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Acclamatur: fanzine nordestino comemora 25 anos!

Por Bruno Bruce
Fonte: RockPotiguar
Postado em 13 de abril de 2012

Liberte-se! Vamos fazer uma rápida viagem no tempo.

Estamos na primeira metade dos anos 1980, a internet para as massas nem chega às raias de um sonho prá lá de distante (seu uso é restrito aos militares). Discos & livros sobre heavy metal são raros, caros. O Brasil é um bunker fechado às importações em geral.

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Nesse contexto, os headbangers realizam a versão mágica metálica da multiplicação do pão: uma horda de tape traders espalha as novas bandas numa cadeia de amigos que enviam & recebem fitas cassetes via Correios. Cartas são trocadas com sua rede pessoal de contatos no país e, para os mais sortudos, no exterior. Esses contatos são a garantia contínua do fluxo de informações, a veia onde corre o sangue headbanger. Se a veia são os indivíduos, o fanzine seria o correlato do coração. É ele que impulsiona e por onde passa todo o plasma essencial da cena. Nos fanzines, endereços eram publicados, nasciam os fã-clubes e organizavam-se eventos. O fanzine chegou antes de qualquer outra publicação nacional renomada sobre heavy metal, com o aval de já nascer com a devida credibilidade dos inseridos nesse movimento (ninguém gasta seu próprio dinheiro & tempo, sem retorno financeiro, para publicar mentiras).

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Tive a sorte de ser contemporâneo do pernambucano Acclamatur, fanzine a comemorar, em 2012, 25 anos do lançamento do exemplar número 1. Conheci Guga (Gustavo Burkhardt, editor) num show do Taurus em março de 1987, na cidade de Recife/PE. Guardei com carinho por quase 3 décadas um raríssimo exemplar (perdi o nº 1, restando o exemplar #3) de uma Era que morreu: o tempo romântico do heavy metal. Só posso discorrer sobre ela, como um livro a relatar a passagem dos dinossauros sobre a Terra. Vivê-la não é mais possível!

A diferença a favor do Acclamatur era ser violentamente anticlerical, rude – com suas capas pretas, a anunciar as bandas mais extremas da época. A agressividade foi a tônica que conquistou minha admiração.

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Abaixo, pequena entrevista com Gustavo Burkhardt. Na minha opinião, para aquele momento, um visionário & destemido.

Bruno Bruce – Em primeiro lugar, o que diabos significa Acclamatur?

Gustavo Burkhardt – É latim e significa "solta-se um grito hostil". Eu e Nina, quando vimos essa frase, achamos perfeita para a proposta.

BB – Você segue ou seguiu alguma religião? Sempre senti uma postura agressiva à religião católica no Acclamatur.

GB – Nunca segui nenhuma religião, apesar de jamais conseguir ser ateu, já me envolvi durante anos com esoterismo porque tenho um lado espiritual muito forte. Nota-se isso nos meus desenhos, escrituras e pintura. Nunca notei nada dirigido diretamente a uma religião. Na verdade o Acclamatur sempre foi um pouco anarquista no conceito geral. Ainda lembro no dia do lançamento do zine em um evento que iria rolar uns vídeos de metal, aqui em Recife. Ninguém havia visto a capa do Acclamatur a não ser Óliver Hellfire de João Pessoa (N.E.: lojista de heavy metal e lenda nordestina entre os headbangers) que viu a arte original. Um banger quando viu o demônio crucificado me questionou o por que de eu tê-lo desenhado assim (todas as capas e desenhos contidos nos zines são meus), aí eu respondi: "Eu crucifico quem eu quiser, o demônio, Jesus Cristo. O Acclamatur é um zine contra todo tipo de manipulação religiosa ou política". Inclusive o grande contraste desse desenho é que o demônio esta crucificado numa cruz invertida, portanto não era uma cruz cristã. Eu sou pé atrás com a religião organizada. Na época do ‘Aqualung’ (Jethro Tull), Ian Anderson disse uma coisa bem interessante mais ou menos assim : "A religião organizada tira a liberdade espiritual do homem".

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BB – Meu primeiro contato com o fanzine foi num show do Megahertz em Fortaleza/CE. Muitos headbangers trocavam zines e fitas. O que você pensa dessa época?

GB – Foi mágica, nunca mais volta. Ver o thrash surgindo, Venon, Motorhead, aqueles riffs que pareciam ter saído do nada, foi demais. A dificuldade de conseguir material fazia com que a gente desse valor a cada fitinha gravada. Saíamos de Recife para assistir shows de bandas que haviam lançado apenas uma tosca demo tape, cada fanzine impresso era devorado.Tinham os caras que gostavam mais de Helloween e os outros mais de Hellhammer, Celtic, mas não tinha tanta frescura dessas subdivisões como agora. Na época era tudo na raça. Fomos, e digo isso com muito orgulho, desbravadores pra essa galera que tá hoje por aí. Agora tá muito fácil. Todo mundo se tatua, põe piercing. Lembro de um show que fomos em João Pessoa do Necrópolis (pra mim a mais fudida banda do nordeste) e Óliver Hellfire (vocal) no inicio avisou que deram um recado que se alguém falasse palavrão iria preso. Passamos a noite vagando pela cidade esperando amanhecer para pegar um ônibus para Recife e fomos acompanhados a todo o momento por um camburão. Tinham medo da gente.

