Beyoncé: metal nacional deve se inspirar no novo álbum
Por Nacho Belgrande
Fonte: Playa Del Nacho
Postado em 18 de dezembro de 2013
Na semana passada, a artista estadunidense BEYONCÉ lançou um álbum do nada. O produto simplesmente apareceu no iTunes, sem promoção, sem entrevistas, sem que as pessoas sequer soubessem que ele estava sendo produzido.
Na verdade, descrever o produto lançado pela cantora como ‘álbum’ pode não descrever completamente do que se trata o conteúdo que foi disponibilizado. Trata-se de uma seleção de faixas em áudio, claro, mas acompanhadas cada uma de um vídeo correspondente, sendo que todos os vídeos são inéditos.
Só o fato de um artista ter lançado um álbum com vídeos para todas as músicas contidas nele já colocaria Beyoncé na história da música, assim como a ousadia de tal estratégia, inédita até onde se saiba [pelo menos propositalmente]. Alguns ainda dão conta que ‘Beyoncé’ ´4e também o álbum mais caro já produzido, superando ‘Chinese Democracy’ [2008], de W. AXL ROSE, que, no entanto, demorou 14 anos para ser completado, datando de um tempo anterior até mesmo ao início da carreira da cantora em questão.
Comparando o ato de Beyoncé [com certeza orquestrado por seu marido, o rapper JAY-Z] com o modus operandi da comunidade musical em geral, há várias lições a serem tiradas, em especial pelos músicos do chamado ‘underground’ [por que ainda usam esse termo em 2013 quando os meios de divulgação dos independentes são exatamente os mesmos dos majors?] nacional , que reclamam, choram e revindicam uma importância que não tem e destaque e valorização pra um produto que não merece.
Comecemos apontando para o fato de ‘Beyoncé’ ter vendido 828.773 unidades do álbum completo [o download pago via iTunes não permitia a compra de faixas ou vídeos avulsos] em três dias. E é aí que há de se começar a prestar atenção ao que isso implica.
Primeiramente, quando você lança um álbum do nada, sem publicidade nem mídia nem estardalhaço somente na internet, sem as burocráticas e fisicamente dispendiosas mídias físicas, você dá seu trabalho de mão beijada para os piratas, certo?
Nesse caso, ficou provado que não. Que é perfeitamente possível competir com [contra] o Google, que trabalha duramente pra ignorar proteção a conteúdo patenteado enquanto basicamente manda os artistas se virarem e se adaptarem aos tempos modernos.
A inclusão de vídeos no pacote BOTOU NO RABO do YouTube, afirmando que a relação entre os artistas e a gigante dos vídeos – que paga microcentavos para os artistas que montam seus próprios canais em seu site – pode ser útil, mas não é, de modo algum, crucial, especialmente quando se leva em conta as práticas bizantinas da empresa.
A principal razão para que um álbum seja lançado com acesso restrito, controlado, com administração viável e imediata sobre que modo ele pode ser adquirido é que os ganhos são mais previsíveis em relação à sua procedência, a liquidez é bem maior e os lucros – que é o que interessa MESMO no fim das contas – são maiores.
Alguns dos artistas – de novo, os brasileiros, com seu inabalável complexo de vira-latas – podem ainda argumentar que tal empreitada só pode ser executada por alguém de muito nome e bala na agulha. É como o dono de um trailer que vende lanches e só abre de quarta-feira a domingo dizer que o McDonalds só vende muito porque é o McDonalds. Até aí o McDonalds já foi basicamente um trailer que vendia lanches décadas atrás.
Mas tal manobra não se restringe a nomes do primeiro escalão. Colocar um álbum à venda no iTunes, não custa nada caso o artista não queira usar das vias de promoção viral do serviço. ‘Beyoncé’ acabou por dar – temporário – prejuízo para a loja, dado que a procura pelo download foi tão intensa que acabou por derrubar o servidor dedicado da Apple [e isso é dizer MUITO].
Sejam lá quantos fãs você tiver, eles vão botar a mão no bolso pra comprar seu produto. Na verdade, é isso que define quem é DE FATO um fã. A exposição e a divulgação que você faz dando shows em bares em troca de cachês que, quando divididos entre os membros da banda, mal cobrem o custo de estacionamento dos músicos só tem sentido quando resulta no aumento do número de fãs desses que querem PAGAR pela sua música e você, desse modo, consiga receber e viver de sua arte.
