Paul McCartney: 50 mil pessoas extasiadas em Fortaleza
Resenha - Paul McCartney (Arena Castelão, Fortaleza, 09/05/2013)
Por Leonardo Daniel Tavares da Silva
Postado em 11 de maio de 2013
Em 9 de julho de 1980, quando eu tinha quase três anos, meu pai e minha mãe vieram a Fortaleza para ver o Papa João Paulo II, que participaria de uma celebração que reuniu 120 mil pessoas, o maior público da história do estádio. Nunca fui um primor de católico, mas, apesar de não ter podido ir com eles, esse dia, que, com certeza marcou as suas vidas, esteve sempre presente em minha infância, através das fotos em uma das revistas da época e das histórias contadas. Faltando exatamente um mês para esta data completar trinta e três anos, um outro evento de semelhante magnitude ocorreu tendo como cenário o mesmo estádio Castelão, agora transformado em Arena Castelão e ostentando orgulhoso o posto de primeiro estádio a ficar pronto para a Copa do Mundo do ano que vem. E, coincidentemente, agora são os pais do meu filho (que tem quase a mesma idade que eu tinha em 1980) que vão participar desta festa, junto com sua tia preferida. Assim como eu, em breve ele saberá que participamos de, talvez, o maior evento que a cidade receberá nos próximos anos, isso dito mesmo com a proximidade das partidas das copas (das Confederações no próximo mês e do Mundo em 2014).
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Primeiro, um aviso. O texto é longo. É impossível reunir em um único texto toda a emoção daquela noite se ele não for tão longo quanto os shows de PAUL MCCARTNEY. E a emoção de poder ver o ex-Beatle tão de perto, em sua própria cidade tomou conta dos fortalezenses desde que os primeiros rumores de uma possível vinda começaram a surgir. Com as obras da Arena Castelão em estágio muito avançado, chegou-se a cogitar que ele faria a inauguração do estádio, o que não aconteceu. Felizmente, a confirmação logo chegaria, fazendo com que muitas pessoas, que são fãs dos quatro de Liverpool desde o útero, começassem a contar os dias até o tão sonhado evento. Durante os dias que antecederam esta quinta-feira, comentários sobre o show eram frequentes nas redes sociais (tanto as virtuais quanto as reais).
Os primeiros a ver PAUL MCCARTNEY no palco foram os privilegiados que participaram do Hot Sound, que puderam acompanhar a execução de cerca de doze músicas, algumas quase nunca vistas em shows ao vivo, entre covers de CARL PERKINS e músicas dos WINGS que ficaram de fora do set list oficial e apenas "All My Loving" e "Lady Madonna" em comum com o show que seria acompanhado por todos logo mais.
Contrariando a pontualidade britânica, houve algum atraso no Hot Sound, o que provocou outro atraso na abertura dos portões. Mas, quem já pode entrar nessas últimas horas da tarde de quinta-feira nem poderiam imaginar o tamanho do caos que se instalava no resto da cidade. Alguma dificuldade em chegar ao Castelão já era prevista e é perfeitamente normal, uma vez que o show acontecia em pleno dia de semana (a produção tinha tentado de toda forma transferir o show pelo menos para a sexta-feira, mas a agenda do cantor já estava comprometida) e a cidade, apesar de ter o primeiro estádio brasileiro pronto para as copas, ainda engatinha no quesito mobilidade, após oito anos de completo abandono. O estádio estava pronto, mas o entorno ainda estava tomado pelas obras que deveriam ter ficado prontas bem antes. Por isso, saímos o mais cedo que conseguimos e, felizmente, não sentimos os efeitos negativos do trânsito que em poucas horas imobilizariam milhares de pessoas. Confortavelmente instalados na sala de imprensa, os relatos que recebíamos eram os piores possíveis. Pessoas presas em engarrafamentos intermináveis começavam a ficar desesperadas, com o ingresso na mão e sem poder sequer chegar perto do local onde o show iria acontecer. Mesmo pessoas que não iriam ao show puderam "participar" do show, ficando presas em engarrafamentos intermináveis ao tentar voltar para suas casas após um dia de trabalho. Outros desistiam de chegar aos bolsões de estacionamento e chegavam a deixar os carros bem longe do estádio e faziam o longo trajeto a pé. Outros chegaram a desistir do show, amargando além de perder a oportunidade de ver o ex-BEATLE ao vivo, a perda do valor pago para isso. Ainda se ouviu falar de pessoas que só conseguiram chegar às 23h, quando o show já chegava à sua segunda metade. Da AMC, autarquia que controla o trânsito da cidade, ninguém tinha notícia.
