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SP Trip: um ano da estreia do The Who no Brasil

Resenha - SP Trip (Allianz Parque, São Paulo, 21/09/2018)

Por Leonardo Daniel Tavares da Silva
Postado em 22 de setembro de 2018

Nesta sexta-feira, 21 de setembro, a primeira apresentação da icônica banda THE WHO no Brasil completou um ano. O show aconteceu no Allianz Parque e foi parte das atrações do festival SP Trip (será que já podemos esperar por um SP Trip 2). À época, além do Whiplash e diversos outros veículos especializados, estavam lá a Metal Militia Web Radio. A primeira noite do Festival SP Trip foi de tirar o fôlego. Três grandes nomes, de três gerações diferentes, se apresentaram para um público que, embora não tenha lotado o Allianz Parque até a tampa (afinal, uma quinta-feira ainda é uma quinta-feira) foi bastante considerável. E por ser também a primeira vez que os lendários THE WHO, da trinca de ouro da invasão do rock britânico dos anos 60 ao lado de BEATLES e STONES, tocaram na América do Sul, o estádio do Palmeiras recebeu também torcedores de times de vários outros estados do Brasil e dos arredores. Por motivo de força maior, a rádio encerrou as atividades, mas os momentos que passamos como parte da equipe ficarão para sempre. E um aniversário desses, bicho, tem que ser lembrado e comemorado. Lembre aqui como foi a estreia do THE WHO (impossível não juntar os dois artigos na mesma frase - "o" e "the" - não vamos nos curar desse vício) no Brasil. Confira também como foram as apresentações de ALTER BRIDGE e THE CULT no texto publicado originalmente no site da Metal Militia. As fotos são de as fotos de Ricardo Matsukawa, cedidas gentilmente pela Mercury Concerts.

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ALTER BRIDGE

O ALTER BRIDGE subiu ao palco pontualmente às 18:15. Aliás, pontualidade foi a tônica de todos os shows na primeira noite, então torna-se desnecessário repetir isto aqui. O público ainda era muito pequeno, o que não quer dizer que a banda não tenha apelo, mas por ser praticamente fim de expediente em São Paulo, a cidade do trânsito mais cruel do Brasil (embora muitas outras capitais sonhem rivalizar com ela). O quarteto, formado pelos ex-CREED Mark Tremonti (g), Brian Marshall (b) e Scott Phillips (d) e por Myles Kennedy (mais conhecido por ser o vocalista da banda solo de SLASH), começou o show com "Come to Life", de seu segundo álbum, "Blackbird" (2007), e logo emendou "Addicted to Pain", do "Fortress" (2013). Myles disse que estava feliz por "finalmente, depois de 13 anos, conseguir tocar no Brasil", antes do público cantar junto "Ghost of Days Gone By". Em seguida, a intro de "Cry of Achilles" foi acompanhada com palmas, um dos pontos altos do show, uma canção em que cada integrante teve seu momento de brilhar (Tremonti mais que um). E é o guitarrista que canta a primeira parte de "Crows On A Wire", do disco mais recente "The Last Hero" (2016). E apesar deste ser o nome também da turnê que trouxe o AB ao Brasil, esta é a única do álbum.

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O show segue com "Isolation" e "Blackbird", esta com um trecho da clássica canção homônima dos BEATLES na introdução. Mais emocional, a canção tem um solo arrasador de Tremonti. O guitarrista é, sem dúvida alguma, o grande destaque da banda, com seus solos, ora fritadores, ora cheios de feeling. Quase não se consegue perceber do CREED, que alçou a maior parte do quarteto ao estrelato, a não ser talvez em pontos isolados de "Open Your Eyes" ou "Metalingus". Fechando o show, Myles Kennedy canta "Rise Today" sem a sua guitarra, o que lhe dá mais liberdade para passear pelo palco. E talvez seja isso que falte à banda, porque, sim, falta alguma coisa, sabe? Com quatro integrantes absurdamente técnicos (e muito bons no que cada um faz), a liberdade que um frontman "despido" de guitarras tem alavancaria a troca entre banda e público, dando mais emoção ao jogo e faria com que parecesse menos uma aula e mais um show de rock como deve ser. Na despedida Myles falou o quanto estava honrado por dividir o palco com THE CULT e THE WHO e, claro, pelo público que foi vê-los.

