Psicodélico, Steve Vai deixou plateia chapada no Best of Blues and Rock
Resenha - Steve Vai (Best of Blues and Rock, São Paulo, 03/06/2023)
Por André Garcia
Postado em 07 de junho de 2023
Um dos maiores guitarristas de sua geração, Steve Vai surgiu em 1980 tocando na banda de ninguém menos que o cientista louco musical Frank Zappa. A seguir, ele despontou como um dos maiores nomes da era pós-Eddie Van Halen, chegando a tocar com David Lee Roth. Como se não bastasse, na década seguinte, em carreira solo, terminou de se consagrar como guitar hero ao lado do amigo de infância Joe Satriani.
Seu lançamento mais recente é "Vai/Gash" (2023), uma homenagem ao bom e velho glam rock oitentista. Mas o que o trouxe ao Best of Blues and Rock foi a turnê de seu último trabalho solo instrumental, "Inviolate" (2022), o primeiro desde "Modern Primitive" (2016). Em São Paulo o guitarrista fez o primeiro show da perna sul-americana da Inviolate Tour, cuja maior atração vem sendo seu insano brinquedo novo: a Hydra — a guitarra de três braços.
Steve Vai subiu ao palco pontualmente às 18h40, e foi recebido pela área externa do auditório do Ibirapuera lotada. Quando acesso minhas recordações daquele show, é difícil acreditar que eu não estava chapado, mas eu estava sóbrio.
Fotos: André Velozo
Na coletiva de imprensa, ele falou sobre a importância de pensar o show como um espetáculo de entretenimento. Faz sentido, afinal de contas, é para isso que as pessoas saem de suas casas ao invés de simplesmente ouvir o disco. E ele não estava brincando. Já em sua entrada no palco, precedida por barulhinhos e uivos de sua guitarra, ele parte para a ignorância e mostra por que está a tanto tempo no rol dos maiores. Se o show tivesse sido só aquela primeira música, já teria valido a caminhada da estação AACD até o auditório do Ibirapuera pelo portão 6.
Já desde o começo, fica claro como Vai tem mudado com o tempo, e o quanto tem sido interessante ver ele envelhecer (como o vinho). Nem parece mais aquele shredder que nos anos 80 parecia um Eddie Van Halen ligado no 220. Hoje em dia, ele está numa onda mais Jeff Beck, está mais interessado em extrair sons da guitarra do que em escalas, velocidade ou técnicas avançadas. Assistir a um virtuoso solar por um show inteiro pode ser enfadonho, mas não com Vai, ele se especializou em fazê-lo de forma a entreter até leigos musicais. Ele parece nunca ter tocado tão lento, mas parece nunca ter tocado tão bem.
Sobre o palco, essa sua nova versão parece um mágico apresentando um espetáculo de ilusionismo sonoro. Ou um encantador de serpentes (vestidas com camisas pretas de banda). A plateia virou um mar de cabeças paradas e olhares fixos no palco. O guitarrista parece ser capaz de extrair da guitarra todo e qualquer som que ele conseguir imaginar. Por vezes ele parece equilibrar a guitarra a uivar no ar enquanto dança ondulando o outro braço no ar. Dobrando ondas sonoras no ar, como um grande teremim. Isso é o se tornar um com o instrumento a que se referia Jeff Beck.
Ao contrário de Tom Morello, Steve Vai entendeu a importância de um bom show de luzes na construção do show. Mais que uma banda muito bem ensaiada, é um espetáculo meticulosamente concebido. Dobrar ondas sonoras. Tudo isso é colorido pelo bem feito uso da ótima iluminação do evento. Ora as luzes pareciam responder ao som da guitarra; ora pareciam controladas pela bateria; ora telecinese.
"Greenish Blues" foi dedicada a Buddy Guy, que subiria ao palco a seguir para fechar a segunda noite. Vai disse ser um privilégio para ele sequer dividir o cartaz com um dos maiores de todos os guitarristas, um dos músicos que influenciaram Jimi Hendrix. "É impossível quantificar as contribuições que esse cara deu a nossa querida guitarra", concluiu.
Após um solo de bateria, o palco escurece. Mistério. E eis então que lá vem a Hydra, o momento mais aguardado e ponto alto do show. Ele só não toca os três braços ao mesmo tempo por falta de mãos, mas em diversos momentos ele toca com uma mão em cada braço. Dura apenas uma música, mas é intensa e acrobática.
É difícil algo vir a seguir sem soar como um anti-climax, mas Vai tirou da cartola um técnico de som que ele disse ter acabado de descobrir que canta ópera. Com sua participação especial, o show foi encerrado com "For the Love of God" — metade cantada em italiano, metade instrumental.
Apesar da reverência, um número considerável dos que foram ao festival para assistir a Steve Vai, foram embora sem esperar que Buddy Guy subisse ao palco. Não sei se eles não gostam de blues ou se acharam que seria um anticlimático… Só posso dizer com certeza que perderam. Cada um à sua maneira, ambos são virtuosos, e lendas vivas.
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