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Kiss: há 20 anos o começo do fim (ou o fim do recomeço?) da era "romântica"

Por Doctor Robert
Postado em 04 de maio de 2015

Agosto de 1995. Após quase dois anos de uma extensa turnê mundial (a mais bem sucedida há décadas), o Kiss faz uma pausa em suas merecidas férias para gravar o seu "MTV Unplugged", que seria transmitido pelo canal de TV alguns meses depois e levaria seus fãs mais antigos ao delírio – era a primeira vez desde o final da década de 1970 que a formação original se reuniria novamente, inclusive com Ace Frehley e Peter Criss dividindo o palco com a formação atual ao final do show, gerando de imediato perguntas e mais perguntas sobre uma possível volta da formação clássica.

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Voltando no tempo, um ano antes, durante sua passagem pelo Brasil para o show que fechava o primeiro "Monsters Of Rock" tupiniquim, Paul Stanley relatava em entrevistas que o grupo já estava em processo de composição, e que o próximo disco do Kiss seria "pesado e psicodélico". Como os últimos lançamentos, "Revenge" e "Alive III", foram tão bons e tão bem recebidos, as expectativas eram altas. O Kiss rumava forte de volta ao topo... Mas esse seria apenas o começo de novas turbulências na sua já tão conturbada história.

MTV UNPLUGGED

Gravado nos estúdios da Sony em Nova York, em 9 de agosto de 1995, e lançado em vídeo e CD no ano seguinte, pode-se dizer que o "MTV Unplugged" do Kiss foi o grande catalisador para que outros artistas lançassem seus acústicos oficialmente – até então era meramente um show para a MTV, que apenas alguns artistas resolviam lançar oficialmente com certo sucesso. A audiência e as vendas foram bem altas, catapultadas pelo fanatismo do Kiss Army e pela primeira apresentação ao vivo da formação original do grupo desde o fim da turnê de "Dynasty" – Peter Criss aparece nos créditos de "Unmasked", mas como se sabe, não gravou nada (o baterista foi Anton Fig, que já havia gravado algumas faixas em "Dynasty") e saiu da banda antes da turnê (fora substituído pelo saudoso Eric Carr).

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Na verdade, essa versão oficial acústica apadrinhada pela MTV foi uma consequência das diversas participações feitas pelo Kiss nas convenções de fãs ao redor do mundo, onde o quarteto subia ao palco apenas com violões e baixo acústico, e tocava (ou tentava tocar) o que quer que os fãs pedissem. Diversos bootlegs foram lançados dessas apresentações, onde é curioso ver como em muitas canções que o grupo não tocava há anos (ou jamais havia tocado ao vivo), trechos instrumentais são esquecidos, assim como as letras, onde muitas vezes a plateia assumia os vocais.

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Voltando ao registro oficial, Gene Simmons e Paul Stanley resolvem convidar Ace e Peter para participar do encerramento do show, uma grata surpresa para os fãs mais antigos. Vídeos dos ensaios para o programa saíram no VHS (você se lembra o que era isso?) oficial, e mostram um clima bem ameno entre os músicos. Obviamente diversas especulações sobre a volta da formação clássica surgiram, mas todas prontamente negadas pelo Kiss. A informação oficial era de que estavam voltando aos estúdios para gravar um novo disco com Eric Singer e Bruce Kulick ainda aquele ano, e foi o que aconteceu.

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CARNIVAL OF SOULS

Era esse o cenário quando em novembro de 1995 o Kiss iniciava as gravações de seu novo disco, com o auxílio do produtor Toby Wright (que também trabalhara com Alice In Chains, Korn, Slayer, entre outros). Parecia que o assunto "Reunião" estava enterrado de vez – apenas parecia - o que os fãs mal poderiam imaginar é que em poucos meses a história do Kiss viraria do avesso e essas gravações não veriam a luz do dia tão cedo.

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Sofrendo forte influência da sonoridade da época, "Carnival Of Souls" trazia composições pesadas, arrastadas, com o grupo usando inclusive de afinações mais graves. Algo totalmente diferente do que seus fãs se acostumaram a ouvir, num resultado final talvez tão controverso quanto o de "The Elder", onde o Kiss se aventurou pelo rock progressivo.

Gene Simmons rasga a voz em temas como "Hate" e "In My Head", Paul Stanley parece cantar como nunca em "Rain", "Master & Slave" e "The Mirror", Eric Singer senta a mão nas baquetas. Mas quem dá as cartas e brilha no disco é o guitarrista Bruce Kulick, de longe o melhor guitarrista que já fez parte do Kiss. Kulick abusa de timbres e efeitos, desfila ótimos solos, assume o baixo em algumas músicas e até mesmo o vocal principal em "I Walk Alone", uma das melhores do disco. Outro grande momento é "Childhood’s End", escrita por Simmons, Kulick e um certo Tommy Thayer, além de "I Will Be There", com seus violões em afinações alternativas e baixo fretless.

