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Resenha - Ville Valo (Carioca Club, São Paulo, 01/11/2023)

Por Marcelo R.
Postado em 19 de novembro de 2023

Ville Valo, ex-vocalista do icônico – e, infelizmente, já saudoso – conjunto finlandês de gothic rock H.I.M, retornou ao universo musical, em carreira solo. Lançou, nesse ano de 2023, sob as iniciais VV, seu álbum de estreia, Neon Noir. O material é, em parte (e, frise-se, apenas em parte), uma revisitação à música do H.I.M, mas com abordagem superiormente mais pop e menos pesada, com uma veia romântica e atmosférica ainda mais presente (em comparação com a música executada por sua banda predecessora).

Foto: Reprodução
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A audição de Neon Noir exige, por certo, mente aberta (e, talvez, algumas repetições, para melhor absorção, compreensão e adaptação ao seu clima).

A proposta musical de Neon Noir direciona-se a uma verve mais sentimental e romântica, sem foco em elementos pesados. Há amplo predomínio de características vivazes e, por vezes, dramáticas, num contrabalanço musical tragicômico (sem preocupação, porém, com peso intenso, excessivo e desnecessário). Há exploração, em detrimento da citada falta de peso, de outros elementos e características musicais, com foco e priorização em belos arranjos de teclado, além de sentimentais riffs e solos de guitarra, todos pródigos e bem encaixados ao longo da audição.

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Ao ouvinte predisposto a encontrar mera continuação do H.I.M, Neon Noir pode soar excessivamente leve (e, portanto, sem impacto). Nesse ponto, é importante salientar que VV contrapõe-se, em parte, à proposta de sua banda anterior. Não é mera continuação do H.I.M. VV, em carreira solo, é entidade autônoma, com personalidade própria, ainda que alguns elementos, naturalmente, sejam aproveitados, captados, revisitados e, assim, percebidos pelo ouvinte, em audição comparativa.

Aliás, nas próprias palavras do vocalista Ville Valo:

"[O álbum Neon Noir] é uma tentativa desesperada de um gótico finlandês em fazer (o filme) ‘Blade Runner’ virar música. Uma mistura de gêneros. É sombrio e melancólico, mas não queria que soasse agressivo ou com abordagem pesada como no HIM. Na realidade, queria que passasse uma sensação mais como um abraço caloroso. E sua sonoridade está mais para um Depeche Mode do que Black Sabbath" (Site Igor Miranda).

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E é sob essa perspectiva – e, sobretudo, sem comparações com o passado – que Neon Noir deve ser ouvido. Arrisco a afirmar que, após algumas audições, esse álbum seja, talvez, o meu favorito de 2023. O tempo dirá.
Pois bem. Após o lançamento de Neon Noir, Ville Valo iniciou turnê mundial para promoção do seu trabalho de estreia solo. O Brasil, felizmente, integrou a rota.

Adquiri meu ingresso poucas horas após o anúncio do show em terras tupiniquins. E, nessas poucas horas, as vendas avançaram rapidamente, em ritmo quase vertiginoso, ao terceiro lote! Soube que, poucos dias depois, os tickets simplesmente se esgotaram.

Aguardei ansiosamente pelo tão desejado e esperado dia do show, 1º de novembro. E não me arrependi por contabilizar os minutos.

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O concerto estava previsto para início às 21h00min. Cheguei à tradicional casa de show Carioca Club pouco antes desse horário, numa chuvosa noite de quarta-feira pré-feriado.

O local é relativamente pequeno e, assim, o show pode ser acompanhado com tranquilidade e com perfeita visão do palco, independentemente da posição das pessoas (exceto em alguns pontos específicos, onde algumas colunas prejudicam parcialmente a visão do palco).

Com poucos minutos de atraso – inferior a 10min –, a banda assomou ao palco, antes mesmo do vocalista, verdadeiro showman da noite. Iniciou, então, o despejo de notas da animada Echolocate Your Love, canção de abertura do show (e do novo álbum).

Pouco antes do início da parte cantada da faixa, Ville Valo emergiu ao palco, imponente, sob intensa saraivada de aplausos de uma plateia efusiva, efervescida e empolgada, que preencheu aquela casa de eventos num show rapidamente esgotado.

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Com um breve e tímido cumprimento de "boa noite" em português, Ville Valo iniciou o desfile de canções.

Para a minha grata surpresa e alegria, o público cantou, em uníssono, em alto volume, as faixas solo de Ville Valo (lançadas recentemente, nesse ano de 2023), fazendo coro ao vocalista, a todo o momento.

