Angra: Destrinchando a música "Carolina IV"
Por Fabrício Eduardo
Fonte: Blog Climax
Postado em 01 de maio de 2014
Advinda de um álbum conceitual ("Holy Land" de 1996) onde todas as músicas abordam (direta ou indiretamente) o descobrimento do Brasil em 1500, na minha opinião a música "Carolina IV" é uma obra prima do ANGRA.
Os arranjos musicais do "Holy Land" sofrem muita influência da música e cultura brasileira, com referências aos índios e seu folclore, e no caso de "Carolina IV" um pouco também da cultura africana. Conta também com arranjos clássicos, simbolizando a Europa naquela época. Em termos de letra (falando do álbum como um todo) estas abordam efeitos da descoberta sobre os nativos; o vislumbre e os desafios que as viagens marítimas acarretavam; o fascínio do novo mundo; o folclore e a cultura indígena da época, etc.
Vamos experimentar uma análise detalhada sobre essa música traduzida.
Engraçado que a música começa com uma batida que lembra muito Olodum e conta com um refrão no começo e no fim que é cantado exclusivamente em português.
"Salve, salve Iemanjá,
Salve Janaína
E tudo o que se fez na água
Jogam flores para o mar
Deus salve a Rainha
E o meu passo nessa esfera...
Um caboclo de orixás
Logo deixa a Terra
Vai de encontro à sua sina
Onde o céu encontra o mar
Achará seu porto
E é assim que isso termina..."
Sobre Iemanjá: Iyemanjá, Yemanjá, Yemaya, Iemoja ou Yemoja, é um orixá africano, cujo nome deriva da expressão Iorubá "Yèyé omo ejá" ("Mãe cujos filhos são peixes").
Acho interessante essa citação de Jorge Amado:
"Iemanjá, rainha do mar, é também conhecida por dona Janaína, Inaê, Princesa de Aiocá e Maria, no paralelismo com a religião católica. Aiocá é o reino das terras misteriosas da felicidade e da liberdade, imagem das terras natais da África, saudades dos dias livres na floresta"
"Carolina IV" possivelmente é nome de uma embarcação, talvez uma caravela. Naquela época era comum darem-se nomes de mulheres as embarcações de grande porte (hoje são os furacões e tornados, rsrs). Na história, dois amigos experientes em náutica se aventuram novamente para o mar e quem sabe para os mistérios de um novo mundo.
"Tudo que eu vejo flutua com o vento
Todos os milagres da água
São milagres nunca vistos antes
De algum modo minha vida começa agora
Esta música que foi tocada através do tempo
Agora começa a atingir meus pés
Sente-se como a inundação de minhas necessidades
A partir da harmonia de sempre
Som das melodias do mar
E você saberá no caminho
Eu estou voltando para meus inimigos
Eu estou voltando
Eu estarei de volta para meus últimos dias
Eu estou voltando para o mar!
Então... você não vem comigo, meu amigo?
Emoções... como tínhamos antes
Esperança... nunca mostrando o mesmo
Para um homem solitário"
Essa música aborda algo que nunca chegou ao seu destino, desaparecendo em "um rio para o céu". A frustração de muitas expedições que saíram à caça de descobertas e desapareceram no anonimato sem conseguir realizar o objetivo.
"Desde o dia em que deixamos a terra
Nós estivemos ansiosos ao aproximar-nos
O capitão continuou mostrando seus planos:
'Sob as velas nós vamos!'
Profundas do oceano azul Eu olho
As reflexões da minha alma
Temos conosco um convidado especial
E para ele, fizemos um brinde
Carolina IV pegou um rio para o céu
Sete homens à bordo fazendo parte
Para levar seus corações ao redor
Ao redor, ao redor do mundo"
A letra vai mostrando que a embarcação está se perdendo e assim sua tripulação vai aos poucos esmorecendo... O que sobra são apenas lembranças de um passado, talvez um amor perdido deixado em terra ou talvez apenas amarguras que ficaram para trás com a intenção de serem superadas por algum senso doentio de realização pessoal.
"Tudo que posso lembrar daquele dia
Naquele diz com certeza
Todas as mãos para cima contra o nevoeiro
Enquanto nós tentávamos retorna
Carolina IV pegou o rio para o céu
Um homem a menos a bordo - sonhos humanos
Algumas vezes o custo de suas vidas,
Todas as suas vidas sonhando
Fui um tolo
Eu tenho tanto medo
Do meu coração para você eu digo:
- Eu vou estar aqui para ficar!
Nada de mais à esquerda do barco
Muitos anos vieram e se foram
Ainda não posso esquecer o passado
E os deixei em casa"
"Carolina IV pegou o rio para o céu
O vento assobiando a noite
Fizeram-me virar à direita para o olho do vento
Agora eu morrerei cantando:
Fui um tolo
Eu tenho tanto medo
Do meu coração para você eu digo:
-Eu vou estar aqui para ficar!
