Blindagem: mais de 35 anos de Rock n Roll
Por Leonardo Schenato Barroso
Fonte: Folha de Irati
Postado em 24 de dezembro de 2012
Com mais de 35 anos de estrada e de rock ‘n’ roll, a banda curitibana Blindagem esteve no município de Irati, no sábado (15) se apresentando no Underground Snooker Bar durante a Virada Cultural da cidade. Na ocasião, apresentaram clássicos do grupo como "Dias Incertos", "Miragem" e "Loba da Estepe", além de versões cover de músicas marcantes da história do rock. Em entrevista exclusiva para a Folha de Irati, Juk e Teixeira, os "Paulos" do Blindagem, fizeram um balanço das diferenças entre o mundo da música atual comparado ao do início da carreira, comentaram sobre a perda do vocalista Ivo Rodrigues, em 2010, deram dicas para bandas de rock iniciantes e revelaram alguns planos para 2013.
Qual o segredo do Blindagem para ultrapassar 35 anos de carreira no rock ‘n’ roll?
Paulo Juk – O que importa, mais do que tudo, é que você criou uma marca registrada. No nosso caso, assim como de outras bandas que estão na faixa dos 35-40 anos, como os Rolling Stones, Eagles e o Roupa Nova, é uma coisa meio sem mudança. Conseguimos manter a mesma formação, com exceção daqueles que foram partindo pelo caminho. Isso não é mudança, mas uma continuação do trabalho dos que nos deixaram, só que a essência da banda é a mesma, não partiu para outros movimentos musicais que surgiram. No geral, o grupo permanece porque conseguiu criar uma marca e ficar junto por uma grande amizade que existe.
Paulo Teixeira – Basicamente é o amor à música, o prazer de tocar. A banda através do tempo vai se comprometendo cada vez mais com o público e passamos a ficar com o desejo de ‘fazer a cabeça’ de quem curte a gente. Nunca nos negamos a tocar em qualquer lugar, ou seja, é a vontade de tocar e o ‘tesão’ de fazer música, de ser guitarrista e divertir as pessoas que motivou a longevidade da banda. E também a amizade entre os integrantes, que é essencial.
Quais as diferenças entre o universo musical do início da carreira do Blindagem e o atual?
Paulo Juk – Quando nós surgimos, o mundo vivia uma revolução cultural, com aquilo de `amor livre`, `Flower Power`, `paz e amor` e tudo mais, e todas as dificuldades que existiam no acesso à informação. Lembro que era difícil estudar música: alguém tinha uma partitura e você pegava a cópia da cópia mimeografada e fazia disso uma forma de estudo, ouvindo gravações de baixa qualidade. Os Beatles lançavam uma música e ela demorava anos para chegar aos EUA e mais tempo ainda ao Brasil. Hoje, há uma revolução tecnológica e as coisas acontecem muito mais rápido devido à internet: uma banda lança uma música e no mesmo dia ela pode ser ouvida em qualquer lugar do mundo. E pouquíssimo tempo depois, você já pode aprender a tocá-la pela internet.
Paulo Teixeira – A gente pode dizer que viu uma transformação importante do analógico para o digital. A gente viveu esse momento de transição. Nos adapta-mos a isso, desenvolvendo mais o lado tecnológico para estarmos inseridos na web, atualizando e aproveitando mais dos canais novos que ‘pintaram’. Esse é o dado mais importante da evolução da banda: ter gravado em fita analógica, muitas vezes sem condições apropriadas, e agora ter a facilidade de registrar qualquer coisa a qualquer momento.
Como você enxerga o cenário atual do rock no Paraná e no Brasil?
Paulo Juk – O rock continua. Hoje você vai num show de Sertanejo Universitário, que é a música do momento, e escuta Legião Urbana, Barão Vermelho, Raul Seixas. Então, o que há é um movimento da mídia para empurrar um segmento musical que está sendo consumido. Acho que a coisa deveria ser mais eclética: a música não precisa ser tão consumida. Assim como o rock, na década de 80, que encheu de tanto tocar na rádio. Você ligava e só tocava rock. Isso era uma imposição de mídia, era o movimento cultural da época. Poucas bandas daquele tempo sobreviveram, como deverá ser com o Sertanejo Universitário de hoje.
Paulo Teixeira – A gente sempre vive na esperança de que o rock cresça e não seja subjugado por outras vertentes, coisas até meio xaropes, como é o caso da música ‘sacana’, bem comercial, procurando a melodia fácil. A gente sempre foi fiel a essa a linha roqueira e não pode se render a ir, por exemplo, para um sertanejo agora só porque está em alta. Apesar de que a banda tem todo um lado de violões, um lado caipira. Eu sou de Palmeira, que é aqui do ladinho de Irati. O Juk também é do interior, todos com uma origem humilde e nas coisas puras, ‘da terra’.
