2019: resenhas de 10 bons discos lançados em Janeiro
Por Tiago Froks
Postado em 12 de fevereiro de 2019
A minha inspiração em resenhar álbuns novos, vai ao encontro da expectativa que guardo em ver o rock e todas as suas vertentes sempre relevantes, sejam no mainstream ou no underground. A ideia é cobrir bandas consagradas e também desconhecidas: celebrar o passado acompanhando os lançamentos de quem já fez muito pela cena, mas sem abrir mão de incentivar e curtir o que está sendo feito de agora para o futuro. Não há um critério definido na escolha dos discos, mas acredito que parte da minha motivação esteja em ficar diante de uma banda que, por motivos de gosto mesmo, não me agradam tanto e, mesmo assim, fazer um esforço e conseguir encontrar algo de bom numa sonoridade que, até bem pouco tempo, eu era incapaz de ver. É um exercício de quem ama a música e de quem sempre quer ser surpreendido por ela. É ainda, um movimento em direção à tolerância e também a uma resignação positiva: ter contato com sonoridades novas, expandir o gosto, conciliar extremos e, se possível, derrubar algumas barreiras que não fazem tanto sentido em existir.
CODY CARPENTER
Force of Nature
(progressivo sinfônico / instrumental) USA
A capa psicodélica engana um pouco: o álbum é essencialmente progressivo. O disco explora toneladas de teclado, levando nossa audição para os lados do symphonic prog. Acontece que as faixas, por serem todas instrumentais, acabam soando também um bocado fusion. As composições assemelham-se enormemente, dando a impressão de serem variações de um único tema. Essa definição deve ser suficiente para dividir o interesse dos ouvintes. Fãs de progressivo possuem alguma coisa de singular no seu organismo que fará com que sintam prazer com esse disco na íntegra. Os demais ouvintes, ou uma boa parte deles, se saciariam em ouvir apenas uma faixa e, por projeção natural, imaginariam todo o resto. E existe quem sequer suportaria um minuto de audição de qualquer uma das faixas. Enfim, para quem estiver disposto, o álbum é repleto de mudanças de andamento, melodias combinadas de teclado e guitarra, um senhor baixo que passeia soberbo em praticamente todo o disco e um baterista pra lá de competente. Forçando um pouco a visão para além da linearidade do álbum, encontrei o cume criativo na faixa "Fantasy of Form" - o baixo nela é formidável, e ainda tem aquele solo flamenco que encereja o bolo.
PLAGUE PIT
Topheth Ablaze
(death metal) Irlanda
Ainda não estou decidido se realmente gostei do álbum. Poço de praga, literalmente, era o local onde enterravam as incontáveis vítimas da peste negra que varreu um terço da população da Europa no século XIV. A banda resolveu chamar-se assim e o nome combina fielmente com o som que eles fazem. Encontrei o disco num site de black metal, mas a despeito da parte lírica, no disco predomina-se o death. Apesar da peste criativa que assola muitas das composições do metal extremo atual, eu não fiquei enfadado com esse disco, mesmo ele rezando na cartilha da mesmice. As faixas todas estão com as guitarras abafadas, deixando a bateria deliberadamente em primeiro plano. Esse ponto me incomodou a princípio, mas talvez seja essa uma peculiaridade feliz do álbum. O tema que destaco é a "Venomous Gaze", segunda do disco. É a mais veloz e direta, e contrasta com a faixa anterior que é bem cadenciada. O trabalho técnico da bateria chega a impressionar em alguns momentos e o vocal, abismal no melhor sentido, casa bem com a peste toda.