Se você ou sua banda fazem 40 shows por ano e não consegue vender cinco mil álbuns no iTunes [que é disponível para qualquer pessoa com conexão com a internet no globo, um contingente significante de consumidores em potencial], então algo está errado.
Beyoncé [e tampouco seu esposo] não está tentando enriquecer o YouTube, ou o Google, ou os serviços de streaming on demand como Pandora e Spotify. Então por que é que você quer?
Se você acha que o meio musical é um campo de altruístas, mude de carreira. Todo mundo está ali pra ganhar dinheiro, e se você não rende, não serve, ponto final. Nenhuma empresa que comercialize, divulgue ou distribua música tem obrigação nenhuma de fazer nada de graça por você. No fim das contas, é capaz de você ter que fazer muito mais coisas de graça por eles do que o contrário. Não interessa se você tem mais de 10 milhões de acessos de um vídeo seu no YouTube: se o site for vendido, você não receberá um mísero tostão do valor pago.
A importância e a validade do formato ‘álbum’ também foram reforçadas. Lançamentos menores com uma ou duas faixas num maior espaço de tempo também é importante, mas não precisa – nem deve – ser o único método de vender sua produção musical.
No Brasil, um país que ainda não tem serviços de música via streaming on demand, a alternativa mais próxima – e expressiva – a isso que os fãs de música têm são o Soundcloud e o YouTube. Nem preciso dizer, o YouTube se adéqua muito mais ao que os fãs adolescentes de rock procuram do que o Soundcloud, afinal há toda uma liturgia que une o dito músico ‘de metal’ e seus seguidores. Esses fãs querem uma experiência mais tangível e lúdica com a música, e se camisetas, vídeos, wallpapers e acessórios estiverem a seu alcance, um tanto melhor. Porque eles querem aliar seu gosto musical à sua personalidade, e querem expor sua personalidade aos demais de seu grupo. ‘Beyoncé’, com todos seus vídeos, sublinha uma tendência que vem dominando o hardware e o software da indústria do entretenimento já há alguns anos: conteúdo exclusivamente em áudio está com seus dias contados. DVD-Audio, Blu-ray áudio, por que alguém pagaria 12 dólares por um produto em áudio quando por 15 pode comprar um com conteúdo alinhado em vídeo, enriquecendo a experiência toda? As pessoas ficam mais gratificadas quando o áudio está em sintonia com suas TVs – uma preferência que ficará cada vez mais comum com a popularização das SmarTVs e Home Theaters.
Bandas com orçamento mais frugal deveriam considerar seriamente a gravação de TODOS seus shows em áudio, e em seguida integrá-los a um vídeo, seja dessa mesma apresentação, seja para uma proposta diferente. Como diz o dito popular, ‘quem não é visto não é lembrado’. É um modo de explorar o YouTube do mesmo jeito que ele pode vir a explorar você um dia. A velocidade da internet no Brasil, ainda que ridícula para os padrões internacionais, já consegue proporcionar visualizações do site em televisores e esse processo não tem mais volta.
Para concluir [e isso tem muito a ver com o modo que Beyoncé age e é vista]: fãs bem supridos, que tenham acesso a informações sobre você e acreditem no seu trabalho, pagarão pelo sue material. Tal feedback não é exclusivo da cantora estadunidense, uma vez que não são poucos os projetos em sites tipo Kickstarter que viabilizam, com ampla margem de conforto monetário, projetos e álbuns de outros artistas.
E se ninguém está disposto a pagar pelo que você está vendendo, será que você tem mesmo fãs? Se ninguém come no seu restaurante porque acha que não vale a pena, será que você tem todo esse talento pra cozinhar? Por que é que uma banda saída dos confins de Ijuí, no Rio Grande do Sul, o KRISIUN, tem gravadoras do primeiro mundo bancando a gravação de seus álbuns em estúdios na Alemanha sem que eles tenham espaço algum na grande mídia nem façam parte da panelinha viciosa da mídia impressa especializada em rock de São Paulo? Por que razão eles conseguem se viabilizar como profissionais enquanto você não?
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