Vendo dessa forma, o incomum atraso para o início do show foi, de certa forma, muito bem vindo. Somente às 21:38, quando ninguém suportava mais os remixes (que sugestivamente terminaram com "The End") que preenchiam o tempo até o início do show, sem conversa, sem aviso, as luzes apagam e quando acendem novamente, Abe Laboriel Jr (bateria e simpatia), Paul "Wix" Wickens (teclados e emulando todos os metais), Rusty Anderson (guitarras), Brian May (o curinga de PAUL) e, claro, o próprio PAUL com seu Höffner de meio século já estão no palco. Parecia mentira, mas era verdade, era realidade. Estávamos, finalmente, frente a frente com um BEATLE, um membro do grupo que revolucionou a música do século XX. Quantas pessoas tiveram a chance de ouvir alguma música executada por Mozart, Bach ou Beethoven nos séculos anteriores? Agora, 50 mil tinham agora a chance de ver, em carne e osso, um dos maiores compositores do nosso tempo.
Como esperado, o show começou com "Eight Days A Week" e "Junior Farm", como em BH e Goiânia. Não havia o impacto da primazia que tiveram os mineiros, mas sabíamos (e aguardávamos ansiosos) que pudesse haver alguma surpresa. Ao final de "Junior Farm", o Sir, extremamente simpático, apesar de já demonstrar dificuldade em suportar o extremo calor da cidade, tira o colete azul enquanto se dirige pela primeira vez ao público.
"Oi, Fortaleza. Boa noite, cearenses. We gonna have a party tonight", e dispara "All My Loving", se dirigindo aos cearenses mais uma vez ao final. "Obrigado. Thank you. E ótimo estar de volta ao Brasil". E vem "Listen What The Man Says", com sua forte levada pre-disco, levantando no ar o baixo em formato de violino ao final e fazendo a primeira das muitas trocas de instrumento que faria ao longo da noite, recebendo a belíssima guitarra colorida, com a ilustração "And The Crowd Goes Wild". Registre-se que o Höfner tem um pequeno ferimento em seu corpo, marca dos anos de uso e que o faz ficar ainda mais valioso para os beatlemaníacos, como se isso fosse possível.
"Finalmente o Paul veio ao Castelão. Esta noite vou falar um pouco de português, espero nao falar bobagem". E comecam os acordes marcantes de "Let Me Roll It". Tera ele desafinado nessa música? Não, um BEATLE não desafina, mas a idade enquanto algo inegável parece não afetar o Sir de 71 anos, que, se não corre pelo palco como um menino, não demonstra cansaço nem incômodo maior que o causado pelo calor que molhava completamente sua camisa branca. Abe Laboriel Jr castiga seu Kit enquanto o próprio PAUL esbanja talento solando "Foxy Lady".
Um dos momentos mais esperados vem a seguir. Improvável seria que algum dos presentes não estivesse curioso para saber o que ele diria em "cearês". Seria "Arre égua", ou "Ahmaria, Nã" (que chegou a ter um início de campanha nas redes sociais) ou "A noite tá só o mi, magote de fulerage"? Com certeza, tinha que ser algo ininteligível por quem não conhece o dialeto praticado na terra de Iracema.
E a resposta foi:
"Vamo botar boneco".
Sim, era hora de botar boneco, era hora de festejar, era hora de extrapolar. E era hora de "Paperback Writer", tocada com a guitarra original e com algumas poucas notas a mais no solo.
Os BEATLES inventaram ou aperfeiçoaram muitos tipos de música popular que existe hoje e, mais uma vez, um ex-membro foi responsável por uma inovação. Na música "My Valentine", dedicada a atual esposa do cantor, PAUL MCCARTNEY cria um tipo diferente de singalong, com a exibição do clipe da música no telão ao fundo, em que os atores Johnny Depp e Natalie Portman interpretam a letra da canção em linguagem de sinais.
