Tom Morello espreme passado, presente e futuro no Best of Blues and Rock
Resenha - Tom Morello (Best of Blues and Rock, São Paulo, 04/06/2023)
Por André Garcia
Postado em 07 de junho de 2023
Surgido no começo dos anos 90 com o Rage Against the Machine, Tom Morello parece um dos guitarristas mais divisivos: para alguns é um dos mais inconfundíveis músicos de sua geração; para outros, só faz mais do mesmo e não passa de um fazedor de barulhinhos. Eu pertenço ao primeiro grupo, mas confesso que, além dos álbuns do Rage e os hits do Audioslave, pouco acompanhei sua carreira.
Fotos: André Velozo
Carreira solo essa em que Tom não abre mão de exercitar e desafiar seu ecletismo. Portanto, fui ao Best of Blues and Rock me perguntando que Tom Morello eu veria: o bombástico do Rage? O melódico do Audioslave? O folk do "One Man Revolution"? O pop do "The Atlas Underground"? A resposta correta foi todas as alternativas anteriores.
Em sua primeira vinda ao Brasil após a pandemia, subiu ao palco para o primeiro de seus dois shows no festival numa fria sexta-feira logo após o Extreme, pontualmente às 20h30. Já de cara chamou atenção Tom Morello cantando. Sei que isso não é mais nenhuma novidade, mas, sei lá, na minha cabeça ele é até hoje só guitarrista.
Ele fez um discurso onde disse, em um louvavelmente bom português: "Obrigado, São Paulo! Olá, São Paulo! Que bom voltar ao Brasil, onde vamos tocar pelo amor, pela paz, pela igualdade, pelo rock n roll, e sempre contra o fascismo. O fascismo sucks… fucking sucks!" Ele não mostrou a mensagem "NO FASCISMO" na guitarra, no entanto, isso foi só no segundo show, domingo, quando fechou o evento.
A seguir veio um medley de músicas do Rage Against the Machine, o que me deixou dividido. Por um lado, foi emocionante ver, pela primeira vez, Tom Morello tocando aqueles riffs; por outro, cada vez que ele pulava de um riff para outro era um coito interrompido musical. Eu adoraria que ele tocasse aquelas músicas inteiras, mas entendo que só isso já tomaria metade do show.
A seguir, ele relembrou seu saudoso ex-colega de Audioslave Chris Cornell. Antes de tocar "Like a Stone", pediu para que os que soubesse a letra cantassem junto; e os que não soubessem, fizessem uma prece à sua memória. Quem cantou não foi Tom, entretanto, foi o guitarrista base, que até que mandou bem. As músicas mais vocalmente desafiadoras foram geralmente deixadas para ele.
Iluminação é um quesito no qual o show poderia ter tirado muito proveito, mas foi bem básico e conservador. Acabou até sendo um anticlímax em comparação ao Extreme, que tocou logo antes e caprichou. Seria muito bem-vindo um uso mais criativo das imagens no telão também. Não é exagero dizer que o show quase inteiro acontece na frente da imagem da capa de "The Atlas Underground Flood" (2021).
Vale ressaltar que Jimi Hendrix foi lembrado e homenageado em todos os três dias de evento. Assim como Malvada, Buddy Guy e Ira, Tom Morello prestou tributo com uma versão instrumental de "Voodoo Child". Instrumentais, aliás, foram boa parte do show: alguns foram jams mais espontâneas, alguns foram momentos acrobáticos mais ensaiados.
Tom Morello disse que em sua carreira já totaliza 21 álbuns — dos quais 17 entraram no repertório daquele show nem que fosse apenas com um riff. E é aí que está o que para mim (e, pelo que pude observar, para outras pessoas também) foi um problema: o show empolga em certos momentos, mas em outros, nem tanto.
Eu entendo o lado dele, no entanto — inclusive acho que está coberto de razão. Entendo que ele não queira passar a vida inteira tocando "Killing in the Name", e não queira passar a vida inteira sendo o cara do R.A.T.M. Seu repertório contempla seu ecletismo e seu passado (ou melhor, seus passados), seu presente e até mesmo arar o terreno para seu futuro. Mas isso cobra um preço: um público oscilando do quente para o frio.
Puxando a reta final, "Cochise" contou com uma participação especial da dupla do Extreme, Nuno Bettencourt e Gary Cherone. Gary sofreu para atingir os picos vocais de Chris Cornell, mas visivelmente deu seu melhor, e não comprometeu. Entre Tom e Nuno um dueto interessante de pelo contraste de dois músicos brilhantes por coisas opostas.
A seguir, com o martelar dos acordes iniciais de "Killing in the Name" não teve cabeça no Ibirapuera que não bateu em aprovação. Essa música não tinha motivo para ser instrumental: não precisa ser um rapper para cantar ela! Pelo menos essa ele tocou até o fim!
Na saideira, um cover do hino proletariado de John Lennon, "Power to the People", em uma versão mais roqueira e abreviada, restrita ao refrão. Além do Extreme, se juntou ao coro Steve Vai. E o telão a mostrar aquela que foi, pelas minhas contas, a terceira imagem exibida em todo o show: um coração sob uma mira que parece tirado de uma busca no Google.
Set list:
One Man Revolution
Let’s Get the Party Started
Hold the Line
Medley Rage Against the Machine: Bombtrack / Know Your Enemy / Bulls on Parade / Guerrilla Radio / Sleep Now in the Fire
Like a Stone (Audioslave)
Voodoo Child (Jimi Hendrix)
Gossip (Maneskin)
Lightning Over Mexico
Secretariat (For EVH)
Cato Stedman & Neptune Frost
Atlas Medley: Rat Race (Electric Sheep) / Battle Sirens / Where It’s At Ain’t What It Is / Prophets of Rage (Public Enemy) / Harlem Hellfighter / Can’t Stop the Bleeding / Bullet in the Head (Rage Against the Machine)
Keep Goin’
Medley: Testify (Rage Against the Machine) / Ghetto Blaster / Half Man Half Beast / Born of a Broken Man / Freedom (Rage Against the Machine) / Snake-Charmer
Vigilante Nocturno
The Ghost of Tom Joad (Bruce Springsteen)
Cochise (Audioslave; com Gary Cherone e Nuno Bettencourt)
Killing in the Name (Rage Against the Machine)
Power to the People (John Lennon; Extreme + Steve Vai)
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