Tudo que eu vejo flutua com o vento
De algum modo minha vida começa agora
Sente-se como a inundação de minhas necessidades
Tudo o que vejo flutuando, flutua com o vento"
Intenções, amizades, promessas e sonhos... Por mais anacrônico que seja misturar Iemanjá com a descoberta do novo mundo, talvez o sentido seja esse que no fim tudo pertence ao mar volta para o mar. Talvez seja por isso que a música se encerre com o mesmo refrão em português.
"Salve, salve Iemanjá,
Salve Janaína
E tudo o que se fez na água
Jogam flores para o mar
Deus salve a Rainha
E o meu passo nessa esfera...
Um caboclo de orixás
Logo deixa a Terra
Vai de encontro à sua sina
Onde o céu encontra o mar
Achará seu porto
E é assim que isso termina..."
Agora vamos para algumas curiosidades:
- Essa música é riquíssima na parte instrumental, ela reúne ou lembra instrumentalmente partes de todas as outras músicas do "Holy Land". Sem contar uma parte quase exclusiva no teclado/piano (peguem o vídeo lá em cima que tem a música e coloquem ela nos 5:13 min) e agora compare essa parte com essa música de Hermeto Pascoal.
- Estranhamente essa letra me remete muito "Moby Dick", mesmo sendo histórias bem diferentes, alguns aspectos são parecidos como a ambição e o fascínio pelo mar. Reparem nesse trecho inicial de "Moby Dick":
"Trate-me por Ishmael. Há alguns anos não importa quantos ao certo, tendo pouco ou nenhum dinheiro no bolso, e nada em especial que me interessasse em terra firme, pensei em navegar um pouco e visitar o mundo das águas. É o meu jeito de afastar a melancolia e regular a circulação. Sempre que começo a ficar rabugento; sempre que há um novembro úmido e chuvoso em minha alma; sempre que, sem querer, me vejo parado diante de agências funerárias, ou acompanhando todos os funerais que encontro; e, em especial, quando minha tristeza é tão profunda que se faz necessário um princípio moral muito forte que me impeça de sair à rua e rigorosamente arrancar os chapéus de todas as pessoas então percebo que é hora de ir o mais rápido possível para o mar. Esse é o meu substituto para a arma e para as balas. Com garbo filosófico, Catão corre à sua espada; eu embarco discreto num navio. Não há nada de surpreendente nisso. Sem saber, quase todos os homens nutrem, cada um a seu modo, uma vez ou outra, praticamente o mesmo sentimento que tenho pelo oceano."
- Engraçado como Mitologia Iorubá, remete muito as mitologias pagãs ou cristãs (mesmo antes do sincretismo). Por exemplo, Iemanjá é a princesa do mar, filha de Olokun (deus/orixá genioso como Poseidon), que dependendo da vertente pode ser uma entidade masculina ou feminina misturado com peixe, que foi acorrentado no fundo do oceano, quando tentou matar a humanidade com o dilúvio.
*Yoruba: Grupo étnico africano, que habita a Nigéria. referindo-se também à mitologia africana
Bom pessoal, espero que tenham gostado. E agradeço pela visita.
Aqui segue o link dessa matéria original:
Viagens, Filosofia e Rock'n Roll - "Carolina IV":
http://blogclimax.blogspot.com.br/2013/12/viagens-filosofia-e-rockn-roll-carolina.html
Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps



A melhor banda de rock de todos os tempos, segundo Bono do U2
As duas preocupações de Rafael Bittencourt com o anúncio do show da formação "Rebirth"
Mystic Festival terá cerca de 100 bandas em 4 dias de shows; confira os primeiros nomes
"Melhor que os Beatles"; a banda que Jack Black e Dave Grohl colocam acima de todas
Steve Harris não tinha certeza de que deveria aceitar volta de Bruce Dickinson ao Iron Maiden
As duas únicas camisas de futebol permitidas nos shows do Oasis em São Paulo
Andreas Kisser afirma que Titãs é a maior banda da história do Brasil
"Come to Brazil" - 2026 promete ser um ano histórico para o rock e o metal no país
Tobias Forge quer praticar mergulho para tornar uso de máscara no palco menos claustrofóbico
O cantor que Robert Plant admite que nunca conseguiu igualar
Bangers Open Air 2026: cinco apresentações que você não pode perder
A banda que inspirou a reunião da formação "Rebirth" do Angra, segundo Rafael Bittencourt
Slipknot anuncia venda da maior parte de seu catálogo musical
As 50 melhores bandas de rock da história segundo a Billboard
Angra comenta show histórico no Bangers; "É a prova de que o metal feito aqui tem força"
As 3 teorias sobre post enigmático do Angra, segundo especialista em Angraverso
O principal cantor do heavy metal, segundo o guitarrista Kiko Loureiro
O disco do Queensryche que foi muito marcante para Kiko Loureiro e para o Angra
A bizarra teoria que aponta cantora do Calcinha Preta no Angra após post enigmático
SOAD: quando Shavo quase matou Brent Hinds em briga na MTV
Compridas: As músicas mais longas de grandes bandas