Qual dica você dá para quem está começando ou pretende começar no ramo da música?
Paulo Juk – Como hoje o acesso à informação é muito maior, a renovação também é mais rápida. Uma banda surge hoje como um sucesso no youtube e duas semanas depois já tem outra, e depois outra e várias ao mesmo tempo. Então, acima de tudo, você precisa ser muito honesto e confiar no que faz, independentemente do estilo musical. E isso eu não vejo hoje. Muitos conhecidos meus que tocavam rock, passaram para outro estilo por ser mais consumido. Aí o cara não está sendo honesto com ele mesmo, porque escuta uma música em casa e no palco toca qualquer outra só para acompanhar a onda do momento.
Paulo Teixeira – É procurar, com todas as forças, trabalhar em algo próprio. Claro que é muito gostoso você tocar um sucesso, fazer um cover legal e tudo mais. Mas é muito importante você tentar passar uma coisa própria. O artista tem que procurar fazer a sua música, de repente algo ligado à realidade dele, de onde ele mora, tentando que suas letras modifiquem alguma coisa e interajam de forma positiva com a galera.
Em 2010, o Blindagem perdeu o vocalista Ivo Rodrigues, vítima do câncer, aos 61 anos. Como você recebeu essa notícia e como isso afetou a banda?
Paulo Juk – Na verdade, isso já vinha acontecendo há alguns anos e a gente via que aquela doença ia consumir com ele. Foi um processo muito doloroso: ele com aquela energia, querendo tocar, nós muitas vezes não querendo que ele fosse porque víamos que ele não estava legal. Ele ia e o público achava que estávamos obrigando ele a cantar. Foi uma dificuldade muito grande. Principalmente no último ano, porque ninguém sabia o que fazer, se o Blindagem ia continuar ou não. Mas alguns dias antes, tivemos uma conversa e ele nos incentivou, assim como diversas pessoas ligadas à banda. No dia em que eu recebi a notícia do falecimento dele, eu vi a força da internet. Pouco tempo depois de postar no meu Twitter, a informação já havia sido compartilhada por milhões de pessoas.
Paulo Teixeira – Eu estava junto com Ivo, estivemos juntos até o último momento. Considero que, apesar de todo o sofrimento que ele teve, ele não se foi. Ele é uma coisa assim, meio mística. Sentimos que ele está presente. Muitas músicas eram dele, então é impossível imaginar o Ivo fora. Quer dizer, ele está fora, mas está dentro também: na vibração que ele tinha e na influência que ele deixou. Vários cantores de Curitiba e outros lugares que se tornaram profissionais são decla-radamente inspirados nele.
Quanto ao Rodriggo Vivasz, atual vocalista, o que ele acrescentou à banda?
Paulo Juk – Ele já estava cantando com a banda mesmo com o Ivo vivo, que sabia disso e gostava muito do trabalho do Rodriggo no The Elder, assim como o resto da banda. Não foi fácil para ele. No primeiro show ele subiu no palco e o público gritando o nome do Ivo, chorando. Tudo isso foi difícil para o Rodriggo assimilar. Mas é um cara quinze anos mais novo, então traz uma energia maior em cima do palco, mais pique. E claro, a capacidade vocal dele possibilitou a continuidade do Blindagem.
Paulo Teixeira – Ele apresentou uma coisa muito bonita. Além de ser um amigo, que se encaixou perfeitamente no grupo como se fizesse parte o tempo todo, ele humildemente se sujeitou a subs-tituir o Ivo nas horas difíceis e fez esse ‘rito de passagem’ de forma maravilhosa, às vezes imitando o Ivo de certa forma. O legal é que ele já está imprimindo seu estilo na banda e o Blindagem já começa a ter um outro lado diferente, e esse é o objetivo do lance.
Quais são os planos da banda para 2013?
Paulo Juk – Se o mundo não acabar no dia 21, como está previsto [risos], o fim do ano sempre marca uma ruptura de um período para outro. Temos um show no Guaíra com a orquestra sinfônica do Paraná, feito já com o Rodriggo, temos projeto com a orquestra sinfônica de Ponta Grossa e músicas novas. Não vamos lançar um CD, mas vamos lançar músicas, disponibilizar na internet e continuar. O importante é que a gente não para.
Paulo Teixeira – Estamos em um processo de desligamento do trabalho passado. Tem uma coisa muito marcante com o primeiro LP, algo meio Rolling Stones: a gente também tem que tocar o nosso ‘Satisfaction’, entendeu? Mas, estamos num período de elaborar nas nossas cabeças uma continuidade, então a gente já toca umas músicas novas, alguma coisa diferente, tentando fazer essa passagem.
Texto e foto: Leonardo Schenato Barroso.
Matéria publicada na edição 1884, de 21 de dezembro de 2012, do jornal impresso semanal Folha de Irati, assim como na versão eletrônica do veículo.
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