O apogeu da maturidade musical. do Visions Of Atlantis em "Pirates II - Armada"
Resenha - Pirates II – Armada - Visions of Atlantis
Por Marcelo R.
Postado em 11 de agosto de 2024
Nota: 10
Matéria originalmente publicada no RockShowBr
Em 2023, os austríacos do Visions of Atlantis desembarcaram em terras tupiniquins para a sua segunda visita ao Brasil.
Num ano extremamente pródigo em shows, a apresentação do conjunto alcançou especial destaque. Noite memorável, à qual, aliás, dediquei não apenas uma detalhada resenha, como também um longo e emocionado relato pessoal, na forma de diário.
Em julho de 2024, dois anos após o seu último lançamento de canções inéditas, o Visions of Atlantis surgiu com novo material, intitulado Pirates II - Armada. Grata surpresa!
Após maturar as impressões com sequenciais audições ao longo das últimas semanas, cravo, sem titubear: Pirates II – Armada é o álbum mais completo, complexo e virtuoso do conjunto. Ocupará, seguramente, as fileiras dos melhores lançamentos de 2024, posição que, creio, já conquistou.
A intenção, aqui, não é a de analisar as faixas, individualmente. O intuito é traçar um panorama, com uma visão geral das impressões colhidas após cuidadosa e atenta audição do álbum.
Pirates II – Armada é inaugurado com To Those Who Choose to Fight, canção curta, mas que não possui, a rigor, estrutura de mera introdução. A cativante faixa é desenvolvida num estilo marcantemente recitativo, com atuação performática de Clémentine Delauney.
Com tonalidades suaves, uma de suas facetas, a vocalista envolve o ouvinte numa aura angelical e doce, com certas notas de dramaticidade, amainando o espírito, desprecavido à explosão sonora iminente.
Após a atmosfera de suspense envolta pela canção de abertura, Pirates II – Armada abre as cortinas para a sua longa e épica jornada musical, despejando aos tímpanos a estrondosa The Land of the Free.
A faixa, verdadeira epopeia, conjunta todos os elementos que caracterizam a identidade do grupo. Dessa vez, porém, com doses mais intensas e predominantes de elementos orquestrais e sinfônicos.
To Those Who Choose to Fight é cadenciada – com leve pendor à aceleração –, pesada e multivariada, com quebras de tempo, explosões sonoras e coros multivocais, além de um belíssimo solo de guitarra. Ao decorrer da canção, há, ainda, aquela típica e agradável alternância entre vocais masculinos e femininos, linha de canto tão característica do conjunto.
Toda essa miscelânea confere a The Land of the Free contornos heterogêneos, prodigando-lhe em termos de qualidade e complexidade. Essas características, aliás, estão amplamente presentes em todo o álbum, como se verá.
Avançando na audição – e sem abordar o álbum faixa-a-faixa, como já alertado –, Pirates II – Armada arrebata com outro destaque: Tonight I'm Alive. A faixa é um presente ao ouvinte, com sua vivaz introdução e seu vibrante andamento, especialmente fincado em elementos de folk metal.
Na percepção desse ouvinte-resenhista, a abertura e o desenvolvimento de Tonight I'm Alive são notoriamente influenciados pelo estilo de conjuntos como Korpiklaani e Elvenking (apenas para registrar duas referências). Essas características são novamente visitadas em outros momentos ao longo do álbum, a exemplo de Magic of the Night, outro primor desse riquíssimo treasure chest musical.
Armada, faixa-título, igualmente não decepciona. Intensa, pesada, veloz e com refrães potentes e vigorosos, a canção representa, provavelmente, o momento mais épico e resfolegante do álbum.
Entre outros destaques, também merecem menções honrosas as faixas The Dead of the Sea e Ashes to the Sea, mutuamente dicotômicas.
The Dead of the Sea é, possivelmente, a canção mais complexa do material. Com especial prevalência dos já citados elementos orquestrais e sinfônicos, e com um andamento moderado, a faixa soa como verdadeira trilha sonora de filme de batalha épico. Essa é a minha canção favorita de Pirates II – Armada, ao lado da magistral Ashes to the Sea, que lhe sucede.
Ashes to the Sea é um contraponto à canção anterior. Estruturada numa atmosfera obscura, dramática e intensamente melancólica, e com desaceleração no andamento, Ashes to the Sea representa agradável e bem posicionado contrabalanço ao tom que, no geral, dita a atmosfera vibrante de Pirates II – Armada.
Essas variações rítmicas, presentes em diversos momentos de Pirates II – Armada, soaram-me como verdadeiras alternâncias do movimento do mar, ora calmo, ora turbulento (outro exemplo dessa variação, a propósito, pode ser ouvido na bela e sentimental faixa Underwater).
Não sei se esse contraste foi uma intencional alusão aos movimentos, pendulares e imprevisíveis, do mar (relembre-se, a propósito, do conceito adotado pela própria banda, em suas letras e imagem). De todo modo, essa é, precisamente, a paisagem musical que a audição de Pirates II – Armada bordou, e transbordou, no imaginário deste ouvinte-resenhista, levado a uma imersiva viagem épica musical.
Avaliado em seu conjunto, Pirates II – Armada retrata um trabalho destacadamente maduro, com clara verve operística.
A sobreposição multivocal, com coros vivazes especialmente nos refrães, confere um tom marcantemente épico a Pirates II – Armada, semelhante a alguns arranjos que caracterizam o som e o estilo do Blind Guardian e do Rhapsody.
A estrutura mais pesada das bases de guitarra e o andamento, no geral, mais cadenciado de Pirates II – Armada conferem, porém, um tom significativamente mais obscuro e sóbrio às faixas, em comparação com o estilo das duas outras bandas antes citadas.
Os arranjos instrumentais de Pirates II – Armada são técnicos e complexos. Conjugam múltiplos e bem explorados elementos orquestrais e sinfônicos, num caldeirão de influências moldado à base do peso e, no geral, da cadência. Tudo isso, ressalte-se, harmonizado com parcimônia.
Como resultado, Pirates II – Armada é um álbum que, embora multivariado, foi executado de forma organizada e coesa, preservando-se seu sentido e direcionamento, com correto entrançamento de seus múltiplos elementos.
Embora fracionado em 12 empolgantes faixas, Pirates II – Armada soa, na verdade, como um todo unitário. Como um contínuo, formado pela contiguidade de peças que, globalmente, soam como a recitação de uma única história, pendular no seu movimento e ritmo.
Essa é a paisagem musical, em suma, bordada por Pirates II – Armada: uma verdadeira e complexa trilha sonora de um filme musical. E tudo isso desenvolvido harmonicamente, com equilíbrio e bom gosto, resultado do trabalho de uma banda que, além de talentosíssima, está no seu inquestionável apogeu criativo.
Que o céu, ou o horizonte inavistável do fim do mar, lhe seja o limite.
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