Era, então, perceptível e notório que plateia presente, que tornava repleto todos os poros do Carioca Club, não estava ali apenas para acompanhar uma apresentação em tom saudosista (simplesmente aguardando a sequência de canções do H.I.M, intercaladas às músicas solo). O público, ao contrário, dominava, na ponta da língua, as músicas novas, cantadas, todas animadamente, com uma precisão que parecia ensaiada.

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Como antecipado no parágrafo anterior, Ville Valo adotou estratégia bastante interessante, que funcionou excelentemente ao vivo. Imaginando, talvez, que o público ainda estivesse pouco acostumado às suas canções solo recém-lançadas (e, assim, para evitar possível esfriamento do show, que, porém, não aconteceu), Ville Valo manteve a empolgação e a temperatura altas ao intercalar músicas solo com canções do H.I.M, tradicionalmente mais conhecidas pelo público.

É dizer: a cada canção de Neon Noir, a banda tocava, em sequência, uma música do H.I.M.

E, claro, funcionou!

Encerrada a faixa de abertura, o conjunto emendou com Poison Girl, grande hit do H.I.M. A faixa, já na introdução e nas primeiras notas, deixou a plateia em polvorosa.

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E assim seguiu o show, com essas intercalações "VV solo versus H.I.M".

Vale, aqui, o registro de depoimento pessoal, com a licença do leitor: minhas memórias com o H.I.M remontam e coincidem, praticamente, com o período em que comecei a ouvir rock e metal, há várias décadas. Presenciar, então, a poucos metros de distância, o mentor dessas composições, em pessoa, desfilando tantos clássicos que me acompanharam ao longo da vida (e que contribuíram à própria formação do meu gosto musical) trouxe-me tamanho grau de emoção e satisfação, que eu simplesmente não conseguiria transmitir e reproduzir em palavras. Lembrança, por certo, impregnada com brasa quente na memória e no coração!

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Regressando ao show.

Ville Valo é bastante simpático – esbanjando sorrisos à plateia, do início ao fim –, mas pouquíssimo comunicativo. As músicas eram tocadas sequencialmente, sem intervalos ou interrupções.

Ainda, Ville Valo não se movimentava no palco. Posicionou-se ao seu centro e lá permaneceu. Não anunciava as canções e, na verdade, praticamente não dialogou com a plateia, tendo apenas, em poucos momentos específicos (por apenas duas ou três vezes), dirigido curtíssimas frases ao público.

A falta de diálogo não prejudicou o show, nem denotou falta de carisma do vocalista. Ao contrário: além do sorriso constante que estampava seu rosto, Ville Valo solicitou, por diversas vezes ao longo do evento, que sua equipe entregasse garrafas de água ao público posicionado mais proximamente ao palco, evidenciando, com esse gesto, atenção e carinho que funcionaram, em parte, como espécie de substituição às suas poucas sílabas.

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De todo modo, a comunicação escassa foi plenamente compensada por um show longo, que somou 19 músicas e percorreu praticamente todo o novo álbum. Apenas Vertigo Eyes foi excluída e, assim, não tocada num segundo bis (realizado em alguns países), embora estranhamente impressa e prevista no set-list do show no Brasil.

Do H.I.M, Ville Valo mapeou diversas fases e períodos. Ao longo das intercalações realizadas, já mencionadas, a banda entregou ao caloroso público os clássicos mais absolutos e inquestionáveis do conjunto, transitando por faixas como The Funeral of Hearts, Join Me In Death (ambas recebidas com enorme alvoroço pelos presentes) e Buried Alive by Love, ao lado de canções mais contemporâneas (e com sonoridades mais modernas), como Rip Out the Wings of a Butterfly e The Kiss of Dawn.

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A primeira parte do show encerrou-se, então, com Saturnine Saturnalia.

Silencioso, Ville Valo saiu do palco enquanto a banda tocava o trecho instrumental da parte final dessa canção. Após, com o mesmo mutismo, os demais integrantes também deixaram o palco.

Aos brados da plateia, que sonoramente clamava pelo retorno de Ville Valo, o conjunto ressurgiu alguns minutos mais tarde para um caprichado bis, ao qual foram reservadas quatro excelentes canções: In Trenodia, a agitada e animada Soul on Fire (H.I.M), Baby Lacrimarium e When Love and Death Embrace (H.I.M).

A escolha de When Love and Death Embrace para encerramento do show foi, em minha avaliação, certeira. A canção é pesada, densa, longa e possui altíssima carga emocional, tanto na estrutura instrumental quanto no conceito da letra. Detém, ainda, um refrão marcante, daqueles que induzem, naturalmente, a uma cantoria em coro pela plateia. E foi precisamente o que aconteceu.

