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Opinião: Mídia Física x Mídia Digital

Por Ricardo Bellucci
Postado em 17 de agosto de 2020

É recorrente em alguns círculos de amizades, ou mesmo na mídia especializada, o debate à cerca da qualidade dos arquivos digitais versus mídia física. No entanto, acredito que esse debate deve ser encarado de uma forma um pouco mais abrangente, ampla, considerando diversos elementos no que podemos compreender como a experiência de ouvir um disco.

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Nas coleções de mídia física, notadamente LP’s, esse experiência é muito abrangente, iniciando pelo aspecto visual, a arte da capa, seus detalhes e meandros. Quantos de nós, principalmente os mais "velhos" não acabaram por comprar um disco pela arte presente na capa. Você fica extasiado pela arte ali presente, sem suas mãos! Era levado pelo impulso, e acabava por comprar e levar o disco para casa. Além do aspecto visual, é claro, a escolha de um LP é uma experiência tátil, do toque, do sentir o disco, a capa em suas mãos. Parece algo irrelevante, mas esse elemento do toque, do sentir o LP era algo quase místico, mágico. A retirada do LP da capa pela primeira vez tinha exatamente esse sentido místico, era um acontecimento quase religioso, marcava o início da experiência musical.

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O que nos leva a outro dado dessa experiência, o aspecto ritualístico envolvido. Colocar o disco na "vitrola", levantar o braço do toca discos, colocar a agulha no vinil, com extremo cuidado era seguido de enorme expectativa e ansiedade. O que viria a seguir? Como será o som do álbum? Principalmente se a música seria apreciada pela primeira vez. Era corriqueiro começar pelo lado A, ir até o fim, depois, virar o disco com cuidado, e recomeçar com o lado B. Alguns faziam exatamente o inverso. Esse ato de escutar o álbum por completo permitia ao ouvinte uma visão total da obra, principalmente em álbuns temáticos, como The Wall, do Pink Floyd, por exemplo, onde as faixas formam um conjunto harmonioso, era algo muito importante, dando relevância a cada faixa do disco, era uma verdadeira experiência sensorial.

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Além disso, esse ritual era muitas vezes coletivo. Como o vinil era caro, muitos deles, devemos lembrar, eram importados, o que nos levava a casa dos amigos com nossa "fitinha" Basf, para gravar. Assim, era construído um ritual coletivo.Chamar a turma de amigos para ouvir eram algo comum, você queria dividir aquele momento com seus melhores amigos, e isso nos leva a duas consequências interessantes, desse processo: a primeira era o fortalecimento dos laços de amizade, que muitas vezes perduravam por uma vida inteira, e a segunda era a formação do ouvinte. Não apenas nossos sentido auditivo era educado., mas todos os aspectos envolvidos no processo levavam a isso. Papos de horas a fio sobre músicos ou bandas invadiam as tardes de domingo, ampliando nossa cultura musical. Algo muito importante e mais profundo do que podemos imaginar. Esse processo ocorria não apenas na escuta do LP, mas desde a sua aquisição. Quantos de nós não participaram de verdadeiras "expedições" em grupo rumo às lojas do centro de São Paulo, por exemplo. Essa experiência marcou muitos de nós pelo resto de nossas vidas!

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Os LP’s tinha também outro aspecto a considerarmos, os encartes. Lá era possível encontrar a letra de cada música, a ficha técnica do álbum, elencando o nome dos músicos, do produtor, além, é claro, de mais uma vez, reforçar o aspecto visual do álbum enquanto verdadeira obra de arte. Acabamos por conhecer muitos dos produtores lendários que ajudaram as lendas do rock a construir álbuns antológicos e clássicos.

Logo, não apenas o aspecto do tipo técnico da mídia creio eu, deve ser levado em conta no debate. A mídia digital possui suas vantagens, é claro. Facilidade de armazenamento, praticidade, já que podemos levar álbuns inteiros na memória de um smartphone ou então dispomos de serviços de streaming. Podemos ouvir a qualquer dia e a qualquer hora aquele álbum que tanto queremos ou apenas uma música que nos marcou em nossas vidas. Eles estão disponíveis em nossas mãos, a um mero toque na tela. Os lançamentos de novidades acabam por ocorrer antes nesses serviços de música online.

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Enfim, procurei abordar aqui alguns aspectos relevantes desse debate, considerando que não devemos apenas nos ater apenas a qualidade da sonora da mídia, mas, sobretudo, o tipo de experiência musical que ela nos proporciona.

Não vou ficar aqui em cima do muro, confesso. Sou um cara formado na experiência analógica. Para mim a experiência musical proporcionada pela mídia digital formou não apenas meu caráter musical, mas sobretudo, ajudou a construir aspectos éticos e estéticos importantes em minha vida, além é claro de cristalizar amizades que mantenho até hoje. No entanto, isso não quer dizer que eu despreze ou menospreze a mídia digital. Levo comigo em meu smartphone álbuns inteiros e tenho meu serviço de música online favorito, que utilizo no ônibus, no metrô ou corrigindo provas na escola.

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E você, caro leitor, já parou para pensar sobre qual tipo de mídia lhe proporciona uma experiência musical mais ampla? Creio que essa é uma bela e importante reflexão em nossa existência enquanto fãs da música, e por que não dizer, do velho e bom rock and roll. Um forte abraço!

Longa vida ao Rock!

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Sobre Ricardo Bellucci

Pedagogo, curador educacional, pesquisador, historiador amador, economista por acaso e sobretudo um vocalista frustrado. Um construtor de Utopias.
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