Resenha - Dois - Legião Urbana
Por Maurício Antunes Ariede
Postado em 13 de setembro de 2003
Ano: 1986
A Legião Urbana estourou nacionalmente em fins de 1984, com um disco nitidamente calcado em raízes punk e new wave. Porém a consagração viria mesmo com o segundo disco da banda, DOIS, lançado em 1986, em meio a um Brasil que se acostumava com a Nova República e com o Plano Cruzado.
Legião Urbana - Mais Novidades
O disco abre com uma gravação ao vivo do trecho final da música "Será", porém as semelhanças com o primeiro disco não serão muitas, a começar pelo clima folk da maioria das canções e mesmo pelo tom gráfico do álbum.
"Daniel na cova dos leões", cujo título é metafórico, é a segunda "entregada" de Renato Russo sobre sua opção sexual; já em "Soldados", do primeiro LP, ele indiretamente mostrava o que se tornaria explícito em "Meninos e meninas" de 1989: sua homossexualidade. "Daniel...", uma das poucas parcerias com o baixista Renato Rocha, mostra claramente os conflitos de Renato: "Aquele gosto amargo do seu corpo[...]De amargo então, salgado ficou doce", para fechar no deslumbrante final onde fica nítida luta entre o que ele queria ser e o que a sociedade esperava que ele fosse: "Mas tão certo quanto o erro de ser barco a motor e insistir em usar os remos". Vale lembrar que esta canção é de 1985 e foi mixada por Russo (há depoimentos de que durante os intervalos da gravação do primeiro LP, Renato já ensaiava os arranjos de "Daniel...").
"Quase sem querer" é um dos hits deste disco, letra triste, melancólica e poética, tudo misturado num arranjo folk inesquecível. O refrão grava-se automaticamente na cabeça já na primeira audição.
"Acrilic on Canvas" possui um arranjo semelhante aos feitos pela gravadora Factory, que produziu, entre outros, Joy Division e New Order. A letra é obscura e mesmo mórbida, porém o ritmo dançante contagia e alivia um pouco o clima dark da canção.
Ao final do lado A temos vários hits em seqüência, "Eduardo e Mônica" foi feita em 1982 e é baseada na história real do antigo produtor executivo da Legião, Rafael Borges, e sua ex-esposa; Renato compôs esta canção na sua época de "Trovador Solitário" e toca todos os instrumentos da música.
"Central do Brasil", que possui apenas arranjo instrumental, cria um clima triste e esquisito meio a la "final-de-tarde-chuvoso-sozinho-em-casa" que dá o tom para a melhor música do disco (na minha opinião): "Tempo Perdido". Com introdução que lembra a guitarra de "The Headmaster ritual" do disco "Meat is murder" dos Smiths e letra semelhante a um antigo sucesso do Aborto Elétrico, "1977", esta canção escancara a depressão e a crise existencial pela qual passava Renato na época; a voz de Russo novamente lembra Morrissey (a maneira que Renato dançava no palco era nitidamente influenciada pelo líder dos Smiths e mesmo parecida com Ian Curtis), a letra é tristíssima e o final clássico. Logo depois há outro instrumental onde é tocado "Tempo Perdido" só com violões; detalhe: algumas versões do vinil não trazem esta versão, economia de faixas? Esquecimento? Sabe Deus.
"Metrópole" abre o lado B lembrando os bons tempos do punk, a letra foi amenizada, pois a original era mórbida e suicida (há sites que disponibilizam praticamente todas as letras do Aborto Elétrico e mesmo as versões em mp3). "Música Urbana 2" possui um tom obscuro e lembra os tempos de Renato pelas ruas e madrugadas de Brasília, aliás, qualquer um que curte ou curtia sair a noite com amigos vai se identificar nesta canção; o número "2" é devido ao fato de o Capital Inicial ter lançado uma música homônima no seu primeiro LP de 1986, com participação de Renato na composição da letra.
"Andréa Doria" (que conforme este mesmo site já divulgou, é o nome de um navio) é outra música triste, onde é tratado o tema da separação. Renato está incisivo: "Mas percebo agora que o teu sorriso vem diferente, quase parecendo te ferir", para concluir de maneira resignada e melancólica: "Nada mais vai me ferir. É que eu já me acostumei, com a estrada que eu segui com minha própria lei". Talvez seja a segunda música mais deprê do disco. Por fim, "Índios" (com aspas mesmo) fecha o disco e um ciclo; o teclado vai subindo juntamente com a voz de Renato, dando a impressão de que um coro inteiro de "índios" canta junto; o refrão figura entre os mais bonitos e depressivos já compostos por Renato e o final, só com violão e um efeito "vento passando pela cidade", é perfeito.
Após este disco a Legião lançaria "Que pais é este" retomando a linha punk e depois enveredaria por caminhos religiosos e introspectivos. Portanto, "DOIS" torna-se um disco que fecha o ciclo juvenil e inocente da banda, apontando para novos caminhos e novas possibilidades. Além disto, é o disco com mais hits juntos que já ouvi, praticamente todo o álbum é perfeito, coeso e estranho, a começar pela capa e o encarte (no CD a foto do encarte é outra, onde dá pra identificar o rapaz: Marcelo Bonfá) que lembram o clima mórbido de "Closer" (último disco do Joy Division). Pra finalizar fica a questão: o DOIS do título refere-se ao número do Lp, ao casal da capa do encarte ou a nenhum dos dois?
Referências utilizadas: algumas revistas Bizz e ShowBizz, o livreto da lata "Por enquanto" e o livro "Conversações com Renato Russo" (coletânea de entrevistas).
Receba novidades do Whiplash.NetWhatsAppTelegramFacebookInstagramTwitterYouTubeGoogle NewsE-MailApps



O primeiro tecladista estrela do rock nacional: "A Gloria Pires ficou encantada"
Axl Rose ouviu pedido de faixa "esquecida" no show de Floripa e contou história no microfone
A banda desconhecida que influenciou o metal moderno e só lançou dois discos
A melhor música dos Beatles, segundo o Ultimate Classic Rock
Nicko McBrain revela se vai tocar bateria no próximo álbum do Iron Maiden
Documentário de Paul McCartney, "Man on the Run" estreia no streaming em breve
Slash quebra silêncio sobre surto de Axl Rose em Buenos Aires e defende baterista
O convite era só para Slash e Duff, mas virou uma homenagem do Guns N' Roses ao Sabbath e Ozzy
Regis Tadeu explica por que não vai ao show do AC/DC no Brasil: "Eu estou fora"
Organização confirma data do Monsters of Rock Brasil 2026
Janela de transferências do metal: A epopeia do Trivium em busca de um novo baterista
Os 11 melhores discos de rock progressivo dos anos 1970, segundo a Loudwire
Megadeth tem show confirmado em São Paulo para 2026
"Um cantor muito bom"; o vocalista grunge que James Hetfield queria emular
O único guitarrista que, para Lindsey Buckingham, "ninguém sequer chega perto"
Legião Urbana: Um dos mais belos discos do rock nacional
A opinião de Renato Russo sobre uso de homeopatia para dependência química
O show de banda australiana que virou tragédia e matou dois amigos de Renato Russo
O incomum caso de família que fez Renato Russo ter um sobrenome apenas
O elemento em comum entre os nomes Metallica e Legião Urbana, segundo Humberto Gessinger
Pink Floyd: O álbum que revolucionou a música ocidental