[an error occurred while processing this directive]Aproveitando o gancho, faz com as mãos o sinal dos WINGS anunciando "Nineteen Eighty Five" e não perde a oportunidade de fazer a sua dancinha. Em seguida, chega o primeiro momento de chorar copiosamente, que começa em "The Long And Winding Road" e continua na homenagem a Linda McCartney, "Maybe I Am Amazed". No telão ao fundo, ao invés de imagens da própria Linda, imagens de PAUL e dois de seus filhos, feitas "muito provavelmente" por ela. Nota: não tenho a confirmação desta afirmação
Vídeo: Guilherme Santini
Toda a banda vem pra frente do palco com violões para "Hope Of Deliverance", ate mesmo Wix e Abe (que ainda faz questão de pertencer à cozinha tocando baixo). Wix teria outra oportunidade de largar seu teclado logo em seguida, ao assumir em "We Can Work It Out" uma sanfona, instrumento que faz parte (para o bem ou para o mal, se você me entende) da vida dos cearenses.
Outro grande momento do show, sem surpresa para quem acompanhou os dois shows anteriores é quando PAUL vem para a frente do palco e uma parte dele começa a subir, enquanto outras estruturas de iluminação descem formando quase o desenho de uma casa. É hora da "irmã" da clássica "Assum Preto" (LUIZ GONZAGA), a belíssima "Black Bird" e da emotiva conversa com JOHN LENNON, "Here Today". Quando o palco desce, como num passe de mágica, o psicodélico Magic Piano está à frente do palco e é nele que PAUL toca "Your Mother Should Know" (mais uma das músicas que estrearam ou reestrearam ao vivo nessa turnê). PAUL MCCARTNEY, o mesmo grande astro que não se incomodou com a presença da esperança Harold e seus primos em Goiânia, continua esbanjando simpatia e fazendo questão de se dirigir a cada um dos setores do estádio. Cada música, no entanto, parece muito mais curta e a causa disso o tempo que está passando muito mais rápido. Já fazem quinze minutos que estamos aqui?
[an error occurred while processing this directive]Vídeo: Guilherme Santini
Vídeo: Guilherme Santini
A bobinha "All Together Now" bem que poderia dar lugar a "Her Magesty", mas isso é só a minha opinião pessoal. As muitas "cree an saish" que ali se encontravam, nos ombros de seus pais, ou ao lado de seus filhos e netos, devem ter adorado. Quem dera eu pudesse ter levado meu filho também.
É preciso falar alguma coisa da extrema solidão dos personagens de "Eleanor Rigby"? Não, os BEATLES conseguiram fazer uma canção que dói profundamente na alma e... e... sentimos toda essa dor com profunda alegria. Então vamos para outro que talvez fosse um dos momentos mais memoráveis de todos os momentos memoráveis que aquela noite traria. Depois de quase 46 anos, finalmente um BEATLE leva a psicodelia de "Being For The Benefit of Mr. Kite" ao palco. Um tempo esplêndido está garantido para todos.
Vídeo: Guilherme Santini
"Something", em que PAUL homenageia GEORGE HARRISON, como de costume iniciada com o astro tocando num ukulele, Fortaleza também homenageia PAUL, com corações vermelhos de cartolina sendo levantados por boa parte dos presentes. Ao final desta música, sempre espero ouvir a "Something Jam". Quem sabe PAUL MCCARTNEY não a inclui em uma de suas turnês futuras. E ao final da música que tem título em iorubá "Obla Di Obla da", PAUL nos brinda com mais uma expressão em cearês, levando todos ao delírio. "Eita Má". Eita, má, que show!!!! Só faltava PAUL querer soltar o "iei" cearense, mas, isso ele jamais conseguiria.
Com um setlist que a cada música se confirmava igual ao de BH e Goiânia, muitos ficaram temerosos quando PAUL e banda tocaram "Hi Hi Hi", dos WINGS. Teria ele limado "Band On The Run"? Felizmente, as duas músicas tiveram apenas a ordem invertida e o maior clássico dos WINGS viria em seguida, com canhões de luz que eu ainda não tinha notado ainda e que pareciam lasers fugindo do palco, bem de acordo com o significado da música (inspirada nas reuniões intermináveis que os BEATLES tiveram que participar quando se tornaram a maior banda do mundo). Se eu ainda não disse que esse foi um espetáculo lindo de se ver não só pela música atemporal, quanto pela mega-estrutura e pelos efeitos especiais, redimo-me agora. A produtora local do show está de parabéns por ter garantido um show impecável para todos, o tempo esplêndido, do momento em que finalmente se adentra na Arena Castelão até o fim.