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Tão logo foram finalizadas as gravações de "Carnival Of Souls", uma reviravolta. Em 28 de fevereiro de 1996, durante a 38ª cerimônia do Grammy o rapper Tupac Shakur aparece no palco dizendo: "Vocês sabem como o Grammy costuma ser, pessoas com ternos, todo mundo parecendo cansado, sem surpresas... Nós estamos cansados disso! Precisamos de algo diferente, algo novo... precisamos chocar as pessoas... então vamos chocar as pessoas!". E o que se segue é o Kiss, em sua formação original, com maquiagem e trajes da turnê "Love Gun" entrando no palco.

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Sim, desde as gravações do "MTV Unplugged", Stanley, Simmons e seu então novo empresário Doc McGhee negociavam a volta da formação clássica em segredo com Ace Frehley e Peter Criss (e seus advogados todos, obviamente). E aproveitando a onda, em março de 1996 o acústico chega às prateleiras, engavetando o novo disco praticamente pronto, para desgosto de Kulick e Singer (que voltou para a banda de Alice Cooper e disse à época que jamais dividiria o palco com Stanley e Simmons novamente). Complementando tudo, um anúncio oficial de uma turnê de reunião foi feito em uma coletiva de imprensa em no porta-aviões USS Intrepid CV-11.

Porém, o que o grupo não esperava era que mesmo em turnê com a formação clássica a todo o vapor, "Carnival Of Souls" não seria esquecido pelos fãs, e rapidamente o disco foi pirateado, vendendo muitas cópias e levando o Kiss a oficializar seu lançamento em outubro de 1997, com o subtítulo de "The Final Sessions", colocando na capa uma foto onde se passa a impressão de um ambiente não muito amistoso entre os músicos (exatamente o contrário do que se vê nos extras do DVD "Kissology 3", onde são exibidas cenas do grupo no estúdio).

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Paralelo a isso foi lançada a coletânea mais sem vergonha da história do Kiss, "You Wanted The Best, You Got The Best", onde foram pinçadas faixas dos dois primeiros "Alive" e incluídas quatro gravações inéditas supostamente ao vivo – sim, supostamente, porque há um consenso quase que geral de que "Room Service", "Two Timer", "Let Me Know" e "Take Me" foram totalmente feitas em estúdio. Num rápido parêntese, recordo até de uma resenha do grande Vitão Bonesso para a revista Rock Brigade na época do lançamento, onde ele citava inclusive efeitos de guitarra que nem existiam na década de 1970. Anos depois, Bruce Kulick chegou a mencionar em entrevistas de que havia participado em estúdio de algumas gravações dessa coletânea.

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PSYCHO CIRCUS

O que seria apenas uma turnê para relembrar os velhos tempos cresceu monstruosamente. E após 192 shows em 11 meses na "Alive/Worldwide Tour", segue-se um breve descanso e logo o Kiss se concentraria em trazer aos fãs o primeiro disco inédito com a formação clássica desde "Unmasked" (na verdade, desde "Dynasty", que foi onde Peter Criss realmente gravou pela última vez com o grupo), aproveitando o ótimo momento e visando principalmente apagar a má impressão deixada pela coletânea anterior. Porém a lua de mel já havia acabado. As velhas tensões que já haviam voltado ainda na turnê de reunião davam as caras com mais força ainda no estúdio.

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"Psycho Circus" foi muito celebrado em seu lançamento em 1998, chegando ao disco de ouro rapidamente nos EUA. A excelente faixa título logo se tornou um clássico imediato e seu vídeo clipe em 3D anunciava a novidade para a próxima turnê (novidade em termos, porque 15 anos antes, o Rush já havia utilizado a tecnologia na turnê de "Grace Under Pressure"). Porém o tempo foi passando e ficou a constatação de que a receita desandou mesmo e o álbum não é lá essas coisas.

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Alternando grandes momentos (como a já citada faixa título e também "Within", de Gene Simmons, que originalmente pertencia a "Carnival Of Souls"), com outros extremamente mornos ("We Are One", "Raise Your Glasses") e outros terríveis ("I Finally Found My Way", uma tentativa frustrada de resgatar o sucesso de "Beth"), "Psycho Circus" é um álbum que não sobreviveu tão bem ao teste do tempo. O que se soube depois é que na verdade Ace Frehley e Peter Criss tiveram muito pouco envolvimento na gravação (os quatro juntos só tocam em "Into The Void"), sendo que as baterias foram quase que totalmente gravadas por Kevin Valentine (à exceção de "Into The Void") e as guitarras por Tommy Thayer e Bruce Kulick (que notadamente gravou o baixo e as guitarras em "Within"). Paul Stanley futuramente culparia o fracasso das gravações pelo envolvimento excessivo de advogados, alegando que "não havia uma banda, não havia um propósito comum entre eles".