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Nos minutos finais dessa faixa, enquanto a banda tocava o trecho instrumental que antecede o seu encerramento, Ville Valo novamente saiu do palco, silencioso. E, dessa vez, para não mais voltar.

O conjunto terminou a execução da música, deixou os instrumentos ao palco e, também sem delongas ou cumprimentos demorados, saiu, discreto, do palco.

As iluminações na casa permaneceram idênticas por longo período, deixando o público esperançoso por um segundo bis (como, aliás, aconteceu em alguns países). Por considerável intervalo, a plateia permaneceu no Carioca Club e, inclusive, bradou, sonora, pelo retorno de Ville Valo e de sua banda ao palco. Sem êxito, dessa vez.

Vertigo Eyes, canção do novo álbum, estava impressa no set-list e, assim, prevista para encerramento do show, num segundo bis. A manutenção da mesma iluminação (com cores frias) após o fim do primeiro (e, infelizmente, único) bis era indício de que a banda possivelmente voltaria (como, aliás, indicava o set-list (via setlist.fm). Algo, provavelmente, aconteceu nesse intervalo e o conjunto decidiu não retornar ao palco.

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Então, sem despedida formal por parte da banda, o público, um pouco confuso, apenas percebeu e se convenceu de que o show terminara quando, algum tempo depois, diversas pessoas surgiram no palco e começaram a desmontá-lo.

Sem problemas! Afinal, Ville Valo entregou um show digno e emocionante. Cantou com vontade e afinação. Foi, ainda, acompanhado por uma banda que executou as faixas – tanto aquelas do álbum solo quanto as da era H.I.M – com extremas técnica e precisão ao longo de pouco mais de 1h30min de concerto.

As 19 canções apresentadas percorreram praticamente a integralidade do álbum solo de estreia, Neon Noir, e mapearam as principais fases da carreira do H.I.M, com uma seleta sequência de músicas, certeiramente escolhida. As melhores, por certo, de cada fase da banda predecessora de Ville Valo.

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Um show que, inquestionavelmente, lavou a alma dos fãs mais saudosistas – nostálgicos desde o encerramento do H.I.M – e que, ao mesmo tempo, demonstrou o vigor das canções novas de Ville Valo, excelentemente tocadas ao vivo por um frontman em plena forma e ainda pródigo de ideias, exteriorizadas na forma de belas canções.

É digno de registro, porém, um ponto. Em alguns momentos – ao menos do local onde me posicionei –, tive a impressão de que o som do baixo e, principalmente, o volume da bateria estavam altos. Nada, porém, que prejudicasse a qualidade e a experiência de assistir a esse memorável show naquela chuvosa quarta-feira, lúgubre tal como o conceito de letras de Ville Valo.

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Encerrada a era H.I.M há alguns anos, espera-se que Ville Valo continue sua exitosa trajetória, agora em carreira solo, com o lançamento de álbuns com a mesma qualidade de Neon Noir. E, claro, com shows tão vigorosos quanto esse entregue, há poucos dias, aos apaixonados fãs brasileiros.

O público, já ansioso, assim o espera. E que não demore.

Set-list:

1. Echolocate Your Love
2. Poison Girl (HIM)
3. The Foreverlost
4. The Funeral of Hearts (HIM)
5. Neon Noir
6. Join Me in Death (HIM)
7. Heartful of Ghosts
8. Rip Out the Wings of a Butterfly (HIM)
9. Salute the Sanguine
10. The Kiss of Dawn (HIM)
11. Run Away From the Sun
12. Buried Alive by Love (HIM)
13. Loveletting
14. Right Here in My Arms (HIM)
15. Saturnine Saturnalia

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Bis:
16. In Trenodia
17. Soul on Fire (HIM)
18. Baby Lacrimarium
19. When Love and Death Embrace (HIM)

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Sobre Marcelo R.

"Marcelo R. é natural de Itu. Da fama de sua cidade, herdou alguns exageros, como o gosto pela música e pela literatura. Ávido leitor e aficionado por uma imensa gama de subgêneros do rock, possui especial paixão pelo metal nacional, do qual é incansável apoiador. É colecionador de discos, já tendo completado algumas discografias, como a do Katatonia e a do Bruce Dickinson. Nas horas vagas, é um despretensioso escritor, aventurando-se especialmente em resenhas de livros e de música. Colabora com a página Rock Show, sediada no site Medium. É formado em Direito."
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