Acho que o show já passa de vinte minutos agora, mas ainda faltam alguns dos maiores clássicos dos BEATLES como "Let It Be". Agora, é o público que faz o show, transformando-se em um mar de luzes. PAUL, Wix, Abe, May e Rusty respondem com o espetáculo pirotécnico de "Live And Let Die". Difícil não enfartar. E a interação continua com cinquenta mil vozes cantando e chorando "Na Na Na Na Na Na Na" e soltando milhares de balões verdes e amarelos em Hey Jude.
Os músicos saem do palco (Rusty exibe um grande "Obrigado" nas costas de sua guitarra branca), mas ninguém sai de seus lugares na plateia e continuam cantando "Na Na Na". O show ainda teria "Day Tripper", "Lovely Rita" (outra do melhor disco lançado por seres humanos, o "Sgt. Peppers") e "Get Back". Paul perguntaria ainda se a multidão queria "get back", voltar pra casa, ao que infelizmente, na empolgação e por pouco conhecimento da língua da terra da Rainha, a multidão respondeu "yes". Claro que não faria diferença. O show estava mesmo caminhando para o seu fim, mas não sem antes o PAUL realizar o "casamento" de Kenzo e Caroline, que durante todo o show exibiram um cartaz pedindo a benção do Padim Padre Paul e tiveram a honra de ser chamados ao palco, onde Kenzo, com menos palavras na boca que na cabeça, pediu a mão de Caroline, recebendo ambos um abraço do grande astro.
A exemplo da campanha #paulvemfalaruai, os jovens membros da campanha #paulnocastelao também eram candidatos fortes a receber esse chamado. A importância deles na escolha de Fortaleza como um dos destinos na turnê é inegável, mas, o amor de Kenzo e Caroline, sentimento presente em boa parte da discografia dos BEATLES dos WINGS e de PAUL MCCARTNEY falou mais alto. A vez deles vai ficar para a próxima. E que essa próxima venha logo. Agora contamos que iniciem a campanha #paulnocastelaodenovo. Está mais que provado que a cidade tem público ansioso por shows da magnitude de um PAUL MCCARTNEY e gente capaz de produzi-los, restando apenas o trânsito como único gargalo. O próximo alvo de uma campanha semelhante é o IRON MAIDEN, cuja comunidade no Facebook já passa dos trinta mil membros e aguarda ansiosamente a confirmação pela Arte Produções de uma das duas datas ainda disponíveis na atual turnê da banda inglesa.
Enfim, o solo de bateria do segundo mais simpático entre os cinco músicos era sinal de que o fim chegara. Extasiadas, cinquenta mil felizes pessoas nem perceberiam a maratona que enfrentariam para chegar de volta a suas casas após o show de suas vidas. Era o fim do maior evento da Arena Castelão no século XXI. E mais uma vez, engarrafamentos enormes, ausência quase completa da autarquia municipal de trânsito, castigaria essas pessoas por terem sido tão felizes por quase três horas. No dia seguinte, hoje, os comentários sobre o quão maravilhosa, apesar de árdua, tinha sido esta experiência foram os donos das redes sociais. Um tempo esplêndido foi garantido a todos, apesar das dificuldades.
Setlist Hot Sound (agradecimentos Gabriela Mamede)
All My Loving
Blue Suede Shoes
Things We Said Today
Midnight Special
Matchbox
C Moon
Honey Don't
Letting Go
Lady Madonna
Every Night
Bluebird
Ram On
Setlist show:
Eight Days A Week
Junior's Farm
All My Loving
Listen To What The Man Said
Let Me Roll It
Paperback Writer
My Valentine
Nineteen Hundred And Eighty Five
The Long And Winding Road
Maybe I'm Amazed
Hope Of Deliverance
We Can Work It Out
Another Day
And I Love Her
Blackbird
Here Today
Your Mother Should Know
Lady Madonna
All Together Now
Mrs Vandebilt
Eleanor Rigby
Being for the Benefit of Mr. Kite!
Something
Ob-La-Di, Ob-La-Da
Hi, Hi, Hi
Band on the Run
Back in the U.S.S.R.
Let It Be
Live And Let Die
Hey Jude
Encore:
Day Tripper
Lovely Rita
Get Back
Second Encore:
Yesterday
Helter Skelter
Golden Slumbers / Carry That Weight / The End
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