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Brigas à parte, veio mais uma turnê mundial com a formação clássica e as já citadas projeções em 3D nos telões, chegando a passar pelo Brasil, que finalmente testemunhava o Kiss original no palco – tive o prazer de estar lá, no caótico Autódromo de Interlagos, e ainda hoje guardo de recordação os óculos e o canhoto do ingresso. Chegaram às bancas também a série de revistas em quadrinhos "Psycho Circus", com a assinatura do renomado Todd McFarlane. Foram centenas de shows ao redor do mundo e, paralelamente a isso tudo, as brigas internas corroendo cada vez mais o já nada fácil relacionamento do quarteto original.

TURNÊ DE DESPEDIDA E ALIVE IV

Em 31 de dezembro de 1999, o Kiss gravaria em Vancouver, no Canadá, o que deveria ser seu "Alive IV" (com o pomposo subtítulo de "The Millenium Concert", por conta da virada do milênio). Porém, devido a um rompimento de contrato com a gravadora Universal, o projeto foi abortado (sendo lançado oficialmente depois apenas no Box "Alive 1975-2000). O clima interno da banda já beirava o insuportável, e no começo do ano 2000, é anunciada a turnê que seria de despedida (ahã...) da banda, que teria shows agendados até abril de 2001. O concerto de setembro de 2000 em Nova Jersey foi inclusive transmitido por diversas redes de TV por assinatura ao redor do mundo, sob o nome de "The Last Kiss" (posteriormente lançado como parte do DVD "Kissology 3").

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Às vésperas dos shows no Japão e Austrália em janeiro de 2001, Peter Criss anuncia sua saída da banda, devido a problemas com os valores que lhe estavam sendo pagos para tocar. Quem o substituiria seria Eric Singer, que concordou em usar a mesma maquiagem e tocar no mesmo estilo minimalista que Criss, levando a uma revolta dupla dos fãs: primeiro pelo fato da maquiagem, já que historicamente quando houve troca de membros na banda, as maquiagens também mudavam (agora Stanley e Simmons eram donos dos "personagens"); segundo porque Eric Singer é um baterista extremamente virtuoso para tocar de maneira tão simplória quanto Peter Criss, uma verdadeira afronta aos seus talentos (mas, pagando bem... pra quem nem dividiria mais os palcos com o Kiss...).

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Após um grande intervalo, em fevereiro de 2002 o Kiss tocava no encerramento das Olimpíadas de Inverno de Salt Lake City, em Utah (EUA), novamente com Eric Singer na bateria. Seria a última performance de Ace Frehley com o grupo, que tocaria novamente no mês seguinte em um show particular em um resort da Jamaica pela primeira vez com Tommy Thayer encarnando o personagem de Ace – gerando ainda mais controvérsias entre os fãs. Thayer ainda apareceria com o grupo na série "That ‘70s Show" e no especial de TV em homenagem aos 50 anos do programa de Dick Clark. Mas em 2003 Peter Criss negocia sua volta à banda, e em fevereiro daquele ano, o grupo se apresentaria na Austrália junto à Orquestra Sinfônica de Melbourne (toda maquiada com os personagens do Kiss), no que resultaria em "Kiss Symphony: Alive IV", novamente com Thayer na guitarra.

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Como a tal aposentadoria do grupo já tinha ido para o espaço mesmo, logo foi anunciada uma turnê conjunta com o Aerosmith pelos EUA. Ace Frehley é convidado a reassumir seu posto, mas se recusa dizendo que a turnê de despedida foi realmente a última, aquilo não era mais o Kiss, e ele se negava em aceitar o Kiss abrindo para o Aerosmith. Com Thayer então oficializado na banda, a novidade agora eram os "Platinum Tickets", ingressos que por módicos US$ 1.000,00 te garantiam os primeiros assentos na pista e o direito a conhecer a banda nos bastidores (era o começo da febre dos "meet and greet"). Foram também os últimos shows de Peter com o grupo e o fim definitivo da fase "romântica" da banda.

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A partir daí, o que se segue foi o Kiss levando a vida adiante com Thayer e Singer incorporando os personagens, muitas trocas de farpas entre os ex-companheiros e Stanley e Simmons (via imprensa, biografias, etc.), novos bons álbuns ("Sonic Boom" e "Monster", muito melhores que o irregular "Psycho Circus"), a voz de Paul Stanley se deteriorando e uma infinidade de shows mundo afora. E se anos antes falava-se em turnê de despedida, hoje o discurso de Gene Simmons é de que o Kiss irá continuar para sempre, mesmo sem ele e Paul Stanley, com novos músicos incorporando seus personagens. Afinal, o $how deve continuar... $empre...

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Sobre Doctor Robert

Conheceu o rock and roll ao ouvir pela primeira vez Bohemian Rhapsody, lá pelos idos de 1981/82, quando ainda pegava os discos de suas irmãs para ouvir escondido em uma vitrolinha monofônica azul. Quando o Kiss veio ao Brasil em 1983, queria ser Gene Simmons e, algum depois, ao ver o clipe de Jump na TV, queria ser Eddie Van Halen. Hoje é apenas um bom fã de rock, que ouve qualquer coisa que se encaixe entre Beatles e Sepultura, ama sua esposa e juntos têm um cãozinho chamado Bono.
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