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THE CULT

Até o início do show do THE CULT, os alto-falantes do ALLIANZ PARQUE só tocaram THE DOORS. Ora, Ian Astbury, vocalista, chegou a cantar em turnês do próprio THE DOORS, substituindo o falecido Jim Morrisson. Ele já chega suado para sua apresentação quando os acordes de Billy Duff deram início à "Wild Flower". Este, om uma guitarra que mais parecia uma geladeira. Branca, grande, linda. E Duff dando uma de Townshend, com seus movimentos de girar o braço antes de atingir a nota. E não há como negar, o quarteto empolga muito mais o público com seu rock and roll pesado. Seguem "Rain", "Dark Energy", do disco novo, que começou com Ian puxando um "olê olê olê Brasil", "Lil' Devil" e "Peace Dog", a "Peace Frog" do CULT.

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Agora com Damon Fox no teclado, "Deeply Ordered Chaos", viajandona e cheia de efeitos, baixa um pouco o ritmo, mas não a potência. A música é do disco novo, "Hidden City", lançado no ano passado e cuja imagem da capa, exibida no telão de fundo de palco, parece saudar a primavera, que chega justamente naquela data. Na letra, referências à violência na Europa, aos ataques terroristas.

Já na pesada "The Phoenix", o baterista John Tempesta arrasa num duelo frenético com Duff. Mas Ian não estava satisfeito com parte do público, mais morno. "Esse é o Brasil, certo? Não parece. Vocês tem certeza? Porque não parece o Brasil pra mim", reclamou o vocalista. "Representem. O que está acontecendo?", ele continuou. E ainda chamou o público de preguiçosos. Segue o show com "Rise" e ele joga um pandeiro para o público, outro ele quebra até ver que a instigada surtira efeito e concluir "agora sim, estamos no Brasil".

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E o Allianz parque explode na hora que eles voltam do interlúdio psicodélico de "Sweet Soul Sister". Mas Ian ainda reclama de alguém digitando num celular: "Deixe pra escrever pra sua mãe depois". Claro, dali a pouco seria hora de "She Sells Sanctuary", certamente uma das mais esperadas do show, assim como "Fire Woman", que termina com outra exibição fantástica de Tempesta. Temos que fazer um parênteses, aqui: eu que sempre reclamo das imagens nos telões (quantas vezes você já não ouviu um solo de guitarra, baixo ou bateria enquanto nos telões aparece apenas o vocalista... tomando água?), tenho que parabenizar a direção de imagem do show, bem sincronizada com os acontecimentos de palco.

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O show chega ao fim com "Love Removal Machine". Ian pede um pandeiro a algum roadie, joga para o público. Pede outro. Joga também, passando poucos segundos com cada um. Derruba o pedestal. Dá trabalho pra produção. Ian ainda conectou o "Love" de sua canção ao "Love" de "Love, Reign O'er Me", da do WHO e declarou ser uma honra e privilégio dividir o palco com Daltrey e Townshend, despedindo-se com "tenham uma viagem de sonhos, amamos vocês". Estranho pra quem reclamara tanto. Mas a experiência sonora realmente valeu. Não para todo mundo, senão Astbury não teria do que reclamar, mas um show desses é um verdadeiro "Dor nos Pés" Removal Machine. Plenamente revigorante.

THE WHO

No intervalo, a história do THE WHO é exibida na tela. Quando a foto de Keith Moon aparece em destaque e com ele sozinho na tela, o público responde com muitos aplausos.