JULIANA HATFIELD
Weird
(alternative rock / indie) USA
Essa é a típica cantora que agrada em cheio aqueles fãs da era grunge que, com o advento da internet, tiveram contato com artistas mais underground. Em paralelo ao sucesso proveniente de Seattle, uma cena distante dos holofotes tomava corpo, só que mais influenciada pelo dream pop e por outros gêneros do espectro do alternativo. Facilmente esse disco será catalogado dentro do termo indie - e estará no lado bom do termo, aquele mais orientado ao rock do que ao "eletrônico cool". Tudo no disco remete aos anos 90, seja na sonoridade limpa das guitarras e na simplicidade dos riffs, quanto nas melodias que flertam com o pop. Pela banda ter uma garota nos vocais, foi inevitável buscar referência em bandas femininas, como o SLEATER-KINNEY (louvadas sejam). Se você imaginar apenas a voz da Carrie Browstein e tirar a atitude riot da banda, o que restaria seria muito próximo à sonoridade desse disco. Gostei do álbum todo, mas para seguir o padrão de eleger a faixa mais interessante, sem dúvida escolho a "Receiver". Com seu riff inicial cativante e nostálgico a la década de 90 e com algumas levadas de bateria propositalmente fora de tempo, a composição sincretiza bem o disco e ainda apresenta uma faceta noise nos instantes finais.
EL EFECTO
Estúdio Show Livre Ao Vivo
(impossível definir) Brasil
"É nosso objetivo expandir as fronteiras da música popular contemporânea correndo o risco de sermos bastante impopulares". Esse texto vinha no encarte do disco Acquiring the Taste, da magnífica banda GENTLE GIANT, um expoente do rock progressivo inglês dos anos 70. Acho que esse texto também traduz muito do que ocorre com uma das bandas nacionais mais interessantes da atualidade. Para quem nunca ouviu falar, o EL EFECTO é uma banda carioca que lançou seu debut em 2004 e de lá para cá vem se superando a cada novo lançamento. Quando me deparei com esse ao vivo, na mesma hora decidi resenhá-lo. E o motivo é simples: as músicas desse show são a base do disco Memórias do Fogo, que eles lançaram ano passado. E o que esse disco tem de especial? Disparado, mas disparado mesmo, foi o melhor disco que ouvi em 2018. E o que posso dizer para que você leitor, queira ouvi-lo? Esse é o primeiro grande desafio. Já o segundo, ainda mais ambicioso, é que você possa ser tocado pelo brilhantismo das composições, e aproveitar tudo que elas podem oferecer. A começar pelo tema "O Drama da Humana Manada": um cavaquinho bem veloz abre passagem para um riff pesado que desagua num samba maroto, ao melhor estilo samba de breque, lembrando o saudoso malandro Moreira da Silva (sem preconceito, ouçam algumas músicas desse senhor e verifiquem por si mesmos a qualidade de suas letras e composições). A próxima faixa é "Café", e explora alguma variante de ritmo latino, alinhada a arranjos complexos, raspando o progressivo. A letra é formidável, mas esse é um ponto comum entre todas as faixas do disco. Outro tema que merece ser citado, é "O monge e o executivo". Para mim, essa foi a melhor música composta no ano passado. A parte lírica é soberba: poucas vezes uma canção de protesto foi tão bem construída. Confesso que essa versão ao vivo não faz jus à original - se tiverem interesse, procurem ouvir a faixa de estúdio. Para encerrar a resenha, peço uma atenção especial à faixa "Carlos e Tereza". Ouvi esse som pela primeira vez num show que eles fizeram aqui em São Paulo. Mesmo sem nunca ter ouvido a música, minha conexão com ela foi instantânea. A letra é uma homenagem bem emocional à Marielle Franco, vereadora que foi assassinada covardemente junto ao seu motorista em março de 2018.
SOILWORK
Verkligheten
(death metal melódico) Suécia
O SOILWORK é uma daquelas bandas de metal mais moderno que nunca dei a devida atenção. Esse foi o primeiro disco inteiro que ouvi deles. De cara, já senti que o Björn Strid de fato merece certa aclamação. Os vocais realmente me chamaram a atenção, tanto o rasgado quanto o limpo. A sensação mais flagrante que tive ao ouvir o disco, foi a de que as composições giram muito na expectativa do refrão. Vou explicar melhor: senti que toda a cozinha da banda soa muito coadjuvante. Não lembro de um solo proeminente de guitarra, tampouco alguma passagem mais marcante dos demais instrumentos. Resolvi escutar os discos mais antigos e vi que a proposta antes era outra. A bateria, por exemplo, em faixas como "The Chainheart Machine" do disco homônimo, era além de veloz, muito mais criativa. Enfim, apesar dessa crítica, gostei do que ouvi. O death melódico feito pela banda é bem executado, sem muita complexidade é verdade, mas com arranjos dignos de uma banda do seu patamar. Os refrãos, sem sombra de dúvida, são o grande destaque desse álbum. E para destacar um, fico com o da faixa "Needles and Kin" que ainda conta com a participação do Tomi Joutsen, do AMORPHIS.
