Ian Paice - Trechos do Workshop do baterista do Deep Purple
Postado em 22 de julho de 1999
Retirado com permissão do site Firerock.
Aproveitando a passagem do Deep Purple pelo Brasil em março deste ano, o mestre Ian Paice participou de um workshop promovido pela Gang Percussion, Brazil Percussion e pela Pearl, marca de bateria da qual Paice é endorsse. Em um dos melhores workshops feitos em São Paulo, o baterista elucidou dúvidas de todos os presentes, comentou sobre sua carreira musical, além de ter se mostrado uma figura muito carismática, dando inclusive autógrafo pra todas as pessoas que compareceram ao KVA.
Ao iniciar o workshop, Paice, usando de toda a sua modéstia, fez questão de ressaltar o seguinte: "Muita gente faz clínicas especializadas em bateria falando sobre coisas específicas, e eles sabem do que estão falando, como eu não sei do que estou falando (nesse momento a platéia teve que descordar de Paice), eu não quero fazer desse workshop uma escola de bateria e sim uma coisa divertida e bem relaxada". E foi assim, com muita descontração que Ian Paice encantou e embasbacou todos os presentes.
A FIRE ROCK esteve lá, e nós selecionamos para vocês as perguntas e respostas mais interessantes do workshop.
FireRock / Qual a principal diferença entre tocar com o Glenn Hughes e com o Roger Glover?
Paice / O Glenn é um cara muito mais ligado ao groove da música negra como funk e soul music, e isso fazia com que eu tivesse que prestar muito mais atenção nele, do que me preocupar em tocar, isso me limitava um pouco. O Roger é um baixista mais livre, ele toca com a alma, e além do mais ele é muito mais rock'n' roll o que me possibilita muito ter mais 'abertura' na hora de tocar. Eu só toco desse jeito no Deep Purple, pela forma que o Roger toca.
FireRock / Pra você, qual a diferença entre tocar em lugares muito grandes, como estádios, e tocar em pequenos clubes ou casas de shows?
Paice / Quando os locais são pequenos, o contato entre a banda e o público, que inclusive estão mais próximos, é muito mais imediato há uma intimidade maior. Quando são grandes arenas pra 10, 15 e até 100 mil pessoas como o próprio Deep Purple já fez, é outro tipo de som e de interpretação, tem que se tocar diferente, com a utilização de outros tipos de técnicas. Por exemplo, agora vocês estão aqui, muito próximos a mim, sentindo a minha pessoa e me vendo tocar de perto, e quando é um lugar muito grande como um estádio, por exemplo, eu sou visto tão pequeno quanto uma formiga, é muito difícil passar os sentimentos de tão longe, essa é a diferença. O som também é bem melhor quando se toca em locais menores porque a banda se ouve melhor, tudo fica mais próximo, e em locais maiores o som fica meio bagunçado e é mais difícil de se escutar, porém uma banda como o Deep Purple fica muito difícil de tocar em locais pequenos, pois não compensa todo o investimento.
FireRock / Quando você começou a tocar, e quais são as suas influências?
Paice / É uma pergunta difícil de se responder porque eu ganhei minha primeira bateria quando tinha 15 anos, mas três anos antes eu já estava destruindo toda a mobília da minha casa com um par de baquetas, daí meu pai achou que seria mais barato me comprar uma bateria, assim eu não iria destruir mais nada em casa. Minha principal influência foi basicamente a música que o meu pai ouvia que eram na maioria Big Bands. Quando eu tinha mais ou menos 15 anos ouvi falar de um tal "rock'n' roll" mais eu nem me interessei muito, depois de alguns anos eu comecei a ouvir alguns discos como os do Litlle Richards, Elvis Presley, etc., mais mesmo assim essas bandas tinham um swing que vinha muito do Jazz, e assim eu conheci o rock'n' roll. Como eu comecei a ouvir rock com todo esse swing, isso acabou fazendo parte da minha personalidade musical, por isso eu acho muito difícil fazer algumas coisas que os bateristas de bandas como Van Halen ou Bon Jovi acham fácil, como por exemplo tocar 'reto', pra mim é muito difícil porque eu tenho esse swing do Jazz e do Rock' n' roll jovem. Eu enlouqueço os guitarristas (risos).
FireRock / Porque você trocou a marca da sua bateria, de Ludwig para Pearl?
Paice / Eu gostava muito da época em que tocava com a Ludwig, mas aconteceu com a Ludwig o que acontece com todas as pequenas empresas que são compradas por empresas maiores que só pensam em dinheiro, a qualidade foi caindo. Eu pedi a Ludwig uma bateria nova e chegou pra mim um instrumento que não era bom, e eu comecei a me preocupar com isso, porque muito gente ia comprar a bateria porque estava me vendo tocar com aquela marca, e o instrumento não era bom, logo isso iria refletir em mim. Então, eu fui procurar alguma fábrica que não fosse só boa pelo seus instrumentos, mas também que fosse uma firma idônea e que desse suporte pro artista e que fosse uma coisa séria, como é a Pearl. Hoje em dia a Ludwig tem boas baterias, mas na época em que eu fiz a troca não eram. Pra vocês terem uma idéia de como é a Pearl em nível de suporte, eu estava na Austrália fazendo um show e algum 'gênio' deu ré no caminhão e passou por cima de um dos meu tambores que ficou igual a uma panqueca, e só havia um tambor igual e com o mesmo acabamento em Tóquio no Japão, e a Pearl colocou o tambor em um jatinho privado pra que eu pudesse fazer o show. Eu não sei se eles irão fazer isso por você, mas por mim eles fizeram (risos gerais).
