Resenha - Angel Of Retribution - Judas Priest
Por Sílvio Costa
Postado em 11 de março de 2005
Vamos tentar esquecer, por alguns instantes, a inegável importância do Judas Priest para que o heavy metal adquirisse os contornos que hoje apresenta. Vamos tentar deixar de lado o fato de que este quinteto britânico é um dos maiores responsáveis pelo fato de sites como o Whiplash possuir tantos leitores e que, graças ao Judas Priest, o heavy metal atingiu a maturidade nos anos 80, transformando-se num estilo multifacetado, mas com uma identidade própria e com todas as características que conhecemos tão de perto. Vamos tentar nos concentrar apenas em pouco mais de cinqüenta minutos de música, distribuídos em dez faixas e compreende-los, antes de tudo, como uma honesta tentativa de ressurgimento de uma banda cuja folha de serviços prestados à música pesada dispensa quaisquer comentários adicionais.
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Parece impossível fazer uma resenha isenta deste álbum. Em primeiro lugar, porque o Judas Priest é considerada uma das bandas cuja imagem e espírito melhor definem o heavy metal. Quando eu penso em roupas de couro, motocicletas e guitarras, imediatamente me vem à cabeça a imagem do K.K Downing curvando-se para trás e arrancando ruídos infernais de uma guitarra Flying V. Ou, quem sabe ainda, o Rob Halford entrando no palco em cima de uma motocicleta e cantando Hell Bent for Leather com todos na platéia boquiabertos, apesar da previsibilidade daquilo tudo. Enfim, o Judas Priest não apenas oferece uma perfeita tradução visual do que é o heavy metal, como também o personifica de modo insuperável.
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Mas o Judas estava devendo um disco condizente com esta imagem tão bem construída ao longo dessas três décadas de carreira. Até mesmo o mais inveterado fã há de concordar que a discografia do grupo é, no mínimo, irregular, apresentando trabalhos absolutamente indispensáveis e outros em que prevalecem outros elementos (como o apelo comercial, por exemplo) em detrimento do heavy metal puro, simples e competente que o consagrou.
Desculpem este fã, que esqueceu algumas das preciosas regras de concisão do texto jornalístico, mas essa resenha vai ser longa.
Angel of Retribution não é apenas um grande disco. É um marco na carreira do quinteto britânico. Parece que a banda resolveu pinçar de cada um dos seus grandes discos um elemento de destaque e costura-los de modo a oferecer um disco inovador, mas que jamais abandona a velha pegada da banda. A faixa de abertura é "Judas Rising", uma música extremamente rápida, com direito àqueles maravilhosos agudos de Halford e àqueles riffs maravilhosos que só poderiam ter saídos dos dedos de KK Downing e Glenn Tipton. Engraçado é que eu não conseguia tirar da cabeça, enquanto ouvia essa música pela primeira vez, o pensamento incômodo de que ela provavelmente soaria ainda mais agressiva com Tim Owens.
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Mas qualquer dúvida quanto à voz certa para o Judas desaparece quando começa "Deal with the Devil". É uma música que poderia muito bem estar no Ram it Down, mas que consegue ter uma cara própria. Novamente, muita velocidade e um refrão martelante. Rob está mais contido aqui, mas dá show de interpretação. "Revolution" é a faixa de trabalho, por isso mesmo tem um apelo mais comercial. Plágio? Custo a crer nisto, mas que ela é diferente de tudo o que o Judas costumava fazer isto é inegável. Quem não tem preconceitos contra o Turbo (1986) não vai ter problemas aqui. Ela tem aquela pegada mais cadenciada, mas que não prescinde de guitarras fantásticas. "Worth Fighting For" nos remete imediatamente àquelas músicas que o Judas andou fazendo para comerciais de cigarros. Eu senti muita falta de músicas assim, mais cadenciadas, mas com um ‘punch’ energético comum nesse tipo de música.
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"Demonizer" infelizmente não está sendo executada nos shows da tour (pelo menos isso não aconteceu nos shows que tive notícia até o momento em que redigia este texto) o que é uma pena. Energética e com uma levada de bateria arrepiante, é uma das melhores do álbum. "Wheels of Fire" é daquelas músicas para se ouvir batendo cabeça ao som da caixa da bateria de Scott Travis. O riff de guitarra é uma navalha e os vocais de Halford, que, de modo geral, optou por tons mais baixos não apenas aqui, mas em diversos momentos do disco, soam melhores que nunca. "Angel" é uma típica heavy ballad, com uma interpretação magistral de Halford.
"Hellrider" é um dos pontos fortes não apenas do disco como também dos shows da nova tour. As sucessivas camadas de guitarras sujas da abertura são logo substituídas por um riff inacreditável e pela levada precisa de Ian Hill e Scott Travis. Para gritar junto com Halford no início ao fim. "Eulogy" é outra balada, desta vez mais trabalhada, do ponto de vista instrumental, o que acabou resultando na música mais atípica do disco. Por fim, a longa "Lochness" que alterna climas épicos e guitarras hipnóticas. Halford é insuperável na sua interpretação. Parece que a música é mais longa do que deveria, mas as longas transições instrumentais são belíssimas e indispensáveis.
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O Judas não mudou muito. Está mais moderno, mais pesado parece ter encontrado o caminho certo. Eu sempre tenho a sensação que o heavy metal é exatamente isso que o Judas vem fazendo desde os primórdios da década de 70 e que qualquer coisa além disso soa deslocado e acaba desandando. Não houve necessidade de vocais femininos, teclados ou abstrações. Apenas uma dupla de guitarristas inspirados, um baixista preciso, um baterista veloz e um vocalista não apenas talentoso, mas capaz de diversificar sua voz sem soar auto-indulgente ou chato. Desculpem-me, mas não acho que precise mais que isso. O heavy metal só precisa de duas palavras para ser corretamente compreendido: Judas Priest.
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