MAD FELAZ
III
(rock progressivo) Itália
Apesar do gênero passar distante do mainstream, o rock progressivo vive um momento especial. A década de 70, que foi o auge do estilo, lançou sementes que brotariam em terrenos diversos, anos depois, do pop ao black metal. Já o presente disco, tem a sonoridade análoga ao das bandas tradicionais do estilo, com leves nuances que vou comentar a frente. O disco abre com a faixa "Es / Frozen size". Apesar do instrumental frenético e rico em mudanças de andamento, a composição me pareceu um pouco desajustada e, mesmo o vocal, que nos temas seguintes tem certo destaque, aqui não impressiona. A segunda faixa, por sua vez, começa bem mais promissora. Seguindo uma linha mais calma, a flauta da introdução me remeteu ao BIG BIG TRAIN, grande nome do prog atual. A voz também melhorou muito nesse tema, dando a entender que o formato de balada talvez seja mais confortável para o frontman. Na sequência, vem a minha predileta do álbum: "Liquid Bliss". Com uma intro cheia de entusiasmo, a banda toda parece solar durante alguns segundos, tendo consecutivas paradinhas de tirar o fôlego. O tema segue com uma atuação vocal agora digna de nota, explorando uma levada cheia de swing e um feeling até então, inédito. Ainda há passagens de teclado emulando o progressivo sinfônico e alguns ecos de canterbury, em especial com os da banda japonesa, MR. SIRIUS.
RIVAL SONS
Feral Roots
(hard rock / blues rock) USA
Não sei você leitor, mas eu vejo uma profusão de bandas aderindo ao revival como um caminho mais suscetível à aclamação da mídia especializada. Eu não sou um crítico feroz dessa intenção, mas desconfio que quando rotulam essas bandas de sonoridade retrô como "salvadoras" do rock, é porque o saudosismo está falando mais alto do que deveria. Feito o comentário, fica claro que situo o RIVAL SONS dentro desse cenário, mas a contrapartida positiva, é que acho a banda uma das mais originais dessa leva. Considero o disco anterior, Hollow Bones, de 2016 uma verdadeira pérola! Passados três anos, senti que a inspiração dos caras deu uma leve regredida. A fórmula das músicas é a mesma, a veia setentista está toda ali, mas as melodias estão menos cativantes. A performance de Jay Buchanan, por sua vez, está irretocável. Como canta esse sujeito! Em alguns momentos soa um pouco Ian Astbury, e não há nem sombra de demérito nisso. O disco todo é muito regular, então vou evidenciar 3 faixas: a "Too Bad" com seu riff sabbáthico e levada mais densa; "Shooting Stars" com direito a um belo coro gospel e, por último, "Feral Roots" que nomeia o álbum. O tema caminha para os lados do blues rock e é dono de um refrão verdeiramente poderoso.