FireRock / Na gravação da música Fireball você usou dois bumbos?
Paice / Eu li uma vez num jornal que eu havia usado somente um bumbo, mas isso não é verdade, mesmo porque não seria possível. Eu tentei em estúdio tocar só com um bumbo, e apesar de eu ter conseguido a velocidade, o impacto não era o mesmo. Eu fiquei tentando a noite toda sem sucesso, no outro dia de gravação o The Who, estava alternando os horários de estúdio com a gente, e a bateria do Keith Moon, que tinha dois bumbos, estava num canto, eu fui lá peguei um bumbo do Keith e coloquei na minha bateria, e fiz tudo o que eu conseguia fazer com os dois bumbos. Essa é a história da Fireball.
FireRock / Comente um pouco sobre a música Burn.
Paice / Quando a Burn estava sendo elaborada, eu achei que se eu trabalhasse ela como eu vinha trabalhando as outras músicas rápidas, ela seria somente mais uma 'música rápida'. Enquanto o Ritchie [Blackmore] e o Roger [Glover] estavam criando em cima dela eu fiquei meio de 'saco cheio' e resolvi tocar em cima qualquer coisa que eu conseguia tocar, comecei a brincar e fazer meio que um solo, e eles de repente falaram "Isso mesmo, essa é a levada". Essa é mais uma história do Deep Purple, e foi assim que a Burn nasceu.
FireRock / Você já tentou algum vez trocar a bateria e tocar como destro?
Paice / Eu já tentei tocar ao contrário, mas geralmente isso acontecia quando eu estava bem bêbado (risos), porque a maioria dos músicos tocam como destros, e quando eu vou pros bares a noite e acabo bebendo 'chá' demais, o pessoal pede pra que eu faça uma jam e eu me atrapalho todo com a bateria ao contrário. Eu consigo ver os músicos das bandas dizendo "Ele não é tão bom assim" (risos gerais). No dia seguinte eu acordo e penso: "Ai meu Deu o que eu fiz ontem".
FireRock / Você continua estudando bateria hoje em dia?
Paice / Eu ainda pratico e estudo, não tanto quanto eu deveria, mas normalmente eu pratico num set de borracha pra trabalhar a minha técnica. Eu gosto de me surpreender quando sento na bateria pra ter idéias novas, as vezes elas são maravilhosas, e as vezes são horríveis.
FireRock / Nos anos 70 existiam bandas como The Who, Led Zepellin, Black Sabbath, entre outras... existia alguma concorrência entre aquelas banda e o Deep Purple? e naquele tempo você muito pra ser o melhor baterista dentre estas bandas?
Paice / Na época não existia essa competição entre os bateristas, todos nós estávamos trabalhando tanto que não tínhamos tempo pra pensar em competição. Tinha muita coisa acontecendo naquela época, e a gente prestava atenção a bateristas que estavam fazendo coisas novas, coisas muito criativas, foi uma época maravilhosa de se estar vivo e de ter 20 anos de idade. O que fez eu ser quem eu sou, não foi necessariamente estudar, foi amar tocar bateria, tocar muito alto e procurar aparecer, não ligava muito para os outros músicos no palco só fazia a minha parte, e outro fator importantíssimo foi ter nascido com muita sorte na época certa e no lugar certo, isso fez toda a diferença.
FireRock / Qual a marca dos seus pratos e porque você usa pratos tão grandes?
Paice / Eu uso pratos Paiste por um simples motivo... na Europa só existiam pratos Zildjan e Paiste, mesmo assim era muito difícil de se achar os Zildjan, e eu precisava de uma fábrica consistente que fizesse prato após prato com o mesmo timbre, pra que quando algum dos meus quebrasse, eu pudesse repô-los, eu não costumo quebrar os meus pratos, costumo ser bem gentil com eles, mas eu precisava saber que teria esses pratos a disposição, e foi por isso que eu escolhi a Paiste, que são maravilhosos, desde então nunca mais pensei em mudar. O motivo pelo qual os meus pratos são grandes, é porque o bumbo é grande (26''), então é importante que os pratos sejam grandes pra que o som apareça. No estúdio, quando uso um bumbo menor, os pratos também são menores.
FireRock / Você sente diferença em tocar com o Ritchie Blackmore, que tem um feeling fenomenal, e com o Steve Morse, que tem uma técnica impecável? Você precisou mudar algo no seu jeito de tocar pra se adaptar ao estilo do Morse?
Paice / O Ritchie toca muito alto, então eu tinha que 'descer o braço' e tocar muito alto também. Já com o Steve, eu posso tocar num volume mais controlado, e dá pra usar baquetas mais leves e ter mais técnica, porque quando você toca muito alto você perde a sensibilidade da música.
FireRock / Quando você está em casa, fora das tournes, você costuma chamar alguns amigos pra tocar algo diferente do que você faz no Deep Purple? O que você toca nessas ocasiões?
Paice / A última coisa que eu faço quando eu estou em casa, é chamar algum amigo pra fazer um som, as vezes quando estou fora de tourne eu não vejo a bateria por uns dois meses. Eu amo a música, mais não sou nem um fanático, então quando eu estou fora do trabalho eu fica com a minha família, vou pescar, enfim, faço outras coisas que eu gosto de fazer.
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