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E quando chega a atração principal, o THE WHO, hoje apenas com Roger Daltrey e Pete Townshend da formação original, o público enlouquece. E com Daltrey já fazendo suas brincadeiras com o cabo do microfone, o WHO traz clássicos atrás de clássicos. "I Can't Explain", "The Seeker", "Who Are You"... e temos um estádio inteiro cantando um monossílabos: "Ru Ru", "Ru Ru". "The Kids Are Alright" também vem.

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"São Paulo, bom ver vocês" são as primeiras palavras do WHO no Brasil, depois de mais de 50 anos (50, eu disse 50) de carreira. Daltrey diz "Esta é a primeira vez na América do Sul, primeira vez no Brasil", enquanto Townshend completa "estamos muito felizes de estar aqui". Os clássicos continuam com "I Can See For Miles" (e o público se embriagando de tanto cantar "mals and mals and mals and mals") e um dos maiores, "My Generation", com direito a trechinho de "Cry If You Want". Não era só a geração de Roger e Pete (ambos na casa dos 70 anos) que estava emocionada, mas ainda umas três ou quatro que viriam depois e estavam ali no Allianz Parque. Sabendo disso, Daltrey ainda apontou o microfone para o público cantar em uma parte de "Bargain".

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Um grande olho azul no telão central não deixa dúvidas. É a vez de "Behind Blue Eyes", que o público canta inteiramente. A canção que o LIMP BISKIT tentou mas não conseguiu estragar é seguida de "Join Together". Mais seis pessoas "se juntaram" à banda hoje além de Daltrey e Townshend. Um deles, Simon Townshend, irmão de Pete, outro, com DNA BEATLE, o filho de Ringo, Zaq Starkey. Talvez antes, o WHO conseguisse incendiar plateias com uma formação mais coesa, o quarteto que também incluia Keith Moon e John Entwistle, mas Roger e Pete já não usam terninhos mod há muito tempo, mas camisas cujos botões quase sempre os traem. É possível perceber que algumas notas, que antes sairiam da guitarra de Townshend hoje saem das cordas do instrumento de seu irmão ou das teclas de algum dos teclados.

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Depois de "You Better You Bet", Townshend, com um violão, avisa "vamos tocar quatro... eu acho que quatro" e confere no set, "três canções do Quadrophenia". E inicia "I'm One", seguida da instrumental "The Rock". No fundo, imagens do tempo da Guerra do Vietnã... a menina queimada... Nixon... E o próprio WHO... também manchetes de jornais, a morte de Lennon, Elvis e Moon... a guerra fria, Reagan e Gorbachov... o muro... o anônimo que desafiou os tanques na Paz Celestial... Clinton, Diana... 2000, a esperança... o 11 de setembro... um conjunto de imagens de causar calafrios. Imagens que chegam até os dias de hoje, com a crise dos refugiados, Paris e os atentados... Essas são as palavras desta canção instrumental. Essas são as palavras do rock. E é por isso que gostamos de rock. Porque para nós, a vida, o mundo é mais que os temas rasos abordados nos outros estilos (eu ia mencionar os nomes aqui, mas, não, não vamos sujar uma resenha de um show do THE WHO com isso). John Corey, solando no teclado faz a transição para "Love, Reign O'er Me" e Daultrey volta ao palco. É hora de gritar, de ficar rouco,e perder a voz e, porque não, chorar. E o Allianz Parque gritou amor.

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Com 50 anos de carreira, o WHO tem canções sessentistas, até inocentes, como "The Kids Are Alright" e modernosas como "Eminence Front", a primeira depois da sessão "Quadrophenia". Ela vem seguida de "Amazing Journey" e "Sparks", com Townshend num duelo com "Ringoson", que honra o nome do pai e a posição em que está.