WITHIN TEMPTATION
Resist
(rock sinfônico / pop) Holanda
Com muito pesar, acho que cheguei ao meu limite com o WITHIN TEMPTATION. Depois de dois shows, de incontáveis audições de todos os discos da banda (considero o Mother Earth uma obra prima) e de fazer vista grossa a cada movimento da banda em direção ao pop, dessa vez, por mais que tenha me esforçado, não deu. A banda definitivamente rumou para um extremo onde meu gosto não conseguiu chegar. Lembro-me de ter resenhado o disco anterior Hidra, de 2014. Ali, a despeito das partes eletrônicas, ainda consegui encontrar composições relevantes. Nesse novo disco, a não ser que o tempo faça algum milagre, não há nada que convença um ouvinte de metal. Para quem já ouviu as composições solo da Sharon, a sonoridade está muito próxima, com a diferença de aqui terem alguns riffs pesados (aleatórios) e a usual orquestração (muito bem explorada, preciso admitir). Estou na terceira audição do álbum, e a minha impressão melhorou levemente. Consegui encontrar momentos legais, como o solo de guitarra na faixa "Raise your banner" e a melodia vocal em "Endless War". Ademais, o disco é uma nova tentativa da banda em ganhar ainda mais popularidade. E honestamente não vejo mal nisso. A banda passou brevemente pelo doom, pela wicca, pelo metal sinfônico e sei lá por mais o quê. Foi competente por cada vertente que passou. Apesar de não ter curtido o álbum, ainda não consigo dizer que a banda lançou um disco ruim, afinal, contrariar o gosto do autor da resenha não é nenhum parâmetro de falta de qualidade. Para terminar, vou eleger a quase trip hop "Firelight" com participação do cantor belga Jasper Steverlinck como um dos destaques, juntamente com a tentativa gótica de "Mad World" e a faixa supracitada "Endless War".
EVERGREY
The Atlantic
(progressive metal) Suécia
Não é nenhuma novidade a relevância da Suécia no cenário do metal – e 2019 começou reforçando ainda mais esse protagonismo. O EVERGREY explora o prog metal desde o final dos anos 90, mas só vim conhecê-los há alguns anos. Mas gostei de cara! O trabalho atual está num nível altíssimo, e o mérito principal fica com Tom Englund, único remanescente da formação original. A começar pela belíssima capa em tons de amarelo, reproduzindo uma tormenta e muito do surrealismo típico às bandas de progressivo, The Atlantic é um álbum soberbo. A capacidade técnica da banda não soa exagerada nas composições. A impressão que passa, é a de o instrumental seja subordinado à melodia, e não o contrário. O quero dizer com isso? Que não há firulas, tampouco exibicionismo nos temas de álbum. O groove está muito presente no disco, e o experiente baixista Johan Niemann (MIND’S EYE, ex-THERION) tem um papel preponderante. Escolher o destaque do álbum é dificílimo, afinal gostei de todas as faixas. Mas para dar um ponto de partida ao leitor, vou indicar "A Silent Arc" com suas ricas variações melódicas, "All I Have" e seu refrão pra lá de grudento e a mais progressiva do disco, "End of Silence".
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Lotus
(proressive metal) Suécia
Quem não tem TOOL caça com SOEN. Já se foram 4 álbuns de estúdio e ainda bato na tecla dessa semelhança (não faço em tom de crítica, só uma constatação mesmo). Mas sem dúvida a banda está cada vez com mais identidade - inclusive cheguei a ter a impressão de não tratar-se do Joel Ekelöf nos vocais desse disco, por conta de não remeter tanto ao Maynard (mas isso apenas na primeira audição). Sobre a sonoridade do disco, tenho bastante convicção de que a banda não baixou nenhum degrau em qualidade - nem em peso! A começar pela faixa "Opponent" e seu riff que está entre os mais marcantes do álbum. Segue-se com a faixa "Lascivious", uma das minhas favoritas: a introdução num riff característico levado no baixo e talvez a melhor performance vocal dentre todas as faixas. Há também uma passagem psicodélica (também ocorre no tema anterior) em que a banda explora um lado mais atmosférico, contrastando muito bem o peso e a ausência dele. A terceira do disco, "Martyrs" também guarda uma passagem em que o andamento muda abruptamente, o que denota, talvez, uma intenção da banda em varias suas composições e não deixar o álbum cair na mesmice. Essa faixa também ganhou um clip que gerou bastante repercussão no Youtube. Pseudo-integrantes da banda aparecem montando-se como drag queens, sendo hostilizados na rua e terminam o clip num palco, emulando os próprios integrantes. Uma grande música com uma mensagem de tolerância digna da grandeza da banda. Outro tema que merece destaque, é própria "Lotus" que caminha por um ambiente mais introspectivo, com uma desempenho bem emocional do Ekelöf e um senhor solo, tocado pelo estreante Cody Ford, ao melhor estilo pink floydiano, obra que deixaria o Sr. Gilmour orgulhoso.
Discos lançados em 2019
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