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BB – As capas, sempre pretas do fanzine, destacavam-se. Como surgiu a ideia?

GB – Queria fazer a diferença. Todos os zines da época tinha sempre uma foto xerocada da banda e a ideia era colocar sempre um desenho na capa e atrás uma foto interessante. Só não poderia ser banda. Daí o desenho do nº 1 virou logomarca do zine. Íamos na melhor copiadora de Recife, bem cedo, para aproveitar o tonner da máquina pretinho. Nada era por grana, gastávamos para fazer o zine com a melhor qualidade visual para a época. Ainda vou explicar numa exposição, página por página, como fazíamos a estética visual do zine, só com cópia xerox, ampliação, redução. Não havia computador. E acho que isso hoje em dia é que valoriza o nosso trabalho. ERA DUCARALHO !

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BB – Hoje, você se considera um headanger ainda? O que escuta? (independente de estilos)

GB – Não me fechei no tempo. Sempre gostei de blues, progressivo, só que nos anos 80, era foda, não dava para ficar ouvindo King Krimson com Destruction ou Slayer destruindo tudo. Hoje escuto os estilos citados acima e tudo de peso que vier pela frente. Stoner metal, thrash, death. Bandas como Destruction (minha grande fonte de inspiração), Celtic Frost, Sodom, Exodus e todos os precurssores brutais de 80: Warbringer, Bonded by Blood, Demonica, Krisium, Old Man Child, Parasytic, Black Breath, Terror 2000, Oddium, Cruor.

Se ainda sou um headbanger? Não tenho mais aquela fúria desenfreada e irresponsável (?) daqueles tempos, mas ainda sinto aquela força quando escuto porrada e que me traz aquela sensação de juventude e de querer quebrar tudo. Ainda tenho vontade de mudar o mundo. E acho que isso é suficiente forte para bater a cabeça. Portanto, acho que vou morrer banger.

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BB – A cena pernambucana de heavy metal foi a maior do nordeste e uma das mais radicais & prósperas do Brasil. Como encontra-se hoje?

GB – Aqui, infelizmente, estamos sem espaço próprio para a cena, a única casa especializada, o Bomber Bar, fechou, mas desde 2011 tá rolando muito show por aqui. Tem um pessoal novo de produção que tá trazendo grandes bandas do underground, e isso tá dando incentivo e oportunidade das boas bandas daqui abrirem para as internacionais, melhorando o intercâmbio. Bandas com Inner Demons Rise, Cangaço, Cruor, Firetomb, Oddium, The Ax.

BB – Ainda há lugar para os fanzines impressos? Não pensa em montar algo no estilo mas em mídia digital?

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GB – Está nos meus planos. E isso vai rolar com certeza. Mas ainda vou fazer um número especial do Acclamatur impresso em cópia xerox só para comemorar os 25 anos do zine.

BB – O que restou do que considero a Era romântica do metal? (meio dos anos 1980)

GB – Restou a certeza da lição de casa feita. Por isso estou indo para o M.O.A. (N.E.: inédito e enorme festival dedicado ao metal em São Luiz/MA) ver Venom, Exciter, Destruction, Exodus, Anthrax, Anvil. Restou a satisfação de ver seu trabalho reconhecido e elogiado, como vi uma matéria sua falando de mim e do Acclamatur, que, sinceramente, me fez rever o zine e trouxe um momento de reflexão para o que estamos vivendo historicamente hoje: veja os grandes festivais, Waken, Hellfest. Quem são as bandas que encabeçam o set? As antigas, os dinossauros que dizem estarem cansados, mas não estão. A obra ficou pronta e firme.

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BB – Espaço aberto para suas considerações!

GB – Never Say Die. Façam e façam diferente. Não se preocupem em tocar muito. O importante é tocar com fúria. Era esse o ideal dos anos 80. Todos estavam contra nós. Não havia internet, não havia equipamento e o que havia era caríssimo. E nem por isso desistimos. Plantamos um ponto na historia. Mesmo que alguns não percebam, esse ponto existe e as vezes com tão pouco. É por isso que estou aqui escrevendo essas coisas, me expondo, mas quem quer fazer com fúria com fúria será lembrado.

Soltem os seus gritos hostis. Valeu !!!!!!!!!

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Sobre Bruno Bruce

Ex-fumante, punk por 15 minutos.
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