O triste fim do lugar onde foram plantadas as folhas de sonho no jardim do solar do Mutantes
Por Bruce William
Postado em 09 de dezembro de 2024
"Panis et Circensis", imortalizada pelos Mutantes em seu álbum de estreia de 1968, traz uma das letras mais inspiradas escritas por Caetano Veloso e Gilberto Gil. Também lançada no "álbum-manifesto" "Tropicália ou Panis et Circencis" do mesmo ano, ela traz em sua letra uma crítica aos valores culturais repressivos da época, mas abordando transformações não apenas políticas e também estéticas e culturais, refletindo o espírito inovador e contestador do movimento tropicalista.
Com frases como "Mandei fazer/ De puro aço luminoso, um punhal/ Para matar o meu amor e matei/ Às cinco horas na Avenida Central/ Mas as pessoas na sala de jantar/ São ocupadas em nascer e morrer", "Panis et Circenses" traz no título uma referência à expressão romana "pão e circo", que ilustra como os governantes ofereciam distrações ao povo para evitar questionamentos sociais e políticos. Assim, a música usa essa metáfora para apontar como a sociedade brasileira também se deixava entreter por superficialidades, enquanto ignorava questões mais profundas.
A ideia de "transformações reclamadas", sejam políticas ou estéticas, aparece de forma ambígua na letra. Por exemplo, a repetição de ações como comer e assistir televisão insinua uma apatia coletiva, enquanto a juventude buscava novos caminhos para se expressar e se libertar de padrões impostos.
Já o trecho "Mandei plantar/ Folhas de sonho no jardim do solar/ As folhas sabem procurar pelo Sol/ E as raízes procurar, procurar" foi muitas vezes interpretado como algo relacionado a uma plantação caseira de maconha e o uso da droga. Como informa o letras.mus.br, "O solar se refere ao antigo hotel Solar da Fossa. Localizado em Botafogo, no Rio de Janeiro, o mítico Solar da Fossa foi moradia de inúmeros artistas e escritores em início de carreira, como Caetano Veloso e Gal Costa. Ali, nasceu o embrião de muito do que foi produzido na cena cultural brasileira nos anos 60."
Conforme relata Ediel Ribeiro, colunista do Diário do Rio, em um texto onde ele fala sobre o livro "O Solar da Fossa" do jornalista Toninho Vaz (Amazon), o local ganhou este nome graças a uma brincadeira feita do carnavalesco Fernando Pamplona que disse ter chegado ali em 1967 após se separar da esposa, descarregando suas malas e sua fossa na recepção.
Pelo lugar, diz Ediel, passaram artistas como Caetano Veloso, Zè Keti, Ruy Castro, Cláudio Marzo, Betty Faria, Gal Costa, José Wilker, Paulo Coelho, Paulinho da Viola, Maria Gladys, Darlene Glória, Abel Silva, Paulo Coelho, Naná Vasconcelos, Zé Rodrix, Guarabyra, Darlene Glória, Tânia Scherr, Sueli Costa, Antônio Pitanga, Ítala Nandi, Aderbal Freire Filho, Tim Maia e muitos, muitos outros.
"O solar virou refúgio de jovens porras-loucas, artistas, revolucionários e idealistas que encontraram no local um espaço livre para a criação e, claro, para farras intermináveis", relata Ediel. "A maioria, jovens que tinham envolvimento na militância estudantil, em ferrenha oposição ao regime militar vigente. Caetano Veloso criou ali sua primeira canção tropicalista: 'Paisagem Útil'; criou também 'Alegria, Alegria'. Pode-se dizer que o solar foi o berço da Tropicália, movimento musical lançado em 1968 com o disco 'Tropicália ou Panis et Circencis'. A capa do disco mostra vários moradores do solar e alguns visitantes habituais", conta o colunista, que relata outras dezenas de histórias em seu texto.
Um post feito no canal Rio - Casas & Prédios Antigos do facebook, conta várias histórias do local, bem como traz imagens da época, e informa que ele foi demolido em 1972 para a construção do Shopping Rio Sul, primeiro shopping construído na capital carioca.
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