papel do jornalismo musical é ser ainda mais informativo, de contextualizar aquele álbum, a carreira do artista, de mostrar possíveis ligações com outras músicas, filmes, quadros, autores, etc.
Sinto que quanto mais apresentarmos essas ligações para o público, mais o aproximamos da música e assim, aumenta o interessa nela.
O quanto o hábito da leitura é importante na construção de um estilo própria, de uma voz, dentro da crítica musical?
De zero a dez, eu diria onze. Para desenvolver melhor as habilidades de escrita, só existem duas coisas possíveis, escrever mais e ler mais, sobre diversos gêneros literários, países e épocas. É igual quando estamos aprendendo a falar quando somos bebês: somente conhecendo e ouvindo diversas vozes, você será capaz de ter a sua.
[an error occurred while processing this directive]O quanto consumir não apenas outros estilos musicais, mas também outras formas de arte, é importante para o trabalho de um jornalista de música?
Ambos são importantíssimos. Vou trazer algo da publicidade que se encaixa muito bem aqui. Diz-se que na hora de criar, quanto mais referências temos, quanto maior nosso repertório, melhor, pois só assim você terá uma ideia diferente.
Na música e na hora de escrever sobre, é preciso conhecer mais sobre outros gêneros e também sobre outras artes para fazer conexões dentro do seu texto. Assim, é essencial saber o máximo que der sobre vários assuntos, desde política e história, até religião e outras artes, para se compreender tudo o que estamos ouvindo.
O que é ser um crítico de música hoje em dia?
Me repetindo um pouco, acredito que o papel do crítico é principalmente compartilhar as informações, encaixando suas visões, preferências e gostos quando necessário. É mostrar essas conexões entre álbuns, artistas, músicos, faixas com outras coisas. Além disso, é dividir com quem acompanha seu trabalho, todo o material que conseguir juntar sobre novos artistas, sejam eles recentes ou redescobertas do passado.
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