Um dos momentos mais esperados no entanto é "Pinbal Wizard". E o público responde lançando balões vermelhos. Recepção menos calorosa não teve "Baba O'Riley", recebida com gritos já em sua introdução "video-gamica" e com luzes de palco desligadas. Quem estava bem perto do palco pode notar um fato curioso. Mesmo com as luzes desligadas, ainda era possível ver Townshed, 72, dançando, sem se conter na espera para disparar um de seus power chords. E foi mais gritaria geral quando ele finalmente começou. Que oportunidade. Que privilégio presenciar um momento assim. É só o que dá pra pensar.

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Won't Get Fooled Again, fecharia o show. Seria o último power chord. Townshend ainda desliza palo palco e volta com a vitalidade de um garoto, dos anos 60, do princípio do THE WHO. Que inveja. É o que dá pra pensar agora.

Na apresentação da banda de apoio, Simon Townshend(g), John Button (b), John Corey, Frank Simes e Loren Gold (k), Zaq Starkey é o mais aplaudido. Claro, é um pouco dos BEATLES no THE WHO. "Estamos tão gratos do nosso primeiro show na América do Sul. É tão amável estar com vocês", despede-se Pete. E o público continua respondendo com "Ru ru", "Ru ru".

Quem tem acompanhado os setlists do WHO nos últimos tempos sabia que tudo terminara ali. Mas, mentira, quem sabia de tudo não sabia de nada. Eles voltam.

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Do verso "Why Should I care" (Por que eu deveria me importar?) de "5:15", Townshend aproveita para declarar no fim da canção-extra: "Eu deveria me importar. Eu deveria me importar por causa de vocês". Daltrey complementa com "vejo vocês alguma vez". É a promessa. Ainda veremos o WHO novamente. Torçamos para que sim.

Eles já iam embora. Zakk saltitante já começara a jogar as baquetas, mas a intenção de Townshend era outra. Ele já pega outra guitarra e o público de São Paulo é presenteado com mais um bônus, "Substitute", clássico que, claro, seria uma grande ausência.

Agora não tem jeito. Ao fim da canção do Meaty, Beaty, Big and Bouncy, de 71, Townshend exorta o público a ir pra casa. "Vão Pra Casa, Vão Pra Casa, Vão Pra Casa". Se a gente não for você continua tocando? Então vamos ficar. Bem que poderia ser assim, não? E aquela noite mágina no Allianz Parque não terminaria nunca.

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Agradecimentos:

Simone e Denise Catto, pela atenção e credenciamento.
Mônica Simonsen Porto e Ed Rodrigues, pela parceria de sempre.

Setlist:
1. I Can't Explain
2. The Seeker
3. Who Are You
4. The Kids Are Alright
5. I Can See for Miles
6. My Generation (com trecho de "Cry If You Want")
7. Bargain
8. Behind Blue Eyes
9. Join Together
10. You Better You Bet
11. I'm One
12. The Rock
13. Love, Reign O'er Me
14. Eminence Front
15. Amazing Journey
16. Sparks
17. Pinball Wizard
18. See Me, Feel Me
19. Baba O'Riley
20. Won't Get Fooled Again

Bis:
21. 5:15
22. Substitute

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Sobre Leonardo Daniel Tavares da Silva

Daniel Tavares nasceu quando as melhores bandas estavam sobre a Terra (os anos 70), não sabe tocar nenhum instrumento (com exceção de batucar os dedos na mesa do computador ou os pés no chão) e nem sabe que a próxima nota depois do Dó é o Ré, mas é consumidor voraz de música desde quando o cão era menino. Quando adolescente, voltava a pé da escola, economizando o dinheiro para comprar fitas e gravar nelas os seus discos favoritos de metal. Aprendeu a falar inglês pra saber o que o Axl Rose dizia quando sua banda era boa. Gosta de falar dos discos que escuta e procura em seus textos apoiar a cena musical de Fortaleza, cidade onde mora. É apaixonado pela Sílvia Amora (com quem casou após levar fora dela por 13 anos) e pai do João Daniel, de 1 ano (que gosta de dormir ouvindo